Acórdão Nº 0500230-19.2013.8.24.0023 do Terceira Câmara de Direito Civil, 24-05-2022

Número do processo0500230-19.2013.8.24.0023
Data24 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0500230-19.2013.8.24.0023/SC

RELATOR: Desembargador SÉRGIO IZIDORO HEIL

APELANTE: POWER IMPORTS VEICULOS LTDA APELANTE: ADEMIR PEREIRA APELADO: MERCADOLIVRE.COM ATIVIDADES DE INTERNET LTDA RÉU: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações cíveis interpostas pelas partes em face da sentença proferida pelo juízo da 4ª Vara Cível da Comarca da Capital que, nos autos da "ação ordinária por indenização por danos materiais", em epígrafe, julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial para condenar a requerida Kia - Power Imports Veículos Ltda no pagamento da importância de R$ 21.000,00 (vinte e um mil reais), acrescido de correção monetária da data do desembolso feito pelo autor e juros de mora a partir da citação. Por fim, condenou as partes no pagamento de 50% das custas processuais cada um e honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor da condenação para cada parte, suspensa a exigibilidade em favor do requerente pelo prazo de 05 anos, conforme disposto no artigo 98 §3º do CPC (evento 117).

Em suas razões recursais aduz a requerida, preliminarmente, que deve ser suspenso o presente processo até que seja apurada a responsabilidade criminal dos golpistas, pois não foi a concessionária que praticou o evento danoso, sendo necessário o esgotamento das investigações para conhecer a autoria do delito; entende que é parte ilegítima para figurar no polo passivo, pois em momento algum o autor comunicou como se daria o negócio, ou seja, não falou que havia encontrado na internet um veículo Zero Km por cerca de 60% abaixo do preço de mercado e que para concretização do negócio deveria ele fazer o depósito em nome de "terceiros", estes, os "vendedores" interessados; entende que o autor foi vítima de estelionatários, devendo estes responderem pelos eventuais danos causados e não a requerida, que também suportou prejuízos e em nada contribuiu para o sucesso do golpe; denunciou à lide as pessoas que receberam os valores pagos pelo autor, quais sejam: Renato Amorim, José Limeira Martins e Jéssica Tamires Martins, requer seja oficiado ao Banco Itaú, onde ocorreram os depósitos para que preste as informações necessárias. No mérito, aduz que o autor procurou a recorrente no afã de adquirir um veículo Bongo zero Km e a todo o momento a narrativa é de que possuía um crédito decorrente de um sinistro de perda total, o qual seria pago pela seguradora Liberty Seguros; "Escolhido o veículo, o Apelado usou o seu celular para telefonar para o então responsável pela seguradora, quando então passou o aparelho para o vendedor Fabiano Lopes, momento em que foram passadas as informações do veículo e as condições de negociação. O Apelado foi informado de que o veículo somente seria entregue após a comprovação de pagamento pela seguradora e de que constaria na nota fiscal a condição de reserva de domínio em favor da Apelante, a qual seria devidamente cancelada também após a quitação."; acredita que a culpa foi toda do autor que devia ter estranhado pagar por um carro zero km apenas 60% do seu valor de mercado. Ao final, requer o provimento do seu recurso, bem como a revogação do benefício da justiça gratuita concedido ao autor, condenando-o em custas e honorários advocatícios. (Evento 122).

Por sua vez, o autor assevera: ter sido vítima de um golpe; entende que a fraude foi levada a efeito em razão de negligência da requerida Kia - Power Imports Veículos Ltda, que confirmou a certeza do negócio celebrado e passou credibilidade ao autor para efetuar transferência do dinheiro a terceiros; destaca que consta na contestação que no início do ano de 2012 a empresa KIA recebeu um comunicado interno emitido pelo departamento de vendas da KMB - Kia Motors do Brasil Ltda, detentora da marca KIA no país, alertando para as inúmeras práticas de golpes idênticos ao ocorrido com o autor em agosto de 2012, onde estelionatários oferecem veículos com valor abaixo do mercado e simulam o pagamento através de TED falsos ou cheques, muitas vezes roubados; entende que a parte ré deixou de adotar os cuidados necessários para evitar novos eventos fraudulentos, de sorte que sua conduta negligente também ficou evidente pelo fato de ter emitido nota fiscal de compra em nome do autor, sem sequer ter confirmado os dados com a seguradora Liberty, razão pela qual deve ressarcir o acionante no valor total de R$ 42.000,00 (quarenta e dois mil reais) e não apenas em 21.000,00 (vinte e um mil reais), como determinado na sentença. Por fim, requer seja conhecido e provido seu apelo (Evento 123).

Contrarrazões, pelo autor (Evento 127), e pela ré (Evento 128).

VOTO

De início, vale esclarecer que tanto a prolação da decisão recorrida quanto a interposição do recurso sucederam à entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), de modo que os pressupostos de admissibilidade recursal devem observar o regramento disposto no novo diploma, consoante disposto no Enunciado Administrativo n. 3 do STJ.

Dito isso, porque presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à análise de suas razões.

Trata-se de ação de indenização por danos materiais ajuizada por Ademir Pereira em face de KIA Power Imports Veículos Ltda e Mercadolivre.com Atividades de Internet Ltda.

As rés apresentaram contestação.

No evento 108, DEC. 203/206 foi indeferido o pedido de tutela antecipada, de suspensão do processo, de inversão do ônus da prova e de denunciação à lide. Foi determinada, ainda, a especificação de provas naquela ocasião.

Na decisão acostada ao evento 108, DEC324/329, foi acatada a preliminar de ilegitimidade passiva da ré Mercadolivre.comAtividades de Internet Ltda, e julgado extinto o feito em relação a esta, prosseguindo a demanda apenas em desfavor de KIA Power Imports Veículos Ltda.

Descontente, o autor interpôs agravo de instrumento (evento 108, AGRAV 333/350), o qual foi negado efeito suspensivo e, no mérito, desprovido por esta Terceira Câmara de Direito Civil, em acórdão da relatoria do saudoso Des. Marcus Tulio Sartorato, mantendo-se a decisão agravada, nos seguintes termos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSUMIDOR. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA EM QUE SE RECONHECEU A ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO RÉU "MERCADOLIVRE.COM". TEORIA DA ASSERÇÃO. COMPRA DE VEÍCULO REALIZADA DIRETAMENTE COM O VENDEDOR A PARTIR DE CONTATO OBTIDO NO WEBSITE DO "MERCADO LIVRE". PRODUTO COM DEFEITO. IMPOSSIBILIDADE DE SE IMPOR AO SITE DE INTERMEDIAÇÃO DE COMPRAS E VENDAS PELA INTERNET O DEVER DE FISCALIZAR A ORIGEM DE TODOS OS PRODUTOS ALI ANUNCIADOS. ATIVIDADE EXTRÍNSECA AO SERVIÇO PRESTADO. PRECEDENTES DO STJ. NEGOCIAÇÃO NO CASO, ADEMAIS, REALIZADA DIRETAMENTE COM O VENDEDOR. AUSÊNCIA DE INTERMEDIAÇÃO DO SITE NAS TRATATIVAS E NO PAGAMENTO. ILEGITIMIDADE PASSIVA VERIFICADA. INTERLOCUTÓRIO MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO. 1. "Não se pode impor aos sites de intermediação de venda e compra a prévia fiscalização sobre a origem de todos os produtos anunciados, na medida em que não constitui atividade intrínseca ao serviço prestado." (STJ, REsp 1383354/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 27/08/2013) 2. "[...] o MercadoLivre.com é parte ilegítima nas hipóteses em que a atuação do sítio eletrônico se restringir a disponibilizar o anúncio feito pelo vendedor, tendo as tratativas do negócio, bem como o pagamento sido feitos diretamente entre os particulares. Igualmente, a instituição financeira não tem legitimidade passiva para responder por numerário depositado em conta corrente de cliente. [...]" (TJDFT, Apelação 0008428-45.2013.8.07.0001, Rel. Des. J.J. Costa Carvalho, 2ª Turma Cível, j. 03.06.2015) (TJSC, Agravo de Instrumento n. 4001637-79.2017.8.24.0000, da Capital, rel. Marcus Tulio Sartorato, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 13-06-2017). (evento 108, DEC. 366/375).

Produzida prova testemunhal, foi proferida sentença, como visto por ocasião do relatório, julgando parcialmente procedente o pedido formulado na inicial para condenar a requerida Kia - Power Imports Veículos Ltda no pagamento da importância de R$ 21.000,00 (vinte e um mil reais), acrescido de correção monetária da data do desembolso feito pelo autor e juros de mora a partir da citação.

Inconformadas, ambas as partes apelaram.

Pretende a parte ré a revogação do benefício da justiça gratuita ao argumento de que o "Apelado...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT