Acórdão Nº 0500017-26.2012.8.24.0030 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 15-10-2020

Número do processo0500017-26.2012.8.24.0030
Data15 Outubro 2020
Tribunal de OrigemImbituba
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0500017-26.2012.8.24.0030, de Imbituba

Relator: Desembargador Luiz Zanelato

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO, AJUIZADA NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. PARTE AUTORA QUE PRETENDE A DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA ORIUNDA DE MÚTUO CIVIL, AO QUAL ATRIBUI A PRÁTICA DE AGIOTAGEM, PLEITEANDO, DE FORMA ALTERNATIVA, A REVISÃO DOS ENCARGOS APLICADOS, COM A CONSEQUENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA, A DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DOS CHEQUES DADOS EM GARANTIA AO PACTO, E O RECONHECIMENTO DA QUITAÇÃO DA DÍVIDA. RÉU QUE, ASSUMINDO O MÚTUO AJUSTADO ENTRE AS PARTES, DEFENDE A MANUTENÇÃO DA TAXA CONTRATADA E APRESENTA RECONVENÇÃO, PLEITEANDO O PAGAMENTO DAS PARCELAS INADIMPLIDAS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, PROLATADA NA VIGÊNCIA DO CPC/2015, QUE REVISA AS CLÁUSULAS DO CONTRATO, LIMITANDO OS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATATOS ORIGINALMENTE EM 3% (TRÊS POR CENTO) AO MÊS AO DOBRO DO LIMITE LEGAL, FIXANDO A TAXA EM 2% (DOIS POR CENTO) AO MÊS, DECLARANDO A INEXIGIBILIDADE DOS CHEQUES QUE GARANTEM O PACTO, E ACOLHENDO, EM PARTE, A RECONVENÇÃO PARA O FIM DE CONDENAR A AUTORA AO PAGAMENTO DO SALDO AJUSTADO REMANESCENTE DA DÍVIDA.

RECURSO DA PARTE AUTORA/RECONVINDA.

JUROS REMUNERATÓRIOS. MÚTUO DE NATUREZA CIVIL E NÃO BANCÁRIA. ENCARGO QUE SE SUJEITA AO LIMITE LEGAL, DESCABENDO QUALQUER MODULAÇÃO EM PERCENTUAL ACIMA DO REFERIDO LIMITE PARA CARACTERIZAÇÃO DA ABUSIVIDADE. TETO APLICADO QUE DEVE COINCIDIR COM O PRÓPRIO LIMITE LEGAL E NÃO ACIMA DELE. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DOS ARTIGOS 591 E 406 DO CÓDIGO CIVIL/2002, EM CONJUNTO COM O ARTIGO 161, § 1º, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. NECESSÁRIA REFORMA DA SENTENÇA PARA O FIM DE LIMITAR A TAXA DE JUROS PRATICADA AO PERCENTUAL DE 1% (UM POR CENTO) AO MÊS, EQUIVALENTE A 12% (DOZE POR CENTO) AO ANO, CAPITALIZADA ANUALMENTE.

REVISÃO DA TAXA DE JUROS E CAPITALIZAÇÃO QUE IMPLICA EM SE PROMOVER O RECÁLCULO DE TODA A DÍVIDA, AUTORIZANDO A REPETIÇÃO/COMPENSAÇÃO DAS PARCELAS PENDENTES COM O QUE A AUTORA TERIA EVENTUALMENTE PAGO A MAIOR NO CONTRATO. QUANTIA JÁ PAGA PELA AUTORA (25 DAS 30 PARCELAS AJUSTADAS) QUE, TODAVIA, TOMANDO POR BASE A REVISÃO CONTRATUAL, INDICA, JÁ DE PLANO, TER ELA QUITADO TODO O DÉBITO, POSSUINDO, AINDA, DIREITO À REPETIÇÃO DE SALDO REMANESCENTE PAGO A MAIOR, A SER APURADO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RECONHECIMENTO DA QUITAÇÃO DO CONTRATO QUE REPERCUTE, AINDA, NA DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA DA AUTORA E IMPROCEDÊNCIA DA RECONVENÇÃO APRESENTADA PELO RÉU/RECONVINTE.

ÔNUS SUCUMBENCIAIS. PROVIMENTO DO RECURSO QUE IMPLICA EM READEQUAR A SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA RECONHECIDA EM PRIMEIRO GRAU, IMPUTANDO-SE À PARTE RÉ/RECONVINTE A RESPONSABILIDADE INTEGRAL PELA PAGAMENTO DAS CUSTAS JUDICIAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS NA SENTENÇA.

RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0500017-26.2012.8.24.0030, da comarca de Imbituba 1ª Vara em que é/são Apelante(s) Guaiúba Mecânica e Guincho Ltda. ME e Apelado(s) Jaime Augusto de Resende.

A Primeira Câmara de Direito Comercial decidiu, por votação unânime, conhecer e dar provimento ao recurso, para fim de limitar em 1% (um por cento) ao mês, equivalente a 12% (doze por cento) ao ano, capitalizada anualmente, a taxa de juros remuneratórios do contrato de mútuo civil entabulado entre as partes, declarando quitado o contrato havido entre as partes, e reconhecendo o direito da parte autora à repetição da quantia por ela paga a maior, a ser apurada em liquidação de sentença, bem como condenar a parte ré à integralidade das custas judiciais e honorários advocatícios fixados na origem. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Guilherme Nunes Born, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Mariano do Nascimento e José Maurício Lisboa.

Florianópolis, 15 de outubro de 2020.

Desembargador Luiz Zanelato

Relator


RELATÓRIO

Guaiúba Mecânica e Guincho Ltda. ME interpôs recurso de apelação cível (fls. 192-207) em face da sentença de fls. 182-189, que, proferida pelo juízo da 1ª Vara da comarca de Imbituba, julgou apenas parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação Declaratória de Inexistência de Débito ajuizada pela apelante em face de Jaime Augusto de Resende, acolhendo, em parte, a reconvenção apresentada pelo réu, ora recorrido.

Cuida-se, na origem, de ação declaratória de inexistência de débito aforada em 23-1-2012 por Guaiúba Mecânica e Guincho Ltda. ME (fls. 05-28), tendo por objetivo principal a declaração de nulidade de contrato de mútuo firmado com Jaime Augusto de Resende diante da suposta prática de agiotagem. Relatou, neste sentido, que tomou emprestado do demandado a quantia de R$ 70.000,00 (setenta mil reais), a ser quitada mediante o pagamento de 30 (trinta) prestações mensais fixadas R$ 3.570,00 (três mil quinhentos e setenta reais) - valor que aponta a adoção de uma taxa de juros remuneratórios de 3% ao mês capitalizada mensalmente, portanto, em violação às diretrizes legais - a vencerem no dia 18 de cada mês com inicio em 18-9-2008, emitindo 30 (trinta) cheques em garantia da dívida. Destacou que vinha honrando regularmente o pagamento das prestações, até que, ao tentar efetuar o pagamento da prestação de n. 26, o requerido negou-lhe o resgate do respectivo cheque garantidor, vindo a protestar o título. Requereu, alternativamente, a modificação do contrato com a revisão dos encargos contratuais para o fim de ajustá-los às regras do mútuo civil, em especial a limitação da taxa de juros remuneratórios ao patamar legal de 1% (um por cento) ao mês, equivalente a 12% (doze por cento) ao ano capitalizado anualmente. Sustentou, ainda, a inexigibilidade dos cheques que serviram de garantia ao contrato, diante da revisão dos valores contratados e da necessidade de reconhecimento da quitação da dívida em razão do decote dos juros e da compensação das parcelas em aberto com o valor já pago a maior, bem como afirmou o direito à repetição do saldo remanescente.

Recebida a inicial, a antecipação de tutela postulada, que tinha por objetivo restou indeferida (fls. 67-68).

Devidamente citada, a parte demandada apresentou defesa na forma tanto de contestação quanto de reconvenção. Em sede de contestação defendeu a legalidade do contrato e das cláusulas contratadas, destacando a inexistência de agiotagem. Argumentou ser legitima a cobrança dos juros remuneratórios nos contratos de mútuo civil alegando a regularidade da taxa contratada. No mais, ponderou a exigibilidade dos títulos que garantem a dívida e, em sede de reconvenção, postulou a condenação da autora ao pagamento do débito supostamente existente, referentes as prestações de n. 26 à 30 representadas pelos respectivos cheques garantidores (fls. 155-168).

Réplica às fls. 176-181, na qual a parte autora reafirmou os termos da inicial, pugnando pela procedência da demanda.

Sobreveio sentença de mérito prolatada em 20-8-2019 pelo magistrado Antônio Carlos Ângelo, da 1ª Vara da comarca de Imbituba, julgando parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, e acolhendo em parte a reconvenção, o que se deu nos seguintes termos (fls. 182-189):

VISTOS ETC.

GUAIÚBA MECÂNICA E GUINCHO LTDA. ME, qualificado(a) à fl. 02, por intermédio de advogado(a) regularmente habilitado(a), ajuizou DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE E INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA em face de JAIME AUGUSTO DE RESENDE, igualmente identificado(a)(s) nos autos, ante os fatos assim descritos na exordial:

"A empresa autora trata-se de uma empresa Imbitubense, que atua a muitos anos na Região da Amurel, através de seus serviços de guincho.

Ocorre que em meados de agosto de 2008 passou por uma crise financeira, a qual resultou a tratativa com alguns bancos em busca de crédito para o funcionamento e investimento na empresa.

Ademais, pelo desespero, acabou contratando em 18 de agosto de 2008, com o requerido Sr Jaime Augusto de Resende um contrato de mútuo financeiro (em anexo), para o empréstimo do valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais).

Para tanto, referido contrato e valor seria cobrado através de 30 (trinta) parcelas no valor de R$ 3.570,00 (três mil quinhentos e setenta reais), sendo que lhe foi entregue trinta cheques com vencimento para cada dia 18, até dia 18 de fevereiro de 2011, totalizando o valor de R$ 107.100,00.

Ainda, foi dado em garantia um Caminhão Muck, Ford Cargo 1517, 1985/1986, de placa MCR 8880, acoplado a um Guindaste Masal com capacidade para 15 toneladas.

Advirta-se que no valor do contrato (R$ 70.000,00) foram cobrados juros de 3% ao mês, conforme cláusula 6º do contrato.

Desta feita, o acordado seria o autor pagar a parcela e resgatar o título respectivo ao mês, com forma de extinção da dívida ao final.

Contudo, de forma surpreendentemente e até agora sem explicação plausível, no pagamento do da 26ª parcela, o requerido reteve o respectivo cheque (mesmo o autor tendo lhe entregado o valor), e posteriormente protestou este e outros títulos junto ao Cartório de Notas e Protestos de Títulos de Imbituba. (títulos 850255, 850256, 000879, 010825)

Neste momento ficou flagrante a má-fé do requerido para com o negócio entabulado.

Ora, Excelência os títulos são inexigíveis, pois serviam de garantia da agiotagem, sendo que o requerido exige juros excessivos e capitalizados, o que caracterizaria tal situação.

Posto isto, não possui a requerente qualquer débito com o requerido, que possa dar origem à cobrança, razão pelo qual se revela a mesma abusiva e com o único propósito de constranger a autora a efetivar pagamento de valores indevidos, haja vista que nada possui em aberto com o referido demandado".

Com base em tais fatos, postulou a entrega de prestação jurisdicional declarando a inexistência de débito e a nulidade dos cheques mencionados ou, alternativamente, a revisão do contrato para que os juros...

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