Acórdão Nº 0308766-13.2016.8.24.0018 do Terceira Câmara de Direito Público, 15-02-2022

Número do processo0308766-13.2016.8.24.0018
Data15 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0308766-13.2016.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (INTERESSADO) APELADO: EVA NILVA MORO (REQUERENTE) APELADO: VILSON RIBEIRO DE MELLO (REQUERENTE) APELADO: VOLMIR DE ALMEIDA (REQUERENTE) APELADO: SOLENI BET (REQUERENTE) APELADO: SILVANIA DOS SANTOS RABER (REQUERENTE) APELADO: SANDRO DE MELLO (REQUERENTE) APELADO: ROSELI MARCIA MORAES DE ALMEIDA (REQUERENTE) APELADO: JOVINIL MORO (REQUERENTE) APELADO: IGOR ABRIACO MARTIORI (REQUERENTE) APELADO: DALVINO PINHEIRO (REQUERENTE) APELADO: CELSON RIBEIRO DE MELLO (REQUERENTE) APELADO: VOLMIR RIBEIRO DE MELLO (REQUERENTE) APELADO: VERONICA GONCALVES DA ROSA PINHEIRO (REQUERENTE) APELADO: SOLANGE DA SILVA (REQUERENTE) APELADO: ROZELEI MORAES DE MELLO (REQUERENTE) APELADO: MARCIO ANDRE RABER (REQUERENTE) APELADO: IRENE DOS SANTOS (REQUERENTE) APELADO: IDOEMA DE MELLO (REQUERENTE)

RELATÓRIO

Na Comarca de Chapecó, Celson Ribeiro de Mello, Igor Abriaco Martiori, Dalvino Pinheiro e Verônica Gonçalves da Rosa, Sandro de Mello, Rozelei Moraes de Mello, Volmir de Almeida, Roseli Márcia Moraes de Almeida, Vilson Ribeiro de Mello, Idoema de Mello, Solen Bet, Márcio André Raber, Silvania dos Santos Raber, Jovinil Moro, Eva Nilva Moro, Volmir Ribeiro de Mello e Solange da Silva ajuizaram "ação de regularização de propriedade plano estadual de regularização fundiária - reconhecimento do domínio de propriedade (projeto larga legal)", objetivando a regularização, com registro de imóvel, de área de terra urbana, inserida no Município de Planalto Alegre, com registro nas matrículas imobiliárias nrs. 50.552 e 3.849, do Cartório de Registro de Imóveis de Chapecó; que a área a ser regularizada "pertence à área espacial da Avenida Brasil, e Avenida Santa Catarina, sendo atendida pelo Posto de Saúde localizado na Rua Nove de Julho, Escolas de Educação Básica e Centro de Educação Infantil pré-escolar"; que a área situa-se em região urbana. Requereram, assim, "a consequente declaração de domínio e titulação dos lotes em questão individualizado a cada requerente nos termos dos Memoriais Descritivos e Mapas da Localidade com a emissão dos respectivos títulos de propriedade".

Em seguida, o MM. Juiz proferiu decisão determinando aos autores para que procedessem à emenda da inicial, com a consequente apresentação de documentos.

Cumprida a determinação judicial pelos demandantes, posteriormente foi determinada a intimação dos "representantes da Fazenda Pública da União, do Estado e do Município para que manifestem eventual interesse na causa".

A União se manifestou nos autos informando que não possui interesse no feito.

Após manifestação ministerial, os autores apresentaram os documentos solicitados pelo juízo e, posteriormente, a Municipalidade apresentou o diagnóstico socioambiental da região discutida nos autos.

Ato contínuo, foi proferida sentença que julgou procedente o pedido inicial para "declarar o domínio sobre as respectivas áreas individualizadas nas plantas e memoriais descritivos acostados aos autos, servindo a presente decisão como título para registro no Ofício de Registro de Imóveis, resolvendo o mérito da causa com base no art. 487, I, do CPC/2015".

Inconformado, o Ministério Público Estadual apelou alegando, em preliminar, que a sentença é nula, sob os seguintes fundamentos: i) com a existência de lide, deve a jurisdição voluntária ser extinta e as partes remetidas às vias ordinárias; ii) a inconstitucionalidade da Resolução CM n. 8/2014, diante da afronta ao art. 22, inciso I, da CF/88, bem como pela contrariedade à Lei Federal n. 13.465/2017 (Lei da Reurb); iii) que a decisão proferida pelo juízo viola os princípios constitucionais do juiz natural e da vedação ao juízo de exceção. No mérito, afirma que os demandantes não preencheram os requisitos mínimos para a regularização da propriedade pretendida (Resolução n. 08/2014).

Após o oferecimento das contrarrazões, os autos foram encaminhados à douta Procuradoria-Geral de Justiça, que no parecer da lavra do Exmo. Procurador de Justiça, Dr. Alexandre Herculano Abreu, manifestou-se pelo desprovimento do apelo.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Ministério Público de Santa Catarina contra sentença que, nos autos da ação de reconhecimento do domínio de propriedade - Regularização Fundiária - Projeto Lar Legal, intentada por Celson Ribeiro de Mello, Igor Abriaco Martiori, Dalvino Pinheiro e Verônica Gonçalves da Rosa, Sandro de Mello, Rozelei Moraes de Mello, Volmir de Almeida, Roseli Márcia Moraes de Almeida, Vilson Ribeiro de Mello, Idoema de Mello, Solen Bet, Márcio André Raber, Silvania dos Santos Raber, Jovinil Moro, Eva Nilva Moro, Volmir Ribeiro de Mello e Solange da Silva, declarou o domínio sobre as respectivas áreas individualizadas na planta e memoriais descritivos acostados aos autos, servindo a respectiva decisão como título para registro no Ofício de Registro de Imóveis, nos termos do Projeto "Lar Legal" (Resolução n. 08/2014 CM TJSC).

O cerne da demanda consiste em verificar se a regularização, com a inscrição de matrícula em registro imobiliário, dos lotes discutidos no processo, respeitam, em sua integralidade ou não, as normas constitucionais e infraconstitucionais que regem a matéria, especialmente as urbanísticas e ambientais.

O Ministério Público Estadual alega, como questões preliminares em seu apelo, que:

i) deva ser decretada a nulidade dos autos, desde a sentença. Havendo lide, deve a jurisdição voluntária ser extinta e as partes remetidas às vias ordinárias. É o que se requer (Evento 123, APELAÇÃO1, p.05);

ii) O Lar Legal, portanto, ao criar regras de Direito Civil (propriedade) por resolução do Conselho da Magistratura, fere de morte o art. 22, inciso I, da Constituição da República. E, a reboque, nega vigência à Lei de Regularização Fundiária, a Lei Federal n. 13.465/2017, que disciplinou integralmente o tema" (Evento 123, APELAÇÃO1, p.08)

iii) Apesar de parecer lógico o dever de obediência às regras constitucionais, o Programa Lar Legal fere o princípio do juiz natural, uma vez que os procedimentos de jurisdição voluntária são julgados por juízes indicados pela Coordenação Estadual do Lar Legal dentre aqueles que concordem" (Evento 123, APELAÇÃO1, p.12) e, por isso, evidente a violação aos princípios constitucionais do juiz natural e do juízo de exceção.

Respectivas argumentações não merecem guarida.

Inicialmente, o apelante defende que, em razão da existência de resistência e/ou oposição do órgão ministerial em relação à questão discutida nos autos, deve o procedimento de jurisdição voluntária ser extinto.

Entretanto, cumpre destacar que a afirmação não deve ser mantida, isso porque, conforme bem esclareceu a MMª. Juíza, Dra. Liana Bardini Alves:

(...) a Resolução 08/14 do CM em seus considerandos preambulares tratou de elencar todo o arcabouço legislativo a fim de fundamentar a sua edição. A resolução tão somente tratou do procedimento, a fim de dar agilidade ao programa Lar Legal e, dessa forma, garantir o direito à propriedade aos mais necessitados.

Na realidade, o Lar Legal é uma mescla de usucapião coletiva em procedimento de jurisdição voluntária, exigindo muito mais do que se exige na usucapião, como por exemplo, verificação de APP ou área de risco. Na usucapião, ao contrário, não se tem tais exigências. O que a resolução 08/14 fez foi instrumentalizar e facilitar a regularização fundiária e, assim, evitar uma enxurrada de usucapiões individuais quando se pode decidir coletivamente.

O que a Resolução 08/14 do CM/TJSC trouxe foi celeridade, dignidade e acesso das pessoas de baixa renda ao Poder Judiciário e, em nenhum momento, afrontou qualquer legislação federal.

Ao que parece, o ideal seria deixar tudo como está (tudo na ilegalidade e na posse) e não dar acesso àqueles que mais precisam a dignidade e o acesso à propriedade.

O que o Poder Judiciário de Santa Catarina fez ao editar a Resolução 08/14 foi instrumentalizar a forma de dar cumprimento à legislação federal e não descumpri-la. Santa Catarina sempre inovando e sendo copiada, sempre na vanguarda. Somos exemplo a ser copiado no Brasil todo e assim será.

Insta ressaltar que o resultado deste processo não tem o condão de interferir em qualquer procedimento de iniciativa intentado pelo parquet. Dita iniciativa, não descura das precauções mínimas, a fim de se poder aferir, com segurança, a legitimidade do pleito e assegurar os direitos de eventuais terceiros interessados.

Uma série de documentos é exigida e, sobretudo, a participação do Poder Público Municipal é fundamental. Também o Estado e a União devem ser cientificados a respeito da existência do procedimento, observando-se, no caso específico, que não houve oposição. Lindeiros, caso não sejam autores da demanda, devem ser igualmente citados e, no caso em tela, não houve insurgência.

Aliás, se resistência houvesse e se fosse fundada, o procedimento, aí sim, tornar-se-ia inadequado, hipótese em que aos interessados não restaria outro caminho senão o contencioso.

Destarte, pela farta documentação juntada aos autos, percebe-se que se trata de área consolidada cujas características se imbuem em perfeita consonância com os lídimos preceitos do "Projeto Lar Legal" ora invocado.

Para arrematar, importante consignar que, surgindo futuramente eventuais prejudicados, não restarão desamparados, uma vez que, nos termos do art. 14 da Resolução "o registro poderá ser retificado ou anulado, parcialmente ou na totalidade, por sentença em processo contencioso, ou por efeito julgado em ação de anulação ou de declaração de nulidade de ato jurídico, ou de julgado sobre fraude à execução" (Evento 97, SENT1).

Portanto, em razão dos fundamentos acima explicitados, afasta-se a primeira preliminar levantada no apelo.

De outro norte, aduz o apelante que o...

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