Acórdão Nº 0383004-37.2006.8.24.0023 do Quarta Câmara de Direito Público, 30-01-2020

Número do processo0383004-37.2006.8.24.0023
Data30 Janeiro 2020
Tribunal de OrigemCapital
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão




Apelação / Remessa Necessária n. 0383004-37.2006.8.24.0023, da Capital

Relator: Desembargador Rodolfo Tridapalli

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. ESBULHO POSSESSÓRIO PELO PODER PÚBLICO NÃO VERIFICADO. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. IMPOSSIBILIDADE DE EDIFICAÇÃO. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. RESTRIÇÃO DECORRENTE DO ANTIGO CÓDIGO FLORESTAL (LEI N. 4.771/65). LEI MUNICIPAL N. 2.193/85 QUE RATIFICOU SER A ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO. EXEGESE DO ART. 10 DO DECRETO-LEI N. 3.365/41. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. EXTINÇÃO DO PROCESSO COM JULGAMENTO DE MÉRITO. PRECEDENTES DO STJ. PRETENSÃO DE DIREITO PESSOAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necessária n. 0383004-37.2006.8.24.0023, da comarca da Capital 2ª Vara da Fazenda Pública em que é Apelante Zaira Cecília Quadros Troglio e Apelado Município de Florianópolis.

A Quarta Câmara de Direito Público decidiu, por unanimidade, reconhecer, de ofício, a ocorrência da prescrição e declarar extinto o processo, com julgamento do mérito, com esteio no artigo 269, IV, do CPC/73. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Sr. Des. Rodolfo Tridapalli, o Exmo. Sr. Des. Odson Cardoso Filho e a Exma. Sra. Desa. Vera Lúcia Ferreira Copetti.

Presidiu a sessão a Exma. Sra. Desa. Sônia Maria Schmitz.

Funcionou como membro do Ministério Público a Exma. Sra. Dra. Monika Pabst.

Florianópolis, 30 de janeiro de 2019.

Desembargador RODOLFO TRIDAPALLI

Relator

RELATÓRIO

Da ação

Adota-se o relatório da sentença recorrida (fl. 306/310), em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, por retratar com fidedignidade o trâmite processual no primeiro grau, in verbis:

ZAIRA CECÍLIA QUADROS TROGLIO, qualificada nos autos, por meio de procurador habilitado, ingressou com AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA, em que figura como demandado o MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS, igualmente qualificado, aduzindo, em suma, que é proprietária de um imóvel localizado na Ponta do Vigia, Barra da Lagoa e que sem justa e prévia indenização o requerido definiu o imóvel em tela como Área de Preservação Permanente, impedindo até mesmo o levantamento de um sítio arqueológico existente no local, o qual já havia sido autorizado pelo IPHAN, por meio de parecer técnico 164/2006 GERUC lavrado pela FLORAM.

Salienta que seu objetivo era o de promover, na forma da lei, o salvamento do sítio arqueológico existente no local para divulgação junto aos museus, escolas e universidades e, após concluído referido processo pretendia construir uma pousada com acomodações para até 26 (vinte e seis) pessoas que exibiriam artefatos achados durante o salvamento arqueológico, datados aproximadamente há 4000 (quatro) mil anos.

Assim, por não poder realizar a exploração econômica no imóvel e ante o impedimento ao direito de construir entende que não alcançará preço algum de venda, razão pela qual requereu a condenação do ente público ao pagamento de indenização referente a parte alodial do seu imóvel como se fosse ATR-2 prevista no Plano Diretor de Florianópolis ou, alternativamente, que seja indenizada pela diferença entre o valor do imóvel como se fosse ATR-2 e o valor autal do mesmo como APP, a título de perdas e danos. Atribuiu valor à causa, bem como acostou documentos.

Com autuação e registro, foi determinada a citação do requerido, onde deixou transcorrer in albis o prazo para apresentar contestação (fl. 73).

Ouvido o Ministério Público, o mesmo deixou de oferecer parecer de mérito na presente ação (fl. 74).

Saneado o feito, foi deferida a produção de prova pericial (fl. 75).

Apresentados os quesitos (fls. 81/82 e 93/94).

Decorrido o prazo para a Municipalidade adiantar o depósito dos honorários periciais (fl. 102); determinou o bloqueio do numerário em questão (fls. 103/106) e mesmo intimado pessoalmente do referido sequestro, deixou de se manifestar (fls. 109/113).

Laudo pericial juntado às fls. 120/286. Intimadas; as partes se manifestaram (fls. 289/291 e 301/304).

É o relatório.

Da sentença

O Juiz de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Capital, Dr. JOSÉ MAURÍCIO LISBOA, hoje Desembargador deste Tribunal de Justiça, julgou improcedente o feito, por não estar caracterizado o desapossamento administrativo (fls. 306/310).

Da Apelação

Irresignada com a prestação jurisdicional entregue, ZAIRA CECÍLIA QUADROS TROGLIO interpôs o presente recurso de Apelação (fls. 313/321), sustentando que se trata de desapropriação indireta, visto que a mudança de classificação de zoneamento causou restrição ao direito de construir, além de desvalorizar consideravelmente o imóvel.

Argumenta que, conforme entendimento jurisprudencial, a limitação administrativa destinada à construção de rodovia ou à criação de parque ambiental, que impede o uso e gozo da propriedade, configura desapropriação indireta, devendo gerar indenização.

Defende que se equivocou o perito ao avaliar o terreno considerando as restrições impostas por se tratar de Área de Preservação Permanente, pois o valor da indenização deve corresponder à diferença entre o que valeria o terreno sem as restrições ambientais e a quantia definida no laudo pericial, relevando-se as limitações impostas na propriedade.

Das contrarrazões

Devidamente intimado, o MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS não apresentou contrarrazões (fl. 325).

Da manifestação do Ministério Público

Lavrou parecer pela Procuradoria-Geral de Justiça o Dr. MÁRIO LUIZ DE MELO, que se manifestou pela desnecessidade de intervenção do Ministério Público (fls. 330/332).

Às fls. 336, o Desembargador PAULO RICARDO BRUSCHI determinou a intimação das partes para que se manifestassem acerca da possibilidade do reconhecimento da prescrição.

Devidamente intimadas (fls. 337), as partes não apresentaram manifestação (fl. 338).

Vieram os autos conclusos.

Este é o relatório.


VOTO

I - Do direito intertemporal

Não obstante o Código de Processo Civil de 2015 tenha aplicabilidade imediata desde 18/03/2016, nos termos de seus artigos 1.045 e 1.046, registra-se, por oportuno, que a análise do recurso se dá sob a égide do Código Buzaid, seja por sua vigência à época em que proferida a decisão sob exame, seja por aquele diploma não compreender efeito retroativo (LINDB, artigo 6º, § 1º).

II - Da admissibilidade do recurso

Presentes os pressupostos legais, o recurso deve ser conhecido.

III - Do julgamento do recurso

Depreende-se dos autos que a Apelante pretende o recebimento de indenização por desapropriação indireta, por ser a legítima possuidora de um imóvel localizado na Ponta do Vigia, Barra da Lagoa, Florianópolis/SC, inscrito no Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis desta Capital, no livro 4/B, n. 1.190 (fl. 11), e ter o MUNICÍPIO DE FLORIANÓPOLIS considerado toda a área como de preservação permanente, o que inviabilizou o uso econômico.

Sem delongas, analisando as provas apresentadas, verifica-se que não se trata de desapropriação indireta, mas sim de limitação administrativa ambiental, não passível de indenização.

Para configuração da desapropriação é necessário o efetivo apossamento da área pelo Poder Público, retirando o bem da esfera privada, independente da vontade de seu titular. CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, ao conceituar desapropriação, ensina que:

Do ponto de vista histórico teórico, pode-se dizer que desapropriação é o procedimento através do qual o Poder Público compulsoriamente despoja alguém de uma propriedade e a adquire, mediante indenização, fundado em um interesse público. Trata-se, portanto, de um sacrifício de direito ao desapropriado. (MELLO, Celso Antôno Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Malheiros Editores LTDA, 2009, pg. 858)

Na desapropriação indireta, o Poder Público expropria o bem antes de realizar o procedimento previsto no Decreto-Lei n. 3.365/41 e o devido pagamento de indenização, devendo o proprietário prejudicado requerer judicialmente o ressarcimento do valor do bem expropriado.

Já a limitação administrativa "é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social" (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 36º ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2010, pg. 664). Em regra não são indenizáveis, pois são preceitos de ordem pública, de caráter geral, dirigidas a propriedades indeterminadas, que apenas limitam o...

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