Acórdão Nº 0324932-26.2017.8.24.0038 do Quinta Câmara de Direito Civil, 18-02-2020

Número do processo0324932-26.2017.8.24.0038
Data18 Fevereiro 2020
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoQuinta Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0324932-26.2017.8.24.0038, de Joinville

Relatora: Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CHEQUES DEVOLVIDOS POR MOTIVO DE FURTO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.

RECURSO DO RÉU

PLEITO DE AFASTAMENTO DO DANO MORAL. INSUBSISTÊNCIA. TALONÁRIO DO AUTOR FURTADO NA AGÊNCIA DO RÉU E DEVOLUÇÃO DOS CHEQUES NA CONTA BANCÁRIA DO REQUERENTE INCONTROVERSOS.

CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTROU TER O DEMANDANTE SOFRIDO DIVERSAS COBRANÇAS INDEVIDAS E AMEAÇAS DE TERCEIROS QUE RECEBERAM AS CÁRTULAS FURTADAS. CONSTRANGIMENTO E HUMILHAÇÕES SOFRIDAS INJUSTAMENTE EM RAZÃO DA NEGLIGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. SITUAÇÃO QUE É CAPAZ DE ENSEJAR ABALO MORAL. CENÁRIO VIVENCIADO QUE ULTRAPASSOU O MERO DISSABOR. BANCO DEMANDADO QUE TEM O DEVER DE ZELAR PELA GUARDA E CONSERVAÇÃO DOS DOCUMENTOS SOB SUA RESPONSABILIDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO EVIDENCIADA. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR MANTIDO.

PLEITO DE REDUÇÃO. INACOLHIMENTO. VALOR ARBITRADO, OBSERVANDO OS CRITÉRIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE, BEM COMO OS PARÂMETROS DEFINIDOS PELA CORTE.

HONORÁRIOS RECURSAIS. PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS. CABIMENTO.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0324932-26.2017.8.24.0038, da comarca de Joinville 3ª Vara Cível em que é Apelante Banco Santander Brasil S/A e Apelado Rogildo Hardt.

A Quinta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Luiz Cézar Medeiros e dele participou, com voto, o Excelentíssimo Senhor Desembargador Ricardo Fontes.

Florianópolis, 18 de fevereiro de 2020.

Desembargadora Cláudia Lambert de Faria

Relatora


RELATÓRIO

Rogildo Hardt ajuizou ação de indenização por danos morais em face de Banco Santander S/A perante o Juízo da 3ª Vara Cível da comarca de Joinville, alegando, em síntese, que é correntista da empresa ré e ao dirigir-se à sua agência para realizar um saque e retirar o extrato bancário, tomou conhecimento que haviam débitos em sua conta corrente originados de cheques devolvidos.

Narra que procurou a gerente da sua conta bancária para lhe prestar esclarecimentos acerca do ocorrido, ocasião em que foi informado que sua agência teria sido alvo de furto e que, no arrombamento, os meliantes subtraíram diversos talonários de cheques em branco, inclusive os cheques do requerente, os quais, aliás, jamais solicitou.

Defende que, em razão da falta de segurança do requerido em guardar os objetos a ele confiados, as cártulas de cheques foram utilizadas em reiteradas compras pelos meliantes, o que está lhe gerando diversos constrangimentos, uma vez que está sendo importunado diariamente com cobranças excessivas, tendo inclusive sofrido graves ameaças de terceiros que estão em posse destas cártulas.

Por isso, pleiteia a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais e ônus sucumbenciais. Ao final, pugna pela concessão da justiça gratuita. Juntou documentos (fls. 15/29).

Às fls. 30/31 o magistrado singular concedeu a justiça gratuita.

Citado, o demandado apresentou contestação (fls.37/48), sustentando, em suma, que o autor não sofreu qualquer abalo anímico ou prejuízo econômico, porquanto os cheques furtados não foram compensados, razão pela qual a demanda deve ser julgada improcedente. Por isso, pugna pela improcedência da demanda, ou, alternativamente pela fixação da verba indenizatória em patamar razoável. Juntou documentos (fls.49/57).

Houve réplica (fls.76/83).

Julgando antecipadamente a lide (fls.84/90), a magistrada singular consignou no dispositivo da sentença o seguinte:

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por Rogildo Hardt em desfavor de Banco Santander S.A., com fundamento no art. 487, I, do CPC, para condenar o réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) em favor do autor, com correção monetária a partir da data de publicação da presente sentença pelo INPC (Súmula 362, STJ) e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar da data do evento danoso, conforme Súmula n. 54, STJ; Condeno a parte ré, ainda, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (CPC, art. 85, § 2º, do CPC)".

Inconformado, o requerido interpôs recurso de apelação (fls.93/101), reiterando os argumentos da contestação e pugnando pelo conhecimento e provimento do presente recurso, com a consequente reforma da sentença, a fim de que seja afastada a condenação de indenização por danos morais, ou, ao menos, que seja reduzido o quantum arbitrado.

As contrarrazões foram apresentadas (fls. 109/114).

Os autos vieram conclusos para julgamento.

VOTO

Inicialmente, diante da entrada em vigor, a partir de 18-03-2016, do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16-03-2015), faz-se necessário definir se a nova lei será aplicável ao presente recurso.

Com relação aos requisitos de admissibilidade recursal, consoante Enunciado administrativo n. 3 do Superior Tribunal de Justiça (aprovado em sessão do Pleno do dia 16-03-16), aquela Corte decidiu que "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC".

No caso em apreço, a sentença foi prolatada já na vigência do novo CPC, portanto, devem ser observados os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, os quais se encontram presentes na espécie.

Por seu turno, a análise do pleito recursal também deve obedecer aos dispositivos do novo código.

No início, cumpre esclarecer que o caso em tela é regido pelas normas do Código de Defesa do Consumidor. A parte autora enquadra-se perfeitamente no conceito de consumidora (CDC, art. 2º). O demandado, por seu turno, subsume-se na definição legal de fornecedor, a teor do art. 3º daquele Códex.

Por ser incontroversa a relação de consumo que envolve as partes, incidem as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor, destacando-se, para o caso concreto, o art. 14 do referido diploma legal:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Assim, à configuração do dever de indenizar, deve a parte interessada demonstrar o defeito no fornecimento do serviço, o dano e o nexo de causalidade entre um e outro.

Pois bem.

Inicialmente, necessário consignar que é incontroverso que as partes mantinham relação contratual. Reputa-se incontroverso, também, que a agência do réu foi alvo de furto e na ocasião o talonário de cheques do autor foi furtado, tendo em momento posterior sofrido cobranças indevidas de terceiros que receberam os cheques dos falsários.

No seu recurso, o demandado alega que os fatos narrados não são capazes de ensejar abalo moral passível de indenização, razão pela pugna pelo afastamento da condenação. Razão, contudo, não lhe assiste.

Analisando minuciosamente os autos, verifica-se que conjunto probatório demonstrou ter o demandante sofrido diversas cobranças indevidas e ameaças de terceiros que receberam as cártulas furtadas (fls.24/29).

A captura de imagem do facebook apresentada pelo autor à fl. 29 demonstrou claramente a ameaça sofrida em decorrência da emissão fraudulenta dos cheques: "Ae amigo como que fica o cheque de mil 1600 que vc canselou? Ou será que tenho que manda uns amiguinhos bem calmo pra acerta isso". (sic)

As demais mensagens enviadas ao requerente também traduzem o constrangimento e desconforto sofrido pelo autor perante terceiros ao ser confundido por mau pagador (fls.24/28):

"Terceiro: Boa tarde! O senhor é quem comprou as ferramentas com o Lucas aqui em Brusque?

Autor: a agência Santander foi assaltada roubaram todas as folhas de cheques dos clientes.

Terceiro: Entendi...teria como a gente estar fazendo o acerto daquele cheque? Combinamos um dia e eu levo o cheque de volta para o senhor".

"Terceiro: "Bom dia tudo bem? Eu vendi um celular pra vc um j5 passei o cheque só que ele voltou

Terceiro: Sabe me dizer o que aconteceu?

Autor: Cheque roubado a agência Santander foi assaltada

Terceiro: E como faço agora?

Autor: Procure uma agência Santander

Terceiro: Ta devo levar copias dos documentos?

Terceiro: Vou conseguir pegar esse dinheiro?

Autor: tem que verificar se não são falsas

Terceiro: não estão todas no mesmo nome tenho comprovante de residência tbm

Autor: Então também foram roubadas do banco

Autor: Vá na delegacia

Terceiro: o senhor lembra de mim né?

Autor: nunca te vi

Terceiro: sim mais pelo menos o senhor lembra que eu te vendi um celular não é".

Note-se que os constrangimentos e as humilhações sofridas injustamente pelo autor decorreram da negligência da instituição financeira que deixou de zelar e guardar em segurança os documentos que estavam sob sua responsabilidade, o que evidencia a falha na prestação de serviço.

Frise-se, ainda, que é irrelevante o fato de o autor não ter suportado prejuízo econômico, pois o abalo moral decorreu dos constrangimentos sofridos com as cobranças indevidas, o que ultrapassou a linha do razoável, uma vez que causaram imensa preocupação, angústia e até mesmo temor em razão das graves ameaças, conforme se verifica dos documentos juntados às fls. 24/29, sendo perfeitamente compreensível o pleito de indenização por danos morais.

Além disso, o demandado nem sequer comunicou o correntista sobre o furto ocorrido no banco, tendo o requerente tomado ciência dos acontecimentos...

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