Acórdão Nº 0320493-35.2018.8.24.0038 do Primeira Câmara de Direito Público, 26-04-2022

Número do processo0320493-35.2018.8.24.0038
Data26 Abril 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0320493-35.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador PAULO HENRIQUE MORITZ MARTINS DA SILVA

APELANTE: MUNICÍPIO DE JOINVILLE (RÉU) APELADO: LEANDRO FARIAS (AUTOR)

RELATÓRIO

Leandro Farias propôs "ação de indenização por danos materiais e morais" em face do Município de Joinville.

Alegou que: 1) em 12-7-2018, por volta das 0h15m, transitava em sua motocicleta pela Rua São Paulo, no Bairro Itaum, foi passar a faixa central e se surpreendeu com acentuado desnível, decorrente de obra pública de recapeamento da via; 2) perdeu o controle do veículo e sofreu grave queda e 3) além dos prejuízos materiais, fraturou o braço direito, o que lhe causou fortes dores, ficou com movimentação impossibilitada e precisou se afastar do trabalho por vários meses.

Postulou indenização por danos material e moral.

Em contestação, o réu sustentou: 1) inexiste prova de que a queda tenha ocorrido em razão do desnivelamento da pista; 2) a culpa pelo acidente é exclusiva do demandante e 3) não há dano moral (autos originários, Evento 9).

Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:

À vista do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado nesta AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS e MORAIS ajuizada por LEANDRO FARIAS contra MUNICÍPIO DE JOINVILLE, condenando o réu a pagar ao autor o valor de R$ 1.322,39, referente ao custo para o conserto da motocicleta avariada, mais R$ 112,02, correspondente à aquisição de medicamentos e da tipoia (R$ 52,02 + R$ 60,00), corrigidos e acrescidos de juros moratórios consoante fundamentação desta sentença.

Condeno o réu, ainda, no pagamento indenização por danos morais, no montante de R$ 12.000,00, acrescido de correção monetária a partir do arbitramento (STJ - Súmula nº 362), e de juros de mora, estes a contar do evento danoso (12.07.2018; STJ - Súmula nº 54; TJMG - Apelação Cível nº 100002046276810001, de Ribeirão das Neves, 16ª Câmara Cível, unânime, rel. Des. Pedro Aleixo, j. em 19.08.2020), a incidir de uma única vez, até o efetivo pagamento, com base nos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (Lei nº 9.494/97, art. 1º-F, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009 c/c Lei nº 8.177/91, art. 12, com as alterações promovidas pela MP nº 567/2012, convertida na Lei nº 12.703/2012).

Condeno o réu no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 15% sobre o valor atualizado da condenação (CPC, art. 85, § 2º). O réu é isento do pagamento das despesas processuais (Lei Estadual nº 17.654/2018, art. 7º, inc. I). (grifos no original) (autos originários, Evento 73)

O ente público, em apelação, reeditou as teses da contestação e acrescentou: 1) o autor não comprovou que o acidente tenha ocorrido em razão de ato ou omissão e 2) sempre que se constata a existência de desnível nas pistas, os órgãos responsáveis providenciam imediatamente o conserto. Subsidiariamente, requereu que o valor da compensação por dano moral seja reduzido para, no máximo, R$ 1.500,00 (autos originários, Evento 81).

Contrarrazões no Evento 102 dos autos originários.

VOTO

1. Responsabilidade civil

Tratando-se de ação ou omissão estatal, não há falar em elemento subjetivo (dolo ou culpa), que, na responsabilidade civil objetiva, é de somenos importância (CF, art. 37, § 6º). Basta a comprovação do ato ilícito, dano e nexo de causalidade.

A sentença proferida pelo MM. Juiz Roberto Lepper é confirmada por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razão de decidir:

[...]

Conforme disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, em casos de ato comissivo de agentes do Estado, é prescindível perquirir-se acerca do elemento culpa dos representantes do Estado com vistas a elucidar a (ir)responsabilidade da conduta estatal. Todavia, em se tratando de ato omissivo (obstáculo, não sinalizado, na via pública), que foi o que se invocou, é exigível a demonstração de todos os elementos da responsabilização civil subjetiva, como o ato danoso, o dano, o nexo causal e a culpa do agente, que devem ser erigidos pela faute du service público ou a sua prestação inadequada (TRF 1ª Região - Apelação Cível nº 2003.31.00.000265-0/AP, 4ª Turma Suplementar, rel. Juiz Federal José Alexandre Franco, julgada em 17.12.2012).

Dito isso, no dia 12.07.2018, por volta das 00h15min, tem-se como fato incontroverso que o autor Leandro Farias pilotava a motocicleta Honda/Biz, placa MKG-0435, pela rua São Paulo, e que, ao transpor a faixa central do leito viário, perdeu o controle do veículo e caiu na via pública. Na época, estavam sendo realizadas obras de recapeamento asfáltico na rua São Paulo, o que gerou o desnivelamento entre as faixas de rolamento (boletim de ocorrência de Evento 1, INF5/6 e depoimento testemunhal de Jackson Machado - Evento 70).

As fotografias revelam o desnivel das pistas (Evento 1, INF10/11), cuja diferença de altura no pavimento asfáltico era de aproximadamente 10 centímetros ("quase um palmo"; vide depoimento testemunhal de Jackson Machado - Evento 70).

Dito isso, registro que é "obrigação do ente público de fiscalizar, manutenir e sinalizar a via pública, primando pela segurança dos usuários" (TJRS - Apelação Cível nº 70065008310, de Gravataí, Décima Primeira Câmara Cível, unânime, rel. Des. Luiz Roberto Imperatore de Assis Brasil, j. em 24.02.2016), inclusive em prestígio ao princípio da eficiência do serviço público. Em caso de anomalia com potencial a gerar algum tipo de risco a transeuntes, motoristas, motociclistas ou ciclistas, cabe ao Poder Público sinalizar, com antecedência e eficiência, de modo a evitar surpresas a quem porventura se sirva de algum corredor público para exercer o seu direito de ir e vir.

A responsabilidade do réu, que é subjetiva, exsurge quando se sabe que dele era o dever de sinalizar adequadamente os obstáculos em vista do risco potencial à incolumidade física aos que por ali porventura transitassem, haja vista que, numa mesma artéria de tráfego, principalmente duas pistas na mesma direção, não é normal o desnivelamento (e, pior, tão acentuado) entre os dois corredores. A testemunha ouvida em Juízo confirmou que não havia qualquer sinalização alertando da existência do desnível na via pública, acrescentando que o acidente aconteceu durante a madrugada (00h15min) e que, apesar do local ser dotado de iluminação pública, havia neblina, o que dificultava a visualização do pavimento assimétrico (depoimento testemunhal de Evento 70). Evidencia-se, portanto, "falha na sinalização de obra na pista, decorrente da remoção da manta asfáltica e existência de desnível no local, fazendo com que a autora perdesse o controle de sua motocicleta" (TJRS - Apelação Cível nº 50003299820188210077, de Venâncio Aires, Décima Segunda Câmara Cível, unânime, relatora Desembargadora Cláudia Maria Hardt, j. em 12.08.2021).

Seja como for, "nas vias ou trechos de vias em obras deverá ser afixada sinalização específica...

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