Acórdão Nº 0306896-19.2017.8.24.0075 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 06-10-2022

Número do processo0306896-19.2017.8.24.0075
Data06 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0306896-19.2017.8.24.0075/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0306896-19.2017.8.24.0075/SC

RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA

APELANTE: SANDRO DE QUADRA (AUTOR) ADVOGADO: MARIA KAROLINE DE ANDRADE (OAB SC042722) ADVOGADO: LUCIANO FERMINO KERN ADVOGADO: Washington Baricalla de Oliveira APELANTE: COOPERATIVA DE CREDITO UNICRED SUL CATARINENSE LTDA - UNICRED SUL CATARINENSE (RÉU) ADVOGADO: CARLOS WERNER SALVALAGGIO (OAB SC009007) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação, interpostos por ambas as partes, da sentença, proferida pela Juíza de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Tubarão (Dra. Lara Maria Souza da Rosa Zanotelli), que, nos autos da ação de revisão contratual (abertura de crédito e outras avenças), ajuizada por Sandro de Quadra em face de Cooperativa de Crédito Unicred Sul Catarinense Ltda. - UNICRED Sul Catarinense, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos:

Ante o exposto, HOMOLOGO a desistência da ação em relação aos contratos nº 2016401944, nº 2013401053, nº 2013401741, nº 2014401209 e nº 2014402108 e, por via de consequência, JULGO EXTINTO O PROCESSO, no tocante a eles, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso VIII, do Código de Processo Civil.

Ainda, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por SANDRO DE QUADRA em face de COOPERATIVA DE CRÉDITO UNICRED SUL CATARINENSE LTDA - UNICRED SUL CATARINENSE, para tão somente promover as seguintes adequações:

(1) No Contrato de Abertura de Crédito em Conta Corrente: (a) Mantenho as taxas de juros aplicadas pela cooperativa para cada mês em que efetivamente utilizado o cheque especial, salvo se a taxa aplicada for superior a três vezes o valor da taxa média de juros divulgada pelo Bacen para a operação cheque especial - pessoa física e para o efetivo mês de utilização do cheque especial, ocasião em que, então, esta última deverá prevalecer, o que deverá o interessado comprovar em sede de liquidação de sentença; (b) Vedo a capitalização de juros; (c) Proíbo a incidência da Tabela Price; (d) Autorizo a incidência da comissão de permanência, de maneira isolada e limitada à soma dos encargos remuneratórios e moratórios da avença; (e) Determino a incidência do INPC como índice de correção monetária;

(2) No Contrato de Cartão de Crédito: (a) Proíbo a incidência da Tabela Price.

Afasto os efeitos da mora no contrato de cheque especial, com a consequente extirpação dos encargos cobrados a esse título, ficando vedada a inclusão/manutenção do nome do autor no rol de inadimplentes em razão de dívida, até verificação de existência de saldo devedor nos termos desta sentença e inércia do devedor em efetuar o pagamento da quantia correta, após cientificada de eventual débito.

Condeno a ré à devolução, de forma simples, dos valores eventualmente cobrados em excesso, calculados com base na presente decisão, após compensação com os débitos existentes.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno a parte autora ao pagamento de 80% (oitenta por cento) das custas e despesas processuais. Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários de advogado do procurador da parte adversa, estes últimos que fixo em 80% de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), com amparo no art. 85, § 8º, do CPC.

Condeno a parte requerida ao pagamento de 20% das custas e despesas processuais. Condeno a parte requerida ao pagamento dos honorários de advogado do procurador da parte adversa, estes últimos que fixo em 20% de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), com amparo no art. 85, § 8º, do CPC.

A cobrança das custas e dos honorários advocatícios devidos pela parte autora fica suspensa em razão do benefício da Justiça Gratuita deferido (art. 98, § 3º, CPC).

Em suas razões recursais, a parte demandante sustentou as seguintes teses:

(a) a abusividade dos juros remuneratórios durante a inadimplência;

(b) a incidência do INPC;

(c) a abusividade dos juros remuneratórios quanto ao contrato de cheque especial;

(d) o afastamento da comissão de permanência quanto ao contrato de cheque especial;

(e) a ilegalidade da capitalização de juros no contrato de cartão de crédito;

(f) a impossibilidade de utilização da TFB como índice de correção monetária quanto ao contrato de cartão de crédito;

(g) a descaracterização da mora;

(h) a repetição do indébito na forma dobrada; e

(i) a inversão dos ônus sucumbenciais.

A parte demandada, por sua vez, defendeu:

(a) a impossibilidade de incidência do CDC;

(b) a validade dos juros remuneratórios e da capitalização de juros quanto aos contratos de cheque especial e cartão de crédito; e

(c) a caracterização da mora.

Foram apresentadas contrarrazões (eventos 81 e 86).

É o relatório.

VOTO

I. Tempus regit actum

Sentença proferida em 06.07.2021.

Portanto, à lide aplica-se o CPC/15, na forma do enunciado administrativo nº 3: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

II. Tempestividade e preparo recursal

Porque tempestivos, conheço dos recursos.

III. Caso concreto

III.I Tópicos comuns às partes

(a) juros remuneratórios

Acerca da temática concernente à fixação de juros remuneratórios em contratos bancários, tal como a hipótese dos autos, a Súmula n. 382 do Superior Tribunal de Justiça assentou entendimento de que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade".

Ademais, no que tange à possibilidade de revisão da taxa pactuada, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de Recursos Especiais Repetitivos (REsp. n. 1.112.879 e REsp. n. 1.112.880), firmou o seguinte entendimento:

Nos contratos de mútuo em que a disponibilização do capital é imediata, o montante dos juros remuneratórios praticados deve ser consignado no respectivo instrumento. Ausente a fixação da taxa no contrato, o juiz deve limitar os juros à média de mercado nas operações na espécie, divulgada pelo Bacen, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente.

Em qualquer hipótese, é possível a correção para a taxa média se for verificada abusividade nos juros remuneratórios.

(REsp. n 1.112.879/PR. Relª. Minª. Nancy Andrighi, j. em 12.05.2010).

Com efeito, a jurisprudência admite a revisão da cláusula que estabelece o percentual dos juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao caso e a exista abusividade no pacto, nos termos do entendimento fixado pelo o Superior Tribunal de justiça, em julgamento de Recurso Especial, afeto ao rito dos recursos repetitivos:

a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

(REsp. N. 1.061.530/RS. Relª Minª Nancy Andrighi, j. em 22.10.2008).

Colhe-se do teor do aludido acórdão os esclarecimentos acerca dos parâmetros a serem utilizados pelo julgador ao apreciar a questão atinente à revisão da cláusula contratual dos juros remuneratórios:

[...] conclui-se que é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada.

Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência ou não de flagrante abusividade.

Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic - taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo.

Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros. Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro. Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).

As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.gov.br/?ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.gov.br/?TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).

A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado...

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