Acórdão Nº 0311416-55.2017.8.24.0064 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 28-07-2022

Número do processo0311416-55.2017.8.24.0064
Data28 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Apelação Nº 0311416-55.2017.8.24.0064/SC

RELATOR: Desembargador DINART FRANCISCO MACHADO

APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. APELADO: M.A.S.C. ESTRUTURAS & EVENTOS LTDA - ME (AUTOR)

RELATÓRIO

BANCO DO BRASIL S.A. interpôs recurso de apelação cível contra a sentença (evento 82, SENT1) que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na "ação revisional de contrato bancário" ajuizada por M.A.S.C. ESTRUTURAS & EVENTOS LTDA. - ME, ora apelada, em desfavor do banco apelante, cujo dispositivo foi redigido nos seguintes termos:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I do Código de Processo Civil, resolvo o mérito, e julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial para:

1. Limitar a cobrança de juros remuneratórios à taxa média do Bacen à época do pacto, para operações da mesma natureza, quanto aos contratos de n. 301.305.023, 301.302.759, 301.303.391, 301.304.781 e 301.303.531.

2. Expurgar a capitalização de juros em qualquer periodicidade quanto aos contratos n. 301.302.759, 301.303.391, 301.304.781 e 301.303.531.

3. Expurgar a cobrança de multa moratória e vedar a sua cobrança sobre os juros moratórios quanto aos contratos n. 301.302.759, 301.303.391, 301.304.781 e 301.303.531.

4. Determinar a restituição, na forma simples, dos valores eventualmente exigidos a maior, corrigidos monetariamente pelo INPC a partir da data do desembolso e com incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação (29-1-2020, evento 70), expressamente admitida a compensação.

Considerando a sucumbência recíproca, condeno as partes, à proporção de 30% pelo autor e 70% pelo réu, ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% do proveito econômico obtido (art. 85, § 2º, CPC).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, e nada mais sendo requerido, arquive-se.

Em suas razões recursais (evento 92, APELAÇÃO1), o banco réu/apelante sustentou, em síntese: a) a legalidade dos juros remuneratórios pactuados; b) a possibilidade da capitalização anual dos juros, tendo em vista a existência de "previsão de uma taxa anual de juros superior ao duodécuplo da mensal, sendo suficiente para se entender que a capitalização de juros com periodicidade anual foi expressamente autorizada pelo ajuste" (fl. 5); c) a legalidade da multa contratual e dos juros moratórios; d) o afastamento da condenação da parte recorrente a restituição de quaisquer valores, porquanto "não houve a cobrança de nenhum valor indevido/abusivo por parte da Recorrente" (fl. 7). Requereu a readequação da sucumbência condenando a parte recorrida ao pagamento da integralidade das custas e honorários advocatícios sucumbenciais. Ao final. pugnou pelo provimento do recurso, a fim de que seja reformada a sentença, com a consequente inversão do ônus sucumbencial.

Apresentadas contrarrazões (evento 98, CONTRAZAP1), os autos ascenderam a esta Corte.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço parcialmente do recurso.

Delimitação da controvérsia

Trata-se de ação revisional de contratos bancários atrelados à conta-corrente n. 00.018.672-4, agência 3013, de titularidade da parte autora.

Em sua inicial, a parte autora indicou as operações de crédito objetos de revisão (evento 1, PET1 - fl. 2): "301.302.759, 301.303.391, 301.305.429, 301.304.781, 301.303.531, 301.305.023".

A autora juntou aos autos as cópias dos extratos consolidados referentes aos seguintes pactos: a) 301.303.391 (evento 1, INF7); b) 301.303.531 (evento 1, INF10); c) 301.304.781 (evento 1, INF11); d) 301.305.023 (evento 1, INF13); e, e) 301.305.429 (evento 1, INF14).

Devidamente intimado (evento 42, DEC53), o banco réu apresentou apenas as cópias das seguintes avenças: a) 301.305.429 (evento 73, INF79) e b) 301.305.023 (evento 73, INF80).

Delimitada a controvérsia, passa-se à análise do apelo.

1 Dos juros remuneratórios

Postula a instituição financeira a manutenção dos juros remuneratórios na forma contratada.

Com relação aos juros remuneratórios, o entendimento consolidado nos Enunciados ns. I e IV do Grupo de Câmaras de Direito Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, autoriza a cobrança dos juros à taxa média de mercado:

I - Nos contratos bancários, com exceção das cédulas de crédito e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil.

IV - Na aplicação da taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade.

Contudo, no que tange à referida "média de mercado", necessário registrar que o Superior Tribunal de Justiça, ao aplicar a "lei dos recursos repetitivos" no julgamento do REsp n. 1.061.530/RS, em que foi relatora a Ministra Nancy Andrighi, decidiu que a taxa média de mercado constitui somente um referencial, não figurando como limitador dos juros remuneratórios, cabendo ao magistrado decidir, caso a caso, se os juros pactuados se revelam ou não abusivos. O mencionado acórdão, julgado em 22-10-2008, restou assim ementado:

ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto (grifei).

Do corpo do voto da ilustre Relatora, colhe-se excerto:

Necessário tecer, ainda, algumas considerações sobre parâmetros que podem ser utilizados pelo julgador para, diante do caso concreto, perquirir a existência ou não de flagrante abusividade.

Inicialmente, destaque-se que, para este exame, a meta estipulada pelo Conselho Monetário Nacional para a Selic - taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - é insatisfatória. Ela apenas indica o menor custo, ou um dos menores custos, para a captação de recursos pelas instituições que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Sua adoção como parâmetro de abusividade elimina o 'spread' e não resolve as intrincadas questões inerentes ao preço do empréstimo. Por essas razões, conforme destacado, o STJ em diversos precedentes tem afastado a taxa Selic como parâmetro de limitação de juros.

Descartados índices ou taxas fixos, é razoável que os instrumentos para aferição da abusividade sejam buscados no próprio mercado financeiro.

Assim, a análise da abusividade ganhou muito quando o Banco Central do Brasil passou, em outubro de 1999, a divulgar as taxas médias, ponderadas segundo o volume de crédito concedido, para os juros praticados pelas instituições financeiras nas operações de crédito realizadas com recursos livres (conf. Circular nº 2957, de 30.12.1999).

As informações divulgadas por aquela autarquia, acessíveis a qualquer pessoa através da rede mundial de computadores (conforme http://www.bcb.gov.br/-ecoimpom - no quadro XLVIII da nota anexa; ou http://www.bcb.gov.br/-TXCREDMES, acesso em 06.10.2008), são segregadas de acordo com o tipo de encargo (prefixado, pós-fixado, taxas flutuantes e índices de preços), com a categoria do tomador (pessoas físicas e jurídicas) e com a modalidade de empréstimo realizada ('hot money', desconto de duplicatas, desconto de notas promissórias, capital de giro, conta garantida, financiamento imobiliário, aquisição de bens, 'vendor', cheque especial, crédito pessoal, entre outros).

A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.

Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros.

A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no Resp. 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp. 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (Resp. 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.

Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos (grifei).

A par da orientação pretoriana, e de acordo com o entendimento desta Terceira Câmara de Direito Comercial, conclui-se que quando os juros remuneratórios pactuados estiverem limitados dentro de uma variação razoável (até 10% - dez por cento) da taxa média de...

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