Acórdão Nº 0602235-33.2014.8.24.0008 do Primeira Câmara de Direito Comercial, 15-12-2022

Número do processo0602235-33.2014.8.24.0008
Data15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoPrimeira Câmara de Direito Comercial
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0602235-33.2014.8.24.0008/SC

RELATOR: Desembargador JOSÉ MAURÍCIO LISBOA

APELANTE: CAIXA DE PREVIDENCIA DOS FUNCS DO BANCO DO BRASIL APELADO: CARLOS ROGERIO APPEL E OUTRO

RELATÓRIO

De pronto, tenho por bem adotar o relatório da sentença, pois além de refletir fielmente a narrativa fática em apreço, garante celeridade ao trâmite processual (art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), in verbis:

Carlos Rogério Appel e Solanhe Schmachtenberg Appel, qualificados e devidamente representados, propuseram a presente "ação de revisão contratual c/c declaração de nulidade de cláusulas e repetição de indébito" em desfavor de Caixa de Previdência Privada dos Funcionários do Banco do Brasil - PREVI, individuada.

Aduziram, em breve síntese, que em 23 de janeiro de 1992, adquiriram um imóvel por meio de contrato de compra e venda com pacto adjeto de hipoteca, no qual a parte ré figurou na qualidade de interveniente credora; que o valor do financiamento foi na cifra de Cr$ 66.631.695,92, sendo Cr$ 63.200.000,00 para atender a compra do referido imóvel, Cr$ 1.332.633,92 para a constituição do Fundo de Liquidez destinado a responder pela solução do saldo devedor acaso verificado ao final da prorrogação de prazo e Cr$ 2.099.062,00 para o pagamento de taxas e demais emolumentos decorrentes do negócio. Afirmam que restou convencionado prazo de 240 meses para amortização, com possibilidade de prorrogação por até 120 meses no caso de persistir saldo devedor. Destacam, ainda, que foram pactuados: juros de 6% ao ano, com incidência sobre o saldo devedor, capitalizados mensalmente; taxa de seguro de 1% ao ano, calculada mensalmente sobre o saldo devedor, a qual seria elevada para 6,02% ao ano quando a requerente atingisse 70 anos de idade; correção monetária pelo IGP-M ou outro índice correspondente à inflação; correção mensal do saldo devedor, sempre no primeiro dia útil de cada mês; coeficiente de equalização de taxas (CET), sendo 5% sobre o valor da prestação inicial, 1%ao ano em virtude da data-base para reajuste salarial da categoria profissional, 6% e 3% a partir dos meses de ocorrência da primeira e segunda promoções da associada; sistema de correção das prestações mensais de amortização; correção monetária de acordo com os índices de reajustes concedidos pelo Banco do Brasil à categoria profissional.

Asseveram que a requerida reajustou as prestações em conformidade com o Plano de Equivalência Salarial da categoria profissional, com base nos aumentos salariais concedidos aos funcionários do Banco do Brasil. E, ainda, que o saldo devedor foi reajustado na forma mencionada e como acréscimo de encargos abusivos (Coeficiente de Equalização de Taxas) e capitalização indevida de juros, inclusive sobre valores que jamais foram liberados aos devedores, os requerentes, a exemplo daquele destinado à constituição do Fundo de Liquidez. Defendem que o correto seria o seguinte: apuração do saldo devedor aplicando-se a taxa de juros pactuada em 6%ao ano, porém descapitalizada, evitando-se o anatocismo; aplicação da mesma taxa de seguro, de 1% ao ano, mas descapitalizada; utilização do IGP-M como índice de correção monetária, salvo nos meses em que for maior que o INPC-IBGE; eliminação do valor destinado ao Fundo de Liquidez. Sob esta perspectiva, a seu ver, o contrato encontrar-se-ia quitado desde o mês de novembro do ano de 2006. Nestes termos, pleiteiam a revisão do contrato, nos moldes acima, coma declaração de nulidade das cláusulas que entendem abusivas, bem como a repetição de indébito.

Valoraram a causa e instruíram a exordial com a documentação de fls. 18/44.

O despacho de fl. 45 deferiu aos autores os benefícios da Justiça Gratuita e determinou a citação da parte ré para, querendo, oferecer defesa no prazo legal.

Citada, a parte ré apresentou contestação às fls. 52/94, por meio da qual arguiu, preliminarmente, a prescrição do direito invocado e a inépcia da petição inicial, sob a justificativa de que a parte autora deixou de apresentar pedido certo e determinado. Quanto ao mérito, defende a não aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso em apreço e a legalidade das cláusulas contratuais. Afirma que, no caso em apreço, não houve amortizações negativas, já que o valor das parcelas sempre foi suficiente para quitar a integralidade dos encargos contratuais e, ainda, amortizar o saldo devedor, pelo que não houve cobrança de juros sobre juros ou prática abusiva, sendo que sempre aplicou juros e índices em estrito cumprimento do livremente pactuado entre as partes. Defende a inexistência de anatocismo pelo uso da Tabela PRICE. Protesta, ainda, pelo reconhecimento da licitude do CET (coeficiente de equalização de taxas), destinado a prevenir e/ou corrigir eventuais diferenças decorrentes da adoção de índices não uniformes para a correção do saldo devedor e das prestações respectivas de amortização. Argumenta não haver ilicitude nos índices de correção monetária previstos no contrato, os quais são admitidos pela jurisprudência. Advoga que ao longo da contratualidade foram concedidos diversos descontos para repactuação da dívida, os quais não poderão ser considerados na hipótese de acolhimento dos pedidos iniciais. Impugna os cálculos apresentados pela parte autora, sob o argumento de que não refletem as cláusulas contratuais pactuadas. No mais, pugna pela realização de prova pericial. Por estas razões, requer a extinção do processo, sem resolução de mérito e, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos.

Houve réplica (fls. 166/169).

Autos conclusos.

Após, sobreveio a parte dispositiva da sentença (evento 32, SENT2), nos seguintes termos:

Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na exordial, para os fins de: a) expurgar das cláusulas sétima e oitava do contrato firmado entre as partes a capitalização mensal de juros, admitida apenas a capitalização anual; b) declarar, para todos os efeitos, a nulidade da cláusula quinta, b, concernente à cobrança de valor a título de Fundo de Liquidez; c) condenar a requerida à restituição, na forma simples, dos valores eventualmente pagos em excesso pelos requerentes, com o acréscimo de correção monetária (INPC) a partir de cada desembolso e juros de mora (1%ao mês) a contar da citação. A apuração dos valores deverá ser realizada em sede de liquidação de sentença.

Diante da sucumbência mínima da requerente, condeno a requerida integralmente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes que arbitro em R$ 3.000,00 (três mil reais).

Assim, declaro extinto o feito, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC.

P.R.I. Se, e quando transitar em julgado, arquive-se.

Irresignada, a entidade demandada interpôs recurso de apelação cível (evento 39, APELAÇÃO3) alegando, em preliminar, a necessidade do reconhecimento de nulidade da sentença, "visto que proferida em flagrante cerceamento de defesa, bem como é considerada decisão surpresa", pois "o Juízo ignorou os pedidos constantes na contestação (única oportunidade fornecida para esta Requerida se manifestar) e procedeu com o julgamento antecipado" (pág. 6).

Em relação ao mérito, assinalou a necessidade de observância à boa-fé contratual e ao pacta sunt servanda, a viabilidade de capitalização mensal, a inexistência de anatocismo pelo uso da Tabela Price, além da necessidade de redistribuição do ônus sucumbencial.

Com as contrarrazões (evento 51, CONTRAZ228 a evento 51, CONTRAZ233), os autos ascenderam a esta Corte, sendo distribuídos...

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