Acórdão Nº 0313044-85.2015.8.24.0020 do Sétima Câmara de Direito Civil, 29-10-2020

Número do processo0313044-85.2015.8.24.0020
Data29 Outubro 2020
Tribunal de OrigemCriciúma
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



Apelação Cível n. 0313044-85.2015.8.24.0020


Apelação Cível n. 0313044-85.2015.8.24.0020, de Criciúma

Relatora: Desembargadora Haidée Denise Grin

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COMINATÓRIA C/C CONDENATÓRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO RÉU.

PLEITO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA INCORPORADORA A QUE VINCULADO O APELANTE. DEMANDA RECUPERACIONAL JÁ SENTENCIADA E ENCERRADA. INCIDÊNCIA DO ART. 6º DA LEI N. 11.101/05 QUE NÃO MAIS SUBSISTE. PEDIDO AFASTADO.

MÉRITO. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. SENTENÇA QUE DETERMINOU A CONCLUSÃO DO EMPREENDIMENTO NO PRAZO DE 6 (SEIS) MESES SOB PENA DE MULTA DIÁRIA. RECORRENTE QUE BUSCA O AFASTAMENTO DA ASTREINTE EM RAZÃO DA CRISE FINANCEIRA QUE ASSOLA O GRUPO ECONÔMICO DO QUAL FAZ PARTE. INSUBSISTÊNCIA. ESCASSEZ DE RECURSOS QUE É EVENTO PREVISÍVEL E INERENTE AO RISCO DA ATIVIDADE DESENVOLVIDA. CONSUMIDOR QUE NÃO PODE SER PENALIZADO PELA MÁ-GESTÃO DO PATRIMÔNIO DO FORNECEDOR. AFASTAMENTO DA MULTA POR DESCUMPRIMENTO QUE ESVAZIARIA O PROVIMENTO JUDICIAL DE EFICÁCIA E TORNARIA INÓCUA A DEMANDA. DECISUM MANTIDO NO PONTO.

"As intempéries não associadas a eventos climáticos surpreendentes e catastróficos, malgrado possam figurar como incontroláveis, encontram-se na esfera de previsibilidade do empreendedor, fazendo, portanto, parte do risco assumido ao desenvolver uma atividade no setor de consumo. [...] Outrossim, não é viável repassar ao consumidor o ônus das dificuldades financeiras por que passa a edificante, a quem também incumbe prever a possibilidade de eventuais embaraços econômicos, ao estabelecer a data para entrega do imóvel e assumir a responsabilidade por edificá-lo, porque cabia a si adotar procedimentos que lhe propiciassem higidez financeira" (TJSC, Apelação Cível n. 0000869-64.2019.8.24.0062, rel. Luiz Cézar Medeiros, 5ª Câmara de Direito Civil, j. 11-08-2020).

MULTA CONTRATUAL. NEGÓCIO JURÍDICO QUE PREVÊ CLÁUSULA PENAL APENAS EM DESFAVOR DA PROMISSÁRIA COMPRADORA. DISPOSIÇÃO ABUSIVA. DESVANTAGEM EXAGERADA DO CONSUMIDOR. ART. 51, IV, DO CDC. INVERSÃO DA PENALIDADE CONTRA O PROMITENTE VENDEDOR. MEDIDA DESTINADA AO REEQUILÍBRIO DA AVENÇA. CAPÍTULO DA SENTENÇA MANTIDO.

"No contrato de adesão firmado entre o comprador e a construtora/incorporadora, havendo previsão de cláusula penal apenas para o inadimplemento do adquirente, deverá ela ser considerada para a fixação da indenização pelo inadimplemento do vendedor" (STJ, REsp 1631485/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 22/05/2019).

DANOS MORAIS. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL QUE, COMO REGRA, NÃO ACARRETA PREJUÍZO EXTRAPATRIMONIAL INDENIZÁVEL. ATRASO EXACERBADO E EXPRESSIVO NA DISPONIBILIZAÇÃO DO IMÓVEL AO PROMISSÁRIO COMPRADOR QUE, TODAVIA, PODE DAR ENSEJO À INDENIZAÇÃO POR ABALO ANÍMICO. CASO CONCRETO EM QUE O BEM DEVERIA TER SIDO ENTREGUE HÁ MAIS DE 5 (CINCO) ANOS. DESÍDIA DO APELANTE QUE PROLONGOU O INCÔMODO E A FRUSTRAÇÃO DA APELADA POR LAPSO TEMPORAL EXCESSIVO E IMODERADO. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA O MERO DISSABOR COTIDIANO. DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO. CONDENAÇÃO MANTIDA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. VERBA FIXADA EM R$ 20.000,00 (VINTE MIL REAIS) NA ORIGEM. PLEITO SUBSIDIÁRIO DE MINORAÇÃO. VIABILIDADE. FRAGILIDADE ECONÔMICA DO RECORRENTE. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE OUTROS FATORES QUE TENHAM CONTRIBUÍDO PARA O ABALO ANÍMICO DA RECORRIDA. MONTANTE CONDENATÓRIO QUE COMPORTA REDUÇÃO PARA R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS). ADEQUAÇÃO DO ÉDITO NO PONTO.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0313044-85.2015.8.24.0020, da comarca de Criciúma 2ª Vara Cível em que é Apelante Edifício Residencial Basílio Borba Empreendimento Imobiliário Lltda e Apelada Thaissa Lopes de Jesus.

A Sétima Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Custas legais.

O julgamento realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Álvaro Luiz Pereira de Andrade (com voto) e dele participou a Exma. Desa. Haidée Denise Grin, o Exmo. Des. Carlos Roberto da Silva.

Florianópolis, 29 de outubro de 2020.

Desembargadora Haidée Denise Grin

Relatora


RELATÓRIO

Forte no princípio da celeridade e utilizando das ferramentas informatizadas, adota-se o relatório da sentença recorrida (pp. 151-154), por sintetizar o conteúdo dos autos, in verbis:

Thaissa Lopes de Jesus aforou ação contra Edifício Residencial Bazílio Borba Empreendimento Imobiliário Ltda., alegando, em síntese, que firmou contrato de promessa de compra e venda de um apartamento a ser localizado em prédio a ser construído pelo réu, porém, apesar de a autora já ter quitado praticamente todas as parcelas contratadas, o réu não cumpriu com os prazos contratados, razão pela qual postula que o demandado seja instado a concluir a edificação, condenado a pagamento da multa contratual e indenização por danos morais.

O pedido de tutela antecipada foi indeferido.

O réu apresentou resposta em forma de contestação, aduzindo que está ligado ao grupo Cizeski, cujo processo de recuperação judicial foi deferido, postulando a suspensão desta demanda, discorrendo sobre sua situação financeira e dificuldades em que se encontra, acrescentando argumentos sobre o princípio da obrigatoriedade dos contratos e que não há previsão na avença firmada com a demandante de pagamento de qualquer espécie de indenização, além de insurgir-se contra o pleito de compensação por danos morais.

A autora manifestou-se sobre a resposta ofertada.

O Juiz de Direito Ricardo Machado de Andrade acolheu os pedidos exordiais, constando do dispositivo do decisum:

Pelo exposto, e com base nos arts. 104, 186 e 927, todos do CC, julgo procedente o pedido e, em consequência:

a) Deverá o réu concluir a obra pela qual se obrigou no contrato de fls. 14/23 no prazo de 06 (seis) meses, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), limitada à quantia de R$ 100.000,00 (cem mil reais);

b) Condeno o réu no pagamento da multa de 2% incidente sobre o valor total do contrato;

c) Condeno também o réu a pagar à autora a quantia de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de danos morais, devendo este valor ser corrigido monetariamente e acrescido de juros de mora, tudo a partir de 15/04/2015.

Condeno, ainda, o réu, no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor da condenação, conforme art. 85 § 2º do CPC.

P. R. I.

Irresignado, o réu interpôs recurso de apelação (pp. 158-170). Reiterou a necessidade de suspensão do processo, nos termos do artigo 6º da Lei n. 11.101/05, em razão de estar vinculado à recuperação judicial da RCF Incorporadora Ltda. No mérito, teceu comentários sobre a crise financeira que assola o grupo econômico do qual faz parte. Aduziu que a determinação de entrega do empreendimento sob pena de multa, na forma em que estabelecida pelo juízo a quo, prejudica o andamento da reestruturação econômica do referido grupo. Sustentou a impossibilidade de incidência da multa contratual em seu desfavor, tendo em vista que a penalidade foi pactuada apenas para a hipótese de inadimplemento da compradora acionante. No mais, defendeu a inocorrência de dano moral indenizável no caso concreto e afirmou ser excessivo o quantum indenizatório fixado na origem. À luz de tais considerações, pugnou pela reforma da sentença para que os pedidos autorais sejam rejeitados ou, subsidiariamente, para que a indenização arbitrada pelo juízo a quo seja minorada.

Com as contrarrazões (pp. 226-233), os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.

De início, rejeita-se o pedido de suspensão do processo formulado às pp. 160-161, uma vez que a recuperação judicial da RCF Incorporadora Ltda., a que estava vinculado o recorrente, já se encontra sentenciada e encerrada (pp. 8.138-8.149 dos autos n. 0313630-25.2015.8.24.0020), não mais subsistindo motivo para incidência do artigo 6º da Lei n. 11.101/05 à espécie.

Passa-se, pois, à análise do mérito recursal.

Trata-se de apelação cível interposta pelo réu com o objetivo de reformar a sentença que determinou a conclusão da obra objeto do contrato firmado entre as partes e o condenou ao pagamento de multa contratual e de indenização por danos morais em favor da autora.

No tocante à obrigação de fazer, o apelante sustenta que a determinação de entrega do empreendimento sob pena de multa, na forma em que estabelecida pelo juízo a quo, prejudica o andamento da reestruturação financeira do grupo econômico do qual faz parte. Não obstante, a crise por si enfrentada não pode ser invocada como causa excludente da responsabilidade pelo cumprimento das obrigações assumidas no contrato litigioso, tendo em vista que a escassez de recursos é evento previsível e inerente ao risco da atividade desenvolvida. Com efeito, não pode o consumidor ser penalizado pela má-gestão do patrimônio do fornecedor, que deve efetivamente responder pelos danos advindos de suas condutas, sejam elas comissivas ou omissivas.

A propósito:

CIVIL - PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - ATRASO NA EDIFICAÇÃO - INTEMPÉRIES CLIMÁTICAS - EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE NÃO COMPROVADA - POSTERIOR INVIABILIDADE NA CONTINUIDADE DA OBRA - RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA EMPRESA - DIFICULDADES ECONÔMICAS - ÔNUS QUE NÃO PODE SER REPASSADO AO CONSUMIDOR - RECONHECIDA CULPA PELA RESCISÃO DO NEGÓCIO

1 As intempéries não associadas a eventos climáticos surpreendentes e catastróficos, malgrado possam figurar como incontroláveis, encontram-se na esfera de previsibilidade do empreendedor, fazendo, portanto, parte do risco assumido ao desenvolver uma atividade no setor de consumo.

2 Outrossim, não é viável repassar ao consumidor o ônus das dificuldades financeiras por que passa a edificante, a...

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