Acórdão Nº 0309523-12.2014.8.24.0039 do Sexta Câmara de Direito Civil, 13-04-2021

Número do processo0309523-12.2014.8.24.0039
Data13 Abril 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0309523-12.2014.8.24.0039/SC

RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO

APELANTE: GILDO GONZAGA DEMORI (AUTOR) APELADO: MAPFRE VIDA S/A (RÉU)

RELATÓRIO

Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório da sentença:

GILDO GONZAGA DEMORI propôs ação pelo procedimento comum em face de MAPFRE VIDA S/A alegando, em suma, que figurou como beneficiário de seguro coletivo de pessoas e desenvolveu doença que o tornou totalmente inválido para o trabalho, tanto que foi declarado nessa condição pelo Instituto Nacional de Seguro Social, que reconheceu sua invalidez permanente para o trabalho e iniciou o pagamento de benefício. Sustentou que mesmo com a constatação dessa invalidez, a ré recusou o pagamento do seguro contratado, sob o argumento de que a doença não cumpriria o requisito contratual para configurar invalidez funcional permanente, recusa ilegítima e manifestamente abusiva. Sustentou, ainda, que para a propositura da ação, contratou advogado e pactuou o pagamento de 30% sobre o benefício patrimonial, despesa essa decorrente da recusa da seguradora ao pagamento do seguro contratado. Requereu a condenação da ré ao pagamento do montante contemplado pela apólice para invalidez permanente, bem como ao ressarcimento dos honorários advocatícios contratuais, firmados em 30% sobre o valor da ação.

Determinada a emenda da petição inicial, o autor cumpriu a determinação.

Citada, a ré ofereceu contestação alegando, em suma, que a cobertura especial por doença exige que a invalidez seja total e permanente, da qual não seja possível recuperação, situação que não ocorreu na hipótese. Sustentou que os critérios utilizados pelo órgão previdenciário para caracterização da invalidez permanente são diferentes daqueles previstos no contrato de seguro e o autor não ficou privado de sua condição de vida independente. Disse que eventual condenação deve ser limitada ao montante previsto pela apólice - R$ 12.500,00, com incidência de correção monetária desde a propositura da ação e juros de mora a contar da citação. Pugnou a improcedência.

Houve réplica.

Em audiência preliminar, a conciliação foi rejeitada.

Sobreveio sentença de parcial procedência, que foi cassada pela instância superior, para oportunizar a produção de prova pericial.

Com a juntada do laudo pericial e encerrada a instrução, as partes ofereceram razões finais.

A parte dispositiva da sentença é do seguinte teor:

Pelo exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados por GILDO GONZAGA DEMORI contra MAPFRE VIDA S/A, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários de advogado da parte adversa, que fixo em 10% sobre o valor corrigido da causa, observada em favor do autor a suspensão do art. 98, § 3º, do CPC. (Evento 141, SENT1).

Inconformado, o Autor interpôs o presente recurso de Apelação Cível arguindo, em síntese, que (a) não havendo informação em prol do consumidor, no que tange as mínimas características da apólice e seus termos, a mesma deve ser observada de maneira mais ampla (CDC, art. 47); (b) o dever de informação não restou devidamente cumprido pela Seguradora, pois as cláusulas acerca da divisão do capital, da graduação da invalidez e, menos ainda, da tabela da Susep, sequer foram apresentadas e/ou discutidas com o segurado; (c) o contrato de seguro se enquadra dentre aqueles definidos como contrato de adesão e sendo aplicáveis as normas do CDC na relação que envolve seguradora e cliente, suas cláusulas devem ser analisadas em prol do consumidor; (d) a cláusula que prevê que a indenização deve ser paga de acordo com o grau de invalidez distorce por completo a indenização a título de incapacidade, em prejuízo do segurado, colocando-o em desvantagem; (e) seria indubitável o direito do Apelante ao recebimento da totalidade do capital segurado a título de invalidez permanente parcial.

Por fim, requereu fosse dado provimento ao presente, condenando-se a Apelada ao pagamento dos valores consignados na Apólice de Seguro de Vida, acrescido de juros e correção monetária.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 151, CONTRAZAP1).

VOTO

De início, uma vez que a sentença foi publicada já na vigência do novo Código de Processo Civil (28-08-2020), convém anotar que o caso será analisado sob o regramento do Diploma Processual Civil de 2015, em consonância com o Enunciado Administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça.

Isso dito, com relação ao recurso de apelação cível interposto pela parte autora, satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, o apelo merece ser conhecido.

Insurge-se o Autor, em síntese, sob a ótica de (i) não ter sido observado o direito de informação que preceitua as relações consumeristas dessa modalidade; (ii) ser devido o pagamento do valor integral do capital segurado.

E a pretensão como posta merece acolhida.

O Código de Defesa do Consumidor estabelece claramente que ao contrato de seguro são aplicáveis as normas consumeristas, como serviço de natureza securitária:

Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

[...]

§ 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (grifo nosso).

E que dentre os direitos básicos do consumidor está "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; [...]." (CDC, art. 6º, inciso III).

No caso, a empresa Polpa de Madeiras Ltda., na qualidade de estipulante, celebrou com a Seguradora Ré contrato de seguro de vida em grupo, apólice n. 10000, em favor de seus empregados, sendo incluído o Autor.

De acordo com o documento do "Evento 35, INF33", foram contratadas garantias para "Morte Qualquer Causa (MORTE)", "Indenização Especial por Acidente (IEA)", "Invalidez Permanente Total ou Parcial por Acidente (IPA)" e "Invalidez Permanente Total por Doença (IPD)".

Antes de se adentrar ao mérito em si, vale o adendo de que, por mais que a Seguradora defenda, tanto na contestação como nas contrarrazões - e até mesmo a sentença se refira à isso -, sobre a existência de cobertura de "Invalidez Funcional Permanente Total por Doença" (IFPD), da apólice de seguro acima mencionado é possível observar que NÃO há contratação para tal cobertura.

Dessa forma, será levado em consideração a cobertura contratada para "Invalidez Permanente Total ou Parcial por Acidente (IPA)", cuja cláusulas gerais do contrato de seguro denominam:

2.1. Acidente Pessoal: evento com data caracterizada, exclusivo e diretamente externo, súbito, involuntário, violento e causador de lesão física, que, por si só e independente de toda e qualquer causa, tenha como conseqüência direta a morte ou a invalidez permanente, total ou parcial, do segurado, ou que torne necessário tratamento médico.

2.1.1. Incluem-se, ainda, neste conceito:a) o suicídio, ou sua tentativa, o qual, para fins de indenização, será equiparado a acidente pessoal, observada a legislação em vigor;b) os acidentes decorrentes de ação da temperatura do ambiente ou influência atmosférica, quando a elas o segurado ficar sujeito em decorrência de acidente coberto;c) os acidentes decorrentes de escapamento acidental de gases e vapores;d) os acidentes decorrentes de seqüestros e tentativas de seqüestros; ee) os acidentes decorrentes de alterações anatômicas ou funcionais de origem traumática da coluna vertebral causadas exclusivamente por fraturas ou luxações e radiologicamente comprovadas.

2.1.2. Não se incluem no conceito de "acidente pessoal":a) as doenças, inclusive as profissionais, quaisquer que sejam suas causas, ainda que provocadas, desencadeadas ou agravadas direta ou indiretamente por acidente, ressalvadas as infecções, estados septicêmicos e embolias, resultantes de ferimento visível causado em decorrência de acidente coberto;b) as intercorrências ou complicações conseqüentes da realização de exames, tratamentos clínicos ou cirúrgicos, quando não decorrentes de acidentes cobertos;c) as lesões decorrentes, dependentes, predispostas ou facilitadas por esforços repetitivos ou microtraumas cumulativos, ou que tenham relação de causa e efeito com os mesmos, assim como as lesões classificadas como: Lesão por Esforços Repetitivos - LER, Doenças Ocupacionais Relacionadas ao Trabalho - DORT, Lesão por Trauma Continuado ou Contínuo - LTC, ou similares que venham a ser aceitas pela classe médico-científica, bem como suas conseqüências...

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