Acórdão nº 0800272-56.2018.8.14.0133 do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, 2ª Turma de Direito Público, 27-11-2023

Data de Julgamento27 Novembro 2023
Órgão2ª Turma de Direito Público
Ano2023
Número do processo0800272-56.2018.8.14.0133
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
AssuntoIndenização por Dano Moral

APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0800272-56.2018.8.14.0133

APELANTE: SILVIO HUMBERTO ALVES

APELADO: GUAMA - TRATAMENTO DE RESIDUOS LTDA, REVITA ENGENHARIA S.A., VEGA VALORIZACAO DE RESIDUOS S.A. - VVR, SOLVI PARTICIPACOES S/A.

RELATOR(A): Desembargador LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

EMENTA

EMENTA: AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATERRO SANITÁRIO DE MARITUBA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO PELO RECONHECIMENTO DE LITISPENDÊNCIA COM AÇÃO CIVIL PÚBLICA COLETIVA. DECISÃO EM CONTRARIEDADE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO ACESSO À JUSTIÇA E ÀS NORMAS DO CPC E CDC. PRECEDENTE TJPA EM CASO ANÁLOGO. DECISÃO CONTRÁRIA À JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ. AFASTAMENTO DA LITISPENDÊNCIA E SUSPENSÃO DA AÇÃO INDIVIDUAL. OBSERVÂNCIA DA TESE FIXADA NO TEMA 60/STJ (RESP Nº 1110549/RS). RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. O ajuizamento de Ação Civil Pública pelo Estado do Pará não afasta o interesse processual para busca de tutela judicial individual. Impõe-se a observância à garantia constitucional do acesso à Justiça.

2. O direito de ação é uma garantia constitucional prevista no inciso XXXV do art. 5º da CF/88. Não se confundindo a ação coletiva com a individual, o interesse processual permanece, como previsto nas condições da ação no art. 17 do Código de Processo Civil.

3. Deve ser afastada a litispendência entre as ações individual e a coletiva, já que o CPC, no art. 337, §2º dispõe três pressupostos para que uma ação seja considerada idêntica à outra: mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido.

4. O Código de Defesa do Consumidor - Lei nº 8.078/90, no art. 104, é expresso quanto à inexistência de litispendência entre as ações coletivas previstas no artigo 81, parágrafo único, incisos II e III, e as ações individuais. Precedente TJPA em caso análogo.

5. Impossibilidade de extinção do feito sob o fundamento de litispendência, no entanto, cabível a suspensão da ação individual, nos termos do art. 104 do CDC, para aguardar a conclusão da coletiva, primando pela segurança jurídica dos jurisdicionados. Observância da Tese fixada STJ no julgamento do Tema nº 60, no sentido de que “Ajuizada ação coletiva atinente a macro-lide geradora de processos multitudinários, suspendem-se as ações individuais, no aguardo do julgamento da ação coletiva” (REsp 1110549/RS).

6. Recurso conhecido e improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores, integrantes da 2.ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Plenário Virtual do Tribunal de Justiça do Estado do Pará.

Julgamento presidido pelo Excelentíssimo Senhor Des. Mairton Marques Carneiro.

Belém, data registrada no sistema.

DES. LUIZ GONZAGA DA COSTA NETO

RELATOR

RELATÓRIO

Tratam os presentes autos de AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL interposto por GUAMÁ - TRATAMENTO DE RESÍDUOS LTDA, REVITA ENGENHARIA S.A, VEGA VALORIZAÇÃO DE RESÍDUOS S.A. – VVR E SOLVI PARTICIPAÇÕES S/A em desfavor da decisão monocrática (ID. nº 13055673) proferida por este Relator, por meio da qual conheci e dei provimento ao recurso de apelação para determinar a devolução dos autos ao Juízo a quo, para tramitação regular, observada a suspensão do mesmo até o julgamento da macrolide.

Inconformado, o agravante alega inicialmente, da impossibilidade de julgamento monocrático, ausência de previsão legal e possibilidade de julgamento monocrático apenas nas hipóteses previstas no art. 932 III a v. inteligência do art. 1.011 do CPC.

Assevera pela manutenção da sentença combatida, já que o dano moral apontado decorre de um dano ambiental já apreciado em ação civil pública, inexistindo demonstração de especificidades que amparem o direito da apelante, ou seja, ausente a demonstração da existência de dano em ricochete.

Ante esses argumentos, requer que o presente agravo interno seja recebido, possibilitando o Desembargador Relator para exercer o Juízo de retratação caso assim querer, caso não exerça o Juízo de retratação, requer seja processado o presente agravo interno, a fim de que seja levado ao julgamento perante a Colenda Turma Julgadora para que seja dado provimento ao presente recurso determinando a reforma da decisão monocrática proferida, para determinar que a apreciação do recurso de apelação interposto pelo agravado seja realizada de maneira colegiada, sob pena de ofensa ao devido processo legal que enseja grave insegurança jurídica.

Requer ainda o prequestionamento dos artigos 1.011 e 932, incisos III a V do CPC, art. 82 e 104 da Lei n. 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) e art. 5º da Lei n. 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública), a fim de preencher o requisito de prequestionamento necessário para eventual interposição de recursos às instâncias superiores.

Não foram apresentadas contrarrazões, conforme certidão do (ID. nº 13818896).

É o suficiente relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente agravo interno e passo a proferir o voto.

De início e sem delongas, afirmo que não há razões para alterar o decisum agravado, eis que, além de devidamente fundamentado, apresenta-se em sintonia com as jurisprudências das Cortes Superiores.

Inicialmente, em relação ao cabimento de julgamento monocrático na decisão agravada, ressalto que as hipóteses autorizadas pelo CPC para julgar monocraticamente o recurso não se restringem ao art. 932, inciso IV e IV, estando inclusas também as situações previstas no Regimento Interno do Tribunal, nos termos do inciso VIII do referido dispositivo.

Nesse sentido, o art. 133, XI, “d”, do Regimento Interno do TJ/PA dispõe que compete ao Relator negar provimento ao recurso contrário à jurisprudência dominante desta Corte ou de Cortes Superiores, o que se observa no presente caso. Dessa forma, da leitura do art. 932, VIII, do CPC c/c art. 133, XI, d, do Regimento Interno deste Tribunal, não há que se falar de inadequação da decisão por comportar julgamento monocrático. Ressalta-se ainda que, se o recorrente não se conformar com a decisão monocrática e almejar pronunciamento colegiado, faculta-lhe a interposição de recurso adequado, qual seja Agravo Interno.

Assim, rejeito à arguição de nulidade da decisão agravada.

Ademais, cinge-se a controvérsia, tão somente, acerca da ocorrência de litispendência entre ações de natureza coletiva e ação de natureza individual, ou, para ser mais específico, se correto o juízo a quo a quando da prolação de sentença extintiva da relação processual, consistente na presente ação de natureza, repito, individual, em razão da ocorrência do fenômeno da litispendência em relação à ação nº 0800524-93.2017.8.14.0133, de natureza coletiva (ação civil pública) ajuizada anteriormente pelo Estado do Pará, ambas, e cada uma de acordo com a sua natureza jurídica, postulando a indenização por danos morais.

Em razão disto, o juízo de 1º grau considerou ocorrente a litispendência (repetição de ação que está em curso - art. 337, §3º, do CPC) e definiu que a questão haveria de ser resolvida na lide coletiva, de vez que, no caso em debate, não haveria o chamado dano ricochete, e tendo sido aforada primeiramente a ação coletiva, privilegia-se a solução da tutela coletiva, daí porque entendeu caracterizada a litispendência e extinguiu o feito, na forma do art. 485, V, do CPC/15.

Compulsando os autos, entendi que assistiu razão ao apelo, na medida em que do ponto de vista constitucional, viola a Carta Magna a existência de qualquer empeço para que o jurisdicionado possa acessar, individual e livremente, o Judiciário em situações de lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV, da CF/88).

É o chamado livre exercício do direito de ação que, como sabemos, é direito público subjetivo, genérico, abstrato e incondicionado, dado a todos, sem distinções e retaliações de qualquer espécie. Por ele, em outras palavras, todos têm acesso à justiça para pleitear tutela jurisdicional preventiva ou reparatória a lesão ou ameaça de lesão a um direito individual, coletivo, difuso e até individual homogêneo.

O princípio do direito de ação, também conhecido como princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional foi positivado no Brasil pela Constituição de 1946 e consta da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, proclamada pela ONU (art. 10) e, ainda, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (San José, Costa Rica, art. 8º, 1).

Assim, julgo que é despropositada a extinção de uma ação individual baseada no fato de que há uma demanda coletiva embasada com o mesmo objeto sob a justificativa da ocorrência do fenômeno processual da litispendência por se tratar de claro empecilho posto ao exercício do sagrado e fundamental do direito de ação.

Somado a isso, deve ser afastada a litispendência entre as ações individual e a coletiva, já que o CPC, no art. 337, §2º dispõe três pressupostos para que uma ação seja considerada idêntica à outra: mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido.

Por outro lado, o Código de Defesa do Consumidor - Lei nº 8.078/90, no seu art. 104 é expresso quanto à inexistência de litispendência entre as ações coletivas previstas no artigo 81, parágrafo único, incisos II e III, e as ações individuais, senão vejamos:

“Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:

(...)

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem...

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