Acórdão Nº 0311069-97.2016.8.24.0018 do Quarta Câmara de Direito Público, 11-08-2022

Número do processo0311069-97.2016.8.24.0018
Data11 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0311069-97.2016.8.24.0018/SC

RELATOR: Desembargador ODSON CARDOSO FILHO

APELANTE: GEMA MANTOVANI ROMANOSKI (AUTOR) ADVOGADO: MARCELO PELLEGRINI (OAB SC036936) APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Na comarca de Chapecó, Gema Mantovani Romanoski ingressou com Ação Acidentária em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Narra que, em razão do exercício da função de auxiliar de limpeza, atividade que exige movimentos repetitivos e de alta demanda física, desenvolveu "reumatismo não especificado - reumatismo". Afirma que, em razão da patologia ocupacional, recebeu o auxílio-doença acidentário, aduzindo que, apesar da cessação do benefício por incapacidade temporária, permanece inapta ao labor habitual. Busca, inclusive em antecipação de tutela, o restabelecimento do auxílio-doença ou a concessão da aposentadoria por invalidez ou, ainda, a implementação do auxílio-acidente (Ev. 1, Inic1 - 1G).

O pleito antecipatório foi deferido, com ordem de reativação do auxílio-doença (Ev. 3 - 1G).

Formada a relação jurídica processual, observado o contraditório e finda a instrução, o magistrado a quo julgou improcedentes os pedidos (Ev. 82 - 1G).

Os embargos de declaração do réu foram acolhidos, para admitir a "obrigação de devolver ao INSS os valores percebidos em razão daquela tutela revogada" (Ev. 86 e 96 - 1G).

Insatisfeitas, as partes interpuseram recursos de apelação.

O acionado, argumentando ter se limitado a antecipar os honorários periciais, tenciona o direcionamento do encargo à Fazenda Estadual, ante a improcedência da demanda, bem assim para fins de prequestionamento (Ev. 102 - 1G).

Por sua vez, a autora sustenta não reunir condições de exercer sua atividade laboral de auxiliar de limpeza, o que comprovado a partir dos documentos amealhados e de laudo confeccionado no bojo de reclamatória trabalhista, bem como que não dispõe de qualificação profissional ou escolaridade que a habilitem a desempenhar outra profissão. Tenciona, subsidiariamente, seja afastado o dever de restituir as quantias percebidas de boa-fé a título de antecipação de tutela (Ev. 107- 1G).

Sem contrarrazões, os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.

Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça indicando ausência de interesse na causa (Ev. 6 - 2G).

Determinei o sobrestamento do reclamo e, com o julgamento do Tema n. 862 do STJ, retomada a marcha processual (Ev. 8 e 15 - 2G).

É o relatório.

VOTO

1. Os recursos apresentam-se tempestivos e preenchem os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual merecem ser conhecidos; recebo-os também em seus efeitos legais (arts. 1.012, caput, e 1.013, caput, do CPC), exceto no que diz respeito à tutela antecipada revogada do decisum (art. 1.012, § 1º, V).

2. Argumenta a autora padecer de enfermidades que ensejam inaptidão para o trabalho habitual, pugnando pela reforma da sentença.

Como cediço, a prova técnica é, via de regra, indispensável para aquilatar a ocorrência ou não de incapacidade laborativa por parte da acionante, a sua causa, o grau de intensidade e a possibilidade de recuperação, elementos que se revelam cruciais para a concessão ou não dos benefícios em questão.

De comum sabença que, para que se reconheça o direito à benesse acidentária, não basta a verificação da doença, é indispensável que a morbidade atinja a capacidade laborativa atual do segurado, incapacitando-o ou minorando sua aptidão ocupacional, do contrário nenhum benefício será devido.

No caso vertente, incontroversa a qualidade de segurado e dispensada a carência (art. 26, I e II, da Lei n. 8.213/91), a perícia judicial atestou que Gema "apresenta discopatia e discoartrose lombar sem determinar compressão nervosa, e apresenta tendinopatia e artrose de ombros D/E, sem determinar limitação funcional" (Ev. 62, p. 9 - 1G).

O liame etiológico concausal entre as patologias e o labor foi admitido ao exame pericial (Ev. 62, item "1", p. 9 - 1G).

No tocante à (in)aptidão para o trabalho, entretanto, o especialista concluiu que "não existe incapacidade laboral na autora atualmente, autora apresenta quadro clinico dentro da normalidade", indicando que "não há sinais de patologia ativa", bem assim que "não há necessidade de afastamento", que a "autora deve fazer uso de analgésicos quando eventualmente tiver dor" e estabelece que não remanescem sequelas (Ev. 62, itens "3", "4" e "1", p. 9 - 1G).

A propósito, é tranquilo o entendimento de que "se a perícia judicial afirmou com segurança que o segurado não está acometido de doenças que o incapacitam, total ou parcialmente, para o desempenho de atividades laborativas, impõe-se o indeferimento de quaisquer benefícios acidentários" (TJSC, Apelação Cível n. 0302466-93.2015.8.24.0010, de Braço do Norte, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 5-11-2019).

Como se nota, não se cogita nem sequer de redução do potencial laborativo, mesmo que em grau mínimo, daí porque tampouco incide na hipótese vertente o precedente do Superior Tribunal de Justiça (Tema n. 416 - Recurso Especial n. 1.109.591/SC, rel. Min. Celso Limongi, j. 25-8-2010), segundo o qual "o nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão".

Não obstante a impugnação ao laudo (Ev. 69 - 1G), instruída com estudo pericial elaborado no bojo de reclamatória trabalhista - no qual consignado haver, naquele momento, incapacidade temporária em grau moderado, cabendo à autora "realizar tratamentos conservadores adequados (medicamentosos e fisioterápicos) para alívio das dores e retardo da progressão natural das suas patologias degenerativas" (Ev. 69, Inf. 84, p. 11 - 1G) -, ao se manifestar a respeito o auxiliar da Justiça repisou que "na data da perícia em 01/11/18, não foi identificado incapacidade" (Ev. 71, item "1", p. 1 - 1G).

Com efeito, nota-se que o laudo trabalhista foi adunado aos respectivos autos na data de 27-8-2017 (Ev. 69, Inf. 84, p. 1 - 1G), ao passo que o exame elaborado nesta ação acidentária foi amealhado em 27-11-2018. Por mais recente, este retrata com atualidade o estado das enfermidades da autora, mormente porque no parecer juslaboral ficou estabelecido que a inaptidão era parcial e de repercussão moderada, portanto a convalescença era o caminho natural.

Não se questiona que "o juiz não fica vinculado aos fundamentos e à conclusão a que chegou o perito no laudo, tampouco às opiniões dos assistentes técnicos das partes" (NERY JÚNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 1196). Assim, "a prova pericial não vincula o juízo quanto às suas conclusões fáticas. Só que muito menos se pode meramente desconsiderá-la" (TJSC, Apelação Cível n. 0302852-64.2017.8.24.0007, de Biguaçu, rel. Des. Hélio do Valle Pereira, Quinta Câmara de Direito Público, j. 13-9-2018).

Tem-se que, embora hipoteticamente viável suplantar as ilações periciais, para tanto é indispensável a presença de outros elementos de convicção, mais robustos que aquelas, porém este não é o caso dos autos.

A acionante, ainda, carreou à inicial documentos de meados de 2015 e 2016 (Ev. 1, Inf. 9-15 - 1G), nota-se, porém, que a quase totalidade dos elementos colacionados é contemporânea ao período - de 8-2-2015 a 27-6-2016 (Ev. 24, Inf. 38, p. 5 - 1G) - em que deferido administrativamente o auxílio-doença. E constam, tão somente, dois atestados - de julho e agosto de 2016 (Ev. 1, Inf. 9, p. 1-2 - 1G) - sugerindo afastamento do trabalho. Tais atestados, todavia, despontam isolados no contexto, haja vista o exame pericial conclusivo em sentido oposto.

Destaco, outrossim, que todos os elementos carreados foram analisados pelo perito, conforme relato do histórico da doença, bem assim que o exame físico não corroborou o cenário da alegada incapacidade (Ev. 62, p. 3-8 - 1G).

O que se vê, então, é um estudo cauteloso acerca das morbidades que acossam a parte autora. Desse modo, inexistem outros elementos no processo capazes de derruir o diagnóstico pericial, o qual foi submetido ao crivo do contraditório, oportunizando também ao réu participar da avaliação.

E "se o obreiro não for capaz de desconstituir a prova pericial, a improcedência dos pedidos inaugurais é medida que se impõe, uma vez que, nos termos do art. 333, I, do Código instrumental, era sua obrigação comprovar o fato constitutivo do direito substancial evocado, qual seja, o acidente do trabalho (acidente de trajeto) ou agravamento da patologia em decorrência do trabalho habitual e a redução permanente da capacidade laborativa, ou perda definitiva da capacidade de trabalho" (TJSC, Apelação Cível n. 2013.042270-1, de São José, rel. Des. Carlos Adilson Silva, Terceira Câmara de Direito Público, j. 1º-4-2014).

Tudo indica, e assim pontuou a perícia, que Gema está plenamente apta ao exercício da profissão.

Sendo assim, não há nada que deponha contra a avaliação pericial. E não evidenciada incapacidade ou redução da capacidade laborativa, está ausente o requisito essencial para franquear à recorrente o benefício almejado. Por corolário, "inexistindo elementos capazes de contraditar as conclusões periciais, as quais apontam pela plena capacidade de trabalho, deve ser negado o pedido de benefício acidentário" (TJSC, Apelação Cível n. 0300054-45.2018.8.24.0218, de Catanduvas, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, Primeira Câmara de Direito Público, j. 16-10-2018).

A manutenção da sentença de improcedência, portanto, é medida que se impõe.

3. Subsidiariamente, a apelante pretende afastar o dever de restituir as quantias percebidas de boa-fé a título de antecipação de tutela.

O pleito, contudo, não merece guarida.

O Estatuto Processual Civil estabelece:

Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se:

I - a sentença lhe for desfavorável;

[...]

Parágrafo único...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT