Acórdão Nº 0308261-36.2018.8.24.0023 do Quinta Câmara de Direito Civil, 07-04-2020

Número do processo0308261-36.2018.8.24.0023
Data07 Abril 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0308261-36.2018.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Ricardo Fontes

APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. RECUSA EM FORNECER MEDICAMENTO. TRATAMENTO PARA CÂNCER NA MEDULA ÓSSEA. PROCEDÊNCIA À ORIGEM. INSURGÊNCIA DA RÉ .

PRELIMINAR. CONTRATO ANTECEDENTE À VIGÊNCIA DA LEI N. 9.656/98. IRRELEVÂNCIA. DEVER DE A OPERADORA POSSIBILITAR A MIGRAÇÃO PARA O PLANO REGULAMENTADO. ART. 35, CAPUT E § 1º, DA CITADA LEI. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS A CORROBORAREM A OPÇÃO DA BENEFICIÁRIA, À ÉPOCA, DE PERMANECER NO PLANO ANTIGO. COMANDO LEGAL INSATISFEITO. DIREITO À COBERTURA INCONTESTE.

MÉRITO. CONTRATO DA BENEFICIÁRIA QUE NÃO PREVÊ A CONCESSÃO DA COBERTURA PARA O MEDICAMENTO PLEITEADO. NÃO ACOLHIMENTO. APLICAÇÃO DO CDC. SÚMULA N. 608 DO STJ. CLÁUSULA LIMITATIVA ABUSIVA. ONEROSA DESVANTAGEM AO CONSUMIDOR. ART. 51, IV, DO CDC. INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO BENEFICIÁRIO DO PLANO. ART. 47 DA LEI PROTETIVA. TRATAMENTO REFERENCIADO POR PROFISSIONAL MÉDICO. MOLÉSTIA CONTEMPLADA PELA ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, BEM COMO SER O ROL DA ANS MERAMENTE EXMPLIFICATIVO. PATROCÍNIO DEVIDO.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 85, § 11, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ARBITRAMENTO.

RECURSO DESPROVIDO.







Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0308261-36.2018.8.24.0023, da comarca da Capital 1ª Vara Cível em que é Apelante Unimed Grande Florianópolis Cooperativa de Trabalho Médico Ltda e Apelado Maria do Carmo Fortuna Ferreira.

A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso de apelação, e majorar os honorários advocatícios devidos ao procurador da autora em 2% (dois por cento). Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 7 de abril de 2020, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Cézar Medeiros e dele participaram o Excelentíssimo Senhor Desembargador Jairo Fernandes Gonçalves e a Excelentíssima Senhora Desembargadora Cláudia Lambert de Faria.

Florianópolis, 8 de abril de 2020.



Desembargador Ricardo Fontes

Relator





RELATÓRIO

Adota-se, por oportuno, o relatório exarado na sentença:

Maria do Carmo Fortuna Ferreira, qualificada à fl. 02, ajuizou a presente ação de obrigação de fazer com pedido de tutela provisória de urgência em face de Unimed Grande Florianópolis - Cooperativa de Trabalho Médico, também qualificada nos autos, alegando ser beneficiária de plano de saúde ofertado pela ré, o qual tem cobertura para o tratamento de oncologia e, ao ter sido diagnosticada com Macroglobulinemia de Waldenstrom (câncer), seu médico especialista prescreveu quimioterapia com o medicamento Ibrutinibe.

Informou que apesar da indicação médica, a ré negou o pedido ao argumento de que o plano de saúde da autora não contempla o fornecimento do referido medicamento.

Aduziu ser ilegal a negativa da ré, motivo porque pugnou pela concessão da tutela provisória de urgência para determinar à ré que forneça imediatamente o medicamento prescrito pelo médico especialista para o tratamento oncólogico na quantidade e pelo período prescrito pelo especialista, tendo em vista gravidade da doença que lhe acomete, sob pena de multa diária por descumprimento de R$ 10.000,00.

Por fim, pugnou pela procedência da demanda com a confirmação da tutela provisória de urgência para condenar a ré ao fornecimento do medicamento prescrito pelo médico especialista para tratamento oncológico e sobrevivência da autora com a manutenção da sua saúde. Requereu, também, a concessão do benefício da justiça gratuita e formulou os demais requerimentos de praxe.

Às fls. 62/64, foi deferido o benefício da justiça gratuita e a tutela provisória de urgência requerida, bem como determinada a inversão do ônus da prova.

Citada, a ré apresentou contestação às fls. 70/80, informando o cumprimento da tutela provisória deferida. Além disso, preliminarmente disse ser inaplicável ao caso a Lei n. 9.656/98, pois firmado em data pretérita no ano de 1995 e oportunizada a parte autora a aderir as mudanças não houve aceitação. No mérito, disse estar ausente a cobertura contratual e que o medicamento Imbruvica (Ibrutinibe)está excluído da cobertura contratual, conforme cláusula VII, item 7.1, alínea "i", destacando que não são assegurados os serviços "vacinas, medicamentos e materiais cirúrgicos, exceto em internações e atendimento em pronto-socorro" (fl. 74), sendo legítima sua negativa, logo não infringiu os ditames da legislação. Além disso, disse que a cláusula 5.1.1 não prevê todo e qualquer tratamento da doença, mas sim cobertura de assistência médica em consultórios médicos, hospitais e ambulatoriais credenciados, ficando excluído o fornecimento de medicamentos por não possuir cobertura contratual, propugnando pela improcedência da demanda.

Houve réplica.

É o relatório.

Ato contínuo, a Magistrada a quo julgou procedente os pedidos dispendidos na peça vestibular através da sentença de fls. 152/156, modificada às fls. 172/173 diante dos Embargos Declaratórios (fls. 160/162), a qual contou com a seguinte parte dispositiva:


Em face do que foi dito, julgo procedentes os pedidos formulados por Maria do Carmo Fortuna Ferreira em desfavor de Unimed Grande Florianópolis - Cooperativa de Trabalho Médico para confirmar a tutela provisória deferida e determinar à ré que autorize e custeie o tratamento quimioterápico com medicamento IBRUTINIBE 420mg oral conforme prescrição médica, nos termos da fundamentação.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e ao pagamento de honorários, no importe de 15% do valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.


Irresignada, a parte requerida interpôs recurso de apelação (fls. 177/192), no qual alega, em sede de preliminar, a inaplicabilidade da Lei n. 9.656/98 ao caso em comento, na medida em que "os contratos celebrados antes da vigência da norma não podem ser atingidos pela regulamentação dos planos de saúde".

No mérito, sustenta, em resumo, que: a) a Lei n. 9.656/1988 atribui competência à Agência Nacional de Saúde - ANS para dispor sobre a amplitude das coberturas, a quem compete elaborar o rol de procedimentos e diretrizes a servir como referência para os planos de saúde; b) a ausência de abusividade frente ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), restringindo-se o instrumento contratual ao rol estipulado pela ANS; c) a necessidade de revogação da tutela antecipada concedida, pautando-se na probabilidade de provimento do recurso, aduzindo a impossibilidade de concessão de medicamento não previsto pela ANS.

Apresentadas as contrarrazões ao reclamo (fls. 198/206).

Após, ascenderam os autos a esta Corte.


VOTO

Trata-se de ação de obrigação de fazer, fundada na negativa, por parte da operadora requerida, em fornecer o tratamento de neoplasia, mediante uso de medicação oral específica, solicitado pela autora, com esteio na suposta ausência de correspondente cobertura no plano de saúde contratado.

De saída, arreda-se a aplicabilidade da legislação consumerista à espécie, pois, a teor da Súmula n. 608 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), "aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão".

Superada tal análise, não repousa controvérsia a respeito de que (a) a autora é, com efeito, beneficiária do "Plano de Saúde Empresarial", firmado com a ré em 1995 (fls. 43/56); e (b) a sujeição ao medicamento postulado – IBRUTINIBE – encontra respaldo em recomendação de médico especialista (fls. 25/27 e 34/35).

É incontroverso também que a operadora negou-se a autorizar o procedimento pretendido.

Na data de 13-07-2018 (fls. 22/23), sob a justificativa de que o plano originário, uma vez pretérito à vigência da Resolução Normativa – RN n.º 428, de 7 de novembro de 2017, não assegura o fornecimento do medicamento pretendido, na medida em que não é elencado no Rol de procedimentos constante do contrato pactuado entre as partes.

Não se diverge de que, com efeito, aderiu a requerente ao plano de saúde oferecido pela demandada em 1995, isto é, anteriormente à vigência da Lei n. 9.656/98, a qual dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde.

No entanto, tal não afastava, necessariamente, a subsunção do contrato avençado entre as litigantes aos preceitos da citada normativa, cujo art. 35, caput e § 1º, contém a seguinte redação:

Art. 35. Aplicam-se as disposições desta Lei a todos os contratos celebrados a partir de sua vigência, assegurada aos consumidores com contratos anteriores, bem como àqueles com contratos celebrados entre 2 de setembro de 1998 e 1 o de janeiro de 1999, a possibilidade de optar pela adaptação ao sistema previsto nesta Lei. § 1º Sem prejuízo do disposto no art. 35-E, a adaptação dos contratos de que trata este artigo deverá ser formalizada em termo próprio, assinado pelos contratantes, de acordo com as normas a serem definidas pela ANS.


Dessarte, observa-se a possibilidade de adaptação dos planos antigos aos ditames da novel lei, mediante prévia cientificação/anuência do beneficiário, obedecidas as formalidades legais (§ 1º).

Em tal cenário, o entendimento sufragado por esta Corte de Justiça pende a determinar a incidência da Lei n. 9.656/98, mesmo aos contratos firmados anteriormente, quando a operadora não comprovar a necessária oferta de migração ao beneficiário para o plano regulamentado. Veja-se:


APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM TUTELA ANTECIPADA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE EMPRESARIAL. [...] PLANO CONTRATADO...

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