Acórdão Nº 0312392-40.2016.8.24.0018 do Primeira Câmara de Direito Civil, 08-07-2021

Número do processo0312392-40.2016.8.24.0018
Data08 Julho 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0312392-40.2016.8.24.0018/SC



RELATOR: Desembargador FLAVIO ANDRE PAZ DE BRUM


APELANTE: HOMERO JOSE DA SILVA ADVOGADO: MAYARA MARINA MATTANA REGINATTO (OAB SC033493) APELADO: NOBRE SEGURADORA DO BRASIL S.A - EM LIQUIDACAO ADVOGADO: RENATA MOQUILLAZA DA ROCHA (OAB SP291997) ADVOGADO: RAFAEL BERTACHINI MOREIRA JACINTO (OAB SP235654) APELADO: TOKIO MARINE SEGURADORA S.A. ADVOGADO: DEBORA LEILA TRINDADE (OAB SC034689)


RELATÓRIO


Trata-se de apelação cível julgada por esta Primeira Câmara de Direito Civil, sob a relatoria do saudoso Des. Paulo Ricardo Bruschi, a qual, por unanimidade, negou provimento ao recurso interposto por Homero José da Silva, mantendo a sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação de cobrança ajuizada contra a Tokio Marine Brasil Seguradora S/A e a Nobre Seguradora do Brasil, afastando, por conseguinte, a pretensão de pagamento da indenização securitária.
Por discordar da decisão prolatada, Homero José da Silva opôs embargos de declaração (evento 43), os quais foram rejeitados (evento 57), e, na sequência, interpôs recurso especial (evento 65).
Apresentadas as contrarrazões (eventos 78 e 80), o recurso especial foi admitido pela 3ª Vice-Presidência deste Tribunal de Justiça e remetido à Corte Superior (evento 84).
No colendo Superior Tribunal de Justiça, houve o parcial provimento do recurso interposto, determinando-se o retorno dos autos a esta Corte Estadual de Justiça para novo julgamento da controvérsia, a fim de que se examine se foi adequadamente observado o dever de informação por parte da seguradora, à luz da jurisprudência do STJ.
Recebo os autos conclusos.
Este o relatório

VOTO


Inicialmente, registre-se que o Superior Tribunal de Justiça, ao dar parcial provimento ao recurso especial interposto por Homero José da Silva, determinou o retorno dos autos a esta Corte de Justiça para reapreciação, tão somente, da questão jurídica sobre o dever de informação, a fim de que examine se foi adequadamente observado no caso concreto por parte da seguradora, sob o fundamento de que "o dever de informação a respeito das condições do contrato de seguro é da própria SEGURADORA, que não o pode transferir para o estipulante" (Evento 94/Traslado de peças 38).
Neste contexto, oportuna a transcrição de excerto do acórdão anteriormente proferido pelo saudoso Des. Paulo Ricardo Bruschi, que assentou ser da estipulante a responsabilidade pela comunicação e repasse das informações sobre as disposições do contrato aos segurados, assim decidindo a matéria em debate (evento 32/Acórdão 12 - fl. 11), in verbis:
"Aliás, "mais uma vez, destaca-se que o contrato de seguro possui interpretação restritiva art. 757 do Código Civil , destacando-se que não há conflito, nesse ponto, com o art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, porquanto a interpretação mais benéfica ao Aderente não pode possuir o condão de alterar o tipo de risco para o qual o seguro foi contratado. Além do mais, nesse caso, essa interpretação mais benéfica à Autora ocorre, de fato, no caso de haver ambiguidade de interpretação ou, então, cláusulas obscuras, sendo que não é essa a situação in casu, mormente porquanto a entabulação, conforme já apontado, se deu entre a Estipulante e a Ré" (AC n. 0018227-87.2013.8.24.0018, Desa. Rosane Portella Wolff).Nessa alheta, "embora a interpretação dos contratos submetidos ao Código Consumerista deva beneficiar o consumidor, essa prerrogativa não pode ser utilizada com o propósito de ampliar direitos dos segurados cujos riscos não foram previstos no pacto, especialmente porque 'o contrato de seguro interpreta-se restritivamente' (VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil - Contratos em espécie. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 379)" (AC n. 2014.061787-7, Des. Jairo Fernandes Gonçalves).Registre-se, ainda, a inaplicabilidade ao caso da disposição inserta no artigo 46, segundo a qual os consumidores não serão obrigados aos contratos "se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo", haja vista que a responsabilidade pela comunicação e repasse das informações sobre as disposições do contrato aos segurados é da estipulante, que tem o poder de representação dos segurados perante a seguradora, razão por que não pode a seguradora ser responsabilizada por eventual desídia da contratante (estipulante), não se podendo, assim, afastar os termos aditivos da apólice devidamente informados nesta.
Sob essa ótica, em relação à matéria devolvida pelo Tribunal da Cidadania para reapreciação - observância, ou não, do dever de informação por parte da seguradora - defende o apelante, em apertada síntese, que "não recebeu no inicio da contratação quaisquer documentos relativos ao seguro de vida, ou seja, não foi cientificado das condições gerais da apólice, não tendo conhecimento das excludentes, inclusive de tabelamento de valores" (evento 31/Apelação 60 - fl. 49).
Com efeito, exsurge dos autos a inexistência de qualquer indicativo no sentido de que a Tokio Marine Brasil Seguradora S/A - contratada pela empresa empregadora de Homero José da Silva para o fornecimento do seguro em grupo - tenha cientificado o segurado acerca das disposições pactuadas no momento em que aderiu à apólice.
Aliás, não consta a assinatura do segurado em nenhum documento coligido ao caderno processual pela Tokio Marine em sua peça de defesa, quais sejam, certificado individual de Homero Jose da Silva, condições contratuais e as condições gerais de seguro de vida em grupo (evento 19/Informação 49 a 51).
Ocorre que, nos termos da legislação consumerista, aplicável à hipótese, deve o consumidor ter acesso a todas as cláusulas pactuadas, notadamente aquelas restritivas de direito, em consonância ao dever de informação estatuído no art. 6º, III, do CDC, veja-se:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
[...]
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
Aliado a isso, nos termos do art. 46 do mesmo diploma legal, "os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance".
E, diversamente do entendimento firmado no aresto que ora se reaprecia, no sentido de que a responsabilidade pela comunicação e repasse das informações sobre as disposições do contrato aos segurados seria da estipulante, restou assente na decisão proferida no recurso especial interposto pelo autor desta demanda, como já mencionado, que "[...] a jurisprudência do STJ orienta, porém, que o dever de informação a respeito das condições do contrato de seguro é da própria SEGURADORA, que não o pode transferir para o estipulante" (evento 94/traslado de peças 38).
Não obstante, urge se registre que, nas hipóteses em que inexistir a comprovação acerca da ciência prévia das coberturas pactuadas, esta Corte firmou o entendimento no sentido de que, em casos tais, eventual direito do segurado à indenização deve se averiguado nos termos do certificado individual, porquanto, in verbis:
"[...] Referido documento, malgrado também não contenha assinatura do autor, é o núcleo rígido e essencial de toda e qualquer relação securitária, sem o qual não há sequer um parâmetro para analisar a existência do direito do segurado no caso concreto. Não se mostra razoável aceitar a premissa de que o autor tenha aderido a um contrato de seguro sem ao menos tomar conhecimento, em linhas gerais, das modalidades de coberturas incluídas e de seus respectivos capitais segurados. Se o fez, não pode ser premiado pela própria desídia e esperar que, por mera presunção, assuma-se a existência de um virtual contrato securitário preenchido de acordo com suas convicções [...]" (TJSC, Apelação n. 0301754-76.2015.8.24.0019, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 15-09-2020 - grifou-se).
Sobre a matéria, aliás, colhe-se o seguinte julgado desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. DOENÇA ALEGADAMENTE DECORRENTE DE ESFORÇOS REPETITIVOS. ALMEJADO O PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR INVALIDEZ PERMANENTE POR ACIDENTE (IPA). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELO DA AUTORA. (1) PRELIMINAR EM APELAÇÃO (ART. 1.009, § 1º. DO CPC). PEDIDO DE AFASTAMENTO DA MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ APLICADA EM DECISÃO QUE RECONHECEU A SUSPEIÇÃO DO PERITO. ACOLHIMENTO. INEXISTÊNCIA DE DOLO OU MALÍCIA AO NÃO ARGUIR A SUSPEIÇÃO DO PROFISSIONAL. DESÍDIA DA PARTE QUE NÃO CONFIGURA MÁ-FÉ. (2) MÉRITO. (2.1) ALEGAÇÃO DE QUE ADERIU À APÓLICE COM COBERTURA TAMBÉM PARA INVALIDEZ POR DOENÇA. NÃO ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVA NESSE SENTIDO. INFORMAÇÃO PRESTADA PELA ESTIPULANTE, ALIÁS, QUE REVELA QUE A AUTORA NÃO FAZIA PARTE DO GRUPO SEGURADO DE APÓLICE COM COBERTURA PARA INVALIDEZ FUNCIONAL POR DOENÇA. AUTORA QUE FAZ JUS APENAS À COBERTURA DE INVALIDEZ POR ACIDENTE.(2.2) SUSTENTADA A POSSIBILIDADE DE EQUIPARAÇÃO DE DOENÇA OCUPACIONAL À ACIDENTE PESSOAL. REJEIÇÃO. ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ASSENTANDO QUE O DEVER DE INFORMAÇÃO NOS CONTRATOS DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO É DA SEGURADORA, E NÃO DA ESTIPULANTE. OBRIGAÇÃO NÃO CUMPRIDA PELA SEGURADORA. CIRCUNSTÂNCIA, TODAVIA, QUE NÃO ALTERA O ENTENDIMENTO DA CÂMARA ACERCA DA VALIDADE DAS CLÁUSULAS RESTRITIVAS. CARACTERÍSTICA ELEMENTAR DESSE TIPO DE CONTRATO, QUE SE PAUTA PELA QUANTIFICAÇÃO DO DANO E PELA NOÇÃO DE RISCOS EXCLUÍDOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA MUTUALIDADE. LIMITAÇÕES QUE NÃO REPRESENTAM VIOLAÇÃO AOS PRECEITOS CONSUMERISTAS. Não é razoável que o beneficiário de contrato de seguro em grupo pretenda indenização total do valor da apólice...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT