Acórdão Nº 0313566-26.2016.8.24.0005 do Quarta Câmara de Direito Comercial, 15-12-2020

Número do processo0313566-26.2016.8.24.0005
Data15 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0313566-26.2016.8.24.0005, de Balneário Camboriú

Relatora: Desa. Janice Ubialli

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REGRESSIVA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO RÉU.

PRELIMINAR EM CONTRARRAZÕES. OFENSA À DIALETICIDADE. NÃO ACOLHIMENTO.

OBRIGAÇÃO DE REGRESSO PREVISTA EM CONTRATO PARTICULAR DE CESSÃO DE COTAS SOCIAIS E OUTRAS AVENÇAS EM FAVOR DO RÉU (PESSOA FÍSICA). POSTERIOR CESSÃO DAS REFERIDAS COTAS SOCIAIS, PELOS MESMOS CEDENTES, DESTA VEZ POR INSTRUMENTO PÚBLICO E EM FAVOR DE PESSOA JURÍDICA ESTRANGEIRA, FIGURANDO O RÉU COMO MERO GARANTIDOR. SENTENÇA QUE RECONHECEU O RÉU COMO "DONO" DA PESSOA JURÍDICA CESSIONÁRIA E, POR ISSO, VÁLIDO O PRIMEIRO CONTRATO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. ACOLHIMENTO. INOBSERVÂNCIA AOS ARTS. 338 E 339 DO CPC. ALEGADA ILEGITIMIDADE E FALTA DE RESPONSABILIDADE PELO RESSARCIMENTO INVOCADO. EMENDA DA INICIAL NÃO FACULTADA PARA EVENTUAL SUBSTITUIÇÃO DO POLO PASSIVO OU INCLUSÃO DA SUPOSTA RESPONSÁVEL (PESSOA JURÍDICA CESSIONÁRIA) COMO LITISCONSORTE. ADEMAIS, IMPLÍCITA CONFUSÃO DA PESSOA JURÍDICA COM A PESSOA FÍSICA. IMPRESCINDIBILIDADE DE INSTAURAÇÃO DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DE PERSONALIDADE JURÍDICA PARA ESSE FIM. SENTENÇA CASSADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0313566-26.2016.8.24.0005, da comarca de Balneário Camboriú (2ª Vara Cível), em que é Apelante Renato Werner e Apelado Ivens Freitag, Ivone Altenburg Freitag e Francisco Amaury:

A Quarta Câmara de Direito Comercial decidiu, em julgamento estendido, na forma do artigo 942 do Código de Processo Civil, por maioria de votos, dar provimento ao recurso para cassar a sentença e reconhecer a nulidade processual a partir do oferecimento da contestação, vencido o Exmo. Des. Torres Marques, que votou no sentido de julgar improcedentes os pedidos contidos na medida regressiva. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. José Antônio Torres Marques, com voto, e dele participaram os Exmos. Des. Sérgio Izidoro Heil, Des. José Carlos Carstens Köhler e Des. José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 15 de dezembro de 2020.

Janice Ubialli

Relatora


RELATÓRIO

Cuida-se de Apelação Cível interposta por Renato Werner da sentença proferida nos autos da Ação Regressiva n. 0313566-26.2016.8.24.0005, aforada por Ivens Freitag, Ivone Altenburg Freitag e Francisco Amaury. O decisório recorrido contou com a seguinte parte dispositiva:

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para CONDENAR o réu à pagar aos autores os valores descritos no acordo de pp. 32-34, tanto aqueles vencidos e já quitados, como os que se vencerem enquanto durar a obrigação, conforme disposto no art. 323 do CPC, corrigidos monetariamente desde o vencimento de cada parcela e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

Condeno o réu ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC.

Embargos de declaração às p. 564-566, acolhidos em parte para afastar a preliminar de ilegitimidade ativa de Francisco Amaury (p. 592-594).

Petição às p. 579-589, pugnando pela concessão de tutela de urgência consistente em protesto contra alienação de bens.

Às p. 598, o juízo de origem deixou de analisar o pedido, por entender que cabe ao Tribunal de Justiça analisar o pleito de tutela de urgência.

O apelante sustenta, em preliminar, que: a) a decisão de primeiro grau extrapolou os limites objetivos e subjetivos da lide, incorrendo em nulidade; b) não há como admitir que a parte autora altere a causa de pedir após a estabilização da demanda; c) ainda que se admitisse a inovação na causa de pedir, seria necessário, para fins de vinculação do apelante à Rustler Corporation LTD e consequente extensão dos efeitos da cessão de cotas à sua pessoa, a instauração do incidente de desconsideração de personalidade jurídica; d) o apelado Francisco é parte ilegítima para figurar no polo ativo da ação, pois o apelante assumiu somente as obrigações de Ivens Freitag e Ivone Altenburg Freitag.

No mérito, aduz que: a) a conclusão do juízo a quo foi fundamentada exclusivamente no depoimento da testemunha Sidirley Assis Tavarez e no depoimento pessoal do maior interessado, Ivens Freitag; b) eventual prova de que alguém é administrador ou sócio de fato de uma sociedade não pode residir exclusivamente em prova oral, destituída de qualquer início de prova documental; c) o depoimento da parte não faz prova em seu favor e a testemunha Sidirley firmou declaração falsa nestes autos, além de possuir intensa animosidade contra o apelante; d) o apelado Ivens Freitag confessou que, ao transferir suas quotas sociais, não procurou investigar a situação financeira da Rustler, de modo que os supostos prejuízos sofridos são de sua inteira responsabilidade, que não agiu com a cautela e diligência necessárias a esse tipo de operação; e) o instrumento particular de cessão de cotas sociais e outras avenças se tornou ineficaz por causa superveniente, porquanto a cessão destas cotas, posteriormente, foi repassada à Rustler Corporation LTD., no qual o apelante é apenas terceiro garantidor, não assumindo as dívidas dos apelados para com a Téknica Mineração Ltda.; f) a assunção de obrigações de Ivens Freitag e Ivone A. Freitag era obrigação acessória, de sorte que tornando-se ineficaz a obrigação principal (cessão das cotas), tornam-se sem efeito, igualmente, as obrigações acessórias pactuadas; g) ainda que admitido que o instrumento particular celebrado em 18-6-1999 seja eficaz, não há como admitir que os apelados exijam do apelante o cumprimento das obrigações acessórias se até hoje não cumpriram com a obrigação principal do contrato, uma vez que as cotas da Ariribá Mineração Ltda., de propriedade da IF Consultoria Empresarial Ltda., nunca foram transferidas para o apelado; h) os apelados apresentam comportamento contraditório, o que é vedado pelo art. 422 do Código Civil (p. 603-623).

Com as contrarrazões (p. 689-690), os autos ascenderam a esta Corte.

Determinada a remessa dos autos ao Núcleo de Conciliação desta Corte (p. 713), os apelados manifestaram desinteresse na composição (p. 714).

Vieram-me os autos conclusos.

VOTO

Tutela cautelar incidental

Os apelados peticionaram às p. 722-735, requerendo a concessão de "tutela de urgência em sede recursal" para determinação de sequestro e respectiva anotação à margem do registro de 1.897.690 ações preferenciais e 361.617 ações ordinárias emitidas pela empresa Electro Aço Altrona S.A., transferidas pelo apelante à empresa HB Participações Societárias S.A. E, posteriormente à empresa Hoggen Invest. Ltd.

Pois bem. Impende anotar desde logo que a tutela cautelar antecipada tem como finalidade assegurar o direito buscado na ação principal, ou seja, o resultado útil do processo. Para tanto, é necessário que se aponte desde logo o direito que se busca assegurar, vale dizer, o fumus boni iuris - a aparência do bom direito, revelador do seu interesse. E, além da plausibilidade desse direito, a presença do periculum in mora, ou seja o risco ao resultado útil do processo.

Ocorre que a medida cautelar de sequestro, respeitadas as opiniões minoritárias em contrário, tem a finalidade de assegurar o direito quando houver dúvida ou discussão quanto à titularidade de um bem específico e risco de dano ou perecimento à coisa. Vale dizer, tem a finalidade de eliminar o perigo de dano ao interesse que uma parte defende ou defenderá no processo principal sobre de determinado bem. A propósito, é a lição de Pontes de Miranda:

O sequestro seria a apreensão e guarda da coisa, temporariamente, para se assegurar a entrega a alguém quando houver cognição bastante pelo juiz; ou seja, é uma medida que visa à conservação de bens certos e determinados, quando sua propriedades ou posse forem objeto de litígio e esteja sob fundado receio de dano, para ao fim garantir a eficácia do provimento jurisdicional obtido pelas partes (História e Prática do Arresto ou Embargo. 1ª Ed. Campinas. Ed Bookseller. 1999, grifou-se).

No entanto, no caso em apreço, a demanda (ação regressiva) não discute a titularidade (posse ou propriedade) das ações, mas apenas o ressarcimento de dívida paga pelos ora apelados, de modo que a medida adequada para assegurar futura execução é outra que não o sequestro. Isso porque, ainda que constatada a insolvência do ora apelante em eventual execução de sentença de procedência do pedido regressivo, seria impossível a imediata conversão do sequestro em penhora, sem que antes houvesse comando judicial para reverter a titularidade das ações ao agravado.

Portanto, não obstante não seja usual ações de companhia listada em bolsa serem negociadas fora desse ambiente, com deságio de 80% em relação ao preço de mercado, voto no sentido de indeferir o pedido de concessão da tutela cautelar pleiteada pela sua inadequação.

Preliminar em contrarrazões - ofensa à dialeticidade

Em contrarrazões, os apelados pugnaram pelo não conhecimento do recurso ante a ausência de impugnação específica dos fundamentos adotados na sentença.

Todavia, impende anotar, desde logo, que no caso não há ofensa ao princípio da dialeticidade porque do cotejo entre a contestação e as razões da apelação apura-se que, embora a parte recorrente tenha reiterado teses contidas na resposta à exordial, apontou expressamente as questões em que diverge da decisão proferida pelo magistrado a quo.

Portanto, rechaça-se a prefacial suscitada em contrarrazões.

Apelação

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço do recurso.

Preliminarmente, o apelante alega a nulidade da sentença, porquanto não teria o juízo singular observado os limites objetivos e subjetivos da lide. Isso porque, segundo alega, a inicial está lastreada no Contrato...

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