Acórdão Nº 0308733-68.2018.8.24.0045 do Segunda Turma Recursal, 08-06-2020

Número do processo0308733-68.2018.8.24.0045
Data08 Junho 2020
Tribunal de OrigemPalhoça
ÓrgãoSegunda Turma Recursal
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Segunda Turma Recursal



Recurso Inominado n. 0308733-68.2018.8.24.0045, de Palhoça

Relatora: Juíza Ana Karina Arruda Anzanello


RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VOO E ATRASO NA CHEGADA AO DESTINO. PERDA DA CONEXÃO. ASSISTÊNCIA MATERIAL INCOMPLETA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DA COMPANHIA AÉREA. AFASTAMENTO DO DEVER DE INDENIZAR PELA EXISTÊNCIA DE CASO FORTUITO/FORÇA MAIOR E PELA ADOÇÃO DAS MEDIDAS ESTABELECIDAS PELA ANAC. INSUBSISTÊNCIA. INCONTROVERSO CANCELAMENTO DE VOO. ALEGAÇÃO DE SITUAÇÃO IMPREVISÍVEL. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO QUE NO VERTENTE CASO, ULTRAPASSOU O MERO DISSABOR. DANO MORAL CARACTERIZADO. MINORAÇÃO DO QUANTUM ARBITRADO A TÍTULO DE COMPENSAÇÃO PELO ABALO ANÍMICO. PLEITO ACOLHIDO. VALOR ELEITO QUE NÃO SE AFIGURA COMPATÍVEL COM AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO E OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REDUÇÃO IMPLEMENTADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0308733-68.2018.8.24.0045, da comarca de Palhoça Juizado Especial Cível e Criminal, em que é Recorrente Gol Linhas Aéreas S/A e Recorrido Niva Luiza Madruga.


A Segunda Turma Recursal decidiu, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Sem custas e honorários advocatícios.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Juiz Marco Aurélio Ghisi Machado, com voto e dele participou o Exmo. Sr. Juiz Vitoraldo Bridi.


Florianópolis, 08 de junho de 2020.

Ana Karina Arruda Anzanello

Relatora

RELATÓRIO

Gol Linhas Aéreas S/A interpôs Recurso Inominado contra sentença proferida pelo magistrado do Juizado Especial Cível da Comarca de Palhoça, que julgou procedente o pedido deduzido por Niva Luiza Madruga, a fim de condená-la ao pagamento de indenização por danos morais, fixados em "R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de compensação por danos morais, atualizado a partir desta sentença e acrescido de juros legais de mora a partir da citação" (fl. 77-79).

Em suas razões recursais (fls. 157-176) a companhia aérea alegou, em síntese, a ausência de responsabilidade pelo cancelamento do voo, diante de caso fortuito, consistente em más condições climáticas. Defendeu ainda, que sendo a situação narrada na exordial é incapaz de ensejar abalo moral. Sucessivamente, requereu a redução do quantum indenizatório.

Com contrarrazões (fls. 218-231), os autos ascenderam a esta Turma Recursal.

Este é o relatório.















VOTO

Inicialmente, encontram-se presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, o reclamo merece ser conhecido, passando-se, desta forma, à respectiva análise.

A companhia aérea defende que não pode ser responsabilizada pelo cancelamento do voo, em razão de que o ilícito ocorreu por fato alheio a sua vontade, haja vista que as condições climáticas não eram favoráveis na data dos fatos.

Em que pese o esforço argumentativo, a insurgência não prospera.

A responsabilidade da empresa aérea – fornecedora de serviços de transporte – por atraso ou cancelamento de voo é objetiva e independe da comprovação de dolo ou culpa, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.

Situações ordinárias de manutenção de aeronaves são considerados fortuitos internos, insuficientes a afastar a responsabilidade civil da prestadora de serviço.

De precedente envolvendo companhia aérea:

RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SERVIÇO DE TRANSPORTE AÉREO DOMÉSTICO. CANCELAMENTO INJUSTIFICADO DE VOO, O QUE OCASIONOU O ATRASO DE CHEGADA AO DESTINO DE APROXIMADAMENTE 4 (QUATRO) HORAS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA GENÉRICA DA COMPANHIA AÉREA DEMANDADA, QUE SE LIMITA À ALEGAÇÃO DA AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR, PORQUANTO TERIA SIDO PRESTADA AO CONSUMIDOR A ASSISTÊNCIA PREVISTA NA RESOLUÇÃO 400 DA ANAC. INSUBSISTÊNCIA. ALEGAÇÃO, ADEMAIS, DA NECESSIDADE DE CANCELAMENTO DO VOO EM DECORRÊNCIA DE CONDIÇÕES CLIMÁTICAS DESFAVORÁVEIS, O QUE NECESSITOU A ALTERAÇÃO DA MALHA AÉREA. AUSÊNCIA DE PROVAS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. EXCLUDENTES AFASTADAS. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO CARACTERIZADA [...] (TJSC, Recurso Inominado n. 0301342-44.2017.8.24.0030, de Imbituba, rel. Juíza Miriam Regina Garcia Cavalcanti, Quarta Turma de Recursos - Criciúma, j. 17-12-2019).


Na hipótese, é incontroverso nos autos que houve o cancelamento de voo que partiria de Salvador rumo à Florianópolis, com conexão no Rio de Janeiro, às 17:30h do dia 25/11/2018 com chegada às 23:30h do mesmo dia (fl. 13).

Ainda que o cancelamento ou atraso de voo não importe automática configuração de abalo moral, no caso tem-se que as circunstâncias ultrapassaram a barreira do mero dissabor.

Em que pese a Ré tenha fornecido hospedagem a Autora, isso só ocorreu após seu desembarque no aeroporto em São Paulo – SC, sendo que às 4 (quatro) horas que antecederam o voo a Autora permaneceu sem nenhum tipo de assistência por parte da companhia aérea. Após chegar ao hotel, a Autora teve apenas aproximadamente 2 horas de descanso apenas. Ademais, a empresa áerea não apresentou nenhuma prova que pudesse comprovar que o cancelamento efetivamente se deu em decorrência de condições climáticas.

De outro caso, colhe-se:


RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. SERVIÇO DE TRANSPORTE AÉREO DOMÉSTICO. ATRASO DE VOO DE APROXIMADAMENTE 16 (DEZESSEIS) HORAS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA GENÉRICA DA COMPANHIA AÉREA DEMANDADA, QUE SE LIMITA À ALEGAÇÃO DA NECESSIDADE DE CANCELAMENTO DO VOO EM RAZÃO DE INTENSO TRÁFEGO AÉREO. EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE NÃO COMPROVADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO CARACTERIZADA. ABALO ANÍMICO CONFIGURADO. PLEITO DE REDUÇÃO DO MONTANTE REPARATÓRIO, FIXADO EM R$ 8.000,00 (OITO MIL REAIS). PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO QUE JUSTIFICAM A MANUTENÇÃO DO QUANTUM DEFINIDO PELO JUÍZO A QUO. QUANTO À CONDENAÇÃO POR DANOS MATERIAIS (R$ 40,78), DECORRENTE DAS DESPESAS COM ALIMENTAÇÃO PELO PERÍODO DE ATRASO, TAL MATÉRIA NÃO FOI OBJETIVAMENTE IMPUGNADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1- "O atraso e o cancelamento de voo, quando não há comprovação de justificativa plausível determinada por condições climáticas adversas ou por impedimento determinado por terceiro, sujeita a companhia aérea à indenização dos danos sofridos por passageiros que, não tendo viajado na data prevista, perderam seus compromissos, sejam eles de ordem pessoal, patrimonial ou profissional." (TJSC, Apelação Cível n. 2012.023928-2, rel. Des. Jaime Ramos, j. 3-5-2012). 2- "(...) 'O valor do dano moral deve ser arbitrado segundo os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, não podendo ser irrisório, tampouco fonte de enriquecimento sem causa, exercendo função reparadora do prejuízo e de prevenção da reincidência da conduta lesiva' (STJ. AgRg no Ag n. 1.259.457/RJ. rel. Min. Humberto Martins. j. em 13.4.2010)." (TJSC, Apelação Cível n. 0000321-54.2013.8.24.0028, de Içara, rel. Des. Henry Petry Júnior, j. 12-9-2017). SENTENÇA CONFIRMADA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS, NOS TERMOS DO ART. 46, DA LEI 9.099/95. (TJSC, Recurso Inominado n. 0301696-31.2019.8.24.0020, de Criciúma, rel. Juíza Miriam Regina Garcia Cavalcanti, Quarta Turma de Recursos - Criciúma, j. 29-10-2019) (g.n.).


De tal modo que a conjunção de fatores experimentados pela Autora ultrapassou o mero desconforto do cotidiano, suficiente para causar-lhe abalo moral.

Por fim, a empresa aérea Recorrente sustenta que a indenização concedida na origem (R$ 8.000,00) estaria ocasionando o enriquecimento indevido da Autora.

No ponto, a irresignação merece ser acolhida.

Com relação à valoração dos danos morais, o julgador deve estar atento às circunstâncias do evento danoso, o interesse do bem jurídico tutelado e a condição das partes, atendidos ainda os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a fim de possibilitar ao lesado um satisfação compensatória, sem importar no seu enriquecimento sem causa.

O doutrinador Sérgio Cavalieri Filho pondera que:


[...] No âmbito do dano extrapatrimonial (moral), a sua quantificação como um decréscimo material é também absolutamente impossível, razão pela qual o critério do arbitramento judicial é o único apropriado [...]. Também aqui terá o juiz que se valer da lógica do razoável, que permite cotejar meios e fins, causas e consequências, de modo a aferir a lógica da decisão. Para que a decisão seja razoável, é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes.

A indenização punitiva do dano moral...

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