Acórdão Nº 0312104-88.2017.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Civil, 04-08-2022

Número do processo0312104-88.2017.8.24.0008
Data04 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0312104-88.2017.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador SILVIO DAGOBERTO ORSATTO

APELANTE: UNIMED BLUMENAU - COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO (RÉU) APELADO: W-8 TEXTIL LTDA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por U. B. C. de T. M. em face da sentença proferida pelo juízo da 5ª Vara Cível da comarca de Blumenau que, nos autos da Ação Cominatória c/c Declaratória de Nulidade de Cláusula Abusiva n. 0312104-88.2017.8.24.0008 ajuizada por W-8. T. Ltda., julgou procedentes os pedidos, nos seguintes termos (Evento 36 - autos de origem):

"Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial por Roseli Irene Prebianca em face de Unimed Blumenau - Cooperativa de Trabalho Médico para:

a) CONFIRMAR a decisão que concedeu a tutela provisória de urgência (evento 5);

b) DETERMINAR à ré que mantenha o plano de saúde da parte autora, em todos os seus termos, com envio de boletos de cobrança.

Houve sucumbência recíproca. Diante disso, condeno a ré ao pagamento de 50% das custas processuais e honorários sucumbenciais, estes que fixo em 10% do valor da condenação, forte no que dispõe o artigo 85, § 2º do CPC. E condeno a autora ao pagamento de 50% das custas processuais e honorários sucumbenciais, estes que fixo em 10% do valor da condenação, forte no que dispõe o artigo 85, § 2º do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitado em julgado. Arquivem-se."

Da sentença houve oposição de embargos declaratórios, os quais foram acolhidos para reconhecer omissão, resultando no seguinte dispositivo (Evento 52 - autos de origem):

"Ante o exposto, com fundamento no art. 1.022 do CPC, CONHEÇO e ACOLHO os embargos de declaração para CORRIGIR o dispositivo da sentença retro (evento 36), que passa a vigorar com a seguinte redação:

Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial por W-8 Têxtil Ltda. em face de Unimed Blumenau - Cooperativa de Trabalho Médico para:a) CONFIRMAR a decisão que concedeu a tutela provisória de urgência (evento 5);b) DECLARAR a abusividade - e a consequente nulidade - da cláusula 16ª do contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares nº 026.6067;c) DETERMINAR à ré que mantenha o plano de saúde da parte autora, em todos os seus termos, com envio de boletos de cobrança.CONDENO a ré ao pagamento de custas processuais e honorários sucumbenciais, estes que fixo em 10% do valor atualizado da causa, forte no que dispõe o artigo 85, § 2º, do CPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Transitada em julgado, arquivem-se."

Inconformado, o apelante sustentou, inicialmente, ser inaplicável o Código de Defesa do Consumidor em contratação firmada entre empresas. Na sequência, aduziu que há respaldo contratual (Cláusula 16ª), legal (art. 17, parágrafo único, da RN n. 195/2009 da ANS) e jurisprudencial para a rescisão do contrato imotivadamente. Não obstante, alegou que a onerosidade excessiva decorrente do aumento da sinistralidade fundamenta a rescisão unilateral. Também destacou que foi oportunizada a contratação de planos individuais aos beneficiários do contrato, tanto em âmbito administrativo quanto em sede judicial. Disse que a sentença violou o princípio da congruência, pois não consta nos autos pedido para declaração de nulidade da integralidade da Cláusula 16ª, tendo, no máximo, pleito genérico para a declaração da nulidade das cláusulas que permitem a rescisão imotivada. Assim, a nulidade de toda a cláusula teria impactado outras hipóteses de rescisão contratual nela previstas e o caso dos autos engloba somente a impossibilidade de rescisão imotivada da contratação, razões que sustentam a sua validade, ainda que parcial (Evento 60 - autos de origem).

Em contrarrazões, a apelada refutou os argumentos recursais, pugnando pela manutenção do plano nos mesmos termos contratados, inclusive em relação aos valores praticados, bem como condenação da apelante em honorários recursais. Também reforçou que o contrato objeto destes autos é o pactuado em 1/8/2004, no qual não contém cláusula que autorize a rescisão imotivada (Evento 65 - autos de origem).

Após, ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade recursal

Preenchidos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conhece-se do recurso e passa-se à sua análise.

A autora apelada sustentou que, no ano de 2004, na qualidade de estipulante, contratou a prestação de serviços médicos e hospitalares, tendo como beneficiários seu pequeno quadro de funcionários e dependentes. Acrescentou que, em 2017, recebeu notificação sobre o intento da operadora de saúde em rescindir a relação jurídica, ocasião em que contranotificou, defendendo a abusividade da ruptura por não satisfazer os requisitos apregoados no art. 13, parágrafo único, inciso II, da Lei n. 9.656/98.

O juízo a quo atendeu aos requerimentos da autora, sobrevindo o presente recurso de apelação interposto pela ré.

Mérito

Cinge-se o recurso na legalidade da conduta da apelante que culminou na rescisão unilateral do contrato empresarial de plano de saúde, pautada em disposição que autoriza a quebra imotivada da avença, considerada nula pelo juízo a quo.

Em suas razões, alegou, inicialmente, a inaplicabilidade do CDC porque existente relação contratual firmada entre duas empresas. Ressaltou que foi oportunizada a contratação de planos individuais aos beneficiários do contrato, em observância aos termos da Resolução CONSU-19 da ANS, tanto no âmbito administrativo quanto no âmbito judicial quando da apresentação da peça defensiva. Ponderou que a avença possuía vigência superior a 12 meses e que a parte foi notificada com prazo de 60 dias de antecedência da rescisão, cumprindo as exigências do art. 17, parágrafo único, da RN n. 195/2009 da ANS.

Ao final, reforçou que a Cláusula 16ª do contrato dispõe de outras hipóteses de rescisão contratual, e o caso engloba somente a impossibilidade de rescisão imotivada da contratação, sendo a sentença incongruente ao ampliar a nulidade integral do comando.

A apelada, em contrarrazões, pugnou pela manutenção do plano nos termos vigentes, inclusive em relação aos valores praticados, bem como a condenação da ré em honorários recursais. Ao final, em reforço ao argumentado no curso do processo, disse que o contrato objeto destes autos é o pactuado em 1/8/2004, no qual não prevê cláusula que autorize a rescisão imotivada.

Pois bem. O recurso, adianta-se, comporta parcial provimento, com a ressalva apresentada no decorrer do voto.

O juízo sentenciante aplicou ao caso o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça que enquadra os contratos empresariais aos contratos individuais, quando firmado com empresas que possuem em seus quadros funcionais menos de 30 beneficiários, amoldando-se, na hipótese, normas mais restritivas, especialmente a que veda a rescisão unilateral sem a prévia motivação idônea.

Nesse particular, é o fundamento da sentença (Evento 36 - autos de origem):

(...)

A regulamentação dos planos coletivos empresariais (Lei n° 9.656/98, art. 16, VII) distingue aqueles com menos de trinta usuários, cujas bases atuariais se assemelham às dos planos individuais e familiares, impondo sejam agrupados com a finalidade de diluição do risco de operação e apuração do cálculo do percentual de reajuste a ser aplicado em cada um deles (Resoluçoes 195/2009 e 309/2012 da ANS). 3. Nesses tipos de contrato, em vista da vulnerabilidade da empresa estipulante, dotada de escasso poder de barganha, não se admite a simples rescisão unilateral pela operadora de plano de saúde, havendo necessidade de motivação idônea. Precedente da Terceira Turma (RESP 1.553.013/SP, Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJ 20.3.2018) (REsp 1776047/SP, Rela. Mina. Maria Isabel Gallotti, j. 23-4-2019)

(...)

Consabido que incumbe à parte instruir a contestação com os documentos destinados a provar suas alegações, ex vi do art. 434 do CPC. Vê-se que a ré não logrou comprovar adequadamente a justificativa para rescindir unilateralmente o contrato de plano de saúde.

No caso, a prova é eminentemente documental. Portanto, passo à análise dos documentos juntados aos autos.

A notificação extrajudicial faz referência, en passant, de que o contrato apresentava grave desequilíbrio econômico-financeiro e gerado prejuízos consideráveis à ré (evento 1 inf 39). Também indica um aumento na sinistralidade naquele último ano e que a soma das contribuições não foi capaz de cobrir os gastos assistenciais. Mas é só. Não foi apresentado nenhum cálculo atuarial que demonstrasse essa circunstância.

Além disso, não há qualquer documento que comprove ter sido ofertado aos beneficiários contratos de plano de saúde com aproveitamento das carências cumpridas (...).

De início, convém anotar que não se desconhece o posicionamento do STJ sobre a possibilidade de rescisão unilateral de contrato coletivo pela operadora do plano de saúde, desde que cumpridas as exigências de vigência mínima de 12 meses e prévia notificação da parte contrária, a saber:

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL. RESCISÃO UNILATERAL PELA OPERADORA. POSSIBILIDADE. ART....

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