Acórdão Nº 0308088-28.2016.8.24.0008 do Segunda Turma Recursal, 08-06-2020

Número do processo0308088-28.2016.8.24.0008
Data08 Junho 2020
Tribunal de OrigemBlumenau
ÓrgãoSegunda Turma Recursal
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Segunda Turma Recursal



Recurso Inominado n. 0308088-28.2016.8.24.0008, de Blumenau

Relatora: Juíza Ana Karina Arruda Anzanello


RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. TRANSPORTE AÉREO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA COMPANHIA AÉREA.

ARGUMENTO DA RECORRENTE NO SENTIDO DE QUE O CONSUMIDOR NÃO ATENDEU AO PERÍODO DE ANTECEDÊNCIA MÍNIMA EXIGIDO PARA O EMBARQUE. INSUBSISTÊNCIA. PASSAGEIRO QUE SE ENCONTRAVA NO AEROPORTO DENTRO DO HORÁRIO INDICADO PELA EMPRESA DE TRANSPORTE AÉREO, SEM BAGAGENS PARA DESPACHAR E COM CHECK-IN REALIZADO. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL.

DANO MATERIAL COMPROVADO PELO AUTOR, QUE NECESSITOU ADQUIRIR NOVAS PASSAGENS. PLEITO ACOLHIDO.

MINORAÇÃO DO QUANTUM ARBITRADO A TÍTULO DE COMPENSAÇÃO PELO ABALO ANÍMICO. PLEITO ACOLHIDO. VALOR ELEITO QUE NÃO SE AFIGURA COMPATÍVEL COM AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO E OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REDUÇÃO IMPLEMENTADA.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0308088-28.2016.8.24.0008, da comarca de Blumenau 1º Juizado Especial Cível, em que é Recorrente Vrg Linhas Aéreas S/A e Recorrido Cauê Steinbach Silveira.

A Segunda Turma Recursal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Sem custas e honorários advocatícios.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Juiz Marco Aurélio Ghisi Machado, com voto e dele participou o Exmo. Sr. Juiz Vitoraldo Bridi.

Florianópolis, 08 de junho de 2020.

Ana Karina Arruda Anzanello

Relatora


RELATÓRIO

VRG Linhas Aéreas S/A interpôs Recurso Inominado contra sentença proferida pelo magistrado do 1º Juizado Especial Cível do Norte da Ilha, que julgou procedentes os pedidos deduzidos por Cauê Steinbach, a fim de condená-la ao pagamento de indenização por danos morais, fixados em "R$ 6.000,00 (seis mil reais), que deverá ser acrescido, até a data do efetivo pagamento, de correção monetária desde a data desta sentença" e danos materiais consistentes no pagamento de "R$ 425,79 (quatrocentos e vinte e cinco reais, setenta e nove centavos), com correção desde 24/01/2016. Ambas as verbas devem ser acrescidas de juros de mora à taxa de 1% ao mês, desde 05/07/2016" (fls. 138-141).

Em suas razões recursais (fls. 149-158), a companhia aérea alegou, em síntese, a litigância de má-fé, pois o voo teria operado normalmente e que o autor que não teria comparecido com a devida antecedência. Defendeu ainda, a inexistência do dano material e a impossibilidade de caracterização do dano moral, diante em razão de caso imprevisível,visando a segurança dos passageiros e tripulação. Defendeu ainda, que sendo a situação narrada na exordial é incapaz de ensejar abalo moral. Sucessivamente, requereu a redução do quantum indenizatório.

Com contrarrazões (fls. 167-176), os autos ascenderam a esta Turma Recursal.

Este é o relatório.









VOTO

Inicialmente, encontram-se presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido, passando-se, desta forma, à respectiva análise.

A companhia aérea defende que não pode ser responsabilizada, haja vista ter o voo partido no horário previsto, e que o autor teria deixado de comparecer para embarque com antecedência.

Em que pese o esforço argumentativo, a insurgência não prospera.

Inicialmente é importante consignar que, apesar da ré ter juntado em suas razões recursais print da tela de consulta no sistema da ANAC, o voo do qual se refere sequer é o mesmo discutido nos autos. A passagem adquirida pelo autor seria para o voo 1597 e não 1209, como demonstra a ré.

Ademais, a mera juntada de tais documentos não é capaz de comprovar o horário de partida da aeronave. O documento apresentado não demonstrada nenhuma validade e sequer indica o sistema do qual foi retirado, portanto, não é suficiente para ser utilizado como prova do ilícito.

Tem-se ainda, que a companhia aérea não comprovou a má-fé do autor, não tendo apresentado nenhuma prova de que este teria se apresentado para embarque sem a antecedência devida.

A empresa aérea – fornecedora de serviços de transporte – responde, independentemente da existência de culpa ou dolo, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.

A ré apenas poderá ser eximida da responsabilização caso comprove que prestou o serviço ou que a culpa foi exclusiva do consumidor ou terceiro (art. 14, §4º CDC), o que não o fez.

Mesmo que o evento não seja capaz de gerar abalos morais ao autor, entende-se que a prática da empresa aérea foi abusiva em relação ao consumidor, devendo ser responsabilizada por seus atos e de seus funcionários.

De outro caso semelhante julgado pelas Turmas de Recursos deste Tribunal:


RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. TRANSPORTE AÉREO. RELAÇÃO JURÍDICA SUBMETIDA AOS DITAMES DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RECORRENTE QUE FOI IMPEDIDO DE EMBARCAR NO VOO ADQUIRIDO. REALOCAÇÃO PARA VOO POSTERIOR. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES ADEQUADAS PELA COMPANHIA AÉREA. ARGUMENTO DE DEFESA NO SENTIDO DE QUE O CONSUMIDOR NÃO ATENDEU AO PERÍODO DE ANTECEDÊNCIA MÍNIMA EXIGIDO PARA O EMBARQUE. INSUBSISTÊNCIA. PASSAGEIRO QUE SE ENCONTRAVA NO AEROPORTO DENTRO DO HORÁRIO INDICADO PELA EMPRESA DE TRANSPORTE AÉREO, SEM BAGAGENS PARA DESPACHAR E COM CHECK-IN REALIZADO INDEVIDO EMPECILHO AO EMBARQUE. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL. VALOR. INEXISTÊNCIA DE PARÂMETROS LEGAIS. MONTANTE QUE DEVE SER FIXADO AO ARBÍTRIO DO JULGADOR. OBSERVÂNCIA DAS CONDIÇÕES ECONÔMICAS DAS PARTES E DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. CONSECTÁRIO LEGAIS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. Tendo o passageiro atendido ao período de antecedência mínima para chegada ao aeroporto exigido pela companhia aérea para realizar a viagem, o empecilho ao seu embarque constitui ato ilícito indenizável, mormente quando não lhe são passadas informações consistentes acerca do infortúnio. Inexistindo parâmetros legais para fixação da indenização, é cediço que deve ser estabelecida ao arbítrio do juiz, que, analisando caso a caso, estipula um valor razoável, mas não irrelevante ao causador do dano, que dê azo à reincidência no ato, ou exorbitante, de modo a aumentar consideravelmente o patrimônio do lesado. Tratando-se de obrigação contratual, o quantum indenizatório deve ser acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação (art. 405 do Código Civil) e de correção monetária a partir desta data (Súmula 362 do STJ). (TJSC, Recurso Inominado n. 0304893-48.2016.8.24.0036, de Jaraguá do Sul, rel. Juíza Viviane Isabel Daniel Speck de Souza, Quinta Turma de Recursos - Joinville, j. 29-05-2019) (g.n.).


De tal modo que a conjunção de fatores experimentados pelo autor ultrapassou o mero desconforto do cotidiano, suficiente para causar-lhe abalo moral.

Quanto ao dano material, devem ser mantidos os termos e fundamentação da sentença. Vislumbra-se que restou devidamente comprovado que o autor necessitou adquirir outra passagem aérea para retorno à Florianópolis diante do ilícito praticado pela ré. Assim, não há que se afastar a condenação pelo dano material.

Por fim, a empresa aérea Recorrente sustenta que a indenização concedida na origem (R$ 6.000,00) estaria ocasionando o enriquecimento indevido do autor.

No ponto, a irresignação merece ser acolhida.

Com relação à valoração dos danos morais, o julgador deve estar atento às circunstâncias do evento danoso, o interesse do bem jurídico tutelado e a condição das partes, atendidos ainda os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a fim de possibilitar ao lesado um satisfação compensatória, sem importar no seu enriquecimento sem causa.

O doutrinador Sérgio Cavalieri Filho pondera que:


[...] No âmbito do dano extrapatrimonial (moral), a sua quantificação como um decréscimo material é também absolutamente impossível, razão pela qual o critério do arbitramento judicial é o único apropriado [...]. Também aqui terá o juiz que se valer da lógica do razoável, que permite cotejar meios e fins, causas e consequências, de modo a aferir a lógica da decisão. Para que a decisão seja razoável, é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT