Acórdão Nº 0318280-12.2017.8.24.0064 do Quinta Câmara de Direito Civil, 22-02-2022

Número do processo0318280-12.2017.8.24.0064
Data22 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0318280-12.2017.8.24.0064/SC

RELATORA: Desembargadora CLÁUDIA LAMBERT DE FARIA

APELANTE: SERRA BRANCA PARTICIPACOES EIRELI (AUTOR) APELADO: MARA REGINA RAMOS CARDOSO (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de ação de rescisão de contrato c/c reintegração de posse e perdas e danos ajuizada por SERRA BRANCA PARTICIPAÇÕES EIRELI em face de MARA REGINA RAMOS CARDOSO em andamento perante a 2ª Vara Cível da comarca de São José.

Adoto o relatório da sentença (evento 40, Sentença 1) por retratar com fidelidade os atos processuais:

[...] SERRA BRANCA PARTICIPACOES LTDA ingressou com AÇÃO DESCONTITUTIVA contra MARA REGINA RAMOS CARDOSO, todos identificados.

Alega a parte autora, em suma, ter celebrado contrato de compromisso de compra e venda com a parte ré, em 24-6-1996, referente ao lote n. 07, quadra 06, do Loteamento Dona Zenaide, pelo preço total de R$ 15.440,00 (quinze mil quatrocentos e quarenta reais). Ocorre que a parte ré, embora tenha sido imitido na posse do imóvel, deixou de adimplir a integralidade da avença, efetuado o pagamento de apenas 30 (trinta) de 72 (setenta e duas) parcelas estipuladas. Concluiu postulando a concessão da gratuidade da justiça; a citação da parte ré; e, ao final, a declaração de rescisão da avença pactuada com a parte ré, a reintegração de posse do imóvel e a condenação ao pagamento de indenização por perdas e danos. Valorou a causa e juntou documentos.

Foi concedida a gratuidade da justiça e ordenada a citação da parte adversa (ev. 3).

A parte requerida foi regularmente citada (ev. 23), mas deixou transcorrer in albis o prazo para a resposta, conforme certidão do evento 25.

Intimado para especificar as provas que pretendia produzir e manifestar sobre a prescrição, a parte autora postulou o julgamento antecipado do mérito, sustentou a inocorrência da prescrição, alternativamente, a procedência apenas do pedido de declaração de rescisão e reintegração de posse (evs. 28 e 38). [...]

Sobreveio sentença (evento 40, Sentença 1) de extinção do feito com resolução do mérito, constando em seu dispositivo o seguinte:

[...] Ante o exposto, RECONHEÇO a decadência do direito da parte autora de resolver o contrato pelo inadimplemento da parte ré, porque prescrita a pretensão de crédito que decorre do contrato, e JULGO EXTINTO o feito com resolução do mérito, na forma do art. 487, II, do Código de Processo Civil.

Condeno a parte autora, com fulcro no artigo 82, § 2º, do CPC, ao pagamento das despesas processuais.

A exigibilidade das verbas sucumbenciais fica suspensa e condicionada à cessação da situação de insuficiência de recursos, desde que ocorra no prazo de 5 (cinco) anos contados do trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, visto que a parte autora goza do benefício da justiça gratuita.

Sem honorários de sucumbência, porque não formalizado o contraditório. [...]

Irresignada, a autora opôs embargos de declaração (evento 44), que foram rejeitados (evento 47).

Na sequência, interpôs recurso de apelação (evento 50, Apelação 1), alegando, em suma, que não há que se falar em decadência do seu direito de resolver o contrato pelo inadimplemento da parte ré, pois a) o pacto ajustado entre as partes possuía cláusula (décima terceira) auto resolutiva expressa, o que a teor do que dispõe a legislação de regência (art. 474 do CC), operou-se de pleno direito quando do atraso da terceira parcela consecutiva entre as partes (parcela n. 33, com vencimento em 10.1.2001); b) considerando os efeitos da revelia impostos à ré, notadamente quanto à inadimplência e à posse precária ostentada por ela, revela-se plenamente possível a imediata reintegração da posse em seu favor; c) em outros três casos semelhantes (autos n. 0007600-72.2010.8.24.0036, 0307497-92.2016.8.24.0064 e 0318302-70.2017.8.24.0064) os contratos, envolvendo a mesma questão jurídica, foram rescindidos; d) não conseguiu exercer seus direitos em razão de liminar concedida na aludida ação civil pública, destacando que a decisão suspendeu o prazo prescricional, tendo em vista que o seu descumprimento importaria em ato ilícito; e) não se operou a prescrição, vez que estava impossibilitada de realizar a cobrança dos créditos que lhe eram devidos; f) o STJ já firmou o entendimento de que o ajuizamento de ação civil pública versando sobre interesse difuso interrompe o prazo prescricional para a apresentação de demanda judicial que verse sobre interesse individual homogêneo; g) o argumento da juíza singular de que a inadimplência do requerido era anterior à propositura da demanda também não prospera, vez que o lapso temporal entre a inadimplência do requerido e a determinação judicial não configura a aventada prescrição; e h) ainda que a inadimplência tenha sido anterior, o pleito de rescisão poderia ter sido formulado a qualquer momento, dentro do prazo prescricional.

Com isso, requereu o recebimento do recurso no seu duplo efeito e, no mérito, o seu provimento, para reformar a sentença, julgando procedentes os pedidos iniciais ou, caso não seja esse o entendimento, reconhecendo a prescrição, tão somente, em relação aos pedidos indenizatórios e sem prejuízo das parcelas não cobertas pelo instituto.

A parte apelada deixou de ser intimada, para apresentar contrarrazões, ante a sua revelia (evento 53).

Os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade, motivo pelo qual deve ser conhecido, sendo a apelante dispensada do recolhimento do preparo, ante a concessão da gratuidade da justiça no primeiro grau (evento 3, despacho 14).

Como visto no relatório, a parte recorrente pretende a reforma do decisum, sob as alegações, em síntese, de que o contrato possuía cláusula resolutiva expressa e a Ação Civil Pública n. 064.01.004173-0 interrompeu o prazo prescricional, em razão da concessão de liminar que lhe impossibilitou a realização das cobranças dos créditos que lhe eram devidos.

Pois bem.

Inicialmente, cumpre salientar que "a jurisprudência do STJ entende que é imprescindível a prévia manifestação judicial na hipótese de rescisão de compromisso de compra e venda de imóvel para que seja consumada a resolução do contrato, ainda que existente cláusula resolutória expressa, diante da necessidade de observância do princípio da boa-fé objetiva a nortear os contratos." (AgInt no AREsp 1278577/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 18/09/2018).

No mesmo sentido, já decidiu esta Câmara:

[...] COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS - RESCISÃO - MANIFESTAÇÃO JUDICIAL - NECESSIDADE - MORA DO COMPRADOR - NÃO CONFIGURAÇÃO - ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL - CUMPRIMENTO DO CONTRATO - EXIGÊNCIA - CABIMENTO - CONDIÇÃO RESOLUTIVA - MORA OU INEXECUÇÃO - OBRIGAÇÃO DOS ALIENANTES - PLEITO DE RESOLUÇÃO DO PACTO CONTRA OS ADQUIRENTES - NÃO CABIMENTO 1 Consoante este Tribunal já teve oportunidade de se manifestar, "é firme a jurisprudência do STJ no sentido de ser 'imprescindível a prévia manifestação judicial na hipótese de rescisão de compromisso de compra e venda de imóvel para que seja consumada a resolução do contrato, ainda que existente cláusula resolutória expressa, diante da necessidade de observância do princípio da boa-fé objetiva a nortear os contratos.' (AgRg no REsp n. 1337902, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 7/3/2013)" (AC n. 2014.056713-2, Des. Jorge Luis Costa Beber). Portanto, independentemente da existência de cláusula resolutória expressa, como se está diante de contrato de compra e venda de imóvel, não se tem como rescindido o pacto sem que o Judiciário assim o tenha declarado. 2 Ademais, na espécie, sem que o prazo previsto contratualmente para a configuração do inadimplemento justificador da rescisão da avença tenha transcorrido, não há falar em mora dos adquirentes. 3 Outrossim, com o cumprimento significativo da obrigação assumida (no caso, adimplemento substancial tanto do sinal quanto da totalidade do preço) e fundamentado nos princípios da conservação dos contratos e de sua função social, considerar de plano resolvida a obrigação tomaria feição abusiva. Em casos assim, a melhor solução é dar cumprimento à avença, com a possibilidade de cobrança do valor residual, evitando-se um sacrifício desproporcional. 4 Não cabe ao contratante se valer de inadimplemento referente a ônus contratual contra si ajustado para pugnar o desfazimento do pacto. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - AÇÃO - VALOR DA CAUSA - INCOMPATIBILIDADE COM O PROVEITO ECONÔMICO - IMPOSSIBILIDADE DE ESTIMAÇÃO - ARBITRAMENTO - EQUIDADE - CPC, ART. 85, § 8º - SOLUÇÃO APROPRIADA - MAJORAÇÃO Quando for inestimável o proveito econômico obtido e o valor da causa não refletir a pretensão buscada com a demanda, os honorários devidos ao patrono devem ser fixados de acordo com o art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil. RECONVENÇÃO - MAJORAÇÃO - NECESSIDADE Nos termos do § 2° do art. 85 do Código de Processo Civil, o magistrado ao fixar os honorários deve atentar para os critérios estabelecidos nos incisos I, II, III e IV. Desse modo, isoladamente não tem relevo o efeito patrimonial direto que a demanda enseja, mas sim a importância da causa e...

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