Acórdão Nº 0322501-19.2017.8.24.0038 do Terceira Câmara de Direito Civil, 10-03-2020

Número do processo0322501-19.2017.8.24.0038
Data10 Março 2020
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão



0322501-19.2017.8.24.0038


Apelação Cível n. 0322501-19.2017.8.24.0038, de Joinville

Relator: Des. Fernando Carioni

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO CUMULADA COM INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. UNIÃO ESTÁVEL. DIREITO SUCESSÓRIO. EXCLUSÃO DO COMPANHEIRO DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL REALIZADO PELOS FILHOS DA EX-CONVIVENTE. NULIDADE. INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 1.790 DO CÓDIGO CIVIL. INEXIGÊNCIA DE AQUISIÇÃO ONEROSA DE BENS. APLICAÇÃO DO ARTIGO 1.829 DO CÓDIGO CIVIL. CONSOLIDAÇÃO DO ENTENDIMENTO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EXARADO COM REPERCUSSÃO GERAL. PUBLICAÇÃO DA DECISÃO DA EGRÉGIA CORTE SUPERIOR APÓS REALIZAÇÃO DO INVENTÁRIO EXTRAJUDICIAL. IRRELEVÂNCIA. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE NESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA POR SEU ÓRGÃO PLENO EM DATA ANTERIOR. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

"Na condição de núcleo familiar constitucionalmente albergado, tanto a união estável, quanto o casamento - quanto, ainda, o arranjo monoparental -, ostentam idêntica natureza (art. 226 da Carta da República), substanciando-se na comunhão de vidas alicerçada em valores como afetividade, conforto emocional e solidariedade. Nesse sentido, a facilitação, prevista na Constituição Federal para convolar-se a união estável em casamento (§ 3º, do art. 226/CF), não implica um minus da primeira em comparação com o segundo, nem que seja aquela um rito de passagem ou um degrau inferior em relação a este, senão que avulta como instrumento para dar mais segurança jurídica aos próprios companheiros e a terceiros, haja vista as formalidades cartoriais intrínsecas a este último, devendo, porém, ser reverenciada, antes e acima de tudo, a enunciação igualitária de que 'a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado' (caput do art. 226/CF). Afinal, mais relevante do que o modelo pelo qual a família é constituída, é o modo pelo qual se a protege juridicamente. Como corolário, tem-se que o inc. III do art. 1.790 do Código Civil afastou-se do primado da proteção estatal assegurado à entidade familiar, ao conferir tratamento diferenciado e detrimentoso ao convivente em união estável, no caso de sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da convivência, na disputa com outros parentes sucessíveis, em desalinho, portanto, com a regra protetiva ditada pela Constituição da República. Impende, por isso, reconhecer a inconstitucionalidade desse preceptivo (inc. III do art. 1.790 do Código Civil)" (TJSC, Arguição de Inconstitucionalidade em Agravo de Instrumento n. 2008.064395-2, de Presidente Getúlio, rel. Des. João Henrique Blasi, Órgão Especial, j. em 17-12-2014).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0322501-19.2017.8.24.0038, da comarca de Joinville (4ª Vara Cível), em que são Apelantes Salésio Rich e outros e Apelado Raimundo Glock:

A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, negar provimento ao recurso. Custas legais.

O julgamento, realizado no dia 10 de março de 2020, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Marcus Tulio Sartorato, com voto, e dele participou a Exma. Sra. Desa. Maria do Rocio Luz Santa Ritta.

Florianópolis, 11 de março de 2020.

Desembargador Fernando Carioni

RELATOR


RELATÓRIO

Adota-se o relatório da sentença recorrida, de pleno conhecimento das partes, proferida na ação anulatória de ato jurídico c/c indenizatória por danos morais, ajuizada por Raimundo Glock contra Salésio Rich, Maria Goreti Rich, Maria Salete Kniess, Valdemar Kniess, Arécio José Moser, Leoclécio Moser Júnior, Salvio Moser e Carlos Fernando Moser.

Ao sentenciar o feito, o MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Cível da comarca de Joinville, Dr. Fernando Seara Hickel, consignou na parte dispositiva:

Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Raimundo Glock em face de Salésio Rich, Maria Goreti Rich, Maria Salete Kniess, Valdemar Kniess, Arécio José Moser, Leoclécio Moser Júnior, Salvio Moser e Carlos Fernando Moser para DECLARAR nulo o inventário extrajudicial realizado pelos réus.

Tendo em vista a sucumbência recíproca, arcam os demandados, pro rata, com 70% (setenta por cento) das despesas processuais e honorários advocatícios os quais, nos termos do art. 85, I, do Código de Processo Civil, fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, arcando o autor, nos termos do art. 85, I, do Código de Processo Civil, com o restante das despesas e honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00 (hum mil reais).

Os pagamentos, entretanto, ficam suspensos, uma vez que deferido os benefícios da justiça gratuita para todas as partes. (fl. 146)

Inconformados, os réus Salésio Rich e outros interpuseram recurso de apelação, no qual sustentaram que: a) a escritura, objeto da demanda, foi ratificada em 27-9-2017, enquanto que o RE 878694 só foi publicado em 6-2-2018; b) a escritura em questão foi devidamente perfectibilizada pela assinatura de todos os herdeiros, bem como, aos preceitos à época, inexistem vícios que a tornaria passível de anulação; c) "[...] a partilha sucedida nos autos n. 0310094-78.2017.8.24.0038, homologada em fevereiro de 2019 é totalmente inconvalidável, eis que a partilha extrajudicial sucedida em setembro de 2017 é integralmente válida, não havendo o que se falar em lavratura da escritura por apenas alguns dos herdeiros da de cujus ou, ainda, na sua nulidade" (fl. 161); d) o apelado não comprou 1/6 da quota da filha da falecida, Sra. Maria, mas lhe foi doado tal fração, com o encargo que dela cuidasse; e) não sabem, entretanto, dizer de o por quê consta o termo "compra e venda"; f) inexistiu dolo ou vício; g) o casamento religioso não substitui o registro de casamento; h) o apelado não atende os requisitos de herdeiro legal da falecida; i) o apelado e a falecida não adquiriram bens em comum.

Requereram a reforma integral da sentença (fls. 158-165).

Contrarrazões às fls. 169-174.

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de apelação com o desiderato de reformar a sentença que julgou procedente o pedido de nulidade de inventário extrajudicial promovido pelos filhos da ex-companheira do apelado.

Pelo que dos autos consta, o apelado conviveu, por 23 (vinte e três) anos, em união estável com a mãe dos apelantes, que, não obstante, foi preterido na partilha do único bem imóvel deixado pela finada.

Nesse sentido, observa-se que o referido bem, matriculado sob o n. 48.888 e o qual é exibida às fls. 26-28, sobreveio à falecida em razão da morte do esposo dela, pelo que, então, na condição de viúva meeira, coube-lhe a metade ideal do respectivo imóvel, ao passo que os filhos, isto é, apelantes, restaram, cada qual, com a fração de 1/6 (um sexto).

Nada obstante, e posteriormente, já durante a aprazada união estável, um dos filhos vendeu ao apelado a parte que lhe coube na herança, e, qual seja, aquele 1/6 (um sexto) da totalidade desse bem.

A par dessa circunstância, com exceção da parte de que o apelado é proprietário, os apelantes, ou seja, herdeiros, dividiram entre si a parte que correspondeu a 5/6 (cinco sextos) do acervo patrimonial em questão.

A sentença, salvo melhor juízo, não merece censura.

O Juiz a quo, pelo se observa dos seus fundamentos, aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal, proferido no RE 878694, para dizer que "assim sendo, ou o autor é meeiro ou herdeiro, nos termos do art. 1829, I, do Código Civil, uma vez que o Supremo Tribunal, após a apreciação de pauta de repercussão geral, decidiu que 'é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado, tanto nas hipóteses de casamento...

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