Acórdão Nº 0312883-75.2015.8.24.0020 do Sexta Câmara de Direito Civil, 20-10-2020

Número do processo0312883-75.2015.8.24.0020
Data20 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0312883-75.2015.8.24.0020, de Criciúma

Relator: Desembargador André Luiz Dacol

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. ASSERÇÃO DE ABALO À HONRA E IMAGEM. AVENTADA PRÁTICA DE ATO ILÍCITO PELAS REQUERIDAS DECORRENTE DE PUBLICAÇÕES DE MATÉRIAS COM USO INDEVIDO DE IMAGENS DO AUTOR EM LOCAL PÚBLICO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.

RECURSO DA PARTE AUTORA. ADMISSIBILIDADE. 1) PLEITO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA. BENEPLÁCITO JÁ DEFERIDO EM PRIMEIRO GRAU. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO, NO PONTO. 2) PEDIDO GENÉRICO DE CONDENAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO NAS RAZÕES DO RECLAMO. FALTA DE DIALETICIDADE RECURSAL DO PLEITO. NÃO CONHECIMENTO NO PONTO. 3) AVENTADO NÃO CONHECIMENTO DO APELO PELA RECORRIDA, SOB O ARGUMENTO DO NÃO CABIMENTO DE RECURSO INOMINADO NA HIPÓTESE. REJEIÇÃO. RECORRENTE QUE UTILIZOU O TERMO "APELAR" INERENTE AO RECLAMO CABÍVEL. ADEMAIS, APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE NO CASO EM TELA. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. PREFACIAL RECHAÇADA.

MÉRITO. PRETENSÃO DE REFORMA DA SENTENÇA SOB O ARGUMENTO DE QUE AS REPORTAGENS PUBLICADAS COM O USO DE IMAGENS DO DEMANDANTE EXTRAPOLARAM OS LIMITES DA LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO. SUBSISTÊNCIA. MATÉRIAS JORNALÍSTICAS PUBLICADAS PELAS REQUERIDAS COM A DIVULGAÇÃO DE FOTOS DO AUTOR QUE SE ENCONTRAVA TOTALMENTE DESPIDO EM UM MONUMENTO PÚBLICO DA CIDADE DE CRICIÚMA-SC, SEM AUTORIZAÇÃO E SEM A UTILIZAÇÃO DE TARJAS PARA RESGUARDAR SUA NUDEZ E INTIMIDADE. CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DE ACORDO COM A ANÁLISE DAS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. TERCEIRA DEMANDADA QUE REPLICOU A NOTÍCIA AINDA ACRESCENDO QUE O REQUERENTE ESTARIA REALIZANDO UM "PROTESTO CURIOSO". INFORMAÇÃO INVERÍDICA. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O DEMANDANTE PADECE DE ESQUIZOFRENIA PARANÓIDE, TENDO SOFRIDO UM SURTO PSICÓTICO NO DIA DOS FATOS. PUBLICAÇÕES COM EXPOSIÇÃO NÃO AUTORIZADA E DESNECESSÁRIA DA NUDEZ DO AUTOR SEM AUTORIZAÇÃO E SEM TARJAS PARA RESGUARDAR SUA INTIMIDADE. EXTRAPOLAÇÃO DOS DIREITOS À INFORMAÇÃO E À LIBERDADE DE EXPRESSÃO. VIOLAÇÃO DO DIREITO À HONRA E À IMAGEM. ILÍCITO CARACTERIZADO. DANO CONFIGURADO. NEXO CAUSAL EVIDENCIADO. REQUISITOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL PRESENTES. DEVER DE INDENIZAR EXISTENTE. SENTENÇA REFORMADA.

QUANTUM INDENIZATÓRIO. OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ANÁLISE CONFORME AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO.

ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. REDISTRIBUIÇÃO.

RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0312883-75.2015.8.24.0020, da comarca de Criciúma 1ª Vara Cível em que é Apelante Alam Spacek Cardoso e Apelados Radio Eldorado e outros.

A Sexta Câmara de Direito Civil decidiu, em sessão extraordinária virtual, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa extensão, dar-lhe provimento.

Presidiu o julgamento, realizado nesta data, a Exma. Sra. Desa. Denise Volpato, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. André Carvalho.

Funcionou como Representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Jacson Corrêa.

Florianópolis, 20 de outubro de 2020.

Desembargador André Luiz Dacol

Relator


RELATÓRIO

Em atenção aos princípios da celeridade e economia processuais, adota-se o relatório da sentença, transcrito na íntegra, por refletir com fidelidade o trâmite processual na origem:

Alam Spacek Cardoso, devidamente qualificado, por sua curadora Maria Margarete Spacek, ingressou com a presente Ação de Indenização por Danos Morais em face de Radio Difusora, JI News e Radio Eldorado, todas também qualificadas, ao argumento de que sofre de quadro psicótico esquizofrênico paranóico e, após sofrer um quadro de delírio, saindo sem roupas pelas ruas da cidade. Ocorre que as rés publicaram o acontecimento, inclusive divulgando diversas fotos do autor sem roupa e sem a devida tarja para cobrir as partes intimas. Segundo o autor, a atitude das rés extrapolou o direito à informação, vindo a ofender os direitos de intimidade do autor. Assim, requereu a condenação das rés a indenizar o autor pelos danos morais suportados, dos honorários contratuais dispendidos e, ainda, dos ônus da sucumbência.

Valorou a causa e juntou documentos.

Recebida a inicial, foi determinada a citação das rés.

Devidamente citada, a ré JI NEWS apresentou defesa, na forma de contestação, alegando que a Constituição Federal garante o direito de manifestação e expressão, que a notícia veiculada sobre o autor não pretendia ofender o autor, tampouco tinha "intenção maliciosa ou de conotação sensacionalista e vexatória", havendo apenas intenção de noticiar e informar o público, tanto que não indicado o nome ou características do autor. Ao final, afirmando a responsabilidade do curador pelo curatelado, postulou a improcedência do pedido, com a inversão dos ônus de sucumbência.

Acostou documentos.

A Rádio Difusora, por sua vez e no mesmo sentido, apresentou contestação, aduzindo, em síntese, que a petição inicial não apresenta qualquer prova dos fatos noticiados, tampouco os descrevendo, sendo, pois, inepta. No mérito, disse que não publicou os fatos envolvendo o autor, tampouco agiu de qualquer modo que o viesse a prejudicar; que o autor estava em local público e movimentado; e que exerceu o direito de liberdade de imprensa. Finalmente, postulou a improcedência do pedido, com a condenação do autor nos consectários legais, ou, alternativamente, a fixação do "quantum" em patamar razoável.

Apresentou documentos.

A Rádio Eldorado deixou transcorrer "in albis" o prazo de defesa (certidão de fl. 118).

Manifestação do Ministério Público pela improcedência do pedido.

Nova manifestação da parte autora.

A sentença, lavrada às fls. 137-144, decidiu da seguinte forma:

Isso posto, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado por Alam Spacek Cardoso na presente Ação de Indenização por Danos Morais movida em face do Radio Difusora, JI News e Radio Eldorado, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno o autor ao pagamento das custas e honorários, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC, observado o disposto no art. 98, § 3º, do mesmo Codex.

Opostos embargos de declaração pelo demandante, estes foram acolhidos para deferir a benesse da gratuidade da justiça postulada.

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação (fls. 148-168).

Primeiramente, pleiteou a concessão da benesse da gratuidade judiciária, sob o argumento de que não possui condições financeiras para arcas com as custas processuais e honorários advocatícios sem prejuízo próprio ou de sua família.

Em suas razões, sustentou que resta configurado o abalo anímico em face do ato ilícito cometido pelo apelado. Nesse viés, alegou que "o que se discute aqui, não é direito que as rés tem em publicar ou não os fatos ocorridos, não pleiteia o autor a condenação das mesmas tendo em vista a veiculação de suas foto em si, e nem culpa-las pela repercussão e nem se apoiar em sua patologia. O que se discute, é se as rés deveriam ou não ter tomado às medidas cabíveis, a fim de resguardar a nudez do autor." (fl. 155).

Asseverou que outros sites e jornais da região publicaram o fato ocorrido, todavia taparam as partes íntimas, em atitude profissional, conduta não exercida pelas requeridas. Defendeu assim que "urge a necessidade de Vossa Excelência em prestar a devida tutela jurisdicional para compelir as empresas rés a pagar ao autor uma indenização pelos danos morais e materiais sofridos." (fl. 156).

Por fim, postulou o provimento do recurso.

Contrarrazões pela requerida Rádio Difusora de Içara Ltda - ME às fls. 167-179. Prefacialmente, aventou que o apelo não merece conhecimento, sob o argumento da tese de erro na interposição do recurso, aduzindo não ser cabível recurso inominado na hipótese, tampouco a aplicação do princípio da fungibilidade. No mérito, manifestou-se pela manutenção do decisum recorrido.

Lavrou parecer pela Douta Procuradoria Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Procurador de Justiça Paulo Cezar Ramos de Oliveira, manifestando-se pelo "parcial provimento do recurso de apelação interposto, reformando-se a sentença apenas no sentido de fixar o quantum indenizatório a título de danos morais no importe de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para o apelante" (fl. 200).

Vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.


VOTO

1. O conhecimento de um recurso demanda a conjugação dos diversos requisitos de admissibilidade (intrínsecos: cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer; e extrínsecos: regularidade formal, tempestividade) previstos na lei, de forma implícita ou explícita.

No tocante ao recurso interposto parte autora, esta pugnou pela concessão do benefício da justiça gratuita, o que já foi deferido em primeiro grau, por meio da decisão de embargos de declaração (fls. 8-9 - dos autos 0004740-68.2018.8.24.0020 - em apenso). Considerando que a benesse é válida durante toda tramitação da causa, desde que, por óbvio, não revogada, deixo de analisar o recurso no ponto, por ausência de interesse recursal.

Neste sentido, colhe-se julgado desta Corte:

APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO OBRIGATÓRIO DPVAT. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. [...] 2. RECURSO ADESIVO DA AUTORA. PEDIDO DE CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA. BENESSE JÁ DEFERIDA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. APELO NÃO CONHECIDO NESTE PARTICULAR. [...] ADESIVO DA DEMANDANTE NÃO CONHECIDO, POIS PREJUDICADO. (Apelação Cível n. 0006375-12.2013.8.24.0036, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Raulino Jacó Brüning, j. 23-2-2017).Os demais pressupostos de admissibilidade estão presentes, ao que conheço parcialmente do recurso. (grifo nosso)

E ainda:

Tendo sido deferidas as benesses da gratuidade da Justiça por ocasião do recebimento da inicial,...

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