Acórdão Nº 0307492-23.2017.8.24.0036 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 17-11-2022

Número do processo0307492-23.2017.8.24.0036
Data17 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0307492-23.2017.8.24.0036/SC

RELATOR: Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

APELANTE: CROSS LINK LTDA (AUTOR) APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Da ação

Adoto o relatório da sentença recorrida (Evento 35), em atenção aos princípios da celeridade e da economia processuais, por retratar com fidedignidade o traquejo da instrução havido na origem, in verbis:

Cross Link Ltda. Me. ajuizou a presente ação de revisão de cláusulas contratuais em face de Banco Bradesco S/A, partes devidamente qualificadas.Informou que as partes firmaram um instrumento particular de aditamento à cédula de crédito bancário de empréstimo para capital de giro. Alegou, contudo, a existência de cláusulas abusivas, as quais pretende que sejam declaradas nulas, manifestando insurgência quanto a: a) juros remuneratórios; b) capitalização de juros; c) índice de correção monetária; d) encargos de mora (multa, comissão de permanência e sua cumulação com correção monetária e multa); e) taxa de abertura de crédito, tarifa de serviço de desconto, tarifa adicional, tarifa de serviços diversos e taxa sobre saldo devedor.Pleiteou a antecipação dos efeitos da tutela para que a parte ré se abstenha de realizar leilão extrajudicial do imóvel alienado fiduciariamente.Requereu, ao final, a revisão do contrato, a repetição em dobro do indébito, a compensação de eventual saldo devedor e a descaracterização da mora, bem como a aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor, com a inversão do ônus da prova. Pediu a concessão dos benefícios da justiça gratuita, valorou a causa e juntou documentos (fls. 1-48).Determinou-se o recolhimento das custas iniciais ou a comprovação da hipossuficiência (fl. 49), o que foi atendido às fls. 52-95, com a juntada de novos documentos.O pedido de justiça gratuita foi indeferido (fl. 96), determinando-se o recolhimento das custas. A parte autora juntou novos documentos e requereu reconsideração da decisão (fls. 99-121), o que não foi deferido (fl. 123). Então, as custas iniciais foram recolhidas (fls. 126-129).Em decisão às fls. 130-133, foi indeferido o pedido de antecipação da tutela e determinada a citação da parte ré.Citada (fl. 137), a parte ré ofereceu contestação (fls. 187-215), arguindo, em preliminar, a inadequação da ação à pretensão de exibição de documentos e a ausência de fundamentação da petição inicial. No mérito, sustentou que o contrato celebrado observou a legislação vigente e a vontade das partes, inexistindo descumprimento da função social do contrato, da boa-fé objetiva e do equilíbrio econômico contratual, alegando a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor na espécie. Defendeu a legalidade da contratação em relação a tudo o que a parte autora se insurgiu, requerendo a improcedência dos pedidos e a produção de provas. Juntou procuração e atos constitutivos, bem como cópia do contrato e demais documentos firmados por ocasião da contratação (fls. 216-296).Instada a se manifestar sobre a contestação e documentos (fl. 298), a parte autora quedou-se inerte (fl. 301).

Da sentença

A Juíza de Direito, Dra. GRAZIELA SHIZUIHO ALCHINI, da Vara Regional de Direito Bancário - Comarca de Jaraguá do Sul, julgou parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na exordial, cujo excerto dispositivo transcreve-se abaixo (Evento 35):

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados por Cross Link Ltda. Me. em face de Banco Bradesco S/A, partes qualificadas, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil para, tão somente: a) afastar a cobrança da tarifa de abertura de crédito (TAC); e b) determinar a compensação de eventuais valores cobrados indevidamente, ou a repetição do indébito na forma simples, caso em que deve ser restituído com correção monetária pelo INPC desde o desembolso e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação.Na forma do artigo 86, parágrafo único, do Código de Processo Civil, tendo em vista que a parte ré sucumbiu de parte mínima do pedido, condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais e mais honorários de sucumbência, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, § 2º do CPC.Autorizo a restituição de eventuais diligências não utilizadas, a ser solicitada na forma da Resolução CM N. 10 de 27 de agosto de 2019.Publique-se. Registre-se. Intimem-se.Cumpridas as formalidades legais, arquive-se.

Da Apelação Cível

Inconformada com a decisão proferida, a Autora CROSS LINK LTDA ME interpôs recurso de Apelação Cível (Evento 40).

Alega que foi cerceado o seu direito de defesa com o julgamento antecipado da lide. Enfatiza que o laudo apresentado pela Apelante, inclusive deixou muito claro a existência de excesso de valores cobrados no contrato firmado com a Apelada, no importe de R$ 20.696,16 (vinte mil e seiscentos e noventa e seis reais e dezesseis centavos) atualizados até 22/07/2019. Sendo assim, pugna pela desconstituição da sentença com intuito de produzir prova pericial para demonstrar a cobrança de encargos abusivos.

No mérito, a Apelante assevera que os juros remuneratórios cobrados pelo Banco ao longo do trato contratual estão acima da média de mercado. Desta intelecção, pleiteia pela redução da taxa de juros remuneratórios, posto que foi a média aplicada no mercado no período da contratação, conforme laudo juntado pela Apelante. Não sendo este o entendimento, aguarda que sejam apurados tais valores em sede de prova pericial.

Sustenta a abusividade da capitalização mensal de juros, uma vez que o instrumento contratual de fl. 19 e seguintes não possui previsão expressa no sentido de ser admitida. Desta forma, diante da ausência de previsão contratual, aliado ao fato da inconstitucionalidade do art. 5º da medida provisória já declarada pelo egrégios Tribunais Pátrios, em especial do TJSC e do c. STF, requer seja expurgado do contrato todo e qualquer valor a tal título de capitalização mensal.

Argumenta que o Banco aplicou cumulada e ilegalmente a comissão de permanência, correção monetária e multa sobre a alegada dívida no contrato. Ocorre que é de conhecimento pelo ordenamento jurídico a vedação da comissão de permanência nos contratos que estipulem a incidência de multa contratual quando da mora no pagamento dos valores contratados, como no caso dos autos. Neste viés, requer a subtração da comissão de permanência aplicada, haja vista que o contrato é extremamente oneroso e abusivo.

Ademais, restando caracterizada a aplicação de encargos leoninos sobre os valores contratados, não há que se falar em cobrança de juros de mora, muito menos da aplicação de multa contratual e comissão de permanência. Desta maneira, a mora está descaracterizada na avença firmada entre os litigantes, tendo em vista a existência de encargos abusivos que oneram os valores contratados, razão pela qual devem ser extirpados a cobrança dos juros de mora e da multa contratual do valor exequendo.

Considerando a incidência do CDC na relação jurídica ativada, e constatada diferença exigida a maior, a Apelante se tornará credora do dobro da quantia que lhe fora cobrada indevidamente pelo Banco, conforme laudo anexo aos autos. Argui que para a repetição de indébito, nos contratos de abertura de crédito em conta corrente, não se exige a prova do erro. Suscita que faz jus ao recebimento dos valores que foram cobrados em excesso, a serem pagos e/ou descontados do valor contratado em dobro pela Autora, forte no art. 42 do CDC, cominado com os arts. 876 e 940 do CC.

Sendo reconhecido o excesso de cobrança de valores contratuais, ainda que parcialmente, e ainda a ilegalidade do ato expropriatório motivado pelo Banco Apelado, sem a tutela do Estado-Juiz, tem-se que o imóvel garantido no contrato subjudice deverá ser ressarcido aos Srs. José Belmir dos Santos e Luiza Izabel dos Santos, pois o indeferimento do pedido de tutela antecipada de fls. 130/133 motivou a alienação extrajudicial do imóvel. Desta feita, como não há possibilidade dos garantidores reaverem seu imóvel, pugna pelo registro do direito a perdas e danos em face do Apelado, caso constatado o excesso de cobrança de valores contratuais.

Ao final, requer o provimento do Apelo para que seja reformada a sentença, condenando-se o Banco Apelado ao pagamento dos ônus de sucumbência. Também requer o deferimento do benefício da gratuidade da justiça, pois comprovado o estado de hipossuficiência da empresa Apelante - porque extinta a pessoa jurídica -, bem como de seus ex-sócios Andressa e Moacir.

Das contrarrazões

O Banco apresentou contrarrazões (Evento 44).

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça.

Após a redistribuição, vieram-me conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

I - Da admissibilidade

a) Da gratuidade da justiça

A Apelante realizou o pagamento do preparo recursal, sendo esta conduta incompatível com a alegada condição de hipossuficiência financeira.

Deixo de conhecer do pedido de concessão do benefício da gratuidade da justiça, ante a falta de interesse recursal.

b) Da dialeticidade recursal

Deixo de conhecer do tópico do Apelo acerca da nulidade da alienação extrajudicial do imóvel e direito a perdas e danos em favor dos ex-sócios da Apelante.

Compulsando os autos, denoto que nada foi alegado em primeira instância no que tange ao ato expropriatório do imóvel objeto de garantia do contrato, bem como não houve pedido de indenização das perdas e danos. Em corolário, a sentença vergastada não versa sobre essa questão.

Portanto, julgo prejudicada a tese inovadora por violação ao princípio da dialeticidade recursal.

Conheço, em parte, da Apelação Cível manejada pela Autora.

II - Do julgamento do mérito

a) Da preliminar de cerceamento de defesa

Em preliminar, a Apelante ventila a nulidade da sentença por cerceamento de defesa. Isto porque a demanda foi julgada antecipadamente, sem oportunizar a produção de prova pericial.

Com a máxima vênia, a preliminar não merece subsistência.

Constato que a prova...

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