Acórdão Nº 0309446-75.2019.8.24.0023 do Primeira Câmara Criminal, 03-11-2022

Número do processo0309446-75.2019.8.24.0023
Data03 Novembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação Criminal
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Criminal Nº 0309446-75.2019.8.24.0023/SC

RELATORA: Desembargadora ANA LIA MOURA LISBOA CARNEIRO

APELANTE: NILMA HECK (ACUSADO) APELADO: ANDRE LUIZ PEREIRA AZEVEDO (AUTOR)

RELATÓRIO

Na comarca da Capital, ANDRE LUIZ PEREIRA AZEVEDO ofereceu queixa-crime em face de NILMA HECK, pelo cometimento, em tese, dos crimes de calúnia e injúria (este último por três vezes), em razão dos fatos assim narrados na peça vestibular (Evento 1 dos autos originários):

Fato I - Inicialmente, registra-se que Querelante e Querelada são moradores do condomínio Plaza Saint Troprez, localizado na rua Pastor Willian Richard Schisler, nº 856, Itacorubi, Florianópolis/SC, no qual aquele exerceu a função de síndico, com mandato no período de 01/06/2018 a 31/05/2019, sendo que desta situação advém a relação entre as partes. Ocorre que no mês de março de 2019, entre os dias 18 e 30, através de mensagens via aplicativo WhatsApp, bem como nas dependências do condomínio no qual residem, a Querelada imputou ao Querelante o crime de apropriação indébita, tipificado no artigo 168 do código penal, porquanto enviou áudios (CD anexo), nos quais afirma que o Querelante na condição de síndico do edifício Plaza Saint Tropez se apropriava indevidamente de numerário pertencente ao condomínio.

Fato II - Igualmente no ano de 2019, entre os dias 18 de março a 20 de abril, a Querelada, sem qualquer razão e com o intuito de ofender a dignidade e o decoro do Querelante, enviou-lhe inúmeras mensagens através do aplicativo whatsapp, em três oportunidades (dias diversos), nas quais o chama de "incompetente", "lixo humano", "ignorante", "burro", "problemático", "maluco", "vagabundo" e "filho da puta" (CD anexo).

Realizada a audiência de conciliação, oferecida a proposta conciliatória, a mesma restou inexitosa. A Queixa-Crime foi recebida. Na oportunidade, proposta e suspensão condicional do processo pelo Ministério Público o benefício foi aceito nos moldes do Termo de Audiência de Evento 23.

Posteriormente, o Ministério Público pleiteou pela revogação da suspensão condicional do processo, tendo em vista que a beneficiária foi denunciada pela prática de novo crime (evento 65, PROMOÇÃO1). Houve a juntada da Certidão de Antecedentes Criminais aos autos, a fim de comprovar suas alegações (evento 65, PROMOÇÃO2).

O benefício do sursis processual foi revogado (evento 68) e o processo prosseguiu seu regular trâmite.

Encerrada a instrução processual e apresentadas alegações finais pelas partes, sobreveio sentença que contou com o seguinte dispositivo (evento 169 dos autos originários):

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na queixa-crime, para o fim de CONDENAR a querelada NILMA HECK, já qualificado nos presentes autos a 07 (sete) meses e 06 (seis) dias de detenção e ao pagamento de 12 (doze) dias-multa, estes fixados individualmente em 1/30 do salário mínimo vigente na data dos fatos, em regime inicial aberto, pela prática dos delitos previstos nos artigos 138, caput e 140, caput (este por três vezes em continuidade delitiva), todos do Código Penal, em concurso material (art. 69, do CP).

Substituo a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direito consistente em prestação de serviço a comunidade à razão de uma hora por dia de condenação, a ser cumprida em instituição indicada pelo Juízo da Execução.

Concedo a acusada o direito de recorrer em liberdade, vez que restou condenada em regime aberto.

Condeno a querelada ao pagamento de custas processuais.

[...]

Inconformada, Nilma interpôs o presente recurso de apelação criminal. Nas suas razões recursais sustentou, em suma, a concessão do benefício da Justiça Gratuita; a necessidade de reconhecimento da retratação nos termos do artigo 143 do CP e a consequente extinção da punibilidade da querelada; a atipicidade da conduta perpetrada pela querelada, vez que eventuais xingamentos foram proferidos de maneira privada ao apelante, sem conhecimento por terceiros; a ausência de dolo decorrente da doença psiquiátrica que lhe acomete desde o início de sua fase adulta; que as mensagens contendo os xingamentos ao querelante nada mais são do que a livre expressão de seus pensamentos; subsidiariamente, requer o afastamento da pena restritiva de direitos consistente em prestação de serviços à comunidade, ante a fragilidade de sua saúde, bem como o afastamento ou diminuição da pena de multa, tendo em vista a alegada hipossuficiência econômica (Evento 174 dos autos originários).

Contrarrazões da acusação pela manutenção incólume da sentença recorrida (Evento 195 dos autos originários).

Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Senhor Procurador de Justiça Dr. Rui Arno Richter, que se manifestou pelo parcial conhecimento e, nesta extensão, pelo desprovimento do recurso (Evento 13 destes autos).

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto pela defesa em face de sentença proferida pelo juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Florianópolis que, julgando procedente a pretensão formulada na queixa-crime, condenou a apelante ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 07 (sete) meses e 06 (seis) dias de detenção e ao pagamento de 12 (doze) dias-multa, estes fixados individualmente em 1/30 do salário mínimo vigente na data dos fatos, em regime inicial aberto, pela prática dos delitos previstos nos artigos 138, caput e 140, caput (este por três vezes em continuidade delitiva), todos do Código Penal, em concurso material (art. 69, do CP).

Por entender presentes os requisitos necessários, a pena privativa de liberdade restou substituída por uma restritiva de direito consistente em prestação de serviço a comunidade à razão de uma hora por dia de condenação, a ser cumprida em instituição indicada pelo Juízo da Execução.



1. Admissibilidade.

O recurso interposto preenche parcialmente os requisitos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido apenas em parte.

Isso porque, inviável o conhecimento do pedido de concessão do benefício da justiça gratuita formulado tão somente em sede recursal, por ser matéria cuja análise incumbe precipuamente ao juízo do primeiro grau.

Nesse influxo: "[...] acerca do pedido de concessão de justiça gratuita, cito que não comporta conhecimento o pedido de concessão do benefício da justiça gratuita e, consequentemente, de isenção de despesas processuais, por se tratar de matéria cujo exame incumbe ao Juízo do primeiro grau, o qual, após a apuração do valor das custas finais, poderá averiguar a situação de hipossuficiência do apenado. Por tal razão, não conheço do apelo nessa parte". (TJSC, Apelação Criminal n. 0000259-04.2019.8.24.0125, rel. Ariovaldo Rogério Ribeiro da Silva, Primeira Câmara Criminal, j. 05-11-2020, grifou-se).



2. Mérito.

Conforme sumariado, a queixa-crime narra a prática de dois crimes, calúnia e injúria, tendo o primeiro supostamente ocorrido quando a querelada imputou ao querelante a prática do crime de apropriação indébita (Art. 168, CP) na condição de síndico do condomínio onde residem as partes, enquanto o segundo teria se configurado em três oportunidades nas quais a querelada teria enviado mensagens ao querelante, via whatsapp, chamando-o de "incompetente", "lixo humano", "ignorante", "burro", "problemático", "maluco", "vagabundo" e "filho da puta".

Pois, bem, antes de adentrar na análise dos pleitos recursais propriamente ditos, colaciona-se o teor da prova oral colhida durante a audiência instrutória.

O querelante André, ouvido em juízo, relatou "que foi síndico do condomínio Plaza Saint Tropez entre os anos de 2018 e julho de 2019. A partir de fevereiro de 2019 Nilma passou a persegui-lo, encaminhando-lhe áudios com xingamentos, como filho da puta, vagabundo, pobre miserável, que não servia pra ser síndico, que roubou dinheiro do condomínio. Que foi acionado em vários episódios de discussões envolvendo a querelada e outros moradores, como quando ela bateu num carro de um morador e se recusou a ressarci-lo, ou quando ela acusou o vigilante de ter ateado fogo no apartamento dela. Sobre o fato 1 descrito na queixa crime, aduziu que a querelada mandou um áudio acusando o querelante de ter se apropriado de dinheiro do condomínio, tendo o acusado também em frente ao antigo morador do...

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