Acórdão Nº 0307466-34.2017.8.24.0033 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 05-03-2020

Número do processo0307466-34.2017.8.24.0033
Data05 Março 2020
Tribunal de OrigemItajaí
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0307466-34.2017.8.24.0033, de Itajaí

Relator: Desembargador Gilberto Gomes de Oliveira

EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DOS EMBARGANTES-EXECUTADOS.

CERCEAMENTO DE DEFESA EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE PERÍCIA. TESE REJEITADA. FEITO QUE SE ENCONTRA INSTRUÍDO PARA O SEU DESLINDE, COM O ARCABOUÇO PROBATÓRIO NELE AMEALHADO.

O instituto do julgamento antecipado da lide não ocasiona cerceamento de defesa; ao contrário, evita a produção de atos dispensáveis para a resolução da demanda, notadamente quando o feito está instruído com documentos suficientes para o deslinde da questão.

REVISÃO DOS CONTRATOS PRETÉRITOS. POSSIBILIDADE. ENCADEAMENTO CONTRATUAL NÃO DEMONSTRADO, CONTUDO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO COM DEMAIS CONTRATOS.

Nos termos da Súmula nº 300 do Superior Tribunal de Justiça, "o instrumento de confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo extrajudicial".

Além disso, "a renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores" (STJ, Súmula nº 286).

Todavia, não demonstrado que o pacto trata-se de renegociação de dívidas pretéritas, não há falar em nulidade da execução em virtude da ausência de juntada dos contratos anteriores.

JUROS REMUNERATÓRIOS. VERIFICAÇÃO DA ABUSIVIDADE QUE SE PAUTA NA TAXA MÉDIA DE MERCADO, ADMITIDA CERTA VARIAÇÃO. ORIENTAÇÃO DO STJ. PRECEDENTES DESTA CÂMARA. APELO PROVIDO NO PONTO.

Na esteira do entendimento delineado pelo STJ - que admite a revisão do percentual dos juros remuneratórios quando aplicável o CDC ao caso e quando exista abusividade no pacto -, esta Câmara julgadora tem admitido como parâmetro para aferir a abusividade a flexibilização da taxa de juros remuneratórios até o percentual de 10% (dez por cento) acima da taxa média divulgada pelo Banco Central.

CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. ENCARGO ADMITIDO, DESDE QUE EXPRESSAMENTE PACTUADO. ORIENTAÇÃO CONSOLIDADA NO RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA N. 973.827.

A prática do anatocismo, como também é chamada a capitalização de juros, com periodicidade inferior a um ano, é permitida pelo ordenamento jurídico pátrio, desde que existente pactuação expressa e clara e que a data do contrato seja posterior à edição da Medida Provisória n. 1.963-17/00, em 31 de março de 2000, (reeditada como MP n. 2.170-36/01).

Acerca da exigência de expressa pactuação, o Superior Tribunal de Justiça entende que havendo previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal, permite-se a cobrança da taxa efetiva anual contratada.

DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. ORIENTAÇÃO CONSOLIDADA PELO STJ NO RESP. N. 1.061.530/RS.

O afastamento da mora do consumidor depende da constatação de encargos abusivos no período de normalidade (juros remuneratórios abusivos e capitalização de juros ilegal) - e não apenas a verificação de abusividade no período de inadimplência do contrato - e do adimplemento de pelo menos a parte incontroversa do débito, quando possível aferir o quantum debeatur.

Em se tratando de contrato vinculado à conta corrente, dispensa-se a exigência do depósito de valores incontroversos, ante a impossibilidade de aferição do quantum debeatur.

READEQUAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA, ANTE A REFORMA DA SENTENÇA.

Reformada a sentença, ainda que parcialmente, é imperiosa a readequação dos ônus sucumbenciais.

APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0307466-34.2017.8.24.0033, da comarca de Itajaí 1ª Vara Cível em que é/são Apelante(s) Bingre Fashion Comércio de Roupas Ltda. e outros e Apelado(s) AMC Têxtil Ltda e outro.

A Terceira Câmara de Direito Comercial decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do relator. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Tulio Pinheiro, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Jaime Machado Junior.

Florianópolis, 05 de março de 2020.

Desembargador Gilberto Gomes de Oliveira

Relator


RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelos embargantes-executados, Valmor Zenere ME e Valmor Zenere, da sentença, proferida pela Juíza de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Videira, Dra. Mônica Fracari, que, nos autos dos embargos à execução (cédula de crédito bancário), movidos em face de Itaú Unibanco S.A. Banco Múltiplo, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para:

(a) determinar que a Cédula de Crédito Bancário, objeto dos autos principais, observe o resultado da revisão judicial ora efetuada, expressa no quadro resumo reproduzido na fundamentação;

(b) determinar a compensação/restituição, na forma simples, dos valores exigidos a maior, de acordo com a revisão ora efetuada, observando os encargos referidos na fundamentação.

Em suas razões recursais, a parte embargante-executada sustentou as seguintes teses:

(a) o cerceamento de defesa em virtude do julgamento antecipado da lide;

(b) a nulidade da execução em face da ausência de exibição dos contratos que deram origem à cédula de crédito bancário;

(c) a abusividade dos juros remuneratórios;

(d) a ilegalidade da capitalização de juros;

(e) a descaracterização da mora; e,

(f) a abusividade da comissão de permanência.

Pautou-se, por fim, pelo provimento do apelo.

Foram ofertadas contrarrazões (fls. 212/223).

Este é o relatório.


VOTO

I. Tempus regit actum

Sentença publicada em 21.08.2019 (fl. 168).

Portanto, à lide aplica-se o CPC/15, na forma do enunciado administrativo nº 3: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

II. Tempestividade e preparo recursal

Constata-se que o recurso de apelação é tempestivo e que o recolhimento do preparo recursal foi comprovado à fl. 203.

III. Recurso da parte embargante-executada

(a) cerceamento de defesa

A parte embargante-executada alega a ocorrência de cerceamento de defesa em virtude do julgamento antecipado da lide, tendo em vista o requerimento de produção de prova pericial.

Razão não lhe assiste.

Sabe-se que o julgamento antecipado da lide é admitido pelo ordenamento pátrio quando o feito trata de questões de fato e de direito, suficientemente compreensíveis a partir das provas documentais que acompanham o feito, ou quando verificada a revelia, com fundamento no art. 355, incisos I e II, do Código de Processo Civil de 2015.

Com efeito, o atual Código de Processo Civil destaca no seu art. 370 que, ao conduzir a instrução processual, pode o magistrado indeferir as diligências inúteis ou meramente protelatórias, competindo-lhe, nos termos do dispositivo seguinte, apreciar os elementos de prova carreados aos autos e, de forma motivada, indicar na sentença as razões do seu convencimento.

A respeito do tema, José Roberto Neves Amorim e Sandro Gilbert Amorim lecionam que "a prova tem como finalidade formar no juiz, seu destinatário, o convencimento quanto aos fatos e fundamentos da causa, trazidos pelas partes, proporcionando um julgamento justo e dentro dos parâmetros legais" (Direito Processual Civil. Rio de Janeiro, 2009. p. 263).

Na verdade, sempre que se mostrar recomendável, deve o togado realizar o julgamento antecipado da lide, mormente em razão do disposto no art. 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988, segundo o qual "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do proces- so e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".

É, pois, justamente o caso dos autos, uma vez que o feito foi instruído com documentos suficientes para o deslinde da questão, existentes elementos nos autos bastantes para a formação do convencimento do julgador, conquanto tenha julgado a causa improcedente na origem.

Neste sentido, colhe-se da jurisprudência desta Câmara julgadora:

Apelação cível. Ação revisional. "Contrato de financiamento" não juntado aos autos. Sentença de parcial procedência. Insurgência de ambos os litigantes.

Gratuidade da justiça. Deferimento pelo Juízo a quo. Extensão do benefício ao segundo grau. Pedido do autor nesse sentido desnecessário. Benesse que abrange todas as fases do processo.

Julgamento antecipado da lide. Arguição de cerceamento de defesa. Prova testemunhal e pericial. Inutilidade na espécie. Discussão acerca da legalidade de cláusulas. Matéria exclusivamente de direito. Elementos probatórios que se mostram suficientes ao deslinde do feito. Prefacial rejeitada. [...]

(Apelação cível n. 0300533-32.2017.8.24.0005, de Balneário Camboriú. rel. des. Ronaldo Moritz Martins da Silva, j. em 08.02.2018).

Preliminar rechaçada, portanto.

(b) nulidade da execução

Os embargantes-executados alegam, ainda, a nulidade da execução em virtude da ausência de exibição de contratos que deram origem à cédula de crédito bancário.

Consigno que, nos termos da Súmula nº 300 do Superior Tribunal de Justiça, "o instrumento de confissão de dívida, ainda que originário de contrato de abertura de crédito, constitui título executivo extrajudicial".

Apesar de constituir título executivo extrajudicial, é possível a revisão dos contratos originários da confissão de dívida, como no caso vertente, com base na Súmula nº 286 do STJ: "a renegociação de contrato bancário ou a confissão da dívida não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores".

No caso vertente, todavia não há falar em nulidade da execução em virtude da ausência juntada dos contratos originários por parte do banco.

Isso, porque, da análise da cédula de crédito bancário, verifica-se que não se prestou a renegociar dívidas...

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