Acórdão Nº 0307930-54.2014.8.24.0036 do Terceira Câmara de Direito Civil, 23-02-2021

Número do processo0307930-54.2014.8.24.0036
Data23 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0307930-54.2014.8.24.0036/SC



RELATOR: Desembargador MARCUS TULIO SARTORATO


APELANTE: NORLI HOSTIN (AUTOR) APELADO: ALLIANZ SEGUROS S/A (RÉU) APELADO: PERICLES AMADEU FURLANI (RÉU)


RELATÓRIO


Adota-se o relatório da sentença recorrida (Evento 99, doc. 108, fls. 1/2), por revelar com transparência o que existe nestes autos, in verbis:
Norli Hostin, já qualificada nos autos, ajuizou a presente ação indenizatória contra Péricles Amadeu Furlani, igualmente qualificado.
Aduziu ao juízo, em síntese, que, no dia 10.12.2013, por volta das 21h06min, foi atropelada pelo demandado, o qual conduzia seu veículo Jeep Cherokee Lared de placas AJY5764 sem a devida atenção. Destacou que, em razão do sinistro, restou afastada de suas atividades habituais e sofreu diversos prejuízos. Assim, requereu a condenação do demandado ao pagamento de indenização por danos morais, além de lucros cessantes e pensão mensal. Valorou a causa e juntou documentos.
Devidamente citado, o réu apresentou resposta ao feito na forma de contestação. Na oportunidade, requereu a denunciação da lide à Allianz Seguros S/A. Quanto ao mérito, destacou que as lesões descritas na inicial foram causadas exclusivamente pela imprudência da autora, a qual, em dia chuvoso e de maneira desatenta, atravessou a rua fora da faixa de pedestres, deixando de adotar as cautelas necessárias a seu intento. À vista desse contexto, pugnou pela improcedência dos pedidos vestibulares. Alternativamente, requereu o reconhecimento a culpa concorrente da autora.
Deferida a denunciação da lide, a ré Allianz Seguros S/A apresentou contestação às fls. 101/128. Em sua peça, sustentou a ausência de prova do imputado ao corréu Péricles e discorreu sobre os limites da apólice. Ao final, pugnou pela improcedência dos pleito inaugural.
Houve réplica.
Saneado o processo, foi determinada a produção de prova pericial e prova oral (fls. 255/256).
O perito apresentou seu laudo às fls. 287/297.
Na audiência de instrução e julgamento, foram ouvidas a parte autora, uma informante e duas testemunhas.
Em seguida, os litigantes apresentaram suas alegações finais por memoriais.
Vieram-me então conclusos.
Brevemente relatado, decido.

O MM. Juiz de Direito, Doutor José Aranha Pacheco, julgou a lide nos seguintes termos (Evento 99, doc. 108, fl. 5):
Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados por Norli Hostin contra Péricles Amadeu Furlani e Allianz Seguros S/A, resolvendo o mérito da lide, o que faço com base no art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Outrossim, condeno a autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 15% do valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Resta sobrestada a obrigação, todavia, face à gratuidade de justiça que lhe foi concedida.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação (Evento 104) no qual alegou que o acidente foi resultado da negligência do apelado, que avançou sentido rua principal sem olhar para os dois lados. Ressaltou que, inclusive, no Boletim de Ocorrência, o apelado depõe que não olhou para a esquerda antes de emergir, portanto, comprova-se que houve desatenção e negligência por parte do condutor. Atentou para o fato de que a autora foi atropelada no final do trajeto, quando já se encontrava do outro lado da rua, junto a calçada, o que foi comprovado pela prova testemunhal da autora e do requerido, de modo que não invadiu a pista de inopino, ou seja, já estava quase chegando do outro lado, quando foi colhida pelo requerido. Além do ressarcimento pelos prejuízos financeiros suportados, a apelante ainda pleiteou indenização pelo dano moral psicoemocional sofrido. Alternativamente, requereu o reconhecimento da culpa concorrente. Pugnou pela condenação do réu ao pagamento dos lucros cessantes e da pensão vitalícia, ao argumento de que ficou inativa após o acidente e sofre com as sequelas do mesmo fato. Aventou que faz jus a indenização deste período. Disse que, sobrevindo incapacidade para as atividades que antes exercia, cabe também o pagamento de pensão vitalícia à apelante.
Em contrarrazões (Eventos 114 e 115), as rés pugnam pelo desprovimento do recurso da adversa

VOTO


1. Dispõe o art. 186 do Código Civil: "Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".
A responsabilidade civil subjetiva pressupõe, assim, a demonstração da culpa ou dolo do agente, do nexo de causalidade entre o ato ilícito e o dano, e o prejuízo "que viole qualquer valor inerente à pessoa humana ou atinja coisa do mundo externo que seja juridicamente tutelada" (Fernando Noronha, Direito das obrigações, Saraiva, 2003, 1ª ed., v. 1, p. 474).
Nas palavras de Maria Helena Diniz, "para que se configure o ato ilícito, será imprescindível que haja: a) fato lesivo voluntário, causado pelo agente, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência; b) ocorrência de um dano patrimonial ou moral [...]; e c) nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente" (Código civil anotado, São Paulo: Saraiva, 2003, 9ª ed., p. 180). Para Serpa Lopes, responsabilidade "significa a obrigação de reparar um prejuízo, seja por decorrer de uma culpa ou de uma circunstância legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância meramente objetiva" (Curso de direito civil: fontes a contratuais das obrigações: responsabilidade civil, Freitas Bastos, 2001, 5ª ed., v. 5, p. 160).
Na presente quaestio, ficou incontroverso que, no dia 10.12.2013, por volta das 21h06min, o réu Péricles Amadeu Furlani conduzia seu veículo Jeep Cherokee Laredo, pela rua Leopoldo Malheiros, sentido rua Marina Frutuoso, no Município de Jaraguá do Sul, quando veio a colidir com a Sra. Norli Hostin, a qual caminhava sobre a via. Em decorrência da colisão, a pedestre sofreu trauma crânio encefálico grave, com formação de contusões cerebrais e hemorragia subaracnóidea e foi imediatamente levada ao hospital, desacordada, permanecendo neste estado na UTI por cerca de 3 (três) dias.
Dessa forma, cinge-se o mérito recursal à análise da culpa pela colisão, uma vez que, a apelante sustenta que o réu vinha trafegando na rua Leopoldo Malheiros sem a atenção necessária, visto que olhou apenas para o seu lado direito ao ingressar na Rua Marina Frutuoso, atingindo a vítima quando esta atravessava a via.
O réu assevera que a culpa pelo sinistro recaiu exclusivamente sobre a vítima, visto que atravessou a rua fora da faixa de segurança, assumindo o risco.
De fato, da análise do conjunto probatório carreado aos autos, vê-se que a vítima teria atravessado a pista fora da faixa de pedestres, que se encontrava há cerca de 20 (vinte) metros do local do atropelamento, aumentando o risco de ocorrência do acidente e infringindo o disposto no art. 69 do Código de Trânsito Brasileiro:
Art. 69. Para cruzar a pista de rolamento o pedestre tomará precauções de segurança, levando em conta, principalmente, a visibilidade, a distância e a velocidade dos veículos, utilizando sempre as faixas ou passagens a ele destinadas sempre que estas existirem numa distância de até cinqüenta metros dele [...]

Todavia, o réu não se desincumbiu integralmente do ônus de comprovar a sua completa ausência de culpa pelo ocorrido.
Cabia ao réu o ônus de provar suas alegações, à luz do artigo 373, II, do Código de Processo Civil, eis que a tese de defesa dependia de prova a excepcionar a pretensão da autora.
Reza o art. 373 do Código de Processo Civil que "o ônus da prova incumbe: [...] ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor" (inciso II). Nas palavras do eminente Desembargador Trindade dos Santos, "é por demais claro o nosso CPC quando, em seu art. 333, inciso II, acomete ao réu o ônus de provar à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor" (AC n.º 2000.004611-6).
Em comentário ao dispositivo acima indicado, Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery esclarecem que "o réu deve provar aquilo que afirmar em juízo, demonstrando que das alegações do autor não decorrem as conseqüências que pretende. Ademais, quando o réu excepciona em juízo, nasce para ele o ônus da prova dos fatos que alegar na exceção, como se autor fosse (reus in exceptione actor est)" (Código de processo civil comentado e legislação extravagante, RT, 2003, 7ª ed., p. 724).
No presente caso, afirma a autora que o acidente ocorreu por conduta culposa do réu, tendo em vista que foi atropelada enquanto atravessava a estrada em direção à calçada da rua que vai para a sua casa. O réu sustenta, a contrario sensu, que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, que inadvertidamente atravessou a pista, em um dia chuvoso, com um guarda-chuva e vários DVD's à mão, sem atentar para o movimento dos carros e fora da faixa de pedestre. Assim, a dinâmica do acidente é controversa, pois as partes discordam quanto à maneira em que o abalroamento se deu.
Porém, não logrou êxito o réu em demonstrar que o acidente ocorreu,...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT