Acórdão Nº 0314854-89.2017.8.24.0064 do Primeira Turma de Recursos - Capital, 28-03-2019

Número do processo0314854-89.2017.8.24.0064
Data28 Março 2019
Tribunal de OrigemSão José
Classe processualRecurso Inominado
Tipo de documentoAcórdão



ESTADO DE SANTA CATARINA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA

Primeira Turma de Recursos - Capital



Recurso Inominado n. 0314854-89.2017.8.24.0064, de São José

Relator: Juiz Marcelo Pizolati

RECURSOS INOMINADOS. AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. DESCONTOS SOB A SIGLA RMC JUNTO AO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. BANCO RÉU QUE PROVOU A EXISTÊNCIA DO CONTRATO. EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE SAQUE VIA CARTÃO DE CRÉDITO. MATÉRIA PACIFICADA PELA TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO ESTADO DE SANTA CATARINA. CONTRATO VÁLIDO. MODALIDADE PREVISTA NO ORDENAMENTO JURÍDICO. ENUNCIADO PARA ORIENTAÇÃO COM A SEGUINTE REDAÇÃO:

"(...) XIV - Observados os termos da Lei n.10.820/03 a da Instrução Normativa n. 28/2008-INSS, é válido o contrato de cartão de crédito consignado com autorização para desconto em benefício previdenciário, não havendo dano moral presumível no caso de sua contratação com inobservância daquelas regras." (TJSC, Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei n. 0000027-49.2018.8.24.9009, de Quarta Turma de Recursos – Lages, rel. Juiz Edison Zimmer, Turma de Uniformização, j. 21-10-2018).

INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, ANTE A APLICABILIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, QUE NÃO DISPENSA A AUTORA DE PROVAR OS FATOS CONSTITUTIVOS DO SEU DIREITO. ART. 373, I, DO CPC. ÔNUS DA AUTORA QUANTO À EXISTÊNCIA DE VENDA CASADA E VÍCIO DE CONSENTIMENTO. PROVA DIABÓLICA QUE NÃO PODE SER IMPOSTA À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CONTRATAÇÃO LÍCITA. DESCONTO DEVIDO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO DO RÉU PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO. RECURSO DA AUTORA VISANDO MAJORAR OS DANOS MORAIS PREJUDICADO.

A inversão do ônus da prova, em face da aplicabilidade das disposições do Código de Defesa do Consumidor, não dispensa o consumidor da indicação, objetiva e plausível, dos pressupostos da responsabilidade civil (Ap. Cív. n. 2007.008077-9, de Tubarão. Rel.: Des. Henry Petry Júnior).




Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado n. 0314854-89.2017.8.24.0064, da comarca de São José Juizado Especial Cível, em que são Recorrente/Recorrido Banco BMG S/A e Recorrida/Recorrente Eloiza Maria da Rosa:

A Primeira Turma de Recursos - Capital decidiu, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso do réu Banco BMG S/A para julgar improcedente o pedido, prejudicado o recurso da autora. Sem custas e sem honorários.


Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Juízes Cláudio Eduardo Régis de Figueiredo e Silva e Rafael Maas dos Anjos.

Florianópolis, 28 de março de 2019.


Marcelo Pizolati

Relator


RELATÓRIO



Trata-se de ação em que a autora alegou que foi surpreendida com descontos sob a sigla RMC. Aduziu que foi induzida a erro pelo réu ao ter contratado cartão de crédito consignado, acreditando adquirir empréstimo consignado convencional. Asseverou que os encargos do cartão de crédito são elevados, tornando a dívida impagável. Discorreu sobre onerosidade excessiva, falha no dever de informação e desrespeito às disposições do Código de Defesa do Consumidor. Requereu a procedência do pedido para declarar a inexistência do contrato de cartão de crédito consignado, convertendo-o em empréstimo consignado tradicional, além da condenação do réu à repetição do indébito e indenização por danos morais.

O réu contestou defendendo a legalidade do pacto, refutando o pedido de dano moral e a existência de ato ilícito. Arguiu que a autora efetuou saques de valores e postulou a improcedência do pedido.

A sentença julgou procedente o pleito inicial, declarando a nulidade do contrato sob discussão e a dívida dele decorrente. Além disso, condenou o réu a restituição em dobro do valor cobrado indevidamente e ao pagamento de danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais).

Ambas as partes recorreram.

A autora postulou a majoração do valor da indenização e o réu a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido.

Este é o relatório.








VOTO


Diante do provento mensal bruto auferido pela autora Eloiza Maria da Rosa (p. 24 – R$ 1.306,64), concedo-lhe o benefício da Justiça Gratuita (p. 195).

Assim, atendidos os requisitos legais de admissibilidade, conheço dos recursos.

1. Código de Defesa do Consumidor.

Nos termos da Súmula 297 do STJ, o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Porém, tal circunstância não implica, por si só, o reconhecimento de nulidade ou ilegalidade do contrato firmado pelas partes.

O mesmo raciocínio é aplicável à inversão do ônus da prova que, embora cabível, nos termos do artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não resulta, necessariamente, no acolhimento da pretensão.

2. Da Reserva de Margem Consignável.

Na espécie, não se pode falar em ausência de contratação, pois os documentos exibidos (pp. 131/137) demonstraram que a autora firmou contrato de cartão de crédito consignado e que autorizou descontos sob a sigla "RMC" (p. 132 – Item VIII).

E o desconto de valores do benefício previdenciário para amortizar débito decorrente de saque, realizado por meio do cartão de crédito é plenamente possível, eis que previsto no art. 6º da Lei n. 10.820/2003, com redação atualizada pela Lei n. 13.175/2015, que assim dispõe:

Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1º e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. § 5º Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para:

I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito;

II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.”

A matéria, inclusive, foi pacificada pela Turma de Uniformização dos Juizados Especiais do Estado de Santa Catarina:

"PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. EMPRÉSTIMO POR MEIO DE SAQUE VIA CARTÃO DE CRÉDITO. PRETENSÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DA CONTRATAÇÃO DO EMPRÉSTIMO VIA CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL, RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS DESCONTOS REALIZADOS E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL NA ORIGEM. RECURSO DA PARTE REQUERIDA. ACÓRDÃO REFORMOU A SENTENÇA PARA JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO. PREVISÃO LEGAL E REGULAMENTAR DA RMC. MEDIDA PROVISÓRIA 681/2015, CONVERTIDA NA LEI N. 13.172/2015 QUE ALTEROU DISPOSITIVOS DA LEI 10.820/2003. CONTRATAÇÃO QUE VEIO A SER COMPROVADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. VALORES LIBERADOS EM FAVOR DAS PARTES CONTRATANTES, ESTAS QUE ADERIRAM LIVRE E CONSCIENTEMENTE AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, POR MEIO DE SAQUES VIA CARTÃO DE CRÉDITO. VALIDADE AMPARADA POR LEGISLAÇÃO E REGULAMENTAÇÃO ESPECÍFICA. IMPOSSIBILIDADE DE SE AVENTAR ILEGALIDADES NAS CONTRATAÇÕES. INEXISTÊNCIA DE IMPUGNAÇÕES DAS ASSINATURAS E, TAMBÉM, DE VÍCIOS A MACULAREM AS MANIFESTAÇÕES DE VONTADES EXTERNADA NA ACEITAÇÃO DOS TERMOS DOS CONTRATOS. INEXISTÊNCIA DE NULIDADES. INCABÍVEL A CONVERSÃO DO CONTRATO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO, VEZ QUE TAL MODALIDADE DE CRÉDITO ESTÁ AMPARADA EM LEI. INVIÁVEL, NO MAIS, READEQUAÇÃO DOS TERMOS DOS CONTRATOS, POSTO QUE AS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NÃO INCORRERAM EM QUALQUER PRÁTICA QUE CARACTERIZE VANTAGEM EXCESSIVA OU ABUSIVA, CAPAZ DE SUBMETEREM OS CONSUMIDORES A SITUAÇÃO DE DESVANTAGEM EXAGERADA OU DE ENCERRAR ILEGALIDADE. INEXISTÊNCIA DE ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL. DIVERGÊNCIA RECONHECIDA - INTERPRETAÇÃO UNIFORMIZADA PARA ATESTAR A LEGALIDADE DOS CONTRATOS DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. DANO MORAL INEXISTENTE. EDIÇÃO DE ENUNCIADOS PARA ORIENTAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS, NA FORMA DO ART.66J, §4º DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS DE RECURSOS DO SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO ESTADO DE SANTA CATARINA COM AS SEGUINTES REDAÇÕES: "XIII - O Juizado Especial é competente para discussão dos contratos que tratam da reserva de margem consignável na Lei n.10.820/2003." "XIV - Observados os termos da Lei n.10.820/03 a da Instrução Normativa n.28/2008-INSS, é válido o contrato de cartão de crédito consignado com autorização para desconto em benefício previdenciário, não havendo dano moral presumível no caso de sua contratação com inobservância daquelas regras." (TJSC, Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei n. 0000027-49.2018.8.24.9009, da Quarta Turma de Recursos - Criciúma, rel. Des. Edison Zimmer, Turma de Uniformização, j. 21-10-2018).

No mesmo sentido decidiu o TJSC:

"APELAÇÃO CÍVEL. "AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES (...)". DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. CARTÃO DE CRÉDITO COM MARGEM CONSIGNÁVEL. VÍCIO DE CONSENTIMENTO E AFRONTA AO DEVER DE INFORMAÇÃO NÃO CONFIGURADOS. CONTRATO REDIGIDO DE FORMA CLARA E...

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