Acórdão Nº 0309048-10.2016.8.24.0064 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 25-02-2021

Número do processo0309048-10.2016.8.24.0064
Data25 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0309048-10.2016.8.24.0064/SC



RELATOR: Desembargador GUILHERME NUNES BORN


APELANTE: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (AUTOR) APELADO: FRANCIELLY GODINHO (RÉU)


RELATÓRIO


1.1) Da inicial.
BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. ajuizou Ação de Busca e Apreensão em face de FRANCIELLY GODINHO, alegando, em síntese, que foi firmado contrato de financiamento para aquisição do veículo Volkswagen Voyage 1.6, placas HOK4693, com garantia de alienação fiduciária, a ser pago em 60 parcelas de R$659,89.
Contudo, o réu encontra-se em mora desde a parcela vencida em 29/04/2016, acarretando o vencimento antecipado da dívida.
Em razão do inadimplemento, não restou outra alternativa à parte autora senão a constituição em mora do devedor.
Ao final, requereu, liminarmente a busca e apreensão do objeto e, no mérito, a consolidação da posse e propriedade.
Atribuiu valor à causa e juntou documentos (evento 1, docs. 2/9).
1.2) Da contestação.
Devidamente citada, a parte requerida apresentou resposta, na forma de contestação, sustentando, preliminarmente, o indeferimento da inicial. No mérito, a abusividade do contrato firmado, existindo excesso na cobrança dos valores, tais como: tarifa de cadastro, tarifa de registro e de avaliação, cobrança de IOF, a cumulação da comissão de permanência com multa, a ilegalidade dos juros remuneratórios pactuados, alegando a necessidade de ser deferida a repetição de indébito, pugnando pela improcedência dos pedidos.
1.3) Do encadernamento processual.
Deferiu-se a liminar (evento 6).
A parte autora apresentou reconvenção (evento 18).
Impugnação à contestação e à reconvenção (evento 24).
Réplica à impugnação da reconvenção (evento 29).
A parte ré interpôs recurso de Agravo de Instrumento, tendo este relator negado provimento ao recurso (evento 32,CERT58/60).
Intimou-se a parte autora para apresentar a original da cédula de crédito em Cartório (evento 33).
1.4) Da sentença.
Prestando a tutela jurisdicional, o Dr. Rafael Fleck Arnt prolatou sentença resolutiva de mérito para:
"[...] JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos efetuados na Ação de Busca e Apreensão proposta por BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A contra FRANCIELLY GODINHO para, CONFIRMANDO o DEFERIMENTO da liminar de fls. 32/37,DECRETAR a consolidação do domínio exclusivo e da posse e do(s) bem(ns) apreendido(s) em mãos do credor fiduciário,ressalvados os direitos do devedor-fiduciário previstos no DL nº 911/69, e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos efetuados na Reconvenção intenta da por FRANCIELLY GODINHO contra BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A para DECRETAR a revisão do contrato de financiamento de fls. e DECLARAR que:
(a) aplica-se a Lei nº 8.078/90 (CDC);
(b) é cabível a revisão judicial, ante a presença de cláusulas abusivas;
(c) para o período da contratualidade,
(c.1) os juros remuneratórios pactuados são ilegais e devem ser limitados à taxa média do BACEN, em 20,28% (vinte vírgula vinte e oito por cento) ao ano;
(c.2) as rubricas 'Tarifa de Cadastro', 'registro de contrato' e IOF são legais, devendo ser mantidas;
(c.3) a rubrica 'Tarifa de Avaliação' é ilegal, devendo ser afastada; d) para o período de inadimplemento, é ilegal a cobrança de comissão de permanência nos moldes pactuados, devendo se dar limitada aos juros remuneratórios revisados(1,55% ao mês), mesmo cumulada com multa contratual de 2% e juros moratórios de 1% a.m.;
DECRETAR a nulidade de pleno direito das cláusulas que dispuserem de maneira diversa dos limitadores acima apontados, mantidos os demais dispositivos, devendo os valores efetivamente devidos ser apurados mediante a realização de simples cálculos aritméticos (NCPC, artigo 798), efetuando-se eventual compensação entre crédito/débito, sendo desnecessária posterior liquidação de sentença.
Nos autos da Busca e Apreensão, face o autor ter DECAÍDO DA PARTE MÍNIMA DO PEDIDO, CONDENO a ré nos ônus de sucumbência-despesas judiciais e honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, revisado,consoante os parâmetros do artigo 85/segs. do NCPC.
Nos autos da Reconvenção, face a SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA, CONDENO ambas as partes nos ônus de sucumbência proporcionais - despesas processuais,pro rata, e honorários advocatícios, os quais arbitro em R$ 750,00 (setecentos e cinquenta reais)para cada procurador, sem compensação (EOAB Lei nº 8.906/94, artigo 23), nos termos dos parâmetros do artigo 85, §2º a §8º, do NCPC. "
1.5) Dos embargos declaratórios e decisão
O banco autor opôs embargos declaratórios, os quais foram rejeitados (evento 52).
1.6) Do recurso.
Inconformado com a prestação jurisdicional, o autor Banco Bradesco Financiamentos SA interpôs o presente recurso de Apelação Cível, aduzindo, a legalidade dos juros remuneratórios contratados, a possibilidade da cobrança da tarifa de avaliação do bem, a inexistência de previsão quanto à comissão de permanência, a ausência de valores a serem ressarcidos.
Ao final, pugnou pelo provimento do recurso e a inversão da sucumbência.
1.7) Das contrarrazões
Aportada (evento 67).
Este é o relatório

VOTO



2.1) Do objeto recursal.
Compulsando os anseios recursais, observa-se que o cerne da celeuma em comento está atrelado à análise dos juros remuneratórios, comissão de permanência, tarifa de avaliação, repetição de indébito e sucumbência.
2.2) Do juízo de admissibilidade.
Conheço do recurso porque presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, eis que ofertado a tempo e modo, recolhido o devido preparo e evidenciado o objeto e a legitimação.
2.3) Do mérito
2.3.1) Juros Remuneratórios.
Sustenta a parte apelante acerca da legalidade dos juros remuneratórios pactuados, devendo ser reformada a sentença.
Para facilitar o raciocínio a seguir estampado, convém registrar que é de conhecimento de todos os operadores jurídicos que o art. 192, § 3º da Constituição Federal, que outrora estabeleceu a limitação dos juros em 12% ao ano, restou revogado pela Emenda Constitucional n. 40 de 29/05/2003, ao argumento de que sua aplicabilidade estava condicionada à edição de legislação infraconstitucional.
É o que dispõe a Súmula 648 do STF e a Súmula Vinculante n. 07:
A norma do § 3º do art. 192 da Constituição, revogada pela EC 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicabilidade condicionada à edição de lei complementar.
Neste condão, tendo em vista a ausência de legislação específica a disciplinar a aplicabilidade dos juros remuneratórios no patamar de 12% ao ano, inconcebível sua incidência no caso em comento.
Em verdade, a limitação dos juros remuneratórios, frente a omissão constitucional e legislativa está pautada na existência ou não de índices que reflitam abusividade capaz de macular/afrontar o equilíbrio contratual e gerar uma onerosidade excessiva ao consumidor e consequentemente um enriquecimento do banco.
Por fim, convém contemplar na presente decisão a inaplicabilidade dos termos legais constantes do Decreto 22.626/33 frente as instituições financeiras. Inteligência encartada na Súmula n. 596 do Superior Tribunal Federal, in verbis:
As disposições do Decreto 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional.
Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. 1. CAPITALIZAÇÃO MENSAL PACTUADA.2. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO EM 12% A.A. IMPOSSIBILIDADE.3. ABUSIVIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. SÚMULAS 5 E 7/STJ. 4. AGRAVO IMPROVIDO.1. As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/1933), razão pela qual a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade, devendo ser realizada uma aferição do desvio em relação à taxa média praticada no mercado.2. É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31/3/2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa...

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