Acórdão Nº 0313744-38.2017.8.24.0005 do Segunda Câmara de Direito Civil, 22-10-2020

Número do processo0313744-38.2017.8.24.0005
Data22 Outubro 2020
Tribunal de OrigemBalneário Camboriú
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



Apelação Cível n. 0313744-38.2017.8.24.0005


Apelação Cível n. 0313744-38.2017.8.24.0005

Relator: Desembargador João Batista Góes Ulysséa

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SEGURO CONDOMINIAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR.

CONTRARRAZÕES. INFRAÇÃO À DIALETICIDADE. INOCORRÊNCIA.

Não viola o princípio da dialeticidade o recurso apelatório que, além de impugnar especificamente os fundamentos da sentença, permite ao órgão ad quem a compreensão da controvérsia.

TUTELA ANTECIPADA. PEDIDO PREJUDICADO, DIANTE DO JULGAMENTO DO MÉRITO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO.

Resta prejudicado o pleito de concessão da tutela antecipada recursal, diante do julgamento do mérito do apelo por este órgão Fracionário.

INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. BENS DE PROPRIEDADE DOS CONDÔMINOS. RISCO EXPRESSAMENTE EXCLUÍDO. DELIMITAÇÃO ADEQUADA (ART. 757 DO CÓDIGO CIVIL). INCIDÊNCIA DO CDC QUE NÃO AMPLIA GARANTIAS. CLÁUSULA RESTRITIVA CLARA E COMPREENSÍVEL. PLEITO INDENIZATÓRIO DESCABIDO.

O contrato de seguro, embora submetido às disposições do Código de Defesa do Consumidor, não autoriza a ampliação das coberturas expressamente previstas na apólice, mormente nas hipóteses em que a exclusão está lançada de forma clara nas condições gerais, tornando incabível a indenização pleiteada.

DANOS MORAIS NÃO PRESUMIDOS. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. ABORRECIMENTO QUE NÃO DEMANDA INDENIZAÇÃO.

O mero descumprimento contratual, representado pela negativa da indenização do seguro, não enseja a reparação por danos morais, já que esta somente é cabível quando comprovada a repercussão na esfera da dignidade do beneficiário do seguro.

RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA FRAÇÃO, DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0313744-38.2017.8.24.0005, da comarca de Balneário Camboriú (4ª Vara Cível) em que é Apelante Marzio Duarte Lenzi e Apelada Mapfre Seguros Gerais S/A.

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer em parte do recurso e, nesta fração, negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado em 22 de outubro de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Rubens Schulz, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desembargadora Rosane Portella Wolff.

Florianópolis, 26 de outubro de 2020.

[assinado digitalmente]

Desembargador João Batista Góes Ulysséa

Relator


RELATÓRIO

Marzio Duarte Lenzi ajuizou ação indenizatória contra Mapfre Seguros Gerais S/A, alegando que, no dia 10-9-2017, o edifício em que reside foi atingido por chamas iniciadas na casa de um vizinho, aniquilando parte do seu imóvel, incluindo todas as suas ferramentas ao labor e outros pertences, perfazendo um prejuízo total de R$ 57.708,00 (cinquenta e sete mil, setecentos e oito reais).

Aduziu que, ao ser acionada a seguradora Requerida pela administradora do condomínio, esta realizou alguns reparos, mas se negou ao ressarcimento dos seus objetos de trabalho e pessoais, como a reforma do fechamento da sacada do imóvel, porque a apólice não cobria danos materiais de terceiros.

Assim, requereu a antecipação dos efeitos da tutela quanto ao ressarcimento pelos danos oriundos aos seus instrumentos de trabalho (R$ 32.871,00) e, ao final, a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos materiais e morais. Pugnou também pela concessão dos benefícios da justiça gratuita e inversão do ônus da prova.

Juntou documentos (fls. 17-30).

Novos documentos pelo Autor às fls. 32-62.

Às fls. 78-80 foi indeferida a tutela do urgência e concedida ao Requerente a benesse da gratuidade judiciária.

Citada (fl. 84), a Requerida ofereceu contestação (fls. 107-138), suscitando, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva e a ilegitimidade ativa. E, no mérito, defendeu indevida a indenização ao Autor, porque não restou caracterizado evento coberto pelo contrato de seguro.

Argumentou que os danos reclamados pelo Requerente se referem ao conteúdo de seu imóvel particular, risco expressamente excluído de cobertura securitária, que engloba, tão somente, o prédio e áreas comuns.

Aduziu que as cláusulas restritivas estão redigidas de forma clara e inteligível, trazendo riscos predeterminados, em consonância com a legislação pátria, não podendo se falar em abusividade ou ilicitude.

Sustentou que o Demandante tinha conhecimento das condições gerais e que o condomínio segurado não contratou cobertura de incêndio ao conteúdo de propriedade individual dos condôminos, o que poderia ter feito por liberalidade própria.

Impugnou os pedidos indenizatórios por danos materiais e morais, inclusive juntando documentos (fls. 144/276), como postulou a extinção do feito ou a improcedência da demanda.

Réplica às fls. 282-285.

Pugnou a Ré pelo julgamento antecipado do feito (fls. 290-292) e o Autor não se manifestou à produção de provas (fl. 293).

Foi proferida sentença (fls. 294-300), julgando improcedentes os pedidos exordiais, condenando-se o Requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade da verba, diante da concessão da gratuidade da justiça.

Irresignado, o Autor interpôs apelação (fls. 304-314), requerendo o provimento do recurso, com a reforma da sentença para julgar procedentes os pedidos iniciais, sustentando que: (a) faz jus à tutela antecipada recursal, visto que o direito lesado pela Ré acarreta no comprometimento do ofício por si exercido, visto que perdeu seus instrumentos de trabalho, com perigo de dano à sua subsistência e de sua família; (b) o contrato firmado entre as partes é de adesão, sendo redigido de forma extremamente confusa, sem previsão explícita e didática acerca dos limites da cobertura securitária, de modo que a Requerida não pode se eximir do pagamento da indenização pela mera alegação de se tratar de bem de terceiro; (c) as cláusulas limitativas devem estar escritas com destaque, permitindo imediata e fácil compreensão, nos termos dos §§ 3º e 4o do art. 54 do CDC, o que não ocorreu, porque na apólice a Apelada apenas remeteu a um sítio eletrônico, pelo que a interpretação deve ocorrer de maneira mais favorável ao consumidor; (d) é parte legítima para figurar na demanda, não se tratando de terceiro, mas de proprietário de apartamento no condomínio segurado; e (e) a situação ultrapassou o simples prejuízo material e a esfera do mero dissabor, porque a falta de ressarcimento dos seus equipamentos inviabilizaram o exercício de sua profissão como músico, fazendo jus à indenização por danos patrimoniais e extrapatrimoniais.

Foram apresentadas contrarrazões (fls. 318-333), com a Apelada postulando o não conhecimento do apelo, por afronta ao princípio da dialeticidade e, no mérito, o seu desprovimento.

Esse é o relatório.


VOTO

Objetiva o Apelante a reforma da sentença que julgou improcedentes os pedidos exordiais, condenando-o ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa a exigibilidade da verba, diante da concessão da gratuidade da justiça.

Embora a Apelada tenha requerido o não conhecimento do recurso por infração ao princípio da dialeticidade, a peça de insurgência preenche os requisitos de admissibilidade, sobretudo porque são compreensíveis as razões de inconformismo, próprias para possibilitar ao órgão ad quem o conhecimento dos temas impugnados e permitir a compreensão do pedido de reforma.

Nesses casos, a jurisprudência é uníssona:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE RESPONSABILIDADE SECURITÁRIA. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA SEGURADORA. DIALETICIDADE. INOCORRÊNCIA DE OFENSA. RECURSO QUE ATACA OS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. DANOS MATERIAIS. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. LAUDO PERICIAL. OBRIGAÇÃO INDENIZATÓRIA. INTERPRETAÇÃO DA APÓLICE SECURITÁRIA À LUZ DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. MULTA DECENDIAL DEVIDA, RESPEITADO O VALOR DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL. JUROS DE MORA. INCIDÊNCIA A PARTIR DA CITAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

I - Não há falar em ofensa ao princípio da dialeticidade, vez que o recurso interposto, apesar de reiterar alguns argumentos lançados na contestação, enfrenta os aspectos rechaçados na sentença objurgada.

[...] (TJSC, Apelação n. 0000319-76.2012.8.24.0042, de Maravilha, rela. Desa. Hildemar Meneguzzi de Carvalho, j. 19-9-2016).

Em contrapartida, salienta-se que o pleito de concessão da tutela recursal resta prejudicado, diante do julgamento do mérito recursal por este órgão Fracionário, conforme já decidiu este Tribunal de Justiça:

APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE GUARDA, VISITAS E ALIMENTOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE REQUERENTE.

ADMISSIBILIDADE. APELANTE QUE POSTULA A CONCESSÃO DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA RECURSAL AO APELO POR SI AFORADO. APRECIAÇÃO PREJUDICADA, DIANTE DO PRESENTE JULGAMENTO DO MÉRITO.

[...] (Apelação Cível n. 0323659-46.2016.8.24.0038, de Joinville, rel. José Maurício Lisboa, Primeira Câmara de Direito Civil, j. 10-9-2020).

Superada tais questões, defende o Apelante que o contrato firmado entre as partes é de adesão, sendo redigido de forma extremamente confusa, sem previsão explícita e didática acerca dos limites da cobertura securitária, de modo que a Requerida não pode se eximir do pagamento da indenização pela mera alegação de se tratar de bem pertencente a terceiro. Aduz também que as cláusulas limitativas devem ser interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor, motivo pelo qual faz jus à indenização securitária, como de indenização por danos morais.

Incide o Código de Defesa do Consumidor na hipótese, por se tratar...

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