Acórdão Nº 0312340-66.2017.8.24.0064 do Terceira Câmara de Direito Civil, 03-08-2021

Número do processo0312340-66.2017.8.24.0064
Data03 Agosto 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0312340-66.2017.8.24.0064/SC



RELATOR: Desembargador MARCUS TULIO SARTORATO


APELANTE: PATRICIA GOMES DOS SANTOS (AUTOR) APELANTE: UNIMED GRANDE FLORIANÓPOLIS - COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO (RÉU) APELADO: OS MESMOS


RELATÓRIO


Adota-se o relatório da sentença recorrida (Evento 23, doc. 63, fls. 1/3), por revelar com transparência o que existe nestes autos, in verbis:
Vistos, etc.
Trata-se de Ação Cominatória e Condenatória ajuizada por Patricia Gomes dos Santos contra Unimed Grande Florianópolis - Cooperativa de Trabalho Médico, aos argumentos, em suma, de que: (I) é integrante do plano de saúde coletivo da requerida, por intermédio da ACAERT - Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão, estando adimplente com suas obrigações contratuais; (II) foi diagnosticada como portadora de membrana neovascular coroideana - MNC, em decorrência de toxoplasmose; (III) seu médico assistente prescreveu uma sessão por mês, em um programa de 24 meses, do tratamento ocular quimioterápico com antiangiogênico; (IV) o plano de saúde negou o custeio do referido tratamento, sob o argumento de que não foram atendidas as diretrizes de utilização definidas no item 74 do anexo II da RN nº 387/2015 da ANS; (V) diante da urgência, familiares ajudaram a custear a primeira aplicação do medicamento, porém não tem condições de prosseguir com as sessões necessárias para tratamento de sua doença; (VI) necessita, em caráter de urgência, do referido tratamento médico, a fim de evitar o avanço da doença degenerativa que pode culminar em cegueira.
Indicou os fundamentos jurídicos do pedido e postulou: a) a concessão da antecipação dos efeitos da tutela para que a empresa ré autorizasse a realização do tratamento, sob pena de multa diária; b) a confirmação da antecipação da tutela; c) a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais; d) a condenação da parte ré ao ressarcimento, em dobro, da quantia de R$4.574,00 (quatro mil, quinhentos setenta quatro reais); e e) condenação da ré nos ônus da sucumbência. Requereu, ainda, o deferimento dos benefícios da justiça gratuita. Valorou a causa e juntou documentos (pgs. 1-86).
Na decisão de pgs. 87-94 foi deferido o pedido de tutela urgência formulado na exordial, determinando-se que a requerida autorizasse a realização do tratamento quimioterápico ocular com antiangiogênico aflibercepte (Eylia) 40mg/ml, no número de sessões que se fizessem necessárias, conforme prescrição do médico assistente, sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais).
Citada, a parte ré informou o cumprimento da decisão de pgs. 87-94 e apresentou contestação (pgs. 105-223) alegando, em suma, que: (I) a autora é beneficiária do contrato de assistência à saúde do tipo coletivo empresarial - UNIFLEX REGIONAL, firmado com a Associação Empresarial da Região Metropolitana de Florianópolis; (II) não há ausência de cobertura contratual para tratamento clínico experimental/off label, que é o caso da autora; (III) o medicamento Eylia (aflibercepte) intravíteo não possui aprovação para tratamento de pacientes com Membrana Neovascular Coroideana (MNS) provocada por toxoplasmose, não possuindo eficácia comprovada para tanto; (IV) a negativa de fornecimento do medicamento experimental foi lícita, não havendo dolo ou má-fé da requerida; (V) deve ser julgado improcedente o pedido de repetição em dobro do valor pago pela sessão já realizada; (VI) não há falar em abalo moral; (VII) em caso de eventual condenação, os juros e correção monetária devem incidir a partir do arbitramento. Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos iniciais.
Houve réplica (pgs. 227-234) na qual a autora rechaçou os argumentos da defesa e novos documentos (pgs. 235-243).
Instadas a especificarem as provas que pretendiam produzir (pg. 244), a parte autora manteve-se inerte (pg. 253), enquanto a parte ré postulou o julgamento antecipado da lide e apresentou manifestação acerca dos novos documentos apresentados pela autora (pgs. 247-250).
Vieram os autos conclusos.
É o relato do necessário.

A MM.ª Juíza de Direito, Doutora Bianca Fernandes Figueiredo, julgou a lide nos seguintes termos (Evento 23, doc. 63, fls. 14/15):
Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Patricia Gomes dos Santos contra UNIMED GRANDE FLORIANÓPOLIS - COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO para:
a) CONFIRMAR a decisão que deferiu os efeitos da tutela antecipada às pgs. 87-94.
b) DETERMINAR que a ré forneça à autora o tratamento quimioterápico ocular com antiangiogênico aflibercepte (eylia) 40mg/ml, na forma prescrita por seu médico assistente e pelo prazo necessário ao tratamento de sua enfermidade;
c) CONDENAR a parte requerida ao pagamento de R$4.574,00 (quatro mil, quinhentos setenta e quatro reais) a título de indenização por danos materiais, com correção monetária, pelo INPC, a partir do desembolso dos valores (6-7-2017, pgs. 39 e 40), e juros de mora de 1% ao mês, desde a citação.
Diante da sucumbência recíproca, condeno a autora e a ré ao pagamento das custas processuais (60% ré e 40% autora) e de honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (60% ré e 40% autora), nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.
Entretanto, no tocante à parte autora, a exigibilidade das verbas sucumbenciais fica suspensa e condicionada à cessação da situação de insuficiência de recursos, desde que ocorra no prazo de 5 (cinco) anos contados do trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 98, § 3 o , do CPC, visto que goza do benefício da justiça gratuita (pg. 87).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Irresignada, a ré interpôs recurso de apelação (Evento 43) no qual sustenta que não se pode obrigar a Unimed a custear um procedimento que não tem respaldo contratual de cobertura, bem como supera o valor contratado, pois não recebeu a contraprestação devida. Insiste que o o rol da ANS é taxativo. Alega que inexiste cobertura para o tratamento pretendido nos autos. Pondera que a doença de que sofre a apelada não é oncológica e não se enquadra nos casos previstos para cobertura de tratamento ocular quimioterápico com antiangiogênico. Acrescenta que, além de a apelada não preencher os critérios estabelecidos na Diretriz de Utilização nº 74, do Anexo II da RN 387/2015, vigente na época dos fatos, de igual forma o medicamento pretendido para realização do seu tratamento não possui indicação em bula para sua situação clínica (off-label). Com relação aos honorários sucumbenciais, ressalta a necessidade de fixação sobre o valor da condenação. Conta que a apelada atribuiu o valor de R$ 33.000,00 (trinta e três mil reais) à causa, montante no qual estariam englobados os pedidos iniciais de obrigação de fazer, ressarcimento e dano moral. Todavia, o pleito de dano moral fora sabiamente afastado pelo sentenciante, de modo que a fixação dos honorários sucumbenciais não pode considerar o dano moral pretendido, devendo, por certo, ser fixado sobre o valor da condenação em favor da apelada.
Em recurso adesivo (Evento 51), a autora insiste ter sido vítima de dano moral. Explica que a injustificada recusa, pelo plano de saúde, de cobertura de procedimento necessário ao tratamento do segurado gera dano moral. Argumenta que negar autorização para a realização de exame ou procedimento de saúde fere a finalidade básica do contrato, colocando o usuário em posição de intensa desvantagem, abalando seu âmago e provocando profundo constrangimento e angústia. Ressalta que seu caso exigiu especial atenção pelo risco de cegueira irreversível, de modo que a negativa da recorrida causou-lhe imenso sofrimento, apreensão e medo de ficar cega. Requer seja a recorrida condenada também ao pagamento no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de danos morais.
Em contrarrazões (Evento 50), a parte autora pugna pelo desprovimento do recurso da adversa.
Mesmo intimada, a parte ré deixou transcorrer in albis o prazo para apresentar as contrarrazões ao recurso adesivo (Evento 55)

VOTO


1. Inicialmente, há que se reconhecer a relação de consumo existente entre as partes, as quais se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor de serviços, estatuídos nos arts. e do Código de Defesa do Consumidor, respectivamente, devendo o presente caso, por essa razão, ser analisado sob a ótica da legislação consumerista.
A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao contratos de planos de saúde é questão velha e bem pacificada na jurisprudência, tendo sido, inclusive, objeto de súmula no âmbito do STJ, in verbis: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde" (Enunciado n. 469).
De igual modo, aplicam-se à espécie as disposições previstas na Lei 9.656/98, que regula os planos e seguros privados de assistência à saúde. Apesar da literalidade do art. 35-G dessa legislação ("Aplicam-se subsidiariamente aos contratos entre usuários e operadoras de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei as disposições da Lei nº 8.078, de 1990"), a aplicação desses dois diplomas legais - CDC e Lei...

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