Acórdão Nº 0800796-12.2017.8.10.0000 do TJMA. Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, 2ª Câmara Cível, 2019

Ano2019
Classe processualAgravo de Instrumento
Órgão2ª Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão


SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Sessão do dia 26 de fevereiro de 2019

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 0800796-12.2017.8.10.0000

Agravante: Noel Mendes Pereira

Advogados: Willington Marcos Ferreira Conceição (OAB/MA 8.556) e outros

Agravado: Estado do Maranhão

Procurador: Sérgio Tavares

Relator: Desembargador Marcelo Carvalho Silva

EMENTA

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO INTERNO PARA AMPLIAÇÃO DE CARGA HORÁRIA DO MAGISTÉRIO. AVALIAÇÃO DE TÍTULOS EM DESCONFORMIDADE COM OS CRITÉRIOS ESTABELECIDOS NO EDITAL. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. MÉRITO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE DE EXAME PELO PODER JUDICIÁRIO. AGRAVO PROVIDO

I — “Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, quando a ação busca aferir a suposta ilegalidade de uma das etapas do concurso, a homologação final do concurso não conduz à perda do interesse de agir.” (AgRg nos EDcl no AREsp 77.316/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/02/2014, DJe 18/02/2014)

II — A tese que o Poder Judiciário não pode penetrar na intimidade do exame do mérito da decisão administrativa em decorrência do princípio da separação de poderes, da conveniência, a utilidade, e a oportunidade, deve ser (re)pensada pelos operadores do direito. A vedação do exame do mérito administrativo é uma criação do próprio Estado Autoritário. A velha concentração de poder do Estado quanto aos seus súditos.

III — A Carta Federal de 1988 abriu profundas veredas quanto ao controle judicial da Administração, para levá-los além da legalidade estrita do ato administrativo e de seus motivos determinantes, quando expressos. Cabe ao Poder Judiciário questionar a legitimidade, a economicidade, a razoabilidade, a proporcionalidade e a eficiência e os resultados. Por isso, diante da nova realidade, deve prevalecer a interpretação ampliativa da possibilidade de controle judicial diante do direito fundamental inscrito no artigo 5º, inciso XXXV, não restrita às questões de legalidade, mas abrangente, sobretudo, das questões meritórias.

IV — Agravo de instrumento provido, de acordo com o parecer ministerial.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por maioria de votos, em dar provimento ao recurso, de acordo com o parecer ministerial, tudo nos termos do voto do Desembargador Relator.

Participaram do julgamento os Senhores Desembargadores Marcelo Carvalho Silva, Nelma Celeste Souza Silva Sarney Costa e o Juiz de Direito, Dr. José Edilson Caridade Ribeiro (convocado).

Funcionou pela Procuradoria-Geral de Justiça o Dr. Raimundo Nonato de Carvalho Filho.

São Luís, 26 de fevereiro de 2019.

Desembargador Marcelo Carvalho Silva

Relator

RELATÓRIO

Adoto como relatório o contido no parecer ministerial, in verbis:

Trata-se de agravo de instrumento com pedido de antecipação da tutela recursal, interposto da decisão da juíza da 3ª Vara da Fazenda Pública do termo judiciário homônimo da comarca da Ilha de São Luís, na ação proposta por Noel Ferreira Mendes contra o Estado do Maranhão, que indeferiu tutela antecipada de urgência, por ausência dos elementos caracterizadores.

Na base, busca o autor compelir o réu: (i) à retificação da sua pontuação na prova de títulos do concurso interno para ampliação da jornada de trabalho, de 20 para 40 horas semanais, dos professores do magistério da educação básica, habilitação para o ensino médio, disciplina Física, regido pelo edital 006/2016-SEDUC; e (ii) por conseguinte, à modificação “para primeiro colocado no certame, retirando-o da condição de excedente”.

O agravante sustenta que apresentou cópias autenticadas do diploma de mestrado e do certificado do curso de aperfeiçoamento, o que lhe garantiria 32 pontos e o primeiro lugar para a única vaga ofertada à disciplina suso. Atribui ao réu a responsabilidade pela ausência do diploma no processo administrativo encaminhado à banca examinadora. Diz que apenas o reconhecimento do curso de aperfeiçoamento faria com que alcançasse 12 pontos, suficientes para ultrapassar a primeira colocada.

Aduz excesso de formalismo não ter sido computada a pontuação referente ao título de mestre, mormente quando este já foi reconhecido pela Administração.

Afirma que a pretensão não enseja invasão no mérito administrativo, mas correção de ilegalidade, baseada em critérios objetivos do edital. Requer o provimento, liminar e definitivo, para determinar a recontagem dos pontos e classificação à vaga ofertada.

Deferida a liminar recursal.

Sem contrarrazões, os autos vieram à PGJ/MA.

Ao final, a douta Procuradoria de Justiça, por meio da Dra. Domingas de Jesus Froz Gomes, manifestou-se pelo provimento do recurso (fls. ID. 1707899 - Pág.5).

É o relatório.

VOTO

I — Juízo de admissibilidade

Verifico a presença dos pressupostos intrínsecos de admissibilidade: a) cabimento; b) legitimidade; c)interesse; d) inexistência de fatos impeditivos ou extintivos do poder de recorrer.

Por outro lado, estão igualmente atendidos os requisitos extrínsecos exigidos para o regular andamento do presente feito: a) tempestividade; b) regularidade formal e c) preparo.

Conheço pois presente recurso.

II — Da pretensão recursal

Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, quando a ação busca aferir a suposta ilegalidade de uma das etapas do concurso, a homologação final do concurso não conduz à perda do interesse de agir.” (AgRg nos EDcl no AREsp 77.316/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/02/2014, DJe 18/02/2014)

Pois bem.

O legislador constitucional de 1988 traduz plenamente a independência dos Poderes de Estado. Assim, os princípios esculpidos no artigo 5º, da CRFB, são considerados fundamentais e cláusulas pétreas.

Diante disso, a Carta de 1988 inseriu no artigo acima citado, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, ou seja, qualquer lesão ou ameaça a direito deve ser conhecida pelo Poder Judiciário.

Sobre os aspectos históricos de inserção de tal garantia na Carta Magna, e as diretrizes do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, veja-se a lição do Doutor e Mestre FLAVIO GALDINO1:

“Na década de 1960 o País é colhido por novo momento de autoritarismo - o chamado ‘Golpe Militar de 1964’. Novamente ocorrerá concentração de poderes - executivos e legislativos - no Poder Executivo. Dessa feita, verificou-se grande empenho por parte daqueles que tomaram o governo em institucionalizar esse poder (não por acaso editaram-se Atos Institucionais), criando um novo manto de legitimidade formal através da juridicização de seus atos. Um excelente registro desse período - também injustamente esquecido - vem da lavra do eminente Professor Felippe Augusto de Miranda Rosa.

Considerando a resistência inicial de vários setores do Poder Judiciário em serem cooptados pelo regime autoritário (rectius: em legitimarem o poder ditatorial) - sendo exemplo notável a mais alta Corte do País, o Supremo Tribunal Federal, mais uma vez o Poder Executivo ‘constituído’ excluiu do Poder Judiciário a possibilidade de apreciação de determinados atos praticados pelo governo ‘revolucionário’ - desconsiderando-se aqui várias outras medidas adotadas contra magistrados (punições, aposentadorias) e com o escopo de reduzir a amplitude do controle judicial, que de fato foi praticamente anulado durante anos.

Dessa feita a exclusão se deu através de dois movimentos diferentes, um deles deveras ímpar. De um lado, de modo bastante original, houve a transferência para a Justiça Militar da competência para julgar várias espécies de causas "civis", registrando a história que a estratégia do governo militar naufragou, pois embora os julgadores de primeiro grau...

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