Acórdão Nº 0501824-91.2011.8.24.0038 do Sétima Câmara de Direito Civil, 17-09-2020

Número do processo0501824-91.2011.8.24.0038
Data17 Setembro 2020
Tribunal de OrigemJoinville
ÓrgãoSétima Câmara de Direito Civil
Classe processualApelação Cível
Tipo de documentoAcórdão




Apelação Cível n. 0501824-91.2011.8.24.0038

Relator: Desembargador Carlos Roberto da Silva

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA. SENTENÇA QUE RECONHECEU A DECADÊNCIA E EXTINGUIU O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.

INSURGÊNCIA DO AUTOR.

PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL PREVISTO NO ART. 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. DESCABIMENTO. PROBLEMAS MECÂNICOS (MOTOR) APRESENTADOS EM VEÍCULO ADQUIRIDO PELO AUTOR PERANTE O ESTABELECIMENTO RÉU. HIPÓTESE EM TELA QUE NÃO CONFIGURA FATO DO PRODUTO GERADOR DE ACIDENTE DE CONSUMO. DEFEITO DE QUALIDADE EVIDENCIADO. INCIDÊNCIA DO PRAZO DE 90 (NOVENTA) DIAS PREVISTO NO ART. 26, II E § 3º, DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA PARA A POSTULADA REDIBIÇÃO. FLUÊNCIA A CONTAR DA NEGATIVA DA RESOLUÇÃO DO IMPASSE PERANTE O PROCON. AJUIZAMENTO DA PRESENTE DEMANDA QUANDO JÁ DECORRIDO O LAPSO DECADENCIAL. PLEITO RESILITÓRIO ALCANÇADO PELA DECADÊNCIA.

"Escoado o prazo decadencial de 90 (noventa) dias previsto no art. 26, II, do CDC, não poderá o consumidor exigir do fornecedor do serviço as providências previstas no art. 20 do mesmo Diploma - reexecução do serviço, restituição da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço -, porém, a pretensão de indenização dos danos por ele experimentados pode ser ajuizada durante o prazo prescricional de 5 (cinco) anos, porquanto rege a hipótese o art. 27 do CDC" (REsp 683.809/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 20/04/2010, DJe 03/05/2010).

ARGUMENTO DE INEXISTÊNCIA DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO INDENIZATÓRIA POR LUCROS CESSANTES. TESE DE APLICAÇÃO DO PRAZO DELETÉRIO PREVISTO NO ART. 27 DO CDC. ACOLHIMENTO. TRANSCURSO DE TEMPO ENTRE A AQUISIÇÃO DO PRODUTO E O AJUIZAMENTO DA DEMANDA QUE NÃO ALCANÇOU O QUINQUÊNIO LEGAL. SENTENÇA REFORMADA NO PONTO. IMPOSSIBILIDADE DE JULGAMENTO DO MÉRITO. CAUSA NÃO MADURA. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.013, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA A REGULAR INSTRUÇÃO DO FEITO.

RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0501824-91.2011.8.24.0038, da comarca de Joinville (5ª Vara Cível) em que é Apelante Atallah Dakhlallh Acrouche e Apelada Luma Automoveis Ltda.

A Sétima Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento, para reconhecer a inocorrência da prescrição da pretensão indenizatória por lucros cessantes, e, em consequência, determinar o retorno dos autos à origem para o regular processamento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, o Exmo. Des. Álvaro Luiz Pereira de Andrade, presidente com voto, e o Exmo. Des. Osmar Nunes Júnior.

Florianópolis, 17 de setembro de 2020.

Carlos Roberto da Silva

RELATOR


RELATÓRIO

Atallah Dakhlallh Acrouche interpôs recurso de apelação contra sentença (p. 155-157) que, nos autos da ação de anulação de negócio de compra e venda ajuizada em face de Luma Automóveis Ltda., reconheceu a decadência e julgou extinto o feito.

Para melhor elucidação da matéria debatida nos autos, adota-se o relatório da sentença recorrida:

Atallah Dakhlallh Acrouche, qualificado nos autos, aforou a presente ação de anulação de negócio de compra e venda contra Luma Automóveis Ltda., e Banco Itaú, igualmente qualificados.

Sustenta, em apertada síntese, que adquiriu da primeira ré em maio de 2007 um veículo GM/Blazer, ano 1997, no valor total de R$ 28.000,00, sendo realizada uma entrada na quantia de R$ 10.000,00 e 36 parcelas de R$ 780.00, valor este financiado pela segunda ré, totalizando um saldo devedor de R$ 18.000,00.

Aduz que logo após a aquisição, o veículo adquirido começou a apresentar diversos problemas mecânicos, o que ocorreu nos meses seguintes. Por conta disso, procurou a primeira ré para resolver a situação, sendo oferecido a substituição do veículo por outro equivalente, um Mercedes/Classe A, ano 1999, com o acréscimo de R$ 3.000,00. Desta forma, houve uma nova negociação no contrato de financiamento pelo segundo réu, assim, as parcelas aumentaram para 48 vezes de R$ 709,63, totalizando o valor de R$ 31.000,00.

Na sequência alega que ficou surpreso ao verificar que o segundo veículo também apresentava problemas no motor, ocorrendo a danificação, razão pela qual, procurou novamente a primeira ré para tentar solucionar o defeito, sendo que esta informou que não faria o reparo.

Requereu a anulação do contrato celebrado, condenação da primeira requerida a devolver a importância de R$ 10.000,00, relativo à entrada, bem como o pagamento de lucros cessantes.

Pela interlocutória de fl. 31 foi indeferido o pleito dos beneficios da Justiça Gratuita.

Citadas, as rés apresentaram, a tempo e modo, contestação (fls.41-62 e 82-87).

Preliminarmente, Banco Itaú Unibanco S.A. aduziu sua ilegitimidade passiva e impugnou a inversão do ônus da prova.

No mérito alegou que não tem relação com as partes, tendo apenas e exclusivamente, atuado como intermediador de ativos financeiros.

Em seguida discorreu sobre eventual rescisão do contrato, a falta de provas dos vícios do veículo e antecipação de tutela.

Ao concluir, clamou pelo reconhecimento de sua ilegitimidade ou improcedência dos pedidos colimados.

Por sua vez, a ré Luma Automóveis Ltda., sustenta a ocorrência da prescrição.

No mérito, contrapôs-se aos argumentos e pedidos articulados na petição inicial.

Ao final pugnou pela improcedência dos pedidos formulados.

Houve réplica (fls.103-109 e 110-113).

Da parte dispositiva do decisum, extrai-se a síntese do julgamento de primeiro grau:

Isso posto, com fundamento no artigo 487, II, do Código de Processo Civil, com resolução de mérito, DECLARO a ocorrência de decadência e, por consequência, JULGO EXTINTO o feito. Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 800,00, com base no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil. Fica suspensa a exigibilidade destas verbas acaso beneficiário da Justiça Gratuita.

Publique-se. Registre-se.Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, arquive-se.

No julgamento dos embargos de declaração opostos pela parte ré, pronunciou-se o Juízo a quo (p. 179-180):

ACOLHO parcialmente os embargos de declaração que LUMA AUTOMÓVEIS LTDA interpôs contra a sentença prolatada nos autos para, suprindo a omissão verificada, fazer constar no dispositivo da demanda o seguinte:

"Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 800,00, com base no art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil, na proporção de R$ 400,00 para cada um dos patronos dos réus".

Em suas razões recursais (p. 169-174) o demandante assevera que "a decadência afeta o direito de reclamar, ante o apelado, quanto ao defeito do produto, fato este que aconteceu dentro do prazo, ao passo que a prescrição atinge a pretensão de deduzir em juízo o direito de ressarcir-se dos prejuízos oriundos do fato do produto" (p. 170).

Aduz que "o não reclamo na forma do art. 26 do CDC, seja ele inexistente ou fora do tempo, não obsta a busca por reparação pelo dano em juízo, na forma do art. 27 do mesmo Diploma, pois versam em lugar temporal e pedidos diferentes, no primeiro se pretende o conserto ou substituição do produto ou serviço, no segundo pugna em juízo pela reparação do dano causado por eles" (p. 172).

Sob tais fundamentos, requer a reforma da sentença para, afastada a decadência, anular o contrato celebrado entre as partes, determinando a devolução da importância paga a título de entrada, bem como condenada a ré ao pagamento de indenização a título de lucros cessantes.

Com as contrarrazões (p. 188-191), ascenderam os autos a esta Corte de Justiça.

Este é o relatório.


VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que reconheceu a decadência e julgou extinto o feito.

De início, destaca-se que a decisão recorrida foi publicada quando já vigente o novo Código de Processo Civil (1º-7-2016 - p. 158), motivo pelo qual a referida norma norteará a presente decisão, por incidência do princípio tempus regit actum (teoria do isolamento dos atos processuais), nos moldes do art. 1.046 do atual Código de Ritos.

Tem-se como fato incontroverso, porque reconhecido expressamente e não impugnado pelas partes, que a apelante, em maio de 2007, adquiriu da primeira apelada o automóvel GM/Blazer, ano 1997, e que passados aproximadamente dois meses referido bem apresentou problema e foi substituído por outro veículo (Mercedes/Classe A, ano/modelo 1999).

Igualmente inconteste que a insurgente reclamou acerca do segundo automóvel, que apresentou problemas no funcionamento do motor, cujo reparo foi negado em razão de o fato ter ocorrido por mau uso pelo consumidor.

A controvérsia, portanto, cinge-se em analisar a almejada incidência do prazo prescricional quinquenal previsto no art. 27 do CDC para a pretensão redibitória, bem como para o pleito de indenização a título de lucros cessantes.

Sobre tais pontos, então, debruçar-se-á a presente decisão.

Adianta-se, desde já, que o apelo comporta parcial acolhimento.

I - Do pleito de rescisão contratual:

A pretensão de incidência do prazo prescricional quinquenal para o pleito resilitório não merece guarida.

Com efeito, dispõe o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor: "Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria".

A lei consumerista, ao exemplificar o que seria fato do produto ou do serviço prevê, no art. 12, § 1º, do CDC, que "o produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera".

Da exegese do dispositivo legal supramencionado percebe-se, portanto, que o fato do produto, também denominado de "defeito",...

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