Acórdão Nº 0310117-87.2018.8.24.0038 do Quinta Câmara de Direito Público, 27-02-2020

Número do processo0310117-87.2018.8.24.0038
Data27 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0310117-87.2018.8.24.0038, de Joinville

Relator: Desembargador Hélio do Valle Pereira

RESPONSABILIDADE CIVIL - DANOS MORAIS - PRISÃO PREVENTIVA - POSTERIOR ABSOLVIÇÃO - IRRELEVÂNCIA - CASSAÇÃO DA DETENÇÃO CAUTELAR QUE NÃO VALE POR ERRO JUDICIÁRIO.

1. As prisões processuais penais têm caráter cautelar. Não são dadas sob cognição exauriente, ainda que as consequências do ato reclamem indicativos eloquentes da necessidade. Não vaticinam certeza de culpa. Não fosse assim, o réu preso que viesse a ser absolvido teria automático direito à reparação por danos morais.

O juízo de valor sobre a possível abusividade de prisões temporária ou preventiva deve se reportar ao momento da decretação, apurando-se naquele instante se a medida era adequada. A posterior revelação de inocência não serve para propiciar uma crítica retrospectiva à má conduta estatal.

2. O autor foi processado perante o Tribunal do Júri por tentativa de homicídio e foi decretada sua prisão preventiva até deliberação pelo Conselho de Sentença, que decidiu pela absolvição.

Ausência de ilicitude.

3. Recurso desprovido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0310117-87.2018.8.24.0038, da comarca de Joinville - 1ª Vara da Fazenda Pública em que é Apelante Paulo Sanches Junior e Apelado o Estado de Santa Catarina.

A Quinta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, conhecer e negar provimento à apelação. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Denise de Souza Luiz Francoski e Vilson Fontana.

Florianópolis, 27 de fevereiro de 2020.

Desembargador Hélio do Valle Pereira

Presidente e relator


RELATÓRIO

Paulo Sanches Júnior ajuizou ação indenizatória em face do Estado de Santa Catarina por erro judiciário.

Contou que fora acusado por tentativa de homicídio contra o atual par de sua ex-companheira por ciúmes. Após oferecimento da denúncia, foi decretada sua prisão preventiva em 12 de janeiro de 2017, que resultou no seu recolhimento em 19 de fevereiro até a realização da sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri em 9 de maio de 2019, quando foi absolvido pelo Conselho de Sentença. Defendeu que a sua prisão preventiva foi ilegal, o que configura erro judiciário. A conduta perpetrada pelas autoridades policial e judiciária causaram-lhe sofrimento e dor durante o extenso período, além da humilhação por ter sido acusado por crime que não cometeu. Pediu a indenização por dano moral na razão de 500 salários mínimos.

A sentença foi de improcedência sob a perspectiva de que não houve nenhum ato ilegal pela Administração Pública, motivo pelo qual o autor recorre.

Insiste na tese da petição inicial: houve erro judiciário porque ficou segregado sem fundamentação plausível, inclusive o próprio Parquet pediu sua absolvição na sessão de julgamento, o que deixa evidente a ação ilegal da Administração Pública. Diz que "não havia provas, sequer indícios fortes da autoria", que era "primário e de bons antecedentes foi acusado pela vítima de ter cometido o crime em conluio", embora "a própria suposta vítima, logo após dar o seu depoimento inquérito policial sumiu e sequer houve o seu depoimento na fase judicial". Busca a reparação moral com a reforma da sentença.

Houve contrarrazões.

A Procuradoria-Geral de Justiça se manifestou apenas formalmente.

VOTO

1. Anoto que uma revogação de prisão ou mesmo uma absolvição criminal posterior não garantem por si só a indenização por danos morais.

Deve-se firmar como premissa que a prisão processual tem natureza cautelar. Mira-se uma deliberação fundada em cognição sumária. Avalia-se a possibilidade de ter ocorrido um crime e de ele ser imputável a alguém, bem como se apura a necessidade da constrição imediata da liberdade. Processualmente, então, não existe incoerência entre haver a prisão preventiva e depois a absolvição porquanto este é ato que exige a cognição exauriente e consequentemente um grau de convencimento muito maior.

Não fosse assim, por exemplo, uma prisão preventiva valeria por uma antecipada condenação, visto que o juízo ficaria premido à posterior imposição de pena! Quer dizer, são coisas bem distintas (a) considerar necessário o afastamento de plano do convívio social e (b) afirmar que alguém é culpado.

Por isso que não se pode admitir o direito à reparação porque simplesmente a prisão cautelar não se converteu em prisão definitiva, ou mesmo porque se deu absolvição.

Poderia haver, é verdade, a indenização por um erro judiciário em si, ou seja, por uma decisão que se desviasse completamente do modelo normativo - na linha do que pretende o apelante. Não se pode, insistindo, dizer que o erro derive da pura liberação do preso adiante.

Cito, aliás, a compreensão pacífica do Supremo Tribunal Federal sobre o tema:

Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Responsabilidade civil do Estado. Ação civil pública improcedente. Ato regular de promotor de justiça. Dever de indenizar. Inexistência. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Precedentes.

1. O Tribunal a quo concluiu, com base nos fatos e nas provas dos autos, que não foram demonstrados, na origem, os pressupostos necessários à configuração da responsabilidade extracontratual do Estado, haja vista que a 'ação ministerial foi manejada no estrito cumprimento das obrigações institucionais do Ministério Público'. Incidência da Súmula nº 279/STF.

2. A jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que, salvo nas hipóteses de erro judiciário e de prisão além do tempo fixado na sentença - previstas no art. 5º, inciso LXXV, da Constituição Federal -, bem como nos casos previstos em lei, a regra é a de que o art. 37, § 6º, da Constituição não se aplica aos atos jurisdicionais quando emanados de forma regular e para o fiel cumprimento do ordenamento jurídico.

3. Agravo regimental não provido.

(ARE-AgR 934.578, Rel. Min. Dias Toffoli)

2. Firmadas as premissas, passo à análise do caso.

O autor fundamenta o pedido de reforma da sentença sob a perspectiva de que o reconhecimento de sua inocência pelo Tribunal do Júri - inclusive a pedido do Ministério Público - é suficiente para classificar a prisão preventiva como ilegal, até porque nem sequer existiam razões para que medida cautelar fosse decretada.

O argumento é insustentável: o que o...

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