Acórdão Nº 0321570-79.2018.8.24.0038 do Terceira Câmara de Direito Público, 15-12-2020

Número do processo0321570-79.2018.8.24.0038
Data15 Dezembro 2020
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 0321570-79.2018.8.24.0038/SC

RELATOR: Desembargador JAIME RAMOS

EMBARGANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com base no art. 1.022, inciso I, do Código de Processo Civil, opôs embargos de declaração, alegando que o julgado embargado carece de esclarecimentos porque manteve a condenação do INSS ao pagamento de custas processuais pela metade.

Defende que a decisão embargada deixou de se manifestar acerca da "inexistência de iniciativa privativa implícita do poder judiciário acerca de leis que disponham sobre custas, despesas judiciais e emolumentos", violando expressamente os arts. 24, inciso IV, 96, inciso II e 145, inciso II, da Constituição Federal, em relação aos quais também requereu prequestionamento.

Após o prazo para o oferecimento das contrarrazões, os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Os embargos declaratórios devem ser rejeitados porque o julgado embargado não contém nenhum dos vícios indicados no art. 1.022, do Código de Processo Civil.

Sustenta o embargante que o acórdão embargado carece de esclarecimentos porque condenou o INSS ao pagamento de custas processuais pela metade. Disse que a omissão reside na ausência de manifestação acerca da "inexistência de iniciativa privativa implícita do poder judiciário acerca de leis que disponham sobre custas, despesas judiciais e emolumentos", violando expressamente os arts. 24, inciso IV, 96, inciso II e 145, inciso II, da Constituição Federal, para os quais também requereu prequestionamento.

Defende que "o Poder Judiciário não tem competência para iniciar processo legislativo referente a custas, despesas judiciais e emolumentos"; que "a matéria tem natureza tributária, que é de competência do Estado, o que viola o art. 145, II, da Constituição Federal" que "o acórdão recorrido, ao julgar inconstitucional o dispositivo sobre a isenção de custas e emolumentos das autarquias, fere o art. 24, IV, da CF porque priva o estado-membro de exercer sua competência legislativa concorrente"; e que "não há interferência no orçamento do Poder Judiciário e competência do Tribunal de Justiça para elaborar proposta orçamentária".

Por vias transversas, o embargante insiste na isenção total das custas processuais de que trata o art. 33 da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com redação dada pela Lei Complementar Estadual n. 729/2018.

Pois bem!

Não há qualquer omissão ou contradição no acórdão vergastado.

Em primeiro lugar, porque a possibilidade de o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina exercer a iniciativa de leis que disponham sobre custas judiciais e emolumentos não foi colocada em discussão nos autos da ação em que foi proferido o acórdão aqui embargado.

Não obstante, é certo que a iniciativa privativa do Tribunal de Justiça, para apresentação de projetos de lei de interesse do Poder Judiciário Catarinense, está prevista no art. 96, inciso I, da Constituição Federal de 1988, e nos arts. 50, "caput", e 83, da Constituição Estadual de 1989, incluindo-se normas legais a respeito da criação, da organização e do funcionamento de serventias judiciais e extrajudiciais:

"[...] É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que as Leis que disponham sobre serventias judiciais e extrajudiciais são de iniciativa privativa dos tribunais de justiça, a teor do que dispõem as alíneas 'b' e 'd' do iniciso III do art. 96 da Constituição da República. Precedentes [...]" (STF, ADI nº 3.773-1/SP, Rel. Min. Menezes Direito, DJE de 3-9-2009). (TJSC, Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2020.080279-7, da Capital, rel Des. Ricardo Fontes, j. 20-07-2011).

No corpo do aresto supra ementado, o eminente Relator deixou claro que "ainda que as custas e os emolumentos tenham natureza jurídica de taxa, conforme a orientação do STF (ADI n. 3.694/AP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 6-11-2006), a competência no microssistema atinente às serventidas extrajudiciais só pode ser exercida mediante iniciativa do Tribunal de Justiça sob pena de afronta à independência dos Poderes". O mesmo ocorre em relação às serventias judiciais, obviamente.

Portanto, não há violação alguma aos arts. 24, inciso IV, 96, inciso II e 145, inciso II, da Constituição Federal.

Em segundo lugar, não há como aplicar a Lei Complementar Estadual n. 729/2018 para isentar totalmente o INSS do pagamento das custas judiciais.

De acordo com o parágrafo único (depois remodelado para § 1º pela LCE n. 279/2004) do art. 33, da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com a redação dada tanto pela LCE 161/97 quanto pela LCE 524/2010, as autarquias federais, quando vencidas em ações que tramitam na Justiça Estadual Catarinense, foram isentadas da metade das custas processuais.

É verdade que a Lei Complementar Estadual n. 729/2018, ao introduzir alteração no referido § 1º, passou a isentar totalmente de custas judiciais as autarquias federais, diante da inconstitucionalidade formal do referido normativo.

Porém, tal como dito pelo Órgão Especial desta Corte de Justiça Estadual, quando do julgamento da ADI n. 8000352.80.2017.8.24.0000, que declarou a inconstitucionalidade formal da Lei Complementar Estadual n. 696/2017, que versava sobre emolumentos das serventias extrajudiciais, por vício da iniciativa parlamentar, esta Terceira Câmara de Direito Público, no dia 12.11.2019, na Apelação Cível n. 0300207.61.2018.8.24.0159, relatada pelo eminente Desembargador Ronei Danielli, assentou que ante a "inconstitucionalidade formal do art. 3º da Lei Complementar Estadual n. 729/2018, revela-se imperioso, por força do efeito repristinatório, aplicar-se a redação anterior do art. 33, § 1º, da LCE n. 156/1997, atribuída pelo art. 1º da LCE n. 524/2010, razão pela qual deve ser mantida, em favor da autarquia federal, a isenção das custas processuais pela metade".

Assim, a fim de evitar a desnecessária tautologia, rogando vênia ao nobre Desembargador, passa-se a transcrever os fundamentos de sua decisão, adotando-os como razões de aqui decidir, "ad litteram":

Referente às custas do processo, tal matéria é regulada pela Lei Complementar Estadual n. 156/1997, mais precisamente, em relação a presente controvérsia, pelo art. 33, § 1º, o qual, na redação atribuída pela Lei Complementar Estadual n. 524/2010 (art. 1º), assim dispunha:

São devidos pela metade, as custas e emolumentos quando o interessado for autarquia federal, e autarquias de outros Estados da Federação e de seus municípios. (sem grifo no original)

A Lei Complementar Estadual n. 729/2018, em seu art. 3º, por seu turno, alterou o dispositivo da seguinte forma: São devidos pela metade as custas e os emolumentos quando o interessado for autarquia de outro Estado da Federação e de seus Municípios, e isento quando o interessado for autarquia federal. (sem grifo no original)

Entretanto, a jurisprudência deste Colendo Tribunal de Justiça é pacífica no sentido dessa última alteração ser inconstitucional.

Para melhor entendimento, faz-se mister breve retrospectiva.

Em 07.02.2018, o Órgão Especial, na ADI n. 8000352-80.2017.8.24.0000, Rel. Des. Marcus Túlio Sartorato, declarou a inconstitucionalidade da Lei Complementar Estadual n. 696/2017, a qual versava sobre os emolumentos nas serventias extrajudiciais.

Referida declaração ocorreu devido ao vício formal de iniciativa, pois o projeto de lei iniciou-se pelos parlamentares estaduais, e não pelo Tribunal de Justiça, contrariando, assim, o art. 96, II, "b" e "d", da Constituição Federal.

Ato contínuo, esta Corte, corrigindo o vício de iniciativa anterior, enviou novo projeto de lei à Assembleia Legislativa, também atinente aos emolumentos nas serventias extrajudiciais. No decorrer do processo legislativo houve emendas parlamentares e, no referente ao tema ora apreciado, incluiu-se a isenção total das custas judiciais em favor das autarquias federais.

Aludida inclusão, todavia, também é inconstitucional, porquanto viola a imprescindível pertinência temática que as emendas parlamentares devem ter nos projetos de lei de iniciativa privativa de outros órgãos.

Nesse norte é o entendimento uníssono do Egrégio Supremo Tribunal Federal:

1) Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4138/MT, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, julgada em 17.10.2018:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE TRIBUNAL DE JUSTIÇA INSTAURAÇÃO DE PROCESSO LEGISLATIVO VERSANDO TEMA PERTINENTE À ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO INICIATIVA DO RESPECTIVO PROJETO DE LEI SUJEITA À CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DE RESERVA (CF, ART. 96, II, D , E ART. 125, § 1º, in fine ) OFERECIMENTO E APROVAÇÃO, NO CURSO DO PROCESSO LEGISLATIVO, DE EMENDAS PARLAMENTARES AUSÊNCIA DE PERTINÊNCIA MATERIAL COM O OBJETO DA PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA DESCARACTERIZAÇÃO DE REFERIDO PROJETO DE LEI MOTIVADA PELA ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DA COMPETÊNCIA MATERIAL E DOS LIMITES TERRITORIAIS DE DIVERSAS VARAS JUDICIAIS A QUESTÃO AS EMENDAS PARLAMENTARES A PROJETOS DE INICIATIVA RESERVADA A OUTROS PODERES DO ESTADO POSSIBILIDADE LIMITAÇÕES QUE INCIDEM SOBRE O PODER DE EMENDAR PROPOSIÇÕES LEGISLATIVAS DOUTRINA PRECEDENTES REAFIRMAÇÃO DE CONSOLIDADA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE O TEMA PARECER DA PROCURADORIAGERAL DA REPÚBLICA PELA INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA LEI COMPLEMENTAR MATO-GROSSENSE Nº 313/2008 AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE. LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO EXERCÍCIO DO PODER DE EMENDA PELOS MEMBROS DO LEGISLATIVO.

O poder de emendar projetos de lei que se reveste de natureza eminentemente constitucional qualifica-se como prerrogativa de ordem políticojurídica inerente ao exercício da atividade legislativa. Essa prerrogativa institucional, precisamente por não traduzir corolário do poder de iniciar o processo de formação das leis (RTJ 36/382, 385 RTJ 37/113 RDA 102/261), pode ser legitimamente exercida pelos membros do Legislativo, ainda que se cuide de proposições constitucionalmente sujeitas à cláusula de reserva de iniciativa, desde que respeitadas as limitações...

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