Acórdão Nº 0308259-12.2017.8.24.0020 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 16-04-2020

Número do processo0308259-12.2017.8.24.0020
Data16 Abril 2020
Tribunal de OrigemMeleiro
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0308259-12.2017.8.24.0020, de Meleiro

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS AJUIZADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. CRÉDITO OBTIDO POR MEIO DE SAQUE EM CARTÃO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNADA. AUTORA QUE PRETENDE A DECLARAÇÃO DE INVALIDADE DA OPERAÇÃO COM BASE EM VÍCIO NA AUTONOMIA DA VONTADE, SUSTENTANDO, PARA TANTO, TER SIDO LUDIBRIADA COM A PACTUAÇÃO DE CARTÃO, QUANDO, NA VERDADE, PRETENDIA APENAS A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE ACOLHE PEDIDO ALTERNATIVO DA DEMANDANTE PARA O FIM DE CONVERTER A OPERAÇÃO DE SAQUE EM CARTÃO DE CRÉDITO EM OPERAÇÃO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO, CONDENANDO A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEMANDADA, AINDA, À RESTITUIÇÃO/COMPENSAÇÃO DE EVENTUAIS VALORES COBRADOS A MAIOR EM DECORRÊNCIA DA CONTRATAÇÃO DE OPERAÇÃO NÃO CONSENTIDA PELA CONSUMIDORA.

RECURSOS INTERPOSTOS POR AMBOS OS LITIGANTES

I - RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA

ALEGADA REGULARIDADE DO CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES. TESE QUE SE MOSTRA ALICERÇADA NOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS CONTIDOS NOS AUTOS. DISPONIBILIZAÇÃO DE SAQUE DE VALOR EM CARTÃO DE CRÉDITO, COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, QUE NÃO EQUIVALE À VENDA CASADA, AINDA QUE O CONSUMIDOR NÃO UTILIZE O CARTÃO PARA PAGAMENTO DE DESPESAS, SEJA PORQUE O CARTÃO DE CRÉDITO NÃO TEM SEU USO RESTRITO A COMPRAS EM ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS, SEJA PORQUE A OPERAÇÃO DE SAQUE SE ENCONTRA PREVISTA NA LEI N. 10.820/03, E REGULADA PELA INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES N. 208/08 EM RELAÇÃO A APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL.

AUTORA QUE, AO TEMPO DA CONTRATAÇÃO, TINHA TRÊS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS COMPROMETENDO A SUA MARGEM CONSIGNÁVEL PARA EMPRÉSTIMO PESSOAL. CIRCUNSTÂNCIA QUE APONTA O CONHECIMENTO DA DEMANDANTE ACERCA DA IMPOSSIBILIDADE DE FIRMAR NOVOS EMPRÉSTIMOS PESSOAIS CONSIGNADOS, POSSUINDO COMO ALTERNATIVA PARA A OBTENÇÃO DO CRÉDITO APENAS A MARGEM CONSIGNÁVEL DE 5% (CINCO POR CENTO), DESCRITA NA LEGISLAÇÃO, PARA UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA POR MEIO DO CARTÃO DE CRÉDITO (ARTIGO 6ª, PARÁGRAFO 5º, I, DA LEI N. 10.820/03).

CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES, NO MAIS, QUE EXPÕE DE FORMA CLARA E PRECISA A NATUREZA, CARACTERÍSTICAS E FORMA DE COBRANÇA DA OPERAÇÃO CONTRATADA, ALERTANDO A CONTRATANTE ACERCA DA INCIDÊNCIA DE ENCARGOS SOBRE A DIFERENÇA DE VALOR EXISTENTE ENTRE O PAGAMENTO TOTAL DA FATURA E O PAGAMENTO MÍNIMO CUJA COBRANÇA É CONSIGNADA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO.

CONSUMIDORA QUE ANUIU EXPRESSAMENTE COM A ADESÃO AO CARTÃO DE CRÉDITO E COM A CONTRATAÇÃO DE SAQUE COM PAGAMENTO MÍNIMO DA FATURA MEDIANTE CONSIGNAÇÃO EM SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NÃO PODENDO ALEGAR, PORTANTO, VÍCIO DA VONTADE E AUSÊNCIA DE INTENÇÃO DE CONTRATAÇÃO DA MODALIDADE DE CRÉDITO UTILIZADA, TANTO MAIS QUANDO, CONQUANTO RECEBESSE MENSALMENTE AS FATURAS DO CARTÃO QUE APONTAVAM O PAGAMENTO MÍNIMO REALIZADO DE FORMA CONSIGNADA, APENAS VEIO A QUESTIONAR O NEGÓCIO JURÍDICO QUASE DOIS ANOS APÓS SUA REALIZAÇÃO.

CONTRATO QUE, TENDO OBSERVADO OS DITAMES DA LEI N. 10.820/03 E DA INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES N. 208/08, E SE MOSTRANDO, PORTANTO, REGULAR, DEVE SER MANTIDO NA FORMA ORIGINALMENTE PACTUADA, AFASTANDO-SE A CONVERSÃO OPERADA PELO JUÍZO SINGULAR, MORMENTE QUANDO A DEMANDANTE SEQUER TERIA MARGEM CONSIGNÁVEL PARA QUE A OPERAÇÃO TRANSMUDADA FOSSE REALIZADA DENTRO DA LEGALIDADE.

ÔNUS SUCUMBENCIAIS. ACOLHIMENTO DAS TESES RECURSAIS DO BANCO DEMANDADO QUE IMPORTA NO RECONHECIMENTO DA TOTAL IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DA INICIAL, REPERCUTINDO NA REDISTRIBUIÇÃO DA RESPONSABILIDADE PELOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA FIXADOS EM PRIMEIRO GRAU, A SEREM ARCADOS EXCLUSIVAMENTE PELA PARTE AUTORA. VERBA CUJA EXIGIBILIDADE, TODAVIA, SE MANTÉM SUSPENSA, POR GOZAR A AUTORA DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA (ARTIGO 98, § 3º, DO CPC/15).

RECURSO DA RÉ CONHECIDO E PROVIDO.

II - RECURSO DA AUTORA

PROVIMENTO DO RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA RÉ, COM O RECONHECIMENTO DA IMPROCEDÊNCIA DE TODOS OS PEDIDOS DA AÇÃO, QUE TORNA PREJUDICADA A APRECIAÇÃO DA APELAÇÃO INTERPOSTA PELA AUTORA.

RECURSO DA AUTORA PREJUDICADO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0308259-12.2017.8.24.0020, da comarca de Meleiro Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense em que são Apelante/Apelado(s) Norma Celestina de Oliveira e Apdo/Apte(s) Banco Bmg S/A.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, (i) conhecer do recurso da instituição financeira ré e dar-lhe provimento a fim de reconhecer a improcedência dos pedidos da ação, e promover a redistribuição da responsabilidade pelos ônus sucumbenciais, a ser arcada exclusivamente pela autora, com o acréscimo de honorários recursais, cuja exigibilidade, todavia, permanece suspensa, por ser a autora beneficiária da gratuidade da justiça; (ii) não conhecer do recurso da autora, por prejudicado. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Carlos Adilson Silva e Mariano do Nascimento.

Florianópolis, 16 de abril de 2020.


Desembargador Luiz Zanelato

Relator





RELATÓRIO

Norma Celestina de Oliveira e Banco Bmg S/A interpuseram recursos de apelação cível (fls. 205-230 e 284-290) em face da sentença de fls. 190-201, que, proferida pelo juízo da Unidade Regional de Direito Bancário do Litoral Sul Catarinense da comarca de Meleiro, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados pela autora na "ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral, com pedido de tutela provisória de urgência antecipada".

Cuida-se, na origem, de "ação de restituição de valores c/c indenização por dano moral, com pedido de tutela provisória de urgência antecipada" aforada em 10-08-2017 por Norma Celestina de Oliveira contra Banco Bmg S/A. Afirmou, a autora, ter procurado a instituição financeira demandada para a contratação de empréstimo consignado, oportunidade em que acabou sendo ludibriada, tendo contratado, sem seu conhecimento e consentimento, crédito disponibilizado por meio de saque em cartão de crédito com reserva de margem consignada, operação com natureza e sujeita a encargos diversos, e superiores, aos do empréstimo pretendido. Destacou que o desconto do valor emprestado em sua folha de pagamento, limitado a 5% de seu rendimento líquido, acaba por tornar o valor recebido impagável, na medida em que apenas da conta dos encargos incidentes, não representando efetiva amortização, fazendo com que o consumidor, a despeito dos pagamentos efetuados, permaneça eternamente devedor do saldo contratado. Alegou que, diante de vício na vontade, não pode ser considerada contratada a operação de crédito na forma efetuada, a qual representa nítida venda casada, tendo em vista que apenas pretendia a contratação de empréstimo e não fornecimento de cartão. Asseverou a aplicação da legislação consumerista ao caso, entendendo pela necessidade de inversão do ônus probatório e apresentação do contrato pela parte adversa. Pugnou, assim, pela declaração de inexistência da contratação, com o cancelamento da operação e a suspensão dos descontos em sua folha de pagamento, bem como a devolução, em dobro, da quantia que entende ter sido indevidamente cobrada. Suscitou, alternativamente, a conversão do crédito contrato em operação de empréstimo pessoal consignado, a ser regido pelas normas correlatas. Requereu, por fim, a condenação da parte demandada ao pagamento de danos morais decorrentes do abalo sofrido pela autora em relação à suposta atitude fraudulenta e aos descontos irregulares perpetrados pela casa bancária (fls. 01-19).

Às fls. 28-30 foi concedida a gratuidade da justiça requerida pela demandante e deferida a antecipação dos efeitos da tutela, para determinar ao banco a suspensão imediata dos descontos efetuados a título de RMC nos proventos de aposentadoria da autora, em relação ao contrato questionado.

Devidamente citado (fl. 35), o Banco Bmg S/A apresentou contestação (fls. 37-43), na qual defendeu, inicialmente, a regularidade da contratação realizada entre as partes. Afirmou, neste sentido, que a parte autora tinha total ciência da natureza e forma de cobrança da operação pactuada, a qual se encontrava descrita de forma clara e expressa no contrato, desprovido de qualquer irregularidade, não possuindo a demandante, diversamente do que alega, a intenção de contratar empréstimo pessoal consignado no lugar do saque via cartão de crédito, tendo em vista que ao tempo da contratação sequer possuía margem consignável além daquela disponível para uso no cartão, sendo esta modalidade de crédito, que não constitui venda casada, a única operação viável para a concessão do valor perseguido. Destacou que a operação de saque via cartão de crédito com margem consignável e o empréstimo pessoal consignado tratam-se de operaçãos distintas, com natureza e características diversas, sendo incabível, por isso, a conversão da operação em crédito pessoal consignado. Argumentou que, inexistindo irregularidades no contrato, ausente o ato ilícito ensejador de dano moral indenizável. Pugnou pela improcedência da demanda.

Manifestação à contestação às fls. 50-62, na qual a autora, rebatendo os argumentos da parte adversa, reitera os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda.

Sobreveio sentença de mérito prolatada em 13-02-2019 pelo magistrado Marciano Donato, da Unidade Regional de Direito...

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