Acórdão Nº 0315996-41.2019.8.24.0038 do Sexta Câmara de Direito Civil, 16-03-2021

Número do processo0315996-41.2019.8.24.0038
Data16 Março 2021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSexta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão










Apelação Nº 0315996-41.2019.8.24.0038/SC



RELATOR: Desembargador ANDRÉ CARVALHO


APELANTE: GOL LINHAS AEREAS S.A. (RÉU) ADVOGADO: GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO (OAB SC047919) APELADO: MAGDA RUBIA DE MELO (AUTOR) ADVOGADO: VITOR FERREIRA (OAB SC034431) APELADO: VITOR FERREIRA (AUTOR) ADVOGADO: VITOR FERREIRA (OAB SC034431)


RELATÓRIO


Adoto, por economia processual e em homenagem à sua completude, o relatório de sentença , in verbis:
Trata-se de ação ordinária na qual pretende a condenação ao pagamento de danos morais e materiais. Apresentada contestação e réplica.

A parte dispositiva é do seguinte teor, ex vi:
Pelo exposto, julgo parcialmente procedente (art. 487, I, CPC) os dois pedidos para condenar a requerida (i) ao pagamento de R$ 20.000,00, metade para cada requerente, com juros mensais de 1% desde 17.02.2019 e correção monetária pelo INPC a contar do presente arbitramento, bem como (ii) ao pagamento de danos materiais fixados em 42.000 milhas, metade creditada em favor de cada requerente, e R$ 928,02. Juros e correção desde 17.02.2019, observados os mesmos índices e percentuais já definidos acima. Por fim, condeno a demandada ao pagamento de custas e honrários de 10% sobre o valor total da condenação.
Intime-se. Sem recursos, ao arquivo.

Inconformada, a parte ré interpôs apelo (evento 33), aduzindo, em breve síntese, que: (i) não há caracterização de prática de conduta irregular de sua parte, não tendo que se falar em concessão de verba indenizatória à parte autora; (ii) apenas cumpriu os termos do contrato, o que também deveria ser sido observados pelos autores, que deveriam ter comunicado o interesse em manter o trecho de retorno em razão da não utiliza]ao do trecho de ida; (iii) todo o transtorno narrado pela parte autora decorreu de culpa exclusiva dos próprios passageiros, que não se apresentaram a tempo para a realização do "check-in" e não lhe informaram sobre a manutenção do trecho de retorno; (iv) tal conduta está de acordo com a Resolução 400 da ANAC; (v) além do contrato, tais informações também estão disponíveis em seu próprio site, sendo evidente que a parte autora tinha pleno conhecimento a respeito dessa restrição; (vi) não deve ser condenada ao pagamento de indenização por danos materiais, na medida em quem deu causa ao prejuízo sofrido foram os próprios autores; (vii) também não há se falar em compensação pelo suposto abalo anímico suportado, mormente porque não comprovados; (viii) sucessivamente, se mantida a condenação ao pagamento de verba indenitária, o quantum deve ser reduzido; (ix) os juros de mora são incidentes somente a partir da data da sentença.
Contrarrazões foram ofertadas pelo no evento 39.
Após, vieram-me os autos conclusos.
É o relato do essencial

VOTO


De início, registra-se que a ação foi proposta já sob a égide do atual Código de Processo Civil, sendo desnecessária qualquer ponderação sobre a legislação processual aplicável.
Isso dito, satisfeitos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.
Como visto, insurge-se a parte ré quanto ao cancelamento automático do trecho de retorno ante a não apresentação no trecho de ida, vez que não comunicado interesse a respeito, além da inexistência de danos materiais ou morais no caso em apreço. Em caráter sucessivo, pugnou pela minoração do montante arbitrado a título de compensação pecuniária, além da incidência dos juros de mora tão somente a partir da decisão que fixar a compensação pecuniária.
Ab initio, faz-se necessário ressaltar que o caso em deslinde atrai a incidência do Código de Defesa do Consumidor, porquanto os autores, que efetuaram a compra de passagens aéreas da empresa ré, enquadram-se de maneira precisa no art. 2º do referido diploma: "Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".
Outrossim, a empresa recorrente também se subsume ao conceito de fornecedor previsto no art. 3º da legislação consumerista, que assim dispõe: "Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".
Isso porque as empresas aéreas disponibilizam no mercado sua prestação de serviços traduzidos na venda de passagens aéreas e na execução do transporte aéreo adquirido.
Assim, na qualidade de prestadores de serviços, diante da normativa inserta no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, tem-se que a empresa deve responder objetivamente "pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos", só ficando isenta caso demonstrem que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; ou que o fato se deu por culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, o que não ocorreu:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1º O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I - o modo de seu fornecimento;
II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III - a época em que foi fornecido.
§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.
§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

In casu, resta incontroverso nos autos que os autores compraram da requerida 4 passagens aéreas (2 para o trecho de ida e 2 para o trecho de volta).
Com relação à ida, ficou confirmada a saída para 12:20, no dia 15-2-2019, do Aeroporto Afonso Pena (São José dos Pinhais) com destinado ao Aeroporto Santos Dumont (Rio de Janeiro) (localizadores GNK9WA e WQSHJH). O retorno, previsto para 21:15 do dia 17-2-2019, teria saída do Galeão (Rio de Janeiro) com destino ao aeroporto novamente ao aeroporto Afonso Pena ((localizador GNK9WA e WQSHJH).
No dia 15-2, chegaram com 3 minutos de atraso para o início dos procedimentos de embarque para o vôo de dia. Como já haviam planejado a viagem, tendo se deslocado de Joinville até o aeroporto Afonso Pena, compraram passagens aéreas para o vôo disponível mais próximo, a saber: vôo da Companhia Aérea Azul, localizador WBJNNF.
Embora a ré não tenha tido qualquer responsabilidade pela perda do vôo de ida, na data do retorno, ao se dirigirem ao atendimento eletrônico no posto de embarque, no aeroporto Galeão, foram surpreendidos com a informação de que seus nomes não constavam na listagem do vôo.
Ao procurar funcionários da empresa ré, explicando o ocorrido, foram informados de que havia ocorrido o "no show", isto é, a perda do direito de retorno em razão do não comparecimento no vôo de ida. Na oportunidade, foram informados de que, para ocuparem os mesmos lugares no mesmo vôo comprado antecipadamente, teriam que efetuar o pagamento de R$ 3.595,88.
Ante o expressivo valor das passagens, não conseguiram comprá-las e, ao se dirigir ao balcão da Companhia Aérea Azul, compraram passagens com 42.000 pontos, tendo pagos os custos de marcação de assento de R$ 110,00 e taxas de embarque de R$ 65,90.
Como as passagens de retorno foram compradas apenas para o dia seguinte, com saída prevista ás 6:20 da manhã do Aeroporto Santos Dummont, hospedaram-se a um hotel próximo a este, ao qual chegaram de táxi, suportando despesas com transporte, hotel e alimentação. Não suficiente, ainda tiveram mais gastos com a diária do veículo que ficou estacionado em São José dos Pinhais.
Além mais, ambos tinham compromisso para o dia seguinte, segunda-feira, sendo que a autora tinha que entrar em seu trabalho às 9hrs da manhã, enquanto o autor possuía audiência às 17hrs na comarca de Garuva.
A requerida, ao apresentar a sua defesa, defendeu a regularidade da conduta perpetrada (cancelamento do trecho de retorno em razão do não comparecimento no treco de ida), além de que os consumidores foram devidamente informados a respeito no momento da compra da passagem.
Em sede recursal, a empresa volta a defender a legalidade da cobrança, ante o que indica ser o parâmetro legal que justifica seu comportamento, qual seja, o art. 19 da Resolução 400 da ANAC.
A esse respeito, impende registrar que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIROS. AQUISIÇÃO DE PASSAGENS DO TIPO IDA E VOLTA. CANCELAMENTO AUTOMÁTICO E...

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