Acórdão Nº 0800097-26.2011.8.24.0005 do Quarta Câmara de Direito Público, 06-10-2022

Número do processo0800097-26.2011.8.24.0005
Data06 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça de Santa Catarina
ÓrgãoQuarta Câmara de Direito Público
Classe processualApelação
Tipo de documentoAcórdão
Apelação Nº 0800097-26.2011.8.24.0005/SC

RELATOR: Desembargador ODSON CARDOSO FILHO

APELANTE: MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ/SC APELADO: ABN AMRO ARRENDAMENTO MERCANTIL S.A

RELATÓRIO

Na comarca de Balneário Camboriú, a municipalidade ajuizou execução fiscal em face de ABN AMRO Arrendamento Mercantil S/A - posteriormente denominado Santander Leasing S/A Arrendamento Mercantil -, mediante apresentação da Certidão de Dívida Ativa (CDA) n. 2235/2011, emitida em 23-9-2011, referente ao "Auto de Infração Leasing" do exercício de 2006, visando à satisfação de crédito no valor de R$ 5.354,09 (cinco mil, trezentos e cinquenta e quatro reais e nove centavos).

Citada (Ev. 11 - 1G), a parte executada sustentou a necessidade de sobrestamento da demanda executiva em razão da determinação, no REsp n. 1.060.210/SC, de suspensão de todos os processos em trâmite no território nacional versando sobre a controvérsia quanto à definição da base de cálculo do ISS incidente sobre operações de arrendamento mercantil ou leasing e quanto à identificação do sujeito ativo da relação jurídico-tributária; também aduziu a pendência do julgamento de apelação cível (autos n. 2007.032882-0) na Ação Anulatória n. 005.06.014186-1, proposta pela instituição financeira em desfavor da municipalidade, cujo objeto era o auto de infração no qual fundada a CDA (Ev. 7-9 - 1G).

O exequente, por seu turno, requereu o prosseguimento do feito, com a realização de penhora on-line (Ev. 12 - 1G).

Na sequência, a magistrada a quo julgou a execução fiscal extinta, nos moldes do art. 267, VI, do CPC/1973, condenando o ente público ao pagamento dos honorários advocatícios, estes fixados em R$ 300,00 (trezentos reais) (Ev. 14 - 1G).

Foram opostos embargos de declaração pelo devedor (autos n. 0011310-86.2016.8.24.0005) (SAJPG).

Irresignado, o município interpôs recurso de apelação com vistas à reforma da sentença, sob o argumento de que o executado "não impugnou a exigência, não expôs uma tese vencedora, e não formulou um requerimento nesse sentido", mostrando-se descabida a condenação ao pagamento de honorários sucumbenciais (Ev. 22 - 1G).

Sem contrarrazões, os autos ascenderam a este Tribunal de Justiça.

Manifestação da Procuradoria-Geral de Justiça indicando ausência de interesse de intervir na causa (Ev. 18 - 2G).

Verificada a existência de questão prejudicial ao julgamento, pois pendentes de apreciação os aclaratórios, determinei o retorno dos autos à origem para as providências cabíveis (Ev. 21 - 2G).

Os embargos de declaração foram acolhidos para "definir como parâmetro para o estabelecimento dos honorários advocatícios o Código de Processo Civil de 2015, e assim, fixando-os em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa" (Ev. 39 - 1G).

Intimadas as partes e, assim, cumprida a diligência, o feito retornou a esta instância.

É o relatório.

VOTO

Cumpre pontuar, inicialmente, que, tendo a sentença combatida sido publicada em 4-4-2016 (Ev. 16 - 1G), isto é, quando já em vigor o Código de Processo Civil de 2015, o caso será analisado sob o regramento do novo Diploma, "respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada" (art. 14 do CPC).

Diante disso, o recurso apresenta-se tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido; recebo-o também em seus efeitos legais (arts. 1.012, caput, e 1.013, caput, do CPC).

A controvérsia cinge-se à possibilidade de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios em execução fiscal extinta sem resolução de mérito quando a parte executada não ofereceu resistência, pois deixou de impugnar o crédito e se limitou a requerer o sobrestamento do feito.

O recurso, adianto, não merece provimento.

No caso, trata-se de execução fiscal ajuizada pelo Município de Balneário Camboriú em face de ABN AMRO Arrendamento Mercantil S/A - antiga denominação de Santander Leasing S/A Arrendamento Mercantil - com vistas à satisfação de crédito de Imposto sobre Serviços (ISS) sobre operações de arrendamento mercantil (leasing), apurado por meio do PAF/AI 001377/2006, no valor de R$ 5.354,09 (cinco mil, trezentos e cinquenta e quatro reais e nove centavos).

Consoante se extrai dos autos, o feito executivo foi ajuizado na pendência do julgamento da Ação Anulatória n. 005.06.014186-1 (0014186-63.2006.8.24.0005), proposta pela instituição financeira em face da municipalidade, com vistas, justamente, à anulação do auto de infração; a anulatória foi julgada procedente, mas aguardava o desfecho da apelação n. 2007.032882-0. Ao tempo da propositura da execucional, encontrava-se igualmente pendente de julgamento o recurso especial repetitivo n. 1.060.210/SC (Tema n. 355), conforme noticiado pelo devedor ao ser citado na execucional (Ev. 7-9 - 1G).

Nesse sentido, observa-se que a sentença de extinção da presente execução fiscal já foi proferida com amparo na tese fixada no recurso representativo de controvérsia, segundo a qual "o sujeito ativo da relação tributária, na vigência do DL 406/68, é o Município da sede do estabelecimento prestador (art. 12); a partir da LC 116/03, é aquele onde o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada, assim entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional da instituição financeira com poderes decisórios suficientes à concessão e aprovação do financiamento - núcleo da operação de leasing financeiro e fato gerador do tributo" (cf. STJ, Recurso Especial n. 1.060.210/SC, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, j. 28-11-2012), assim como no juízo de retratação que manteve a sentença de procedência, por outro fundamento, na anulatória (cf. TJSC, Apelação Cível n. 2007.032882-0, de Balneário Camboriú, rel. Des. Cid Goulart, Segunda Câmara de Direito Público, j. 30-7-2013).

Daí a pertinência da condenação do ente público, à luz do princípio da causalidade, ao pagamento dos honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa (Ev. 39 - 1G).

Evidente, nesse cenário, que a ausência de impugnação propriamente dita do crédito pelo devedor não tem o condão de afastar a condenação do município. A parte executada, afinal, foi citada (Ev. 11 - 1G), e mesmo para o requerimento de sobrestamento da execução, precisou constituir advogado.

A propósito, vejo que o Grupo de Câmaras de Direito Público deste Sodalício admitiu a instauração do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) n. 16, de iniciativa do próprio Município de Balneário Camboriú, julgando-o na sessão do dia 28-7-2021, quando, por unanimidade, firmou a seguinte tese:

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR). AÇÃO ANULATÓRIA E EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUMULATIVIDADE VIÁVEL. AUTONOMIA DAS DEMANDAS. DIREITO SUBJETIVO DO ADVOGADO. TESE FIRMADA: É viável a condenação em honorários advocatícios tanto nos embargos à execução, como na ação anulatória que tratam do mesmo crédito tributário, porquanto as ações são autônomas, exigindo a realização de trabalho pelo causídico em cada uma delas, o que gera ao advogado direito subjetivo à remuneração. (TEMA 16).(TJSC, Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Grupo Público) n. 5073149-08.2017.8.24.0000, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rela. Desa. Sônia Maria Schmitz, Grupo de Câmaras de Direito Público, j. 28-7-2021) (grifei)

Da íntegra do acórdão, que adoto como razões de decidir, tem-se:

[...]

Os honorários, cujo termo encontra origem no latim, foram concebidos como retribuição honrosa e não material ao sujeito que realizava algum feito notável, tal como o exercício da advocacia.

Deveras, em tempos remotos, a atividade do advogado consistia em função honorífica, exercida gratuitamente por aqueles que se dispunham a representar o litigante receoso de se expor por si só em juízo. A remuneração pecuniária foi fruto da evolução e formalização da atividade, que, com o passar do tempo, ganhou contornos mais densos.

A propósito:

A advocacia originou-se do costume de o litigante, constrangido a comparecer pessoalmente em juízo, por via das dúvidas acompanhar-se de um assistente, chamado de patroni ou advocati. Era função honorífica e gratuita nessa época. À medida que as formalidades judiciais aumentaram, e o ordenamento jurídico tornou-se denso e complexo, lenta evolução histórica criou a figura do cognitor ou procurador, o representante legal da parte. Essa transformação do antigo patrono em mandatário importou a onerosidade da atuação do procurador. (ASSIS, Araken. Processo civil brasileiro, v. 2. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 254).

Aliás, no Brasil e alhures, a contraprestação do advogado era vedada expressamente, inclusive com previsão de penalidades, consoante se vê do Alvará do 1º de agosto de 1774, que aqui era aplicado, verbis:

"Item: Porque tem mostrado a experiência não ser bastante nem a providência da Ord. liv. 1 tit. 48 § 11; nem a pena nella imposta para fazerem cessar as convenções, e pactos chamados de quota litis, em que se estipulão quaesquer porções, ou quantias para o caso do vencimento das causas: Prohibo todos os sobreditos pactos, e convenções, ou elles se celebrem com Advogados, Procuradores, ou com outras quaesquer pessoa: debaixo das penas de nullidade dos ditos pactos, e convenções: De trez anos de degredo para Angola, e de perpétua suspensão, e inhabilidade contra os Advogados; E de cinco annos de degredo para Angola contra os mais Procuradores, ou outras quaesquer pessoas, que forem estipulantes nas ditas convenções, por qualquer fórma que sejão celebradas." (sem destaque no original)

O advogado limitava-se a perceber emolumentos estabelecidos no regimento de custas, não podendo ser remunerado nem pelo Governo, tampouco por seu cliente. Somente em 1874, com a edição do Decreto n. 5.737, alterando o regimento de custas judiciárias, passou-se a franquear ao procurador a faculdade de estabelecer...

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