Acórdão Nº 0319042-70.2015.8.24.0008 do Quarta Câmara de Direito Civil, 05-03-2020

Número do processo0319042-70.2015.8.24.0008
Data05 Março 2020
Tribunal de OrigemBlumenau
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão


Apelação Cível n. 0319042-70.2015.8.24.0008, de Blumenau

Relator designado: Desembargador Selso de Oliveira

APELAÇÃO CÍVEL. PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. ALVARÁ JUDICIAL PARA AUTORIZAÇÃO DE TRANSFERÊNCIA DE DOMÍNIO DE IMÓVEL. SENTENÇA QUE DECLARA EXTINTO O FEITO, NOS TERMOS DO ART. 485, INCISO VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, EM RAZÃO DO RECONHECIMENTO DA FALTA DE INTERESSE DE AGIR E INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.

INSURGÊNCIA DOS REQUERENTES.

COMPRA E VENDA DE IMÓVEL FORMALIZADA POR MEIO DE INSTRUMENTO PARTICULAR. QUITAÇÃO DO PREÇO DEVIDAMENTE COMPROVADA. ADEMAIS, DOCUMENTOS ANEXADOS AOS AUTOS QUE DEMONSTRAM A ANUÊNCIA DE TODOS OS INTERESSADOS, DIRETA OU INDIRETAMENTE NO NEGÓCIO, COM O PLEITO FORMULADO NO PRESENTE PROCEDIMENTO. VIABILIDADE DA EXPEDIÇÃO DO ALVARÁ.

SENTENÇA REFORMADA.

HONORÁRIOS RECURSAIS. NÃO CABIMENTO.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0319042-70.2015.8.24.0008, da comarca de Blumenau 4ª Vara Cível em que é Apelante Giovano Bett Ghizoni e outro.

A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso de apelação e, por maioria de votos, dar-lhe provimento, vencidos os Exmos. Desembargadores José Agenor de Aragão e Luiz Felipe Schuch que negam provimento ao recurso. Custas legais.



O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Helio David Vieira Figueira dos Santos, com voto, e dele participou os Excelentíssimos Desembargadores José Agenor de Aragão, Selso de Oliveira, Luiz Felipe Schuch, e Marcus Tulio Sartorato.



Florianópolis, 5 de março de 2020.



Desembargador Selso de Oliveira

Relator designado




























RELATÓRIO

A bem dos princípios da celeridade e da economia processual, adoto o relatório elaborado na sentença, verbis (p. 79-82):


Trata-se de pedido de alvará judicial formulado por Giovano Bett Ghizoni e Maria Adriana Schramm da Silva Ghizoni requerendo a transferência de um imóvel que pertenceu a José dos Santos e Rosa Maria dos Santos. Relatam que o imóvel foi vendido pelos proprietários para Orlando José da Silva e Gertudres Francisca Schramm da Silva em 26.11.1980, mas que os então adquirentes não concretizaram a transferência do imóvel perante o Registro competente. Como os requerentes adquiriram o mencionado imóvel de Orlando e Gertudres, necessitam agora de autorização judicial para regularização do imóvel.

Instado a se manifestar, o Promotor de Justiça apresentou parecer aduzindo não estarem presentes quaisquer das circunstâncias previstas no artigo 178 do CPC, razão pela qual desnecessária seria sua intervenção.


Às p. 79-82 o juiz Marcos D'Avila Scherer extinguiu o feito sem resolução do mérito, com fulcro no artigo 485, VI, do Código de Processo Civil, condenando os requerentes ao pagamento das despesas processuais.

Opostos embargos de declaração (nº 0004306-52.2017.8.24.0008, p. 1-6), foram rejeitados.

Os requerentes apelam às p. 88-95, sustentando que o magistrado a quo se equivocou ao extinguir o feito por ausência de interesse de agir e inadequação da via eleita – ao fundamento de que os requerentes deveriam ter ingressado com ação de adjudicação compulsória –, aduzindo que tanto os herdeiros dos proprietários originários, quanto os últimos vendedores, estão de acordo com o pleito ora formulado.

Enfatizam que "não há nenhuma oposição dos herdeiros de José dos Santos e Rosa Maria dos Santos, muito pelo contrário, todos eles, inclusive seus respectivos cônjuges (maiores e capazes dispensando, inclusive, a participação do Parquet fl. 61), assinaram os respectivos termos de anuência para outorga definitiva de imóvel alienado em vida por José dos Santos e Rosa Maria dos Santos que se encontram acostados aos autos, declarando, ainda, que o negócio jurídico foi cumprido, estando o imóvel na posse dos adquirentes deste então. Como visto, a necessidade de comprovação do efetivo negócio jurídico e da fiel quitação do contrato, bem como a resistência ou a impossibilidade da outorga pela parte adversa não faz sentido nos presentes autos (até porque todos eles restaram comprovados e com eles concordaram todos os herdeiros de José dos Santos e Rosa Maria dos Santos inclusive com o consentimento expresso dos seus respectivos cônjuges), caracterizando, além de um formalismo excessivo, uma flagrante violação ao princípio da eficiência, expressamente estampado no artigo 8º do Código de Processo Civil".

Propugnam "a reforma integral da r. sentença objurgada, a fim de julgar procedente o pedido formulado na petição inicial, e determinar, de conseguinte, a expedição de alvará judicial para a outorga da escritura pública definitiva de compra e venda do imóvel matriculado sob n. 3.199 do Fólio Imobiliário da comarca de Gaspar-SC".

Em sessão de julgamento de 28/11/2019 esta Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unanime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento.

Posteriormente, em data de 6/2/2020, ao lavrar o seu voto, o relator, Desembargador José Agenor de Aragão, entendeu ter havido equívoco naquele julgamento e solicitou, por meio do despacho de p. 114-115, a designação de nova data para julgamento.

No despacho de p. 117 o Presidente desta e. Quarta Câmara de Direito Civil, Desembargador Hélio David Vieira Figueira dos Santos, determinou a reinclusão do presente feito em pauta para novo julgamento.


VOTO


1 Admissibilidade

A sentença foi prolatada e publicada sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, à luz do qual o caso será apreciado, consoante o Enunciado Administrativo nº 3 do Superior Tribunal de Justiça.

O recurso é tempestivo e o comprovante de recolhimento do preparo encontra-se acostado à p. 96.

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.


2 Mérito

Trata-se de apelação interposta pelos requerentes contra sentença que, em sede de procedimento especial de alvará judicial, julgou extinto o feito, sem resolução de mérito, com fulcro no artigo 485, VI, do Código de Processo Civil, por ausência de interesse de agir e inadequação da via processual eleita.

Sustentam os recorrentes, em síntese, inexistir óbice ao deferimento do pleito, por meio do procedimento deflagrado, porquanto devidamente demonstrada a quitação do valor ajustado pelo bem, e porque todos os envolvidos direta ou indiretamente no negócio estão de pleno acordo com a postulação.

Pois bem.

Os procedimentos de jurisdição voluntária, tais como o alvará judicial, segundo o que dispõe o Código de Processo Civil, não estão sujeitos à legalidade estrita. Isso significa que, em face das peculiaridades de cada caso concreto, confere-se ao julgador a possibilidade de adotar de forma discricionária – jamais arbitrária – a solução que entender mais adequada à finalidade social da norma.

É o que se extrai do art. 723, parágrafo único, da atual lei Adjetiva Civil, ao dispor que "o juiz não é obrigado a observar critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que considerar mais conveniente ou oportuna".

O dispositivo encontra correspondência no artigo 1.109 da Lei Processual de 1973, sobre o qual disserta a doutrina de Antônio Carlos Marcato:


Tendo em vista que o sentenciante não é obrigado a observar o critério da legalidade estrita, poderá adotar, em cada caso concreto, a solução que repute mais conveniente e oportuna; [...]. Observar o critério da legalidade estrita significa, em breves palavras, ater-se o juiz à aplicação, na causa em debate, do direito constituído. Nos procedimentos de jurisdição voluntária, ante o permissivo contido no art. 1.109 do diploma legal, compete ao juiz, sim, aplicar ao caso concreto a norma de direito, resolvendo, dessa forma, a causa submetida à sua apreciação; mas, levando em consideração as peculiaridades de cada caso, poderá ele agir, para o fiel cumprimento de sua tarefa, de acordo com critérios de conveniência e oportunidade, sem que com isso se queira dizer possa ser arbitrário. Em outras palavras, ao permitir-lhe investigar livremente os fatos, adotando a solução que lhe pareça mais conveniente e oportuna, visa a lei tornar possível, à luz de cada caso concreto, a exata administração dos interesses privados. É importante frisar que o art. 1.109 do CPC não contém regra assecuratória de vantagens ao juiz: antes, representa instrumento de segurança colocado à disposição dos interessados, pois lhes permite obter uma solução mais adequada e conveniente aos pedidos por eles formulados (Procedimentos especiais. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 329).


Ao tratar do assunto, discorre Elpídio Donizetti:


[...] Em síntese, nessa atividade o Estado-juízo se limita a integrar ou fiscalizar a manifestação de vontade dos particulares, agindo como administrador público de interesses privados. Não há composição de lide. E se não há lide, não há por que falar em jurisdição nem em partes, mas em interessados. [...]. (Novo Código de Processo Civil Comentado. 3ª. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2018, p. 218).


Da análise dos autos extrai-se que o imóvel objeto do presente procedimento de jurisdição voluntária, matriculado sob nº 3.199 no Ofício de Registro de Imóveis de Gaspar/SC, pertencia, originariamente, a José dos Santos e sua esposa, Rosa Maria dos Santos (ambos já falecidos), bem como que, na data de 10/3/1980, eles o alienaram a Orlando José da Silva e Gertudres Francisca Schramm da Silva, por meio da Escritura Pública de Compra e Venda com Pacto Comissório, lavrada perante o Tabelionato da cidade de Gaspar/SC, registrada no Livro...

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