Acórdão Nº 0500131-29.2013.8.24.0159 do Segunda Câmara de Direito Público, 04-04-2023

Número do processo0500131-29.2013.8.24.0159
Data04 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoSegunda Câmara de Direito Público
Classe processualApelação / Remessa Necessária
Tipo de documentoAcórdão










Apelação / Remessa Necessária Nº 0500131-29.2013.8.24.0159/SC



RELATOR: Desembargador FRANCISCO JOSÉ RODRIGUES DE OLIVEIRA NETO


APELANTE: JERUZA VIEIRA MARTINS CARDOSO (AUTOR) ADVOGADO(A): ROSAMON BECKHAUSER ULIANO (OAB SC059288) APELADO: ESTADO DE SANTA CATARINA (RÉU)


RELATÓRIO


Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Estado de Santa Catarina em face de sentença que, proferida na "ação ordinária com pedido de antecipação de tutela" ajuizada por Jeruza Vieira Martins Cardoso, julgou parcialmente procedentes os pedidos, nos seguintes termos:
"Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, resolvo o mérito e JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados na inicial por JERUZA VIEIRA MARTINS CARDOSO em face do ESTADO DE SANTA CATARINA para condenar o respectivo ente ao fornecimento gratuito à parte ativa dos fármacos "Velija 60mg"; "Velija 30mg", "Venlafaxina 76 mg", "Venlafaxina 150 mg", "Oxcarbazepina 600mg", "Arava 20 mg", "Neozine 100mg", "Zolpiden 10mg", "Ultracet 37,5 mg", "Rivotril 2mg" e "Tramadol 50mg", nos termos da prescrição médica que os recomendam-lhe, pelo período que se fizerem necessários.MANTENHO EM PARTE a medida liminar concedida a título de tutela de urgência no decorrer da instrução processual, tão somente no que toca aos fármacos "Velija 60mg"; "Velija 30mg", "Venlafaxina 76 mg", "Venlafaxina 150 mg", "Oxcarbazepina 600mg", "Arava 20 mg", "Neozine 100mg", "Zolpiden 10mg", "Ultracet 37,5 mg", "Rivotril 2mg" e "Tramadol 50mg", nos termos da fundamentação acima.DETERMINO que a parte autora, a cada 90 (noventa) dias, apresente no local competente prescrição médica atualizada na qual conste indicação da continuidade do tratamento objeto de concessão no presente feito, no intuito de evidenciar a persistência de sua necessidade, sob pena de presunção de sua respectiva desnecessidade em caso de eventual omissão. CONDENO a parte ré ao pagamento de honorários de sucumbência, os quais fixo em R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), nos termos do art. 85, §8º, do CPC.ISENTO de custas nos termos da Lei Complementar Estadual n. 729/2018.CERTIFIQUE-SE sobre o pagamento dos honorários periciais e, eventualmente não adimplidos, requisite-se conforme a regulamentação administrativa.Esta sentença não é sujeita ao reexame necessário, consoante o disposto no art. 11 da Lei n. 12.153/09. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. Com o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquivem-se os autos." (evento 369).
Irresignado, o ente federativo sustentou que foi condenado ao fornecimento de medicamentos cujas tecnologias não estão padronizadas no âmbito do SUS. Frisou que tal entendimento contraria o Tema 793 do STF e que insiste no encaminhamento do presente feito à Justiça Federal porque, se a União não estiver no polo passivo da demanda, não conseguirá o ressarcimento administrativo de medicamentos que deveriam ser pagos pelo Ministério da Saúde.
Disse, quanto ao tratamento padronizado postulado, que inexiste requerimento administrativo formulado perante o órgão competente, o que impõe a extinção do processo sem resolução de mérito, ante o reconhecimento da falta de interesse processual.
Quanto ao mérito, aduziu que a assistência à saúde deve observar a legislação sanitária, de modo que o ato decisório responsabiliza indevidamente o Estado de Santa Catarina por omissão que sequer existe, ou ainda, por atribuição que, segundo a legislação, compete a ente federado diverso.
Frisou que o indeferimento do pleito administrativo da parte autora decorreu do fato de que a doença que a acomete não está contemplada na recomendação de incorporação, logo a improcedência do pedido em relação ao ente público estadual é medida que se impõe.
Subsidiariamente alegou a necessidade de adoção da Denominação Comum Brasileira DCB (isto é, o nome genérico da substância ativa ou produto similar), ou, na sua falta, a Denominação Comum Internacional (DCI), nos termos do art. 3° da Lei n. 6.360/76, assim como a necessidade de redução dos honorários advocatícios porquanto arbitrados em valor superior àquele fixado por esta Corte de Justiça em demandas congêneres.
Por tais motivos, prequestionou os dispositivos legais atinentes à matéria e requereu o conhecimento e provimento do recurso (evento 375, fl. 9-10).
Com as contrarrazões (evento 380), ascenderam os autos a esta Corte (evento 41), sendo a mim distribuídos por prevenção.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, lavrou parecer por meio do Procurador de Justiça Carlos Alberto de Carvalho Rosa, manifestando-se "pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto pelo Estado de Santa Catarina. Quanto ao pleito de minoração dos honorários, com fundamento no Ato n. 103/2004/PGJ e no Enunciado n. 10 das Procuradorias de Justiças Cíveis, deixa-se de apresentar manifestação substancial, por não se vislumbrar interesse público que justifique a intervenção institucional" (evento 16, eproc 2° grau).
É o relatório essencial

VOTO


1. O voto, antecipe-se, é no sentido de dar parcial provimento ao recurso.
2. Da competência desta Corte para análise do feito:
Inicialmente, salienta-se que o Grupo de Câmaras de Direito Público, em sessão extraordinária realizada em 13.3.19, aprovou o Enunciado n. XI, fixando o marco temporal para se aferir a competência do juizado especial nos processos cujo valor da causa represente montante inferior à sessenta salários mínimos:
"Enunciado XI Nos termos da 1ª Conclusão do Grupo de Câmaras de Direito Público (DJE n. 2.023, p. 1-2, de 17-12-2014), ratifica-se que são da competência recursal do Tribunal de Justiça as ações cujas petições iniciais tenham sido protocoladas até 23 de junho de 2015, ressalvados os casos anteriores a essa data em que houve inequívoca adoção do rito da Lei n. 12.153, de 22 de dezembro de 2009 (DJE n. 3.024, de 21.3.19)."
Assim, muito embora o valor atribuído à causa seja inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, o processo da origem foi protocolado em 27.5.13, ou seja, em data anterior àquela estabelecida nas Conclusões do Grupo de Câmaras de Direito Público como marco para a aplicação da competência absoluta dos Juizados Especiais das Fazendas Públicas (23.6.15), razão pela qual deve ser conhecida a competência deste Tribunal para o julgamento da causa.
3. Do não conhecimento da remessa necessária:
A remessa necessária, no caso em análise, está dispensada, porquanto a sentença que julgou procedente o pedido inicial está fundamentada no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 0302355-11.2014.8.24.0054 julgado pelo Grupo de Câmaras de Direito Público.
Neste contexto, em observância ao art. 496, § 4º, III, do CPC/15, a remessa necessária não deve ser conhecida.
4. Das preliminares:
4.1 Insurge-se o ente estatal sobre a indispensabilidade da citação da União para compor o polo passivo da demanda, cujo objeto visa o fornecimento de tecnologias não padronizadas no SUS pelo Estado de Santa Catarina.
Acerca da responsabilidade dos entes públicos nas demandas relacionadas à saúde pública, o Supremo Tribunal Federal decidiu, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n. 855.178/SE, com repercussão geral, que "o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente".
Contudo, em sede de embargos de declaração, o Min. Edson Fachin propôs o esclarecimento da responsabilidade solidária a partir da STA n. 175, aprimorando a tese jurídica no seguinte sentido: "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro" (decisão datada de 22.5.19, por maioria de votos do Plenário).
Para a aplicação da referida tese, a Suprema Corte ainda estabeleceu as seguintes diretrizes:
"i) A obrigação a que se relaciona a reconhecida responsabilidade solidária é a decorrente da competência material comum prevista no artigo 23, II, CF, de prestar saúde, em sentido lato, ou seja: de promover, em seu âmbito de atuação, as ações sanitárias que lhe forem destinadas, por meio de critérios de hierarquização e descentralização (arts. 196 e ss. CF); ii) Afirmar que 'o polo passivo pode ser composto por qualquer um deles (entes), isoladamente ou conjuntamente' significa que o usuário, nos termos da Constituição (arts. 196 e ss.) e da legislação pertinente (sobretudo a lei orgânica do SUS n. 8.080/90) tem direito a uma prestação solidária, nada obstante cada ente tenha o dever de responder por prestações específicas, que devem ser observadas em suas consequências de composição de polo passivo e eventual competência pelo Judiciário;iii) Ainda que as normas de regência (Lei 8.080/90 e alterações, Decreto 7.508/11, e as pactuações realizadas na Comissão Intergetores Tripartite) imputem expressamente a determinado ente a responsabilidade principal (de financiar a aquisição) pela prestação pleiteada, é lícito à parte incluir outro ente no polo passivo, como responsável pela obrigação, para ampliar sua garantia, como decorrência da adoção da tese de solidariedade pelo dever geral de prestar saúde;iv) Se o ente legalmente responsável pelo financiamento da obrigação principal não compuser o polo passivo da relação jurídico-processual, sua inclusão deverá ser levada a efeito pelo órgão julgador, ainda que isso signifique deslocamento de competência;v) Se a pretensão veicular pedido de tratamento, procedimento, material ou medicamento não incluído nas políticas públicas (em todas as suas hipóteses),...

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