Acórdão Nº 0312425-58.2015.8.24.0020 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 31-03-2022

Número do processo0312425-58.2015.8.24.0020
Data31 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0312425-58.2015.8.24.0020/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: BRASIL-IP SUL TELECOMUNICACOES LTDA ADVOGADO: ANTONIO CARLOS NEVES DE SOUZA (OAB SC035643) APELANTE: CLARO TELECOM PARTICIPACOES S/A ADVOGADO: Tatiana Campos Matos (OAB MG100244) APELANTE: EMBRATEL TVSAT TELECOMUNICACOES SA ADVOGADO: MAXIMILIANO AMARAL DE SOUZA ARRUDA (OAB RJ169790) RÉU: OS MESMOS

RELATÓRIO

Brasil-IP Sul Telecomunicações Ltda, Embratel TVSAT Telecomunicações Ltda e Claro Telecom Participações S/A interpuseram recursos de apelação da sentença proferida pelo juízo da 2ª Vara Cível da comarca de Criciúma, que julgou improcedentes os pedidos da "ação de cobrança c/c indenização por dano moral", o que se deu nos seguintes termos (evento 147/1G):

Brasil-ip Sul Telecomunicacões Ltda ajuizou ação em face de Claro S/A e Embratel TVSAT Telecomunicações Ltda, afirmando que firmou contrato de prestação de serviços, cujo objetivo era a representação comercial, por meio de instalação e distribuição dos serviços fornecidos pelas rés, todavia, houve imposição de obrigações em seu desfavor que oneraram sua situação financeira, de modo que a ré rescindiu o contrato, sem, contudo, repassar os valores corretos ao representante, requerendo além do pagamento dos mesmos, indenização pelo dano moral sofrido.

As rés foram citadas, afirmando que a inicial não está instruída com o documento essencial à sua propositura, a saber, o contrato firmado entre as partes e o respectivo termo da rescisão, arguiu prescrição do direito invocado, relativamente aos valores reclamados para o ano de 2009 e de 2/10/2012. Disse que há previsão contratual para os atos por si praticados, entendendo ser incabível a aplicação do código consumerista para o caso, afastando, ainda, a obrigação de indenizar o dano moral.

O autor contrariou a defesa.

Produziu-se prova testemunhal.

As partes apresentarem alegações finais.

É o relatório.

Decido.

[...].

Por todo o exposto, com fulcro no art. 477, CC, julgo improcedentes os pedidos.

Condeno o autor no pagamento de custas e honorários advocatícios que arbitro em R$3.500, 00 (três mil e quinhentos reais), com fulcro no art. 85, §8º, CPC.. P. R. I.

Com o trânsito em julgado, arquive-se.

Da sentença, os réus opuseram embargos de declaração (evento 152/1G), os quais foram julgados improcedentes (evento 154/1G).

Ambas as partes, manifestaram irresignação quanto ao decido na sentença, mediante recurso de apelação.

A autora, em suas razões recursais (evento 162/1G, apelação 227), sustenta, em síntese, que: (a) faz jus à gratuidade da justiça, devendo ser dispensada a comprovação do recolhimento do preparo; (b) é cristalina a abusividade praticada pelas apeladas durante a permanência do contrato; (c) impuseram a abertura de filiais nas cidades de Joinville, Curitiba, além da alteração da sede do estabelecimento para Tubarão; (c) também precisou alterar seu contrato social; (d) sequer o valor incontroverso da rescisão contratual foi lhe repassado; (e) o total devido até o término do prazo da representação é de R$ 40.000,00; (f) quanto aos estornos, nos contratos de representação comercial, é vedada a utilização de cláusula del credere; (g) todos os atos abusivos praticados pelas rés resultam no dever de indenizar o abalo moral sofrido pela recorrente. Ao final, pugnou pelo provimento do recurso para, em reforma da sentença, julgar procedentes os pedidos da ação.

As rés, a seu turno, interpuseram apelação cível no evento 168/1G, insurgindo-se apenas em relação ao valor dos honorários de sucumbência, afirmando haver sido fixado por apreciação equitativa e em quantia irrisória. Reclamam que deve ser arbitrado em percentual do valor da causa, conforme determina o art. 85, § 2º, do CPC.

Contrarrazões (eventos 170/1G e 174/1G).

Os autos ascenderam ao Tribunal de Justiça e foram distribuídos a esta relatoria, por prevenção (evento 177/1G).

Pelo despacho do evento 179/1G, foi deferida a retificação do cadastro da ré Claro S/A.

Diante do pedido de gratuidade da justiça pela parte autora, foi determinada a juntada de documentos (evento 18/2G), cumprida no evento 28/2G, sendo a benesse indeferida pela decisão do evento 43/2G, oportunizado o pagamento do preparo recursal.

O pedido de reconsideração (evento 48/2G) foi indeferido (evento 53/2G), abrindo-se prazo para o pagamento em dobro do preparo recursal, cujo comprovante de pagamento aportou no evento 61/2G.

Retornaram os autos conclusos.

Este é o relatório.

VOTO

1. Exame de admissibilidade

Inicialmente, registra-se que se tratam de recursos de apelação interpostos da sentença prolatada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, motivo pelo qual é este diploma processual que disciplina o cabimento, o processamento e a análise dos presentes recursos, por aplicação do princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais).

Por presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço dos recursos de apelação.

2. Fundamentação

2.1 Do recurso da autora - evento 162/1G

2.1.1 Da devolução de valores

Insurge-se a autora-apelante sob o fundamento, em resumo, de que a cláusula del credere é ilegal nos contratos de representação comercial, devendo as rés serem condenadas ao reembolso dos valores indevidamente estornados.

Antes de adentrar na análise do mérito do recurso, cumpre anotar que a demanda ajuizada na origem é de de cobrança cumulada com indenização por danos morais, na qual a autora pleiteia o pagamento dos valores relativos aos estornos indevidos, impostos pagos em duplicidade e reparação pelo abalo moral.

Neste sentido, argumenta a autora, na peça exordial, textualmente (evento 1/1G):

"Diante de diversas reclamações do REQUERENTE ao requerido por causa da insatisfação dos estornos totalmente injustos, a requerida quis fazer a rescisão do contrato para com este, conforme documento anexo, entretanto ao analisar o contrato, além de ter efetuado diversos estornos totalmente ilegal, queriam rescindir o contrato efetuando o pagamento de apenas R$ 25.562,50 (vinte e cinco mil quinhentos e sessenta e dois reais e cinquenta centavos), quando na verdade o requerente tinha por direito receber o valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) dos últimos dois meses de prestação de serviço. Diante de todo o exposto, vem o REQUERENTE requerer judicialmente a cobrança dos estornos realizados injustamente, dos impostos cobrados duplamente bem como uma reparação de indenização pelo dano moral sofrido. (evento 1/1G, petição inicial 1) [grifou-se]

Ao final, requereu:

c) No mérito, Requer a total procedência da presente ação para condenar as requeridas a pagarem em dobro todos os estornos indevidos que realizaram durante o período contratual, e que serão calculados em liquidação de sentença, Requerendo ainda o pagamento de indenização por danos morais ao REQUERENTE no valor de 40 (quarenta) salários mínimos, qual seja, R$ 31.520,00 (trinta e um mil quinhentos e vinte reais) diante de todo o dano que sofreu durante a relação contratual;[...];e) Requer sejam as requeridas condenadas a efetuarem o pagamento no valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) em relação ao termo de distrato e quitação, valor este que deve ser totalmente atualizados com juros e correção monetária desde a época dos fatos;f) Seja as requeridas condenadas a ressarcir todos os estornos que efetuaram injustamente da folha de pagamento do requerido, valor este que deverá ser calculado em liquidação de sentença, mediante a apresentação de todas as folhas de pagamentos que deverão ser apresentadas pela requeridas, sob pena de revelia; (evento 1/1G, petição inicial 1)

A sentença de improcedência é fundamentada na ausência de demonstração pela autora de como chegou ao montante de R$ 40.000,00, bem como que o contrato foi livremente pactuado entre as partes, o qual dispõe expressamente acerca do dever de estorno (evento 147/1G).

Adianta-se que, não obstante a conclusão do juízo da origem, razão parcial assiste à parte recorrente, conforme vai adiante explicado.

É incontroverso que as partes celebraram, em 24-1-2011, "CONTRATO DE CREDENCIAMENTO DE PARCEIROS VIA EMBRATEL E OUTRAS AVENÇAS" e "CONTRATO DE CONSTITUIÇÃO DE RELAÇÕES COMERCIAIS - AA, REGULAMENTO DE REMUNERAÇÃO CANAL CORPORATIVO" (evento 71/1G), nos quais há previsão do ônus atribuído à empresa autora (representante), de estornar o valor da comissão quando o novo cliente cancelar a contratação, disposição que se amolda com a cláusula "del credere", entendida com a disposição contratual que confere à parte representada a possibilidade de descontar, do representante, o valor das comissões a que o representante faz jus, no caso de a venda ser cancelada.

Na conceituação de André Luiz Santa Cruz Ramos: "A representação comercial autônoma é modalidade especial de contrato de colaboração em que o colaborador, chamado de representante, assume a incumbência de obter pedidos de compra e venda para os produtos comercializados pelo colaborado, chamado de representado. Trata-se de contrato que possui regulamentação legal específica (Lei 4.886/1965, que sofreu relevantes alterações provocadas pela Lei 8.420/1992)". (Direito empresarial esquematizado. - 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2016. p. 623)

Com efeito, o art. 43 da Lei n. 4.886/65, que regula a atividade dos representantes comerciais, dispõe:

Art. 43. É vedada no contrato de representação comercial a inclusão de cláusulas del credere.

Fábio Ulhoa Coelho, ao lecionar sobre a cláusula del credere nos contratos de comissão mercantil, cujo conceito também se aplica aos contratos de representação comercial, pondera:

É claro que, mesmo na comissão del credere, os riscos não relacionados ao cumprimento da obrigação pelo comprador ainda permanecem sob a conta do comitente. Se a mercadoria apresentar vícios e, por este motivo, o comprador rescindir a compra e venda ou exigir redução proporcional do preço, arcará o comitente com os encargos correspondentes, inclusive o...

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