Acórdão Nº 0309682-36.2015.8.24.0033 do Terceira Câmara de Direito Civil, 16-11-2021

Número do processo0309682-36.2015.8.24.0033
Data16 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0309682-36.2015.8.24.0033/SC

RELATORA: Desembargadora MARIA DO ROCIO LUZ SANTA RITTA

APELANTE: JUREMA GONCALVES PINTO (AUTOR) ADVOGADO: ARIANE MAIARA SOARES BATISTA (OAB SC045434) ADVOGADO: TIAGO SARAMENTO (OAB SC039805) APELANTE: RICARDO AUGUSTO MELLO SOARES (AUTOR) ADVOGADO: ARIANE MAIARA SOARES BATISTA (OAB SC045434) ADVOGADO: TIAGO SARAMENTO (OAB SC039805) APELANTE: SANTOS COMERCIO A VAREJO DE VEICULO EIRELI (RÉU) ADVOGADO: LAURINHO ALDEMIRO POERNER (OAB SC004845) APELANTE: BANCO ITAUCARD S.A. (RÉU) ADVOGADO: PAULO TURRA MAGNI (OAB SC034458) ADVOGADO: Arthur Sponchiado de Avila (OAB SC033892) ADVOGADO: CRISTIANO DA SILVA BREDA (OAB SC033905) APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Jurema Gonçalves Pinto e Ricardo Augusto Mello Soares ajuizaram ação ordinária de rescisão contratual c/c restituição de valores e indenização por danos morais com pedido de antecipação de tutela contra Santos Comércio a Varejo de Veículo Eireli e Banco Itaucard S.A. Argumentaram que, no dia 31/07/2015, efetuaram a compra de um veículo, junto à primeira requerida, no valor de R$ 20.500,00, cujo pagamento foi pactuado da seguinte forma: entrada, em espécie, de R$ 5.500,00; diferença financiada junto à segunda ré, em 48 parcelas de R$ 584,71 cada (contrato n. 553331356).

Afirmaram que, após três dias utilizando o bem, ao dar partida, o motor explodiu e pegou fogo, queimando toda a parte dianteira do automóvel. Em razão disso, pleitearam a inversão do ônus da prova e, liminarmente, que o banco réu se abstivesse de debitar as parcelas do financiamento. No mérito, sustentaram fazer jus à rescisão do contrato com a restituição dos valores pagos e à indenização por danos morais.

A tutela pleiteada foi indeferida (Evento 10, AO).

Devidamente citadas (Eventos 19 e 22, AO), as demandadas contestaram. A instituição financeira ré arguiu sua ilegitimidade passiva, por ser mera financiadora do veículo, e afastou sua responsabilidade civil objetiva, por não ter havido falha na prestação de seus serviços, sendo o contrato de financiamento um ato jurídico perfeito (Evento 25, AO).

A requerida Santos Comércio a Varejo de Veículo Eireli denunciou à lide a empresa Liberté Veículos Ltda, por ter sido ela quem vendeu o veículo que foi repassado aos autores. Preliminarmente, aduziu inépcia da pretensão de condenação em danos morais. No mérito, defendeu que o carro estava em ótimo estado de funcionamento ao ser entregue aos autores, pois foi previamente vistoriado por mecânico de sua confiança (Evento 26, AO).

Foi apresentada réplica (Evento 31, AO).

Na sequência, foi proferida decisão que inverteu o ônus da prova e decidiu pela manutenção do pagamento das parcelas do financiamento. Reconheceu, ainda, a ilegitimidade passiva do Banco Itaucard S.A., com fulcro no art. 485, VI, do CPC. O pleito de denunciação à lide restou indeferido. Além disso, determinou-se a produção de prova pericial, nomeando-se perito para o feito (Evento 35, AO).

Da referida decisão (Evento 35, AO), os autores interpuseram agravo de instrumento, cujo acórdão, de relatoria desta Magistrada, deu parcial provimento ao recurso, mantendo o réu Banco Itaucard S.A. no polo passivo da demanda (Eventos 42, 45 e 60, AO).

Posteriormente, foi apresentado laudo pericial, que averiguou o bem e concluiu que "a origem do incêndio apresenta relação direta com falhas e deficiências de manutenção do veículo, em momento anterior à aquisição pela autora" (Evento 135, AO).

As partes se manifestaram sobre o laudo pericial (Eventos 144, 145 e 146, AO), tendo o perito respondido a novos quesitos formulados pela primeira ré (Eventos 149, AO), que pleiteou expedição de ofício ao Codetran para apresentação do histórico de boletins de ocorrência registrados sobre o veículo, o que foi negado pelo Juízo (Evento 165, AO).

Após, os litigantes apresentaram as provas que pretendiam produzir (Eventos 172, 174 e 175, AO), as quais foram dispensadas pelo togado a quo, que julgou antecipadamente a lide.

Processado o feito, sobreveio sentença que rejeitou a preliminar de inépcia do pedido de reparação por danos morais. No mérito, condenou a primeira ré à rescisão do contrato, com o ressarcimento da quantia paga na entrada e das parcelas já adimplidas do financiamento bancário, e ao pagamento de indenização moral em R$ 5.000,00. Não obstante tenha reconhecido a ausência de solidariedade entre as requeridas quanto aos prejuízos causados pelo vício do produto, ordenou o cancelamento do contrato de financiamento e condenou solidariamente a instituição financeira a reembolsar as parcelas quitadas. As custas foram divididas igualmente entre as demandadas, e os honorários foram arbitrados em 10% do valor da condenação, para a vendedora, e em R$ 1.000,00, para a instituição financeira (Evento 181, AO).

Irresignadas, ambas as requeridas apelaram e os autores protocolaram recurso adesivo.

Em suas razões de apelação, o Banco Itaucard S.A. aventou a nulidade da sentença por julgamento citra petita, explicitando que a decisão colegiada proferida em agravo de instrumento apresentou duas vertentes consolidadas no Superior Tribunal de Justiça acerca da legitimidade da instituição financeira no polo passivo de demandas desta natureza, não tendo, o Magistrado da origem, pontuado qual das duas seria aplicável ao presente caso. Por isso, requereu seja cassada a sentença com o retorno dos autos à instância inferior ou seja reconhecida a sua ilegitimidade passiva. Meritoriamente, postulou pela improcedência dos pedidos inaugurais (Evento 191, AO).

Já a apelante Santos Comércio a Varejo de Veículo Eireli ventilou o cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide, já que efetuou pedido de produção de provas, razão pela qual pugnou pela cassação do decisum, com o retorno dos autos à origem. Quanto ao mérito, externou que o laudo pericial é viciado e que as fotos nele contidas não demonstram os vícios apontados. Argumentou que o carro foi vistoriado por mecânico de confiança que atestou pequenos reparos, que não causariam a explosão do motor. Que, após o fatídico, solicitou aos autores que providenciassem laudo técnico, o que não ocorreu. Por isso, pleiteou a improcedência dos pedidos da exordial ou o afastamento da condenação ao pagamento de indenização por dano moral, pelos fatos narrados serem incapazes de ensejar a reprimenda (Evento 195, AO).

Os autores apresentaram contrarrazões aos dois apelos das rés (Evento 205, AO) e interpuseram recurso adesivo, com as seguintes considerações: pleitearam a concessão da justiça gratuita e, no mérito, postularam pela majoração do quantum indenizatório por danos morais, por entenderem que o montante arbitrado se apresentava demasiadamente brando para o caso em apreço. Ademais, pugnaram pela majoração dos honorários advocatícios arbitrados em desfavor da instituição financeira ré, para 10 a 20% do valor das parcelas do financiamento, para que fiquem em conformidade com o art. 85, § 2º, do CPC, e com a realidade dos autos (Evento 206, AO).

As demandadas contra-arrazoaram o recurso adesivo (Eventos 214 e 215, AO).

Conclusos, os autos ascenderam a este Tribunal, cujo juízo de admissibilidade se perfaz neste julgamento.

VOTO

Inicialmente, cumpre assentar que, tanto as apelações (Eventos 191 e 195, AO), quanto o recurso adesivo (Evento 206, AO), são tempestivos, nos termos do art. 1.003, § 5º, do CPC.

Os apelos das requeridas se encontram devidamente acompanhados de preparo integral (Eventos 190 e 202, AO).

Por outro lado, verifica-se que os autores, ora apelantes, pleiteiam o benefício da justiça gratuita, como determina o art. 99, caput, do CPC, o que justifica a ausência de comprovação de recolhimento do preparo.

Na hipótese, entende-se que os elementos apresentados comprovam suas situações financeiras vulneráveis e demonstram a plausibilidade do pedido, tendo em vista que Ricardo Augusto Mello Soares demonstrou estar desempregado desde fevereiro de 2020 (Evento 206, Comprovantes 2 e 4, AO), e ter sido diagnosticado, no final do ano de 2019, com doença grave (Evento 164, Petição 1 e Outros 2, AO), além de não possuir nenhum veículo ou imóvel em seu nome. Jurema Golçalves Pinto, de seu turno, é manicure autônoma, não possui renda fixa comprovada (Evento 206, Comprovantes 2, AO), e nenhum veículo ou imóvel em seu nome.

Isto posto, defiro o benefício da gratuidade aos recorrentes, sem prejuízo da possibilidade de reversão desta decisão, se comprovada a mudança financeira.

Conheço dos recursos porquanto presentes os pressupostos de admissibilidade.

No caso em apreço, incontroversa a existência de relação jurídica entre as partes, porquanto concordam ter firmado contratos de compra e venda de veículo e de financiamento de crédito bancário (Evento 1, Inf. 5, AO).

Além disso, importante frisar que as relações jurídicas ora entabuladas são manifestamente de consumo, já que os contratantes se enquadram nos arts. e do CDC, devendo, portanto, aplicar-se ao caso a legislação consumerista.

Preliminarmente, na fase recursal, pleiteia a instituição financeira a nulidade da sentença, com o retorno dos autos à origem, por julgamento citra petita, no que tange à sua ilegitimidade passiva. Argumenta que o magistrado a quo deixou de analisar a proemial ora aventada, tomando como base somente o fato de que a decisão proferida em agravo de instrumento (Evento 61, Certidão 111, AO) a manteve no polo passivo da demanda segundo duas vertentes antagônicas do STJ, que amparariam ambas as hipóteses. Afirma que, apesar de tê-la mantido na lide por prudência, o julgador não pontuou qual das duas correntes do STJ seria aplicável ao caso.

Porém, razão não lhe assiste. E, para melhor alinhavar esta controvérsia, importante transcrever trecho do acórdão proferido por este mesmo colegiado em agravo de instrumento, onde se levantaram as referidas teses do STJ (Evento 61, Certidão 111, AO):

No que diz respeito à (i)legitimidade da casa bancária, de anotar-se que, segundo entendimento consolidado pelo...

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