Acórdão Nº 0308415-92.2016.8.24.0033 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 16-08-2022

Número do processo0308415-92.2016.8.24.0033
Data16 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0308415-92.2016.8.24.0033/SC

RELATOR: Juiz GIANCARLO BREMER NONES

APELANTE: CAPITAL TRADE IMPORTACAO E EXPORTACAO LTDA APELADO: ALLOG TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA.

RELATÓRIO

HELLMANN WORLDWIDE LOGISTICS N.V., representada por ALLOG TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA., ingressou com ação de cobrança contra CAPITAL TRADE IMPORTACAO E EXPORTACAO LTDA, narrando, em síntese, ter sido contratada pela ré para realizar o transporte marítimo de produtos importados acondicionados em contêineres. De acordo com o pactuado, a ré deveria devolver os contêineres durante o período de franquia, conhecido como free time, contado desde a data do descarregamento deles no porto de destino. Contudo a ré não devolveu os contêineres no prazo acertado, o que a sujeita à cobrança pela sobre-estadia, também chamada de demurrage. Por esse motivo, pediu a condenação da ré ao pagamento do valor equivalente a R$ 70.736,81, bem como ao ressarcimento das despesas com a tradução juramentada da documentação necessária ao ajuizamento desta ação.

Regularmente citada, a ré contestou, alegando, resumidamente que: a) a autora não é parte legítima para figurar no polo ativo da ação; b) a representação processual dela está irregular; c) por sua vez, não é parte legítima para figurar no polo passivo da ação; d) os valores cobrados são abusivos e gera enriquecimento ilícito; e) o termo de responsabilidade é adesivo, unilateral, com cláusulas abusivas e sem o condão de vinculá-la; f) não houve pactuação expressa quanto aos valores da penalidade e aos prazos; g) não possui responsabilidade pelo pagamento, em virtude dos entraves estruturais e burocráticos dos regimes portuários e alfandegários (força maior); h) os valores cobrados são exorbitantes e possuem natureza da cláusula penal, logo devem sofrer a limitação prevista no art. 412 do Código Civil; i) a data da descarga e a indenização devida não estão corretas. Além disso, promoveu a denunciação da lide à proprietária da carga. Por essas razões, pediu a extinção do processo sem a resolução do mérito ou, se superadas as matérias preliminares arguidas, o reconhecimento da improcedência das pretensões iniciais.

Houve réplica.

A seguir, foi proferido julgamento antecipado, nos termos do dispositivo abaixo reproduzido:

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do CPC e resolvendo o mérito, JULGO PROCEDENTE a pretensão inicial e, em consequência, CONDENO a parte ré Capital Trade Importação e Exportação Ltda ao pagamento da importância de:

a) R$ 70.736,81 (setenta mil, setecentos e trinta e seis reais e oitenta e um centavos), a título de sobre-estadia de contêineres, cujo montante deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC-IBGE (provimento n. 13/95 da CGJSC) e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento), ambos a contar do ajuizamento da ação (1-8-2016).

b) 392,99 (trezentos e noventa e dois reais e noventa e nove centavos), a título de despesas com tradução juramentada (pp. 11,112 e 116), cujo montante deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC-IBGE (provimento n. 13/95 da CGJ-SC) e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento), ambos a contar do ajuizamento da ação (1-8-2016).

Diante da sucumbência, condeno a ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, a teor do art. 85, § 2º, do CPC.

Inconformada, a ré interpôs a presente apelação e, em suas razões, insistiu basicamente nas teses de ilegitimidade ativa, de irregularidade de representação da autora e de ilegitimidade passiva, reforçando, ainda, a necessidade de se admitir a denunciação da lide à proprietária da carga. Reiterou suas alegações quanto ao caráter adesivo e unilateral do termo de responsabilidade, à ausência de responsabilidade pelo pagamento, em virtude dos entraves estruturais e burocráticos dos regimes portuários e alfandegários (força maior) e à natureza de cláusula penal da demurrage. Por fim, argumentou que a indenização cobrada deveria restringir-se ao valor do dano supostamente suportado.

Por essas razões, pediu que o recurso seja conhecido e provido, a fim de o processo ser julgado extinto sem a resolução do mérito. Caso rejeitadas as preliminares arguidas, pediu que a sentença objurgada seja cassada, para bem de se admitir a denunciação da lide. Subsidiariamente, pediu a reforma da sentença, julgando-se improcedentes os pedidos formulados na inicial.

A autora apresentou suas contrarrazões.

Após ascenderem a este segundo grau, os autos vieram conclusos.

VOTO

O recurso merece ser conhecido, uma vez que presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

Com relação às teses preliminares de ilegitimidade ativa e de irregularidade de representação, importante esclarecer que a autora opera como transportadora/agente internacional de cargas, segundo conceito de Eliane Maria Octaviano Martins: "O transportador (carrier) é a parte contratada que firma um contrato de transporte de determinada mercadoria, por navio, de um porto a outro. O transportador não é necessariamente proprietário ou armador do navio e nem sempre executa efetivamente o transporte (transportador executor)" (Curso de direito marítimo. v. II. Barueri: Manole, 2008, p. 248-249).

Tendo como ponto de partida essa definição, extrai-se dos autos que ALLOG TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA. representa HELLMANN WORLDWIDE LOGISTICS N.V. no Brasil, conforme carta nesse sentido acostada e traduzida (evento 1, doc 5).

No referido documento, HELLMANN WORLDWIDE LOGISTICS N.V. outorga poderes a ALLOG TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA. para que "[...] possa contratar advogados, receber e responder notificações judiciais, dar continuidade a ações judiciais, fazer acordos e tudo o que for necessário para defender os nossos interesses como Transportador Principal de Cargas Marítimas segundo os termos dos nossos Master Bill of Ladings".

Depois, constata-se que HELLMANN WORLDWIDE LOGISTICS N.V. firmou os conhecimentos de embarque dos produtos importados em nome de Pelorus Ocean Line Limited (evento 1, docs 9-12).

A condição de agente internacional de cargas da ALLOG TRANSPORTES INTERNACIONAIS LTDA., representante da HELLMANN WORLDWIDE LOGISTICS N.V., está inclusive registrada no termo de responsabilidade firmado pela ré (evento 1, doc 29)

Logo, existem elementos suficientes a indicar que não há defeitos na representação da autora e a respaldar a legitimidade ativa questionada, conforme precedentes deste tribunal:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. TARIFAS DE SOBRE-ESTADIA DE CONTÊINERES - DEMURRAGE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE DEMANDADA. PRELIMINARES. ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE ATIVA. PREFACIAL REJEITADA. DEMANDANTE QUE ATUA NA CONDIÇÃO DE AGENTE MARÍTIMO (TRANSPORTADORA NÃO PROPRIETÁRIA DO NAVIO). RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AUTORA E REQUERIDA AMPLAMENTE COMPROVADA. LEGITIMIDADE ATIVA INCONTESTE. "[...] não poderia ser acolhida a alegação de ilegitimidade ativa da autora/apelada, que atuava no transporte marítimo na qualidade de...

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