Acórdão Nº 0306933-46.2016.8.24.0054 do Quarta Câmara de Direito Público, 30-01-2020

Número do processo0306933-46.2016.8.24.0054
Data30 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemRio do Sul
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0306933-46.2016.8.24.0054, de Rio do Sul

Relator: Desembargadora Vera Copetti

TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. ICMS. PRETENSÃO DE ESCRITURAÇÃO E APROVEITAMENTO DE CRÉDITOS DECORRENTES DA AQUISIÇÃO DE MERCADORIAS UTILIZADAS NO USO E CONSUMO DO PROCESSO PRODUTIVO, NA PROPORÇÃO DA RECEITA LÍQUIDA, COM DESTINO À EXPORTAÇÃO. REPERCUSSÃO GERAL DA MATÉRIA RECONHECIDA, PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 704.815/SC (TEMA 633). AUSÊNCIA DE DETERMINAÇÃO DE SOBRESTAMENTO DOS FEITOS NAS INSTÂNCIAS ORIGINÁRIAS. JULGAMENTO POSSIBILITADO. IMUNIDADE PLENA DAS EXPORTAÇÕES ASSEGURADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL 42/2003, AO DAR NOVA REDAÇÃO AO ART. 155, § 2º, X, "A", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INEXIGIBILIDADE DE REGULAMENTAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. LIMITAÇÃO DO ART. 33, I, DA LEI COMPLEMENTAR N. 87/1996 INAPLICÁVEL. PRECEDENTES DESTA CORTE. ORDEM CONCEDIDA. SENTENÇA REFORMADA.

"Conforme dispõe o art. 155, § 2.º, X, a, da Constituição Republicana, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 42/03, o ICMS não incidirá 'sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores'. Partindo-se da premissa de que a lei não comporta termos despidos de carga imperativa e semântica, a inserção pontual do direito ao aproveito de crédito das operações que antecedem a venda ao exterior deve ser observada em sua mais ampla extensão. O direito à compensação, na hipótese, já vinha resguardado por força do primado da não-cumulatividade, o que permite concluir que o destaque dado pela EC n. 42/03 tem um único desiderato: conferir à imunidade objetiva toda sua amplitude, de sorte a propiciar aos exportadores a perspectiva concreta de concorrer no mercado externo, mitigada de todas as formas a pretexto de suposta perda arrecadatória. Com a atual redação do dispositivo, revela-se anacrônica a discussão em torno da distinção entre os créditos físicos e financeiros, pois a todos deve ser dado tratamento linear, qual seja, o direito de apropriação, sem condicionantes, do crédito apurado nas operações inseridas no ciclo produtivo de bens destinados à exportação.

Para operacionalizar o aproveitamento do crédito, deve-se empregar a fórmula já fixada para aqueles créditos de energia elétrica e de serviços de telecomunicação, conforme disciplinado do art. 33 da LC n. 87/96. Nos termos desse artigo, o aproveitamento deve corresponder ao valor proporcional das exportações, pelo seu valor integral (receita bruta), tendo como parâmetro o total de saídas do estabelecimento.

Havendo específica disciplina acerca da compensação (art. 23, parágrafo único, da LC n. 87/96), e cuidando-se de pretensão complexa (com pedido de natureza declaratória), a correção, a ser provida pela Selic, deve alcançar, além das parcelas vencidas a partir do manejo da ação mandamental, todo o crédito apurado no período que antecede a impetração, desde o advento da emenda constitucional". (TJSC, Apelação n. 0016785-42.2011.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Ricardo Roesler, Quarta Câmara de Direito Público, j. 14-04-2016).

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0306933-46.2016.8.24.0054, da comarca de Rio do Sul 3ª Vara Cível em que é Apelante Atlas Compensados Indústria e Comércio Ltda e Apelado Gerente Regional da Secretaria de Estado da Fazenda Em Rio do Sul.

A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pela Exma. Sra. Desembargadora Sônia Maria Schmitz (com voto) e dele participaram o Exmo. Sr. Desembargador Rodolfo Tridapalli e a Exma. Sra. Desembargadora Vera Lúcia Ferreira Copetti.

Funcionou como representante do Ministério Público na sessão a Exma. Sra. Dra. Monika Pabst.

Florianópolis, 30 de janeiro de 2020.

Desembargadora Vera Copetti

Relatora


RELATÓRIO

Atlas Compensados Indústria e Comércio Ltda. impetrou mandado de segurança preventivo contra ato acoimado de ilegal, atribuído ao Gerente Regional da Secretaria de Estado da Fazenda em Rio do Sul.

Sustentou que atua, de forma preponderante, na realização de operações de exportação de chapas compensadas de madeira e, nos termos do art. 32, II, da Lei Complementar n. 87/1996, tem direito a escriturar e manter os créditos de ICMS decorrentes da aquisição de bens de "uso e consumo" na proporção das exportações, inclusive no tocante à escrituração extemporânea desses créditos. Defendeu que o art. 33, I, da Lei Complementar n. 87/1996 trata apenas das operações internas e, ainda que assim não fosse, tal norma estaria superada com o advento da Emenda Constitucional n. 42/2003, que alterou o art. 155, § 2º, X, "a", da Constituição Federal para conferir imunidade plena às exportações e garantir o irrestrito aproveitamento dos créditos de ICMS. Diante disso, requereu a concessão da segurança: a) "a fim de declarar o direito líquido e certo da impetrante de escriturar e manter (fazer o aproveitamento) dos créditos de ICMS decorrentes da aquisição de bens de 'uso e consumo' na proporção das receitas das saídas de mercadorias destinadas ao exterior, bem como declarar o direito da impetrante de efetuar o lançamento extemporâneo dos créditos de ICMS decorrentes da aquisição de bens de 'uso e consumo', respeitado o prazo prescricional quinquenal [...]"; b) seja "determinado à autoridade coatora que se abstenha de glosar os créditos extemporeamente lançados, bem como de autuar a impetrante ou lhe exigir o ICMS"; e c) seja "determinada a aplicação da SELIC para correção monetária dos créditos a serem lançados extemporaneamente [...]"(pp. 1-14, grifos no original).

Acostou documentos (pp. 15-25).

Nas informações, o Estado de Santa Catarina e a autoridade impetrada asseveraram, preliminarmente, o não cabimento do mandado de segurança contra lei em tese e, no mérito, que o direito ao pretendido creditamento do ICMS encontra óbice no art. 33, I, da Lei Complementar n. 87/1996, aplicável ao caso, bem como que não tem incidência a correção monetária sobre os créditos de ICMS. Postularam, assim, a denegação da segurança (pp. 40-65).

O Ministério Público manifestou-se pela denegação da ordem (pp. 72-81).

A sentença indeferiu a preliminar e, no mérito, denegou a segurança, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, ao fundamento de que "o direito postulado pela empresa impetrante de compensação no tocante a aproveitar créditos de ICMS relativos às mercadorias adquiridas com a incidência do imposto e destinadas ao uso e consumo, na proporção da receita das operações de exportação, encontra respaldo legal, porém, até 1o de janeiro de 2020 ele não pode ser exigido", em razão da limitação temporal prevista no art. 33, I, da Lei Complementar n. 87/1996 (pp. 82-88).

Inconformada, a impetrante interpôs recurso de apelação, repisando que o art. 33, I, da Lei Complementar n. 87/1996 não se refere às operações de exportação e, de qualquer forma, a modificação promovida pela Emenda Constitucional n. 42/2003 ao art. 155, § 2º, X, "a", da Constituição Federal conferiu imunidade plena às exportações e garantiu o irrestrito aproveitamento dos créditos de ICMS. Postulou, assim, a reforma da sentença (pp. 96-109).

Em contrarrazões, o Estado de Santa Catarina pugnou pela manutenção do decisum (pp. 118-124).

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria-Geral de Justiça a Exma. Sra. Dra. Walkyria Ruicir Danielski, opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso (pp. 137-147).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de mandado de segurança preventivo impetrado Atlas Compensados Indústria e Comércio Ltda. contra ato do Gerente Regional da Secretaria de Estado da Fazenda em Rio do Sul, com o objetivo de obter autorização para escriturar, manter e aproveitar os créditos de ICMS oriundos das mercadorias por si adquiridas e destinadas ao uso e consumo por seu estabelecimento produtivo, na proporção da receita líquida das operações de exportação.

Ressalta-se, inicialmente, que o egrégio Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário n. 704.815/SC, reconheceu a repercussão geral da matéria, em decisão da lavra do Exmo. Ministro Luiz Fux (Tema 633); contudo, não determinou o sobrestamento dos feitos nas instâncias originárias, razão pela qual não há óbice ao julgamento do recurso por esta Corte de Justiça.

A impetrante sustenta, em apertada síntese, que o pedido já encontrava respaldo no art. 32, II, da Lei Complementar n. 87/1996. Todavia, após a edição da Emenda Constitucional n. 42/2003, que conferiu nova redação ao art. 155, § 2º, X, "a", da Constituição Federal, foi garantida a imunidade plena às exportações e o irrestrito aproveitamento dos créditos de ICMS, restando superada eventual necessidade de observância às limitações temporais impostas no art. 33, I, da Lei Complementar n. 87/1996.

O Juízo a quo, no entanto, denegou a segurança, ao compreender que o aproveitamento do ICMS assegurado no art. 155, § 2º, X, "a", da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 42/2003, depende da regulamentação do art. 33, I, da Lei Complementar n. 87/1996, razão pela qual inexistiria direito líquido e certo (pp. 82-88).

O recurso, adianta-se, deve ser provido.

Em que pese a existência de julgados com o entendimento referido na sentença, a orientação atualmente prevalecente neste Tribunal de Justiça endossa as razões da impetrante.

Cita-se, a propósito, o elucidativo precedente:

APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. ICMS. DIREITO AO APROVEITAMENTO DE CRÉDITO NA AQUISIÇÃO DE INSUMOS ("BENS DE CONSUMO E DE USO"), EMPREGADOS NA ELABORAÇÃO DE PRODUTOS DESTINADOS À EXPORTAÇÃO....

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