Acórdão Nº 0500690-44.2011.8.24.0033 do Terceira Câmara de Direito Comercial, 03-02-2022

Número do processo0500690-44.2011.8.24.0033
Data03 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoTerceira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0500690-44.2011.8.24.0033/SC

RELATOR: Desembargador TULIO PINHEIRO

APELANTE: VILDA JUSTINA AIOLFI (RÉU) APELADO: ITAUCARD ADM DE CARTOES DE CRED E IMOB LTDA GRUPO ITAU (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Vilda Justina Aiolfi contra sentença do Juízo da Vara Regional de Direito Bancário da Comarca de Itajaí, em ação de reintegração de posse contra si ajuizada por Itaucard Adm. de Cartões de Cred. e Imob. Ltda. Grupo Itaú.

No decisum combatido, a MM.ª Juíza Cristine Mattos julgou: a) improcedente a actio possessória e condenou a financeira acionante ao pagamento de multa por litigância de má-fé no montante de 2% (dois) por cento do valor da causa, bem como a responsabilizou pelas verbas de sucumbência e; b) parcialmente procedente a reconvenção, a fim de condenar a casa bancária reconvinda ao pagamento, a título de danos morais, de R$ 10.000,00 (dez mil reais) em favor do reconvinte, além de rejeitar a pretensão de repetição do indébito em dobro, além de responsabilizá-la pelos ônus sucumbenciais (evento 178 da origem).

Em suas razões, a parte consumidora postula, em suma, a reforma do decisum, seja para que haja a restituição do indébito na forma dobrada, por ter sido demandada por dívida já quitada, seja para a majoração do quantum arbitrato a título de indenização e de honorários advocatícios sucumbenciais na actio reconvencional (evento 185 da origem).

Com as contrarrazões (evento 200 da origem), subiram os autos a esta Corte.

VOTO

Das preliminares de deserção e de ofensa à dialeticidade, sustentadas em contrarrazões.

De início, não comporta acolhida a preliminar de deserção do recurso, aduzida em contrarrazões.

Isto porque, conforme se extrai dos autos, a apelante, simultaneamente ao manejo do reclamo, procedeu ao recolhimento do preparo (evento 185, Comprovantes 253 e 254).

Igualmente, não há falar em ofensa à dialeticidade, uma vez que o apelo pede a modificação da sentença em pontos específicos, passíveis de análise à luz da fundamentação lançada.

Destarte, rejeitam-se as isagoges aventadas e passa-se a apreciar o recurso de apelação, o qual, adianta-se, será examinado por tópicos.

Da pretendida restituição do indébito na forma dobrada.

De início, postula a recorrente, com fulcro no art. 940 do Código Civil, a repetição do indébito na forma dobrada. Para tanto, fundamenta sua pretensão no fato de ter sido demandada, ainda que em ação de natureza possessória, por débito judicialmente declarado quitado em demanda declaratória anteriormente ajuizada para este fim (Ação n. 033.10.019651-1).

Assite razão à recorrente quanto ao ponto.

Consoante disposto no art. 940 do Código Civil:

Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.

Sobre o artigo em voga, colhe-se dos ensinamento de Maria Helena Diniz:

(...) Responsabilidade do demandante por débito já solvido. O artigo sub examine trata do caso do excesso de pedido, ou seja, do re plus petitur (Revista do Direito, 59: 593; RT, 804:189, 799:363, 407:132, 581:159 e 585:99), com o escopo de impedir que se cobre dívida já paga, e só será aplicável mediante prova de má-fé do credor, ante a gravidade da penalidade que impõe. Assim, quem cobrar judicialmente dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar o quantum recebido, ficará obrigado a pagar ao devedor o dobro do que houver cobrado (...) (Código civil anotado. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p.729).

Outrossim, na lição de Theotônio Negrão sobre o tema extrai-se que "'pratica conduta maliciosa o credor que, após demonstrado cabalmente o pagamento pelo devedor, insiste na cobrança de dívida já paga e continua praticando atos processuais, levando o processo até o final' (STJ- 3ª T., Resp 608.887, Min. Nancy Andrighi, j. 18.8.05, dois votos vencidos, DJU 13.3.06)" (Código civil, 32ª ed., rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2013, p. 349).

Nota-se, pois, que a indenização prevista no dispositivo citado depende da comprovação da existência de dolo por parte do credor que efetuar a cobrança indevida.

No caso sub examine, à época do ajuizamento da presente reintegração de posse, protocolizada no dia 31.5.2011, a parcela que deu origem a propositura da possessória - cujo vencimento se operou em 30.10.2010 -, já havia sido paga, tendo, inclusive, sido quitada em tempo e modo acordados. Fato este, aliás, de pleno conhecimento do banco credor, uma vez que a quitação da prestação foi objeto de ação declaratória anteriormente ajuizada perante o Juizado Especial Cível da Comarca de Itajaí (Autos n. 033.10.019651-1), que reconheceu a inexigibilidade do valor nela expressado e determinou que o banco credor se abstivesse de "exercer quaisquer atos de notificação, inscrição ou cobrança da dívida decorrente da prestação vencida em 30/10/2010".

Vale ressaltar, outrossim, que a referida declaratória, ao tempo do ajuizamento desta reintegração de posse (31.5.2011), já contava com o deferimento da tutela de urgência (proferida em 10.2.2011), ou seja, ao pleitear judicialmente a retomada do bem garantidor de seu crédito, o banco credor já era sabedor da quitação da prestação contratual que ensejou a presente possessória (nos termos da liminar concedida).

Além disso, mesmo após reiteradas manifestações da parte devedora no curso do presente processo - com destaque à peça reconvencional (evento 110, Reconvenção 122), protocolada em 02.05.2012, com a qual a devedora acostou os comprovantes de pagamento das parcelas remanescentes do financiamento - o banco credor procedeu ao leilão extrajudicial do veículo, locupletando-se, com isso, indevidamente com o produto de sua venda.

Diante desse quadro, não há dúvidas acerca da configuração do dolo indispensável à aplicação da sanção.

Aliás, a própria sentença vergastada já havia reconhecido a má-fé do banco acionante por ajuizar a presente possessória e "alterar a verdade dos fatos", ao condená-la ao pagamento da multa prevista no art. 80, inc. II, do Código de Processo Civil. A aplicação da sanção processual, ademais, diga-se, nem sequer foi objeto de irresignação recursal.

Cumpre esclarecer, de outro vértice, que, diferentemente do que consignou a douta magistrada sentenciante, embora a reintegração de posse não seja propriamente uma ação cobrança de valores, nela se pretende a satisfação de uma dívida não adimplida, ou seja, a mora do...

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