Acórdão Nº 0602071-68.2014.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 01-09-2022

Número do processo0602071-68.2014.8.24.0008
Data01 Setembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0602071-68.2014.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador LUIZ ZANELATO

APELANTE: BANCO DO BRASIL S.A. (AUTOR) APELANTE: ACP CONFECCOES EIRELI (RÉU) ADVOGADO: SÉRGIO FERNANDO HESS DE SOUZA (OAB SC004586) ADVOGADO: DANTE AGUIAR AREND APELANTE: DIETER VILMAR RADUENZ (RÉU) ADVOGADO: SÉRGIO FERNANDO HESS DE SOUZA (OAB SC004586) ADVOGADO: DANTE AGUIAR AREND APELANTE: JAQUELINE REIF RADUENZ (RÉU) ADVOGADO: SÉRGIO FERNANDO HESS DE SOUZA (OAB SC004586) ADVOGADO: DANTE AGUIAR AREND APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Banco do Brasil S.A. e ACP Confecções Eireli interpuseram recursos de apelação cível em face da sentença do Evento 101 dos auto de origem, que, proferida pelo 19º Juízo da Unidade Estadual de Direito Bancário, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação de Cobrança ajuizada pelo Banco do Brasil em face de ACP Confecções, Dieter Vilmar Raduenz e Jaqueline Reif Raduenz, o que se deu nos seguintes termos:

RELATÓRIO

BANCO DO BRASIL S.A. ajuizou demanda em face de e outros, objetivando cobrar crédito no valor originário de R$ 332.111,75, decorrente de contrato(s) de contrato de desconto de títulos.

O(s) integrante(s) do polo passivo foi(ram) citado(s) e apresentaram contestação sustentando a impossibilidade da cobrança do valor ante a ocorrência de abusividades.

Houve réplica.

Após o regular trâmite, os autos vieram conclusos.

FUNDAMENTAÇÃO

Julgo a demanda antecipadamente, por se tratar de matéria somente de direito, consoante art. 355, I, do CPC.

Da carência de ação/iliquidez ou inexistência do título que embasa a presente ação

Não prospera a prefacial.

De início, convém esclarecer que a ação de cobrança é o instrumento processual que dispõe o credor para obter, com base em documento escrito, a formação de título executivo judicial, diante da ausência dos pressupostos de liquidez, certeza e exigibilidade da obrigação, ou seja, ao contrário do que argumenta a parte e, a ação de cobrança não exige a presença dos requisitos da ação de execução definidos no CPC.

Na definição do jurista De Plácido e Silva,

[...] a ação de cobrança é a que resulta do chamamento do devedor a juízo para o pagamento de obrigação representada em documento assinado pelo devedor, ou resultante de qualquer compromisso por ele assumido, ou decorrente de contrato (Vocabulário jurídico. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 11).

No mesmo sentido, já decidiu o TJSC:

APELAÇÃO CíVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DOS DEMANDADOS. PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INOCORRÊNCIA. PROVAS DOCUMENTAIS SUFICIENTES PARA O JULGAMENTO DA LIDE. CONTRATOS DEVIDAMENTE ACOSTADOS AOS AUTOS. TESE AFASTADA. ALEGADA ILIQUIDEZ E INEXIGIBILIDADE DOS DOCUMENTOS APRESENTADOS. AÇÃO DE COBRANÇA QUE NÃO EXIGE A PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 586 DO CPC. PRESENÇA DE ELEMENTOS QUE CONFIRMAM A PACTUAÇÃO DE SERVIÇOS HAVIDA ENTRE AS PARTES. (TJSC, Apelação Cível n. 2008.005137-9, de Herval D'Oeste, rel. Des. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 27-09-2012).

Fica, nestes termos, afastada a prefacial.

Do pedido de revisão contratual

Juros Remuneratórios

Segundo entendimento sedimentado pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, os juros remuneratórios podem ser superiores a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassem a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil. Tanto é que os integrantes do Grupo de Câmaras de Direito Comercial deste egrégio Tribunal de Justiça editaram alguns enunciados sobre o assunto.

Veja-se:

I - Nos contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12 % (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil. [...] IV - Na aplicação da taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade.

No mesmo sentido, o verbete sumular n. 648 do Supremo Tribunal Federal (que culminou na edição da Súmula Vinculante n. 7 e a Súmula n. 296 do Superior Tribunal de Justiça:

Aliás, oportuno registrar excerto do voto da Minª. Nancy Andrighi, prolatado no Resp n. 1061530-RS: "a taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos".

Destaco que o Custo Efetivo Total (CET) não é o parâmetro de comparação com a taxa média de mercado, porquanto ultrapassa o percentual de juros, para fins de englobar todas os demais encargos incidentes na contratualidade, conforme a Resolução 3.517/2007 do Conselho Monetário Nacional. Notadamente, o referido índice não é adequado para verificação da onerosidade, pois tal análise deve ser resolvida individualmente para cada suposta irregularidade contratual, sob pena de resultado incongruente. No ponto, aliás, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina orienta que é "descabida a utilização da taxa prevista no contrato correspondente ao custo efetivo total anual para aferição da abusividade dos juros remuneratórios, porquanto ela representa não somente a remuneração do capital, mas todos os encargos e despesas incidentes na operação, nos termos da Resolução n.º 3.517/2007, do Banco Central do Brasil" (TJSC, AC 2012.043020-0, Paulo Roberto Camargo Costa, 07.08.2014).

Acrescento que as instituições financeiras, desde que devidamente constituídas e reconhecidas pelos órgãos oficiais, por via de regra não precisam de autorização específica do Conselho Monetário Nacional para contratação de juros em níveis superiores aos permitidos às demais pessoas jurídicas não fiscalizadas pelo Bacen, ressalvados casos específicos previstos em lei, a exemplo das cédulas de crédito industrial, rural e comercial, apesar do disposto no art. 4º, IX, da Lei 4.595/1964. Isto porque a referida entidade regulamentar e fiscalizadora não exerceu a atribuição administrativa de fixar limite à remuneração do capital, deixando o equilíbrio do sistema financeiro à livre atuação do mercado. Daí que somente quando se tratarem de notas e cédulas de crédito rural, comercial e industrial, será necessário que a casa bancária comprove (art. 373, II, do CPC) que obteve prévia autorização do Conselho Monetário Nacional para exigir juros remuneratórios acima de 12% ao ano, conforme interpretação sistemática dos arts. 5º do Decreto-lei 413/1969, da Lei 6.840/80 e 22 do Decreto 22.626/33 (Lei da Usura).

Assevero, ainda, ser possível a variação da taxa de juros na administração de cartões de crédito, porquanto as instituições financeiras não podem antever os custos de captação de recursos para concessão dos financiamentos referentes a cada período mensal, sendo natural que calculem seus custos operacionais e margem de lucratividade de acordo com as variações de mercado. Tal procedimento é normal e aceitável, desde que o consumidor seja prévia e devidamente informado dos encargos incidentes sobre a linha de crédito que estão disponibilizados para o período subsequente (mediante indicação prévia nas faturas mensais, por exemplo), de modo que possa avaliar a viabilidade e onerosidade da contração de novos financiamentos, prestigiando o princípio da informação estampado nos arts. 6º, III, 46 e 52, I e II, do Código de Defesa do Consumidor (cf. TJSC, AC 2008.000727-3, Jorge Schaefer Martins, 28.07.2008).

No caso dos autos, as cláusulas gerais e especiais do contrato de desconto de títulos trazidas não estipulam de forma expressa o percentual convencionado a título de juros remuneratórios.

Em situações desse jaez, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial do TJSC, no julgamento dos Embargos Infringentes n. 2015.038388-3, de relatoria da Exma. Desa. Soraya Nunes Lins, deliberou por aplicar a taxa média de mercado informada pelo Banco Central também nas hipóteses em que o instrumento contratual não tenha sido acostado aos autos, acompanhando, assim, o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça.

A propósito: (REsp 1112879/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 12/05/2010, DJe 19/05/2010)

Cabe mencionar, a respeito do tema, o teor da súmula 530 da Corte da Cidadania, aprovada em 13/5/2015:

"Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros efetivamente contratada - por ausência de pactuação ou pela falta de juntada do instrumento aos autos -, aplica-se a taxa média de mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o devedor."

Dessarte, prestigiando a decisão do Grupo de Câmaras de Direito Comercial do TJSC, bem como o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, passa-se a entender que, na impossibilidade de aferição do percentual cobrado a título de juros remuneratórios, seja pela falta de pactuação ou pela ausência do contrato, deve-se aplicar a taxa média divulgada pelo Banco Central, para contratos da mesma espécie, exceto se a taxa cobrada no caso concreto for mais vantajosa para o devedor.

Da capitalização dos juros

Quanto à capitalização de juros, frise-se que a orientação firmada pelo STJ em sede de Recurso Repetitivo REsp n° 973.827-RS, submetido ao regime do artigo 543-C do CPC de 1973 (correspondente ao art. 1.060 do CPC de 2015), de relatoria para acórdão da eminente Ministra Maria Isabel Gallotti, firmou o seguinte entendimento: "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada."

A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a...

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