Acórdão Nº 0312149-92.2017.8.24.0008 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 04-11-2021

Número do processo0312149-92.2017.8.24.0008
Data04 Novembro 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0312149-92.2017.8.24.0008/SCPROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0312149-92.2017.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador GILBERTO GOMES DE OLIVEIRA

APELANTE: GLOBAL SECURITIZADORA S/A (AUTOR) ADVOGADO: FRANCISCO MAROZO ORTIGARA (OAB SC017943) APELADO: PAULO DE OLIVEIRA (RÉU) ADVOGADO: JORGE CALIL CANUT NETO (DPE) APELADO: PEBLO INDUSTRIA E COMERCIO DE EMBALAGENS PLASTICAS EIRELI (RÉU) APELADO: PEDRO THIAGO DE OLIVEIRA (RÉU) ADVOGADO: JORGE CALIL CANUT NETO (DPE)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela autora, Global Securitizadora S.A., da sentença (evento 174), do Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da comarca de Blumenau (Dr. Anddré Udyllo Gamal de Diniz Mesquita), que, em monitória proposta contra Peblo Indústria e Comércio de Embalagens Plásticas Ltda., Pedro Thiago de Oliveira e Paulo de Oliveira, julgou a pretensão inicial improcedente.

A autora defende que o julgamento é extra e ultra petita. Para tanto, diz que a demandada Peblo Ltda. foi citada e não ofertou resposta e que os demais demandados foram citados por edital, cuja contestação, oferecida pela Defensoria Pública, resumiu-se à negativa geral, de modo que em nenhum momento se arguiu, no caso dos autos, a nulidade da cláusula de recompra.

Após, defende que a cláusula de recompra é válida, porquanto não atuou como factoring, mas, sim, como empresa de securitização.

Após discorrer sobre o enriquecimento ilícito dos demandados, pede pelo provimento do apelo.

Contrarrazões, pela Defensoria Pública, no evento 203.

É o relatório.

VOTO

I. Tempus regit actum

A decisão recorrida foi publicada em 13.12.2018.

Portanto, à lide aplica-se o CPC/15, na forma do enunciado administrativo nº 3 do STJ: "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

II. Admissibilidade

Conheço do apelo, porque satisfeitos os pressupostos legais.

III. Caso concreto

Trata-se de ação monitória proposta por Global Securitizadora S.A.

A demanda funda-se em contrato de cessão de direitos de crédito firmado em 18.11.2014 pela Peblo Ind. e Com. de Embalagens Plásticas Ltda. EPP. e garantido por Pedro Thiago de Oliveira e Paulo de Oliveira (devedores solidários).

Na inicial, a autora narrou que "nos termos da Cláusula 3ª do referido contrato, para cada transferência de recebíveis é formalizado por uma Declaração de Recebimento (aditivo), discriminando os títulos, a forma de pagamento, o valor da compra e o deságio, a fim de confirmar a cessão de crédito", porém, os demandados "não cumpriram com suas obrigações, como dispõe cláusula 6ª, do respectivo contrato, pois não recompraram o título inadimplido".

Pediu, pois, pela condenação dos demandados ao pagamento de R$ 11.970,00, com a devida atualização (R$ 14.562,98).

A Peblo Ind. e Com. de Embalagens Plásticas Ltda. EPP. foi citada no evento 34.

Os devedores solidários, Pedro Thiago de Oliveira e Paulo de Oliveira, foram citados por edital (evento 147) e, e, razão disto, a contestação foi oferecida pela Defensoria Pública, na condição de curadora especial.

Então, o Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da comarca de Blumenau, Dr. Anddré Udyllo Gamal de Diniz Mesquita, julgou a causa improcedente tendo em vista a nulidade da cláusula de recompra.

Fundamentou Sua Exa.:

O pleito inicial está fundamentado na cláusula sexta do contrato de cessão e transferência de direitos creditórios (evento 1, documento 8), a qual prevê a obrigação do polo passivo de recomprar os títulos cedidos em caso de simples inadimplemento pelo sacado, emitente ou devedor.

Contudo, conforme firme entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça, referida cláusula é nula porque descaracteriza a própria finalidade do contrato de cessão de crédito entabulado, salvo quando houver algum vício no próprio título, hipótese essa sequer ventilada na petição inicial, cuja pretensão está calcada, frisa-se uma vez mais, no simples inadimplemento do sacado.

Desta decisão, apela a autora, Global Securitizadora S.A.

Assiste-lhe razão, em parte, conforme se verá.

(i) julgamento extra ou ultra petita: não ocorrência

No caso, a autora defende que o julgamento é extra e ultra petita, pois a demandada Peblo Ltda. foi citada e não ofertou resposta, tornando-se revel, e os demais demandados foram citados apenas por edital, cuja contestação, oferecida pela Defensoria Pública, resumiu-se à negativa geral, de modo que em nenhum momento se arguiu, no caso dos autos, a nulidade da cláusula de recompra.

Os arts. 141 e 492 do CPC tratam do princípio da adstrição (ou congruência) do juiz aos limites da lide:

Art. 141. O juiz decidirá o mérito nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.

Art. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

O julgamento extra ou ultra petita configura-se justamente quando o juiz decide fora destes limites, que são fixados nos pedidos realizados na inicial. Porém, não apenas dos pedidos realizados na inicial, mas, também, da defesa.

Ao contrário do que defende a empresa autora, não se observa mácula no julgamento, porquanto pautou-se unicamente na regra processual acerca do ônus da prova, pela qual incumbe ao autor a demonstração de fato constitutivo do direito que alega ter e ao réu a existência de fato modificativo, impeditivo ou extintivo.

Senão vejamos: a demanda foi proposta para a cobrança de título de crédito no valor de R$ 11.970,00 e ampara-se unicamente no inadimplemento do sacado e na cláusula de recompra firmada pela cedente em contrato de cessão de título de crédito; porém, o juízo entendeu que "referida cláusula é nula porque descaracteriza a própria finalidade do contrato de cessão de crédito entabulado, salvo quando houver algum vício no próprio título, hipótese essa sequer ventilada na petição inicial, cuja pretensão está calcada, frisa-se uma vez mais, no simples inadimplemento do sacado".

Outrossim, válido lembrar que a revelia ou mesmo a contestação apresentada por Curador Especial, múnus público no caso exercício pela própria Defensoria Pública, no caso de réu citado por edital, não ensejam a imediata e automática procedência do pedido. Ademais, a Defensoria Pública controverteu os fatos (evento 156) e a ela nem mesmo se aplicaria o ônus da impugnação específica.

Na realidade, não há nulidade e infere-se que a insatisfação atém-se apenas ao resultado do julgado.

(ii) Mérito: acolhimento parcial

Sabe-se que a factoring (ou fomento mercantil) presta serviços no mercado financeiro, a exemplo da gestão e administração de créditos, razão pela qual exige o pagamento de remuneração (deságio) quando adquire recebíveis.

A respeito, leciona Arnaldo Rizzardo:

O sentido tradicional de factoring não oferece maiores dificuldades. Pode-se afirmar que se está diante de uma relação jurídica entre duas empresas, em que uma delas entrega à outra um título de crédito, recebendo, como contraprestação, o valor constante do título, do qual se desconta certa quantia, considerada a remuneração pela transação. (Factoring, 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 11).

Fábio Ulhoa Coelho, por sua vez, explica:

Pelo contrato de fomento mercantil, um dos contratantes (faturizador) presta ao empresário (faturizado) o serviço de administração do crédito, garantindo o pagamento das faturas por este emitidas. A faturizadora assume, também, as seguintes obrigações: a) gerir os créditos do faturizado, procedendo ao controle dos vencimentos, providenciando avisos e protestos assecuratórios do direito creditício, bem como cobrando os devedores das faturas; b) assumir os riscos do inadimplemento dos devedores; c) garantir o pagamento das faturas objeto de faturização. (Curso de Direito Comercial, vol. III, ed. Saraiva, 2005, p. 144).

Em termos simples, as empresas de factoring compram títulos de crédito, oriundos de vendas mercantis ou prestação de serviços, pagam à vista o emitente, com ajuste de deságio remuneratório, e aguardam o vencimento dos títulos para cobrá-los...

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