Acórdão Nº 0306505-30.2016.8.24.0033 do Segunda Turma Recursal - Florianópolis (Capital), 20-07-2021

Número do processo0306505-30.2016.8.24.0033
Data20 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
Classe processualPROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL
Tipo de documentoAcórdão
RECURSO CÍVEL Nº 0306505-30.2016.8.24.0033/SC

RELATORA: Juíza de Direito Margani de Mello

RECORRENTE: ZENILDE SARAGOCA JARDIM (AUTOR) RECORRIDO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU) RECORRIDO: MUNICÍPIO DE ITAJAÍ/SC (RÉU)

RELATÓRIO

Conforme autorizam o artigo 46, da Lei 9.099/95, e o Enunciado n. 92, do FONAJE, dispensa-se o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso inominado interposto por ZENILDE SARAGOCA JARDIM em face de sentença que extinguiu o processo, sem resolução do mérito, em relação ao insumo e ao exame não padronizado e julgou procedente o pedido de fornecimento de medicamento padronizado. Alega, em síntese, que é desnecessária a participação da União nas demandas que envolvem tratamentos não padronizados.

Sem contrarrazões.

Para cada um dos tratamentos/medicamentos/exames postulados pela parte a solução deste processo judicial deve ser diferente, considerando que se está diante de um caso no qual um dos insumos não é padronizado e pode ser substituído (Modulen), o medicamento é padronizado (Mesalazina) e o exame perseguido não é padronizado (Estudo de intolerância alimentar).

(i) No que pertine ao medicamento padronizado (Mesalazina), a sentença foi de procedência e não houve insurgência dos entes federativos recorridos, motivo pelo qual não há necessidade de análise do ponto.

(ii) No que pertine ao exame não padronizado, a sentença foi extintiva, sem resolução do mérito, considerando a necessidade de participação da União no polo passivo da demanda (considerando que envolve dois outros insumos, sendo um deles padronizado).

Neste ponto, a sentença não merece reparo.

Em recente julgamento, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a solidariedade dos entes federativos para prestações na área da saúde, bem como a necessidade de integração da União nas demandas que discutem o fornecimento de medicamento/tratamento não padronizado pelo Sistema Único de Saúde:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE. POSSIBILIDADE. RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE. DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. 2. A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. 3. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. Precedente específico: RE 657.718, Rel. Min. Alexandre de Moraes. 4. Embargos de declaração desprovidos. (RE 855178 ED, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-090 DIVULG 15-04-2020 PUBLIC 16-04-2020, sem grifos no original)

Do voto proferido pelo Ministro Edson Facchin, colhe-se o seguinte excerto:

[...] Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas as suas hipóteses), a União necessariamente comporá o polo passivo, considerando que o Ministério da Saúde detém competência para a incorporação, exclusão ou alteração de novos medicamentos, produtos, procedimentos, bem como constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica (art. 19-Q, Lei 8.080/90), de modo que recai sobre ela o dever de indicar o motivo da não padronização e eventualmente iniciar o procedimento de análise de inclusão, nos termos da fundamentação.

Dessa forma, inarredável a conclusão de incompetência absoluta da Justiça Estadual para o processamento e julgamento da ação nesse ponto, diante da necessidade de participação da União em processo em que se discute a prestação de fármaco/tratamento não padronizado se harmoniza com o que foi decidido no Tema n. 793, conforme recente entendimento do STF:

AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO ADOTADO NO REGULAMENTO DO SUS. INCLUSÃO DA UNIÃO DO POLO PASSIVO. TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL. 1. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, no julgamento do RE 855.178 (Rel. Min. LUIZ FUX, Tema 793), examinou a repercussão geral da questão constitucional debatida nestes autos e reafirmou a jurisprudência desta CORTE no sentido da responsabilidade solidária dos entes federados do dever de prestar assistência à saúde. 2. Posteriormente, ao rejeitar os embargos de declaração opostos em face deste acórdão, o SUPREMO fixou a seguinte tese: "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro". 3. No caso concreto, ao determinar a inclusão da União no polo passivo da demanda, com a consequente remessa dos autos à Justiça Federal, o Tribunal de origem seguiu a tese de repercussão geral. 4. Agravo Interno a que se nega provimento (RE 1299773 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 08/03/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-050 DIVULG 15-03-2021 PUBLIC 16)

Neste mesmo sentido: RE 1307921, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Julgamento: 19/03/2021, Publicação: 23/03/2021; ARE 1298325, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Julgamento: 12/02/2021, Publicação: 18/02/2021; RE 1303165, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO Julgamento: 11/02/2021, Publicação: 17/02/2021; ARE 1298493, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgamento: 24/03/2021, Publicação: 25/03/2021; e ARE 1301670, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Julgamento: 17/12/2020, Publicação: 07/01/2021.

O entendimento também se coaduna com o que foi recentemente decidido pela Turma de Uniformização:

Nas demandas propostas perante os juizados especiais fazendários que objetivem o fornecimento de medicamentos ou procedimentos não padronizados pelo SUS, a União obrigatoriamente fará parte do polo passivo na qualidade de litisconsorte necessário. (Enunciado aprovado apud acta, art. 66-M, RITR).

Diante deste cenário, considerando que (a) o pedido inicial engloba medicamento padronizado e exame/insumo não padronizado e que (b) seria inviável a cisão do processo com o envio de apenas parte dele para a Justiça Federal, a extinção do processo, sem resolução do mérito, em relação ao pedido de realização de exame não padronizado é medida que se impõe, diante da manifesta incompetência da Justiça Estadual, estando a sentença correta no ponto.

(iii) Por outro lado, no que pertine ao pedido de fornecimento do insumo Modulen (não padronizado), a sentença deve ser alterada, já que o laudo pericial judicial foi claro ao indicar a possibilidade de sua substituição por alternativas oferecidas pelo Sistema Único de Saúde (evento 188, p. 7).

Assim, não preenchido um dos requisitos estabelecidos no IRDR n. 0302355- 11.2014.8.24.00541, qual seja, a ineficiência das alternativas fornecidas pelo Sistema Único de Saúde no caso concreto ou a impossibilidade de substituição, a demanda deve ser julgada improcedente, sendo desnecessário, neste caso, a inclusão da União no polo passivo da demanda.

Colhe-se julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina neste sentido:

MEDICAMENTO - IRDR 0302355-11.2014.8.24.0054 DESTE TRIBUNAL - TEMA 106 DO STJ - PERÍCIA EM SENTIDO CONTRÁRIO À PRETENSÃO - SOLIDARIEDADE ATÍPICA RECONHECIDA PELO STF - NECESSIDADE, EM TESE, DE INCLUSÃO DA UNIÃO - OCIOSIDADE NO CASO CONCRETO ANTE A IMPROCEDÊNCIA QUANTO A REMÉDIO NÃO PADRONIZADO - SENTENÇA MANTIDA. 1. É possível a concessão de medicamentos pela via judicial (STJ, Tema 106; TJSC, IRDR 0302355-11.2014.8.24.0054, rel. Des. Ronei Danielli). A ideia não fere a isonomia ou a separação de Poderes, tampouco é óbice uma específica previsão orçamentária prévia. 2. A demandante pede remédio não padronizado, mas a prova técnica afastou a imprescindibilidade à vista de estudo científico que não comprova a eficácia, aliada à existência de políticas públicas para a asma grave. 3. Pelo Tema 793 do STF, aclarando em embargos de declaração, a União dever ser citada nas causas em que se postulam medicamentos não padronizados. Aqui, todavia, a decisão é de improcedência em relação a remédio não padronizado e não existe por que garantir defesa para quem não pode sofrer condenação. Ademais, a Justiça Federal é competente apenas quando a União for parte (requerimento que depende do interesse do autor). Aqui, ela não tem esse status e a decisão a favorece. Não vale desprezar o processo já maduro para solução. Se existe a solidariedade, como disse o STF, ainda que atípica, deve-se relembrar que, improcedente o pedido quanto a um codevedor, não pode "o credor queixar-se; aliás, ele podia ter demandado em conjunto todos os devedores" (disse o brilhante professor Fernando Noronha a...

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