Acórdão Nº 0308383-11.2015.8.24.0005 do Quinta Câmara de Direito Civil, 18-02-2020

Número do processo0308383-11.2015.8.24.0005
Data18 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0308383-11.2015.8.24.0005, de Balneário Camboriú

Relatora: Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

APELAÇÃO CÍVEL. RESCISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA, CUMULADA COM REINTEGRAÇÃO DE POSSE E REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS. INADIMPLÊNCIA DO RÉU. PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM.

RECURSO DO AUTOR

DANOS MATERIAIS. PLEITO DE INDENIZAÇÃO PELA DESVALORIZAÇÃO DO VEÍCULO DURANTE O PERÍODO DE USO PELO RÉU. POSSIBILIDADE. DEMANDADO QUE PERMANECEU MAIS DE CINCO ANOS USUFRUINDO O BEM. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. COMPENSAÇÃO EM FAVOR DO AUTOR A SER ESTABELECIDA EM CONSONÂNCIA COM TABELA FIPE. VALOR DE MERCADO DO VEÍCULO NA DATA DA SUA RESTITUIÇÃO, OBSERVANDO O PERCENTUAL DO PREÇO QUE FOI ADIMPLIDO. UTILIZAÇÃO DA REFERIDA TABELA QUE JÁ VALORA A DEPRECIAÇÃO SOFRIDA, DISPENSANDO A INCIDÊNCIA DE CONSECTÁRIOS LEGAIS.

DANOS MORAIS. INFRAÇÕES DE TRÂNSITO COMETIDAS PELO RÉU QUE ENSEJARAM A SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR DO AUTOR, BEM COMO NECESSIDADE DESTE DE REALIZAR CURSO DE RECICLAGEM. TRANSTORNOS CAUSADOS QUE ULTRAPASSAM A ESFERA DO MERO ABORRECIMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO.

ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. REDISTRIBUIÇÃO NECESSÁRIA.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0308383-11.2015.8.24.0005, da comarca de Balneário Camboriú 1ª Vara Cível em que é Apelante Guilherme Diegoli e Apelado Ronny Peter Sandri.

A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Cézar Medeiros e dele participou, com voto, o Excelentíssimo Senhor Desembargador Ricardo Fontes.

Florianópolis, 18 de fevereiro de 2020.

Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

Relatora


RELATÓRIO

GUILHERME DIEGOLI, representado por JOANITA DIEGOLI, ajuizou "ação de rescisão de contrato particular de compra e venda, cumulada com perdas e danos e tutela antecipatória para restituição do bem" contra RONNY PETER SANDRI, alegando, em síntese, que, em 31 de março de 2014, alienou veículo de sua propriedade (RENAULT CLIO 2011, placas MJF-5125) ao demandado, pela contraprestação de R$ 19.000,00.

Relatou que as partes pactuaram o pagamento da quantia de forma parcelada, mediante depósito (R$ 2.950,00 em cinco parcelas de R$ 590,00 e 16.050,00, em uma parcela de R$ 1.050,00 e 15 parcelas de R$ 1.000,00), mas o requerido não cumpriu com o ajustado, desrespeitando tanto os valores como as datas combinadas, tendo quitado, apenas, o montante de R$ 5.050,00.

Narrou, ainda, que o requerido estava transitando com o veículo de forma irregular, porquanto o licenciamento encontra-se vencido, e cometendo infrações de trânsito, em relação as quais a pontuação está sendo registrada na sua CNH. Ademais, aduziu que as diversas tentativas extrajudiciais de tentar quitar o débito ou de restituir o bem restaram inexitosas.

Por este motivo, pugnou pela antecipação dos efeitos da tutela, para a busca e apreensão do veículo; pela declaração da rescisão do contrato de compra e venda; pela condenação do demandado ao ressarcimento dos danos sofridos e pela expedição de mandado de reintegração definitiva de posse.

Na decisão interlocutória de fls. 26/29, a magistrada singular indeferiu o pleito de antecipação dos efeitos da tutela.

O requerido apresentou contestação às fls. 53/68, oportunidade em que argumentou que, na verdade, quitou a quantia de R$ 9.550,00, sendo que o pagamento parcial se deu em razão da superveniência de defeitos na parte mecânica do veículo, logo após as partes terem firmado o contrato, tornando o bem impróprio para uso. Além disso, narra que despendeu o montante de R$ 6.149,77, para efetuar o conserto do automóvel.

Afirmou que o autor negou-se a transferir a propriedade do bem para seu nome, sob o argumento de que apenas o faria após a integral quitação do preço pactuado, atitude que diverge do que foi acertado nas tratativas. Ademais, sustentou que o veículo encontra-se em circulação com todas as taxas quitadas e devidamente licenciado e que, ao deixar de comunicar a venda ao DETRAN, o autor assumiu os riscos sobre eventuais pontos registrados em seu prontuário de habilitação.

Por fim, defendeu que é indevida a indenização por danos morais.

O requerido apresentou reconvenção (fls. 86/91), em que pugnou pela condenação do autor a indenizá-lo pelos danos materiais sofridos em razão do conserto do veículo (R$ 6.149,77) e pelos danos morais originados pela cobrança indevida de valores.

O autor apresentou réplica às fls. 112/118 e contestou a reconvenção às fls. 122/128.

O réu impugnou a contestação do autor às fls. 133/137.

O demandante juntou documentos relativos ao procedimento administrativo instaurado contra ele em razão das infrações de trânsito cometidas pelo demandado (fls. 139/142). Informou, posteriormente, que seu direito de dirigir foi suspenso pelo período de dois meses e terá realizar curso de reciclagem em razão do excesso de pontuação na CNH.

Julgando antecipadamente o mérito, a juíza a quo proferiu sentença de parcial procedência dos pedidos, cujo dispositivo transcreve-se abaixo:

ANTE O EXPOSTO, acolho em parte os pedidos inaugurais, resolvendo o mérito com fulcro no art. 487, I, do CPC, para declarar a resolução do contrato particular de promessa compra e venda celebrado entre as partes (fls. 12-14), determinando o retorno destas ao status quo ante, mediante a reintegração do autor na posse do veículo em discussão, incumbindo-lhe providenciar, em ato simultâneo, a devolução do montante já quitado pelo réu, correspondente a R$ 7.050,00 (sete mil e cinquenta reais), devidamente corrigida pelo índice do INPC desde a data dos respectivos desembolsos. Outrossim, rejeito os pedidos de ressarcimento das perdas e danos e indenização por danos morais.

Por conseguinte, tendo sido cada parte vencedora e vencida, condeno ambos os litigantes ao pagamento das custas processuais - na proporção de 50% para cada um. Fixo os honorários advocatícios devidos aos procuradores do autor e do réu em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da causa, ex vi dos arts. 85, § 2º e 86, ambos do CPC.

Quanto à reconvenção, rejeito os pedidos formulados, resolvendo o mérito com fulcro no art. 487, I, do CPC. Via de consequência, condeno o reconvinte ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais arbitro em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da reconvenção, ex vi do art. 85, §2º, do CPC.

O autor interpôs embargos de declaração, sustentando que a decisão foi omissa por ter deixado de se pronunciar acerca da depreciação do veículo pelo tempo uso pelo demandado. O recurso foi, no entanto, rejeitado (fls. 165/166).

Insatisfeito com a prestação jurisdicional entregue, o autor interpôs recurso de apelação (fls. 167/176), em que se insurge acerca do indeferimento do pedido de indenização por perdas e danos. Assevera que houve depreciação do bem, em decorrência do decurso do tempo que desvalorizou o automóvel e, para que as partes efetivamente retornem ao status quo ante, a quantia referente à desvalorização deve lhe ser indenizada; defende que o quantum indenizatório deve ser apurado em fase liquidação de sentença. Ademais, reitera que é devida indenização por danos morais, porquanto teve o direito de dirigir suspenso por 02 meses e teve que realizar curso de reciclagem, em razão das infrações de trânsito cometidas pelo réu, que foram registradas em seu nome.

Foram apresentadas contrarrazões às fls. 184/195.

Os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Os requisitos de admissibilidade encontram-se preenchidos, motivo pelo qual o recurso deve ser conhecido.

Dá análise do caderno processual, infere-se que as partes pactuaram a compra venda do veículo Renault Clio, Cam, 1.0, 16V, branco, ano 2011, placas MJF-5125, Renavam 344.291.812, em 31 de março de 2014. No entanto, o réu, ora apelado, apenas adimpliu parcialmente o preço ajustado, motivo que ensejou a propositura da presente demanda pelo autor/apelante, a fim de rescindir o contrato.

Infere-se que a controvérsia da lide consiste na investigação da existência do dever de indenizar do apelado no que tange à desvalorização do veículo, durante o tempo em que o bem permaneceu com este, e acerca do suposto dano moral sofrido pela perda do direito de dirigir pelo período de dois meses, em decorrência das infrações de trânsito cometidas pelo apelado.

Pois bem.

Em relação ao dano material, razão assiste ao apelante.

Isso porque o apelado utilizou o automóvel por período superior a 05 anos, não podendo se olvidar que houve desvalorização do bem, notadamente pela redução do seu valor de mercado. Desta forma, a condenação do autor à restituição da integralidade do valor pago pelo apelado à época da aquisição do veículo ensejará manifesto enriquecimento ilícito deste, o que é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.

Destarte, o montante a ser restituído deverá ser proporcional ao valor de mercado do veículo, conforme tabela FIPE, vigente na data da restituição do veículo ao autor, sem a incidência de correção monetária e juros de mora, "de modo a evitar o enriquecimento sem causa por quaisquer das partes, haja vista que, durante a vigência do pacto, o veículo foi livremente utilizado pela adquirente" (Apelação Cível n. 2013.062699-0, rel. Des. Henry Petry Junior, j. 07/01/2014)."

Nos julgados em que se discutiu a restituição de veículo ao vendedor em razão de rescisão contratual, este foi o entendimento desta Corte de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS E RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO USADO. VÍCIO OCULTO. AUTOMÓVEL ALIENADO QUE POSSUI VERSÃO CLONADA EM CIRCULAÇÃO. - PARCIAL PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DA RÉ. (1) CONDENAÇÃO À DEVOLUÇÃO INTEGRAL DO PREÇO. DESPROPORCIONALIDADE. BEM...

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