Acórdão Nº 0307172-75.2018.8.24.0023 do Sétima Câmara de Direito Civil, 23-04-2020

Número do processo0307172-75.2018.8.24.0023
Data23 Abril 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0307172-75.2018.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Osmar Nunes Júnior

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE TRATAMENTO PELA OPERADORA DEVIDO A PERÍODO DE CARÊNCIA. COMPLICAÇÕES NA GRAVIDEZ. PROCEDIMENTOS REALIZADOS EM SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE CONDENOU A RÉ A CUSTEAR OS PROCEDIMENTOS. RECURSO DA AUTORA.

ALEGADA OCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS. NEGATIVA DA OPERADORA QUE EXTRAPOLARIA MERO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. INSUBSISTÊNCIA. SITUAÇÃO VIVIDA PELA AUTORA QUE NÃO PODE SER ATRIBUÍDA À CONDUTA DA RÉ. AUSÊNCIA DE DANO COMPROVADO EM RAZÃO DA NÃO AUTORIZAÇÃO ADMINISTRATIVA. PROCEDIMENTOS DEVIDAMENTE REALIZADOS QUE SERÃO ARCADOS PELA DEMANDADA NOS TERMOS DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

HONORÁRIOS RECURSAIS INDEVIDOS. FIXAÇÃO EM PATAMAR MÁXIMO NA ORIGEM.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0307172-75.2018.8.24.0023, da comarca da Capital 6ª Vara Cível em que é/são Apelante(s) Yara Dambros Cardoso e Apelado(s) Agemed Saúde S/A.

A Sétima Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.





O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Osmar Nunes Júnior, relator, e dele participaram o Exmo. Sr. Des. Álvaro Luiz Pereira de Andrade e a Exma. Desa. Haidée Denise Grin.

Florianópolis, 23 de abril de 2020


Desembargador Osmar Nunes Júnior

Relator


RELATÓRIO

Cuido de apelação cível interposta por Yara Dambros Cardoso contra sentença proferida pela 6ª Vara Cível da Comarca da Capital nos autos do processo n. 0307172-75.2018.8.24.0023, que julgou parcialmente procedente a demanda.

Versa a lide sobre ação indenizatória ingressada pela ora apelante em face de Agemed Saúde S/A, em que conta ser beneficiária de plano de saúde ofertado pela ré, porém, quando da necessidade de realização de procedimentos de urgência em razão de complicações no processo gestacional, teve a cobertura negada pela operadora sob o argumento de que ainda estavam vigentes os prazos de carência. Assim, não obtendo êxito na solução extrajudicial, propôs a presente demanda a fim de ver a ré condenada a custear os procedimentos realizados pela demandante, bem como ao pagamento de dano moral no valor de R$ 20.000,00.

Após instrução do feito, sobreveio sentença de parcial procedência, de cujos termos extraio:


Além do mais, caracterizando-se como emergencial, insubsistente a alegação da requerida de que o procedimento abrangeria somente situações ambulatoriais, tendo em vista que a cobertura diz respeito a qualquer ato necessário a salvaguardar a integridade física do paciente, inclusive a internação.

Desta feita, merece amparo o pedido formulado para obrigar a requerida à cobertura dos procedimentos realizados pela demandante.

No que concerne à indenização por danos morais, tenho que o pleito não prospera. Isso porque, embora presente a decepção e frustração do consumidor que obteve a negativa do plano de saúde, denota-se que esta ocorreu com fundamento no próprio contrato firmado, tendo em vista que a demandante não havia cumprido os períodos de carência. Destarte, pautando-se no contrato firmado, inviável a fixação de verba indenizatória. Não se está a dizer que a conduta da requerida foi legal, mas, sim, que foi incapaz de gerar abalo anímico, considerando que a negativa não se deu de maneira arbitrária, embora equivocada do ponto de vista da interpretação contratual.

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Yara Dambros Cardoso em desfavor de Agemed Saúde S/A, extinguindo o feito com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para obrigar a requerida à cobertura dos procedimentos realizados pela demandante.

Diante da sucumbência recíproca, condeno ambas as partes (50% para cada) ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes que arbitro em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, na proporção acima mencionada, nos moldes do art. 85, § 2º, CPC. Em relação à autora, resta suspensa a exigibilidade das verbas, considerando a concessão do benefício da justiça gratuita à p. 115 (art. 98, § 3º, do CPC).


Irresignada, a parte autora interpôs o presente recurso de apelação, sustentando, em síntese, a responsabilidade objetiva da ré, de modo que a recusa da operadora em autorizar atendimento de urgência da demandante teria frustrado o próprio sentido da relação jurídica das partes, configurando, assim, danos morais indenizáveis.

Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos conclusos.

É o relatório.





VOTO

1. Admissibilidade

A admissibilidade do recurso, bem como o presente julgamento, será realizada sob o enfoque do CPC/2015, vigente à época da publicação da decisão recorrida, consoante Enunciado Administrativo n. 3 do STJ.

O prazo para a interposição da apelação foi respeitado (pp. 213-214), sendo a apelante beneficiária da justiça gratuita (p. 115).

Ainda, os interesses recursais são manifestos e suas razões desafiam os fundamentos da sentença, encontrando-se satisfeitos, pois, os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

2. Mérito

Sustenta a apelante que possui a apelada responsabilidade objetiva, sendo que, devido à indevida recusa dessa em autorizar atendimento de urgência, frustrado estaria o sentido do contrato firmado entre as partes, de modo que tal ultrapassaria o mero inadimplemento contratual.

Afirma que nítido seria o abalo anímico sofrido pela recorrente, à medida que precisou se submeter a procedimentos emergenciais em razão de complicações na gravidez que levaram ao aborto. Assim, alega "que qualquer pessoa que tenha o desprazer de passar por uma situação como a dos autos, por tamanho sofrimento, tem por evidência maculada a sua dignidade, seu direito; há certeza de negligência no presente caso".

Dessa maneira, requer a reforma da sentença para que a operadora demandada seja condenada a pagar indenização por danos morais.

Pois bem.

Como constatado na decisão vergastada, errônea foi a negativa perpetrada pela apelada, haja vista que mesmo em período de carência, por tratar-se de situação de emergência, imperativo era a cobertura do plano de saúde ao tratamento solicitado.

Contudo, é cediço que o mero inadimplemento contratual – aqui caracterizado pela negativa da apelada –, por si só, não motiva a incidência de reparação por danos morais. Para tal, faz-se necessário que o ato ilícito supere a linha da normalidade e ocasione constrangimento que perpassa os dissabores do cotidiano, atingindo a integridade psicológica e moral da vítima.

Acerca da configuração do dano moral, explica Sérgio Cavalieri Filho:


Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos. (Programa de Responsabilidade Civil. 9 ed. rev. e ampl. São Paulo: Editora Atlas S. A., 2010. p. 87).


Embora o inadimplemento contratual possa configurar ato ilícito, esta Corte entende que tal conduta, ainda que reprovável, não tem o condão de, sozinha, ensejar abalo moral passível de indenização.

Para que essa reparação seja devida, é imprescindível que a parte lesada demonstre comprovado prejuízo à sua integridade física e psicológica, e que este foi de fato ocasionado pela atitude da parte contrária.

Para melhor elucidação do ponto, registra-se:


APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. DIAGNÓSTICO DE RETOCOLITE ULCERATIVA. PRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTO "VEDOLIZUMABE 300MG". RECUSA DA OPERADORA. DEVER DE CUSTEIO. INCIDÊNCIA DAS NORMAS CONSUMERISTAS. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS. MERA DISCUSSÃO QUANTO À INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. ABALO QUE NÃO SE CONFIGURA. DEVER DE COMPENSAR RECHAÇADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NATUREZA NÃO CONDENATÓRIA. VALOR EXORBITANTE. FIXAÇÃO POR APRECIAÇÃO EQUITATIVA DO JUIZ. INTELIGÊNCIA DO ART. 85, § 8º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APELO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO E DO AUTOR DESPROVIDO. "Impertinente a negativa à cobertura de fornecimento de medicamento, quando este possui registro na ANVISA e o plano de saúde prevê a cobertura do tratamento" (TJSC, Apelação Cível n. 0005625-94.2013.8.24.0008, de Blumenau, rel. Des. João Batista Góes Ulysséa, Segunda Câmara de Direito Civil, j. em 13-12-2018). "'O inadimplemento do contrato, por si só, pode acarretar danos materiais e indenização por perdas e danos, mas, em regra, não dá margem ao dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. Embora a inobservância das cláusulas contratuais por uma das partes possa trazer desconforto ao outro contratante - e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT