Acórdão Nº 0311631-23.2018.8.24.0023 do Sétima Câmara de Direito Civil, 25-02-2021

Número do processo0311631-23.2018.8.24.0023
Data25 Fevereiro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0311631-23.2018.8.24.0023/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0311631-23.2018.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador CARLOS ROBERTO DA SILVA

APELANTE: MELIA BRASIL ADMINISTRACAO HOTELEIRA E COMERCIAL LTDA. (RÉU) ADVOGADO: PAULO SOARES DE MORAIS (OAB SP183461) APELADO: FÁBIO LOPES DE LIMA (AUTOR) ADVOGADO: FÁBIO LOPES DE LIMA (OAB SC016277)

RELATÓRIO

Melia Brasil Administração Hoteleira e Comercial Ltda. interpôs recurso de apelação contra sentença (evento 23) que, nos autos da ação de rescisão contratual cumulada com pedido de restituição de valores pagos e tutela provisória de urgência ajuizada por Fábio Lopes de Lima, julgou procedentes os pedidos iniciais.

Para melhor elucidação da matéria debatida nos autos, adota-se o relatório da sentença recorrida (evento 23):

Fábio Lopes de Lima propôs "ação de rescisão contratual, c/c restituição de valores pagos, c/c tutela provisória de urgência" em desfavor de Melia Brasil Administração Hotelaria e Comercial Ltda., ambos qualificados.

Sustentou que no mês de janeiro de 2016 viajou com a família para Punta Cana, na República Domicana, e que naquele local foram abordados por prepostos do hotel onde estavam hospedados, que ofereceram insistentemente um programa denominado "Club Meliá Vacation Club" como serviço de hospedagem de férias no qual o comprador paga antecipadamente pelo gozo de férias futuras.

Narrou que os prepostos do mencionado programa afirmaram que os adquirentes do título poderiam usufruir de sete dias de hospedagem em alojamento chamado "Bedroom Máster Suite", equivalentes a 31.000 das nominadas "opções" do programa, não inclusa alimentação, utilizáveis bianualmente pelo prazo de cinquenta anos, nos anos ímpares, mediante pagamento de título e quotas de manutenção anuais, com mais de trezentas opções de hospedagem, incluindo rede parceira (RCI) com mais de três mil hotéis.

Descreveu que, após concessão de vantagens e exaustiva explanação e sem tempo para reflexão, acabou aceitando a proposta, mas que dois dias depois tentou rescindir o contrato, sem sucesso, e em fevereiro de 2018 buscou novamente a rescisão, também sem sucesso.

Alegou que a requerida ofereceu propaganda enganosa, pois ao tentar utilizar o programa, em vez das promessas de simplicidade de uso e acesso, versatilidade e rapidez, deparou-se com demora na utilização, burocracia, dificuldade na reserva, necessidade de antecedência anual sob pena de perda total das "opções" do programa, e diversas outras desvantagens do plano, caracterizando propaganda enganosa e descumprimento da oferta.

Afirmou, ainda, que buscou a rescisão contratual em fevereiro de 2018, que foi negada pela requerida sob o argumento de que inexiste possibilidade de rescisão.

Ao final, pugnou (i) pela concessão da tutela provisória de urgência; (ii) pela declaração: a) de nulidade das cláusulas abusivas, mormente as de escolha do foro e de impossibilidade de rescisão; b) pela declaração da rescisão contratual, assim como dos demais acessos vinculados e originados dele, sem aplicação de multa ou, subsidiariamente, com multa de 10%; (c) pela declaração de utilização das "opções" adiantadas pelo autor do ano de 2019 para 2018, compensando-se os créditos; (d) pela declaração de não utilização do total de 183.948 "pontos rewards", com o respectivo estorno à requerida e respectiva compensação; (e) pela declaração de utilização do total de 316.052 "pontos rewards" em viagens efetuadas, compensando-se os créditos; (iii) pela condenação da requerida: a) à devolução do valor de R$ 25.382,05, compensados com os valores utilizados pelo autor; b) à devolução do valor de R$ 21.752,82, compensados com os valores utilizados pelo autor; c) à devolução em dobro dos valores pagos a partir do pedido de rescisão (fev/2018) até a propositura da presente (out/2018), além das parcelas vincendas; d) à devolução do valor de R$ 3.204,68 das "opções" convertidas em "possibilidades RCI", compensados com os valores utilizados pelo autor; e) ao ressarcimento do valor de R$ 2.406,71 da proporcionalidade da taxa de administração cobrada, descontada a proporção do período. Juntou procuração e documentos (pp. 37/163).

Indeferida a tutela provisória de urgência, foi invertido o ônus da prova e determinada a citação (pp. 168/169).

A requerida apresentou resposta na forma de contestação, alegando (i) ilegitimidade passiva ad causam; (ii) incompetência absoluta da Justiça brasileira e da lei material a ser aplicada; (iii) inexistência de vínculo entre as empresas e culpa exclusiva de terceiro; (iv) consentimento e ciência do autor sobre as condições contratuais, inexistindo falha na prestação de serviços; (v) impossibilidade de restituição em dobro pela ausência de má-fé; (vi) subsidiariamente, responsabilização apenas subsidiária da requerida; (v) necessidade de aplicação da legislação dominicana; (vi) subsidiariamente, em razão da rescisão unilateral, a redução e limitação do valor da condenação a no máximo 50% (cinquenta por cento) do valor pago; (vii) subsidiariamente, incidência de juros de mora e correção monetária tenha como termo inicial o ajuizamento da presente, assim como a exclusão dos valores pagos a título de IOF; (viii) impossibilidade de inversão do ônus da prova. Juntou procuração e documentos (pp. 200/262).

O autor apresentou réplica (pp. 266/281).

Os autos vieram conclusos (grifado no original).

Da parte dispositiva do decisum, extrai-se a síntese do julgamento de primeiro grau:

Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados por Fábio Lopes de Lima em desfavor de Melia Brasil Administração Hotelaria e Comercial Ltda. e, em consequência:

a) declaro a resilição unilateral do contrato objeto do litígio em 28.02.2018;

b) condeno a requerida a devolver ao autor os valores pagos por este até a data da resilição (28.02.2018), com a retenção de 30% (trinta por cento), percentual que fixo como indenização à requerida, devidamente atualizados monetariamente desde cada pagamento (índice da CGJ/SC), e com juros legais de mora à razão de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação;

c) condeno a requerida a devolver a integralidade dos valores pagos por este após a data da resilição (28.02.2018), devidamente atualizados monetariamente desde cada pagamento (índice da CGJ/SC), e com juros legais de mora à razão de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação.

Diante da sucumbência mínima do pedido (art. 86, parágrafo único, do CPC), condeno exclusivamente a parte demandada ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, a teor do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, dê-se baixa e arquive-se, observado o art. 320 e seguintes do CNCGJ/SC no tocante às custas pendentes.

Custas pela autora.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se (grifado no original).

No julgamento dos embargos de declaração opostos pela parte ré (evento 29), pronunciou-se o Juízo a quo (evento 38):

Ante o exposto, sem a necessidade de maiores digressões, conheço e rejeito os embargos declaratórios. Porque provocado um incidente manifestamente infundado, visando a rediscussão da matéria, condeno o embargante ao pagamento de 2% sobre o valor atualizado da causa, com fundamento no art. 80, inciso VI, e 81 do CPC.

Em suas razões recursais (evento 45), a ré suscita as seguintes preliminares: a) falta de fundamentação da decisão objurgada; b) incompetência absoluta do Juízo brasileiro diante da validade da cláusula de eleição de foro da República Dominicana e a necessidade de observância da lei daquele país, nos termos do art. 9º da Lindb; c) ilegitimidade passiva, pois "é incontroverso que a apelante NÃO PERTENCE AO "CLUB MELIÁ", de modo que não há como colocar o serviço, objeto da ação, no mercado nacional, sendo inconteste que a empresa SOL MELIÁ VC DOMINICANA S.A., foi a empresa que firmou o contrato, devendo figurar no polo passivo, se o caso" (evento 45, doc. 1, p. 15). Em caráter subsidiário, afirma que "ao contrário da r. sentença, e do que foi apresentado na exordial pelo apelado, a responsabilidade discutida não é solidária, mas, na pior das hipóteses, subsidiaria, visto haver apenas uma empresa contratada, qual seja a empresa estrangeira" (evento 45, doc. 1, p. 17).

No mérito, sustenta que "Pelo que se lê dos contratos colacionados pelo apelado e pelas alegações de que tiveram uma série de palestras e explicações, não é possível PRESUMIR da forma pela qual o MM. Juiz a quo o faz, de que o apelado não teve ciência das informações prestadas ou que o contrato não prevê tais situações, mesmo com a apresentação de todos os regulamentos e contratos realizados pelo autor. O Contrato assinado entre as partes não possui nenhuma irregularidade, foi firmado com base em normas vigentes no exterior e não no Brasil, cujos encargos não poderiam suportar o que demonstra o descumprimento contratual por parte deles e não da empresa estrangeira" (evento 45, doc. 1, p. 13).

Aduz que "O Contrato assinado entre as partes não possui nenhuma irregularidade, tendo sido firmado com base em normas vigentes no exterior e não no Brasil, cujos encargos não poderia suportar, o que demonstra o descumprimento contratual por parte dele, e não da empresa estrangeira. Assim, deve ser aplicada cláusula prevista em contrato que prevê a retenção de TODOS OS VALORES PAGOS caso o apelado de motivo para rescisão contratual. A cláusula oitava é expressa neste sentido" (evento 45, doc. 1, p. 19).

Argumenta que "em função da culpa do autor, seja em função de eventuais despesas decorrentes do contrato firmado com a empresa estrangeira, é necessário reduzir o valor de eventual condenação em, no mínimo, 50% do valor supostamente pago" (evento 45, doc. 1, p. 20).

Por fim, pleiteia a incidência da correção monetária a partir do ajuizamento da ação e de juros de mora a partir do...

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